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RESISTÊNCIA

AO
CISALHAMENTO
(Apostila EESC-USP)

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RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO

1. INTRODUÇÃO

Vários materiais sólidos empregados em construção resistem bem a tensões de


compressão, porém têm uma capacidade bastante limitada de suportar tensões de tração e de
cisalhamento. Assim ocorre com o concreto e também com os solos.
No caso dos solos, a menos de situações especificas, são geralmente considerados apenas
os casos de solicitação por cisalhamento, pois as deformações em um maciço de terra são devidas a
deslocamentos relativos entre as partículas constituintes do maciço. Dessa forma, ao mencionar a
resistência dos solos está - se implicitamente falando de sua resistência ao cisalhamento.
A resistência forma, ao lado da permeabilidade e da compressibilidade, o suporte básico
para resolução dos problemas práticos da engenharia de solos. Trata-se de uma propriedade que
apresenta certa complexidade em sua determinação, pois além das suas próprias dificuldades deve-
se levar em conta as dificuldades pertinentes ao conhecimento da permeabilidade e da
compressibilidade, visto que estas interferem decisivamente na resistência do solo.
Dentre os problemas usuais em que é necessário conhecer a resistência do solo, destacam-
se a estabilidade de taludes, a capacidade de carga de fundações e os empuxos de terra.

1.1. Curvas Tensão Deformação Típicas e Tensão de Ruptura

Conquanto o conceito de resistência seja algo intuitivo, definir resistência para um solo
não é tão simples, devido sobretudo à dificuldade de definir ruptura. A ruptura em um solo é um
conceito que envolve ruptura propriamente dita e deformação excessiva. Para ilustrar este tópico,
apresentam-se na Figura 13.1 algumas curvas típicas tensão-deformação que diferentes materiais
podem apresentar. Para um material que apresenta ruptura do tipo frágil, como aquele
representado pela curva tensão-deformação da Figura 13.1a), não há dificuldade em tomar-se o
valor da tensão máxima suportada pelo corpo de prova como tensão de ruptura. Como se sabe, na
ruptura de tipo frágil, o valor da tensão cresce acentuadamente, com pequenas deformações,
quando então para um certo valor de tensão r, o material subitamente rompe. Materiais como o
concreto em tração apresentam comportamento desse tipo. O mesmo já não ocorre quando o
material apresenta curvas tensão-deformação como as mostradas na Figura 13.1 b), c) e d). Tais
curvas são comuns em solos. No caso b), tem-se solos que apresentam ruptura do tipo plástico
("por deformação excessiva"), isto é, a tensão é crescente até um determinado valor y (tensão de
cedência ou de plastificação) e a partir daí as deformações apresentam uma parcela irreversível ou
permanente que continua a crescer, praticamente sem variação de tensões. Num caso como este, a
tensão de cedência poderia caracterizar a ruptura, pois uma vez que ela fosse atingida as

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deformações poderiam crescer de tal monta de sorte a inviabilizar qualquer obra construída com
esse solo ou sobre ele.

Tensão Tensão
R +
Y

Deformação Deformação
(a) (b)
Tensão Tensão
pico
res

Deformação Deformação
(c) (d)

Figura 13.1: Exemplos de curvas tensão-deformação em solos.

Na situação representada pela curva da Figura 13.1c), a tensão atinge um valor máximo
(pico), para em seguida decrescer e encaminhar-se para um valor constante, que caracteriza a
chamada resistência residual. Materiais como estes são conhecidos como materiais que apresentam
amolecimento (work-softening). Numa situação como esta, costuma-se definir a tensão de ruptura
como o valor de pico (pico), contudo, em certas ocasiões, pode-se utilizar para definir a ruptura o
valor da tensão residual (res).
Materiais representados pela Figura 13.1d) são classificados como materiais que
apresentam endurecimento (work-hardening), admitindo ganhos adicionais de resistência à medida
que aumentam as deformações. Evidentemente, como nesta situação não há nenhum ponto
característico que possa sugerir a ruptura, um critério possível é definir a "ruptura" em função das
deformações que estão em jogo. Na falta de um valor especifico para a situação, tem sido utilizado
como valor rotineiro a tensão correspondente a uma deformação de 15 ou 20%. Ressalte-se que,
em determinadas situações, para quaisquer dos materiais apresentados pode-se condicionar a
tensão de ruptura a um determinado valor de deformação permissível, como, por exemplo, 5%. No
item 5, correspondente a ensaios para determinação da resistência ao cisalhamento, ilustram-se
estas formas de definição da tensão de ruptura.
Além da possibilidade de determinar a tensão de ruptura, as curvas tensão deformação
permitem obter o módulo de elasticidade que encontra aplicação no cálculo de tensões e
deformações provocadas por uma determinada solicitação. No item 11 retoma-se este assunto.

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2. CAUSAS FÍSICAS DA RESISTÊNCIA DOS SOLOS

2.1- Introdução

Em linhas gerais, pode-se dizer que a resistência dos solos é proporcionada por forças de
atrito resultantes de enlaces moleculares nas superfícies em contacto.
Segundo a lei de Coulomb, a resistência por atrito é função da tensão normal no plano de
deslizamento relativo. Costuma-se representar a resistência por atrito de duas formas, segundo se
esquematiza na Figura 13.2, onde dois corpos sólidos estão em contacto .
Pode-se utilizar o coeficiente de atrito, , ou a obliquidade máxima (máx = ) que a
resultante forma com a normal, valor este atingido quando a força T é capaz de dar início ao
deslocamento relativo dos corpos. O ângulo de máxima obliquidade recebe o nome de ângulo de
atrito e é representado por .

R  W
Fa = Tmáx =  . N
Fa = Tmáx = N . tg máx
T
máx = 
Fa Fa = N . tg 
N

Figura 13.2: Atrito entre corpos sólidos.

A lei de Coulomb resultou de observações empíricas. Terzaghi (1925) elaborou uma teoria
que fornece embasamento físico para as constatações empíricas das leis de atrito.
Segundo Terzaghi, em sua "Teoria Adesiva do Atrito", a superfície de contacto real entre
dois corpos constitui apenas uma parcela da superfície aparente de contanto, dado que em um nível
submicroscópico as superfícies dos materiais são efetivamente rugosas. O contacto se dá então
apenas nas protuberâncias mais salientes, conforme se mostra na Figura 13.3.

N N

T T

N
N
Ac1 Ac2
(a) (b)

Figura 13.3: Contacto entre corpos sólidos. a) vista macroscópica; b) vista microscópica.

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As tensões transmitidas são significativamente altas, a ponto de provocar a plastificação do
material nos pontos de contacto. Sendo Ac a área real de contacto, N a força normal atuante e y a
tensão de cedência do material resulta:

N
Ac  (13.1)
y

Admitindo que a resistência do material da região plastificada é , a máxima força


cisalhante possível de se aplicar (T), será:

T =  . Ac (13.2)

Disso resulta que o coeficiente de atrito será:

T .Ac 
   (13.3)
N  y .Ac  y

Considerando que o coeficiente de atrito deve ser governado pelo que ocorre nos pontos
reais de contacto, as características de rugosidade e de adsorção da superfície da partícula serão
relevantes para controlar a resistência que se desenvolve. A rugosidade governa o tamanho das
protuberâncias superficiais, que em geral são diferentes quer se consideram partículas grossas ou
partículas finas. Por outro lado, a adsorção de água e outras substâncias tende a afetar a natureza e
o tamanho da área de contacto entre partículas.

2.2 - Esforços Normais e Resistência das Partículas de Solo

As partículas minerais vêem-se envolvidas por uma película de água adsorvida, fruto de
potenciais elétricos de superfície, não equilibrados. As forças de superfície são maiores nas
partículas finas. Estas atraem então moléculas de água e cátions, os quais por sua vez podem atrair
água também. Determinados cátions, como o Na+ por exemplo, fazem com que a película de água
adsorvida seja bastante espessa.
A água adsorvida, submetida às altíssimas tensões de adsorção que normalmente se
verificam entre partículas finas, encontra-se solidificada (ou com alta viscosidade) próximo às
partículas e tem grande importância na resistência que se desenvolve.
A Figura 13.4 esquematiza a natureza das forças que podem se desenvolver entre duas
partículas.

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Mineral
Fm - Mineral x Mineral
Superfície Fa - Ar x Mineral
de
cisalhamento Fm Fa A' R ' Fw Fw - Água x Mineral
Água x Água
A' - Atração
Ar Mineral Água R' - Repulsão

Figura 13.4: Forças entre partículas

Em linhas gerais as forças normais e cisalhantes se transmitem apenas nos contatos entre
minerais. As outras ações, sobretudo as de atração e repulsão, têm a sua importância em
determinados solos, como se mostrará adiante.
A presença de água adsorvida, entretanto, sugere que possam existir situações nas quais
não se desenvolvam contactos entre minerais e daí pode ocorrer que esforços normais sejam
transmitidos através da película de água.
Um elucidativo exemplo da transmissão de esforços através de um conjunto de partículas é
fornecido por Lambe & Whitman (l969), o qual se reproduz em seguida. São considerados os
casos extremos de partículas lamelares colocadas face a face e de um arranjo de partículas grossas
equidimensionais. No primeiro caso, duas placas recobertas de montmorilonita sódica úmida são
solicitadas por uma forca de 63,1 N, atuante numa área de 625 mm2 (Figura 13.5a).
Na Figura 13.5 b) aparece a relação entre a tensão normal e a separação entre as partículas,
obtida experimentalmente para o material em questão. Pode-se observar que para uma tensão de
0
0,1 MN/mm2 (l atm) a distância correspondente é de 115 A , o que indica a possibilidade de
transmissão de esforços sem que haja contacto direto mineral-mineral. Destaque--se ainda, que é
necessário uma tensão de 550 MN/mm2 para expulsar a película de água adsorvida e possibilitar o
contacto direto entre as partículas para a configuração apresentada.

6
F = 63,1 N

placa

placa
mm 63,1
argila =
2
25 = 0,101 MN/m
625
25 mm
(a)

partícula de argila
o
Espaçamento entre

2d = 115 A
partículas ( A )

200
o

partícula de argila
o

2d = 115 A
100  = 0,1 espaçamento torna-se
2
nulo para 550 MN/m

0
0,01 0,1 1,0 10 100
2
Tensão (MN/m )

(b)
0,6 mm

área de contacto 63,1


areia =
2
 0,03 % da área total = 335 MN/m
0,188

partículas de areia

(c)

Figura 13.5: Transmissão de esforços entre partículas (Lambe & Whitman, 1972).

Na segunda situação as placas são revestidas por partículas de areia equidimensionais, com
diâmetro aproxima do de 0,06 mm, permanecendo a mesma área de contacto aparente de 625 mm2.
Para essa configuração, a área real de contacto corresponde a cerca de 0,03% da área
aparente de contacto. A tensão transmitida nos pontos de contacto será:

63,1
 2
 335MN / mm2 (13.4)
0,0003.25

Essa tensão é capaz de expulsar a película de água adsorvida que envolve os grãos de areia,
possibilitando contactos grão a grão.
Evidentemente, tais situações constituem casos extremos. Como se sabe, os solos são uma
mistura de partículas das mais variadas formas e tamanhos o que possibilita a disposição das
partículas segundo situações intermediárias entre as apresentadas. No caso das argilas, qualquer
grau de floculação possibilitará contactos reais, partícula a partícula, de forma que a transmissão de
esforços, de uma maneira genérica se situa intermediariamente entre os casos propostos. Há
evidências de que o mecanismo de transmissão de esforços normais se aproxima muito mais do
caso das partículas equidimensionais.

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As tensões atuantes podem gerar contactos de natureza elástica e plástica. Na Figura 13.6
ilustra-se um contacto plastificado entre partículas, em presença de uma película adsorvida a partir
do qual algumas diferenças que se observam no atrito entre minerais massivos e lamelares podem
ser qualitativamente explicadas.

Água adsorvida
N
T

 Ac

Ac

Figura 13.6: Contacto plastificado entre duas partículas com película adsorvida. (Mitchell, 1976)

Como as superfícies estão envolvidas pela película adsorvida, o contacto real se dá em


apenas uma parcela da área total (Ac) e a máxima força de cisalhamento (T) será:

T = Ac [ + (1 - ) f ] (13.5)

onde f é a resistência ao cisalhamento da película e  a resistência da partícula mineral.


No caso de um arranjo de partículas grossas, as altas tensões nos contactos implicarão a
extrusão da película adsorvida e um aumento das áreas reais de contacto e conseqüentemente da
resistência (ângulos de atrito altos). Partículas de quartzo usualmente exibem ângulos de atrito
variando entre 26 e 30. Ressalte-se, contudo, que esta não é a única fonte de resistência num
conjunto de partículas granulares como se discutirá adiante (vide Item 8).
Para um arranjo de partículas finas, a carga em cada contacto inter-partícula tende a ser
baixa e, passa a ganhar relevância, a película adsorvida. As áreas de contacto mineral-mineral
serão reduzidas ocasionando baixos ângulos de atrito, já que é razoável supor que a resistência na
película de água (f) é muito menor do que no mineral. No caso extremo de partículas colocadas
face a face e na impossibilidade de um contacto direto, o cisalhamento se dará através da película
adsorvida, resultando baixíssimos ângulos de atrito.
Este modelo de representação não deve ser generalizado para qualquer solo de partículas
finas. A constatação de ângulos de atrito relativamente altos reforça a idéia de que o mecanismo
de resistência, na maior parte dos solos argilosos, se aproxima muito mais do observado
caracteristicamente nos solos de granulação grossa.
Deve-se lembrar ainda que, no caso de partículas finas as forças de superfície passam a
desempenhar um papel importante. Assim, o arranjo de partículas finas poderá contar com uma
resistência adicional gerada pelas forças de atração inter-partículas, denominada de coesão.

8
2.3 - Coesão

A coesão consiste na parcela de resistência de um solo que existe independentemente de


quaisquer tensões aplicadas e que se mantém, ainda que não necessariamente a longo prazo, se
todas as tensões aplicadas ao solo forem removidas.
Várias fontes podem originar coesão em um solo. A cimentação entre partículas
proporcionada por carbonatos, sílica, óxidos de ferro, dentre outras substâncias, responde muitas
vezes por altos valores de coesão. É interessante notar que os agentes cimentantes podem advir do
próprio solo, após processos de intemperização. Tal ocorre, por exemplo, na silificação de arenitos,
quando a sílica é dissolvida pela água percolante e depositada como cimento (Paraguassu, 1972).
Excetuando-se o efeito de cimentação, pode-se especular que as outras formas de coesão
sejam devidas a forças normais "internas” ou “intrínsecas” que proporcionam uma resistência
adicional por atrito. Esta parcela adicional de resistência independe das tensões externas que
geram a reação normal. As tensões "internas” ou “intrínsecas” são o resultado da ação de muitas
variáveis no sistema solo-água-ar-eletrólitos, podendo-se destacar as forças de atração e de
repulsão (forças R’ e A’ Figura 13.4), originadas por fenômenos eletrostáticos e eletromagnéticos e
as propriedades da película adsorvida junto às partículas, que contribuem para transmitir e
modificar as forças eletroquímicas atuantes inter-partículas.
As atrações de origem eletrostática decorrem da interação entre partículas de cargas
opostas. Evidentemente também ocorrem forças de repulsão quando as partículas apresentam
cargas de mesma natureza. As forças de atração ganham relevância quando as partículas se
encontram a distâncias menores que 25 A. Já as atrações eletromagnéticas, do tipo das forças de
Van der Waals, têm chance de contribuir quando as distâncias entre as partículas são muito
pequenas e quando essas partículas são menores que l m. As formas complementares de atração
inter-partículas devem-se a ligações do tipo pontes de hidrogênio e de potássio. Maiores detalhes
sobre a interação entre partículas de solo e sua interferência sobre a resistência, bem como outras
propriedades do solo podem ser obtidas em Lambe & Whitman (1969) e Mitchell (1976).
Um aspecto interessante refere-se aos tipos de ligação proporcionados pelas forças
intrínsecas. Existem evidências de que além de ligações elásticas podem ocorrer junções plásticas,
como no caso dos solos sobre-adensados, onde se constata que a resistência é proporcional a tensão
de pré-adensamento.
A despeito das dificuldades de explicação física e da medida de seu valor, tem-se
constatado que a coesão aumenta com:
a) quantidade de argila e atividade coloidal.
b) sobre-adensamento
c) diminuição da umidade.

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2.4 - Coesão Aparente

Existe um tipo de coesão, muito comum, que não tem sua origem na cimentação e nem nas
forças intrínsecas de atração. Esta coesão, denominada de aparente, ocorre em solos não saturados
e deve-se ao efeito da interação da matriz do solo com a água (efeitos capilares e de adsorção). A
água num solo não saturado encontra-se com pressão neutra negativa e tende a atrair as partículas,
com aumento da tensão normal. Embora o princípio das tensões efetivas não possa ser estendido
indiscriminadamente aos solos não saturados, pode-se, em primeira aproximação, utilizá-lo para
explicar o aumento da resistência . Para os solos saturados tem-se ' =  - u . Como a água num
solo não saturado encontra-se com pressão neutra negativa, tem-se uma situação em que a tensão
normal efetiva supera a tensão total, donde o ganho adicional de resistência.
Esse tipo de coesão desaparece caso o solo seja totalmente saturado ou secado, donde o
nome aparente. A sua intensidade cresce com a diminuição do tamanho das partículas.
A Figura 13.7 ilustra a contribuição, para a resistência, das diversas fontes citadas.

5
10 Argilas Siltes e areias

4
10
Resistência a tração (psi)

3
10
Cimentação por
compactação
2
10 Ad
es
ã o
Li ca Cimentação por
10 ga pi
çõ la deposição
e r
s
de
1 Va
n
D
er
-1 W
10 aa
ls
-2
10 -7 -6 -5 -4 -3 -2 -1
10 10 10 10 10 10 10 1
 (cm)

Figura 13.7: Contribuição dos vários mecanismos de ligação para a resistência dos solos (Ingles,
1962 in Mitchell, 1976).

10
SOBRA

No caso de partículas grossas, a altura das protuberâncias é muito menor do que o diâmetro
das partículas, de modo que cada contacto aparente engloba minúsculos contactos reais, donde se
devem esperar altas tensões nesses pontos de contacto. Nas partículas finas, ainda que mais lisas,
são pouco prováveis ou contactos face a face, devido às forças de superfície. Assim os contactos
devem se dar, predominantemente, através das quinas das articulas e cada contacto deve ocorrer
atra vás de uma única protuberância, resultando um esquema resistente semelhante ao que ocorre
nas partículas grossas.

Conforme já salientado, os contactos inter-partículas dependem das protuberâncias


superficiais. Mitchell (1976) postula que para um dado número de contactos por partículas, a carga
em cada contacto é maior nas partículas grossas; para partículas de mesmo tamanho as cargas são
menores nas partículas lamelares (mica, etc.) do que nas partículas massivas (quartzo, feldspato,
etc.) .

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3. ESTADO PLANO DE TENSÕES. CÍRCULO DE MOHR. POLO

Vários problemas da Mecânica dos Solos permitem soluções considerando um estado de


esforços no plano. O elemento de solo da Figura 13.8a) está submetido a um estado plano de
tensões. Por essa razão, as tensões que têm por direção a normal ao plano considerado são nulas,
isto é: xy = yx = zy = yz = y = 0 e por razões de equilíbrio xz = zx = .

z z z
1
zx
xz 

x 3

x x
(a) (b)

Figura 13.8: a) elemento de solo sujeito a estado plano de tensões; b) elemento sujeito a tensões
principais.

Na Figura 13.8 b) aparece um estado particular de solicitação no qual as tensões


cisalhantes em dois planos, perpendiculares entre si, são nulas. Estes dois planos são chamados de
principais bem como as tensões normais que neles atuam : 1 tensão principal maior (atua no plano
principal maior - PPM) e 3 tensão principal menor (atua no plano principal menor - ppm).
Conhecidas as tensões atuantes nas faces do elemento é possível conhecer as tensões
geradas em um plano com inclinação  qualquer ( e ), em relação ao plano principal maior.
Para tanto basta aplicar as equações de equilíbrio de força, nas direções horizontal e vertical.
Considerando a condição representada na Fig. 13.8 b), pode-se obter as seguintes relações entre
tensões:

1  3 1  3
   . cos 2 (13.6)
2 2

   3 
   1 sen 2 (13.7)
 2 

Por estas expressões pode-se verificar que a soma das tensões normais em dois planos
ortogonais quaisquer é constante e igual à soma das tensões principais. Além disso, constata-se que
a máxima tensão de cisalhamento ocorre em planos que formam 45o com os planos principais.

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Nestas expressões, o ângulo  é medido a partir do plano principal maior e é positivo no sentido
anti-horário.
Ao elevar as duas expressões ao quadrado e somá-las obtém-se:

  3     3 
2 2

   1    2   1  (13.8)
 2   2 

Esta expressão corresponde à equação de um círculo cuja representação está na Figura


13.9, conjuntamente com a convenção utilizada para designar os esforços. Em Mecânica dos Solos
e em Geotecnia, em geral, as tensões de compressão são assumidas como positivas. As tensões de
cisalhamento são positivas se tendem a girar no sentido horário, em torno de um ponto situado
externamente ao elemento, na face de interesse. Note-se que o círculo tem como abscissa do centro

 1   3    3
o valor  ;0 e que o raio vale R  1 .
 2  2

  (+)
M (,) (-)

(1 - 3)
P  R=
2
(+)
3 1   (-)

(1 + 3)
2

Figura 13.9: Círculo de Mohr e convenção para as tensões.

Este é o chamado círculo de Mohr de tensões, cujos pontos têm como coordenadas, as
tensões em todos os planos que passam por um ponto.
Um ponto notável destaca-se no circulo de Mohr: é o polo, ou origem dos planos, ponto P
da Figura 13.9, que no caso do estado de tensões do elemento da Figura 13.8b, coincide com o
ponto representativo da tensão principal menor. Desejando conhecer as tensões num plano de
inclinação conhecida, basta traçar uma paralela ao citado plano, pelo polo. A intersecção dessa
paralela com o círculo fornecerá as tensões no plano, como por exemplo, o ponto M que representa
as tensões num plano de inclinação  com a horizontal.
Para localizar o polo P no círculo pode-se fazer a construção inversa, uma vez conhecidas
as tensões num plano e sua direção. Seja por exemplo o estado de tensões atuantes no elemento da
Figura 13.10 e o correspondente círculo de Mohr, desenhado na mesma figura. Considerando o
13
ponto no círculo que representa as tensões (A,), basta traçar por ele uma paralela ao plano onde
atuam essas tensões e determinar a sua interseção com o círculo, ponto P. O mesmo resultado pode
ser conseguido a partir de (B,).
Na Figura 13.10 tem-se representado, para o elemento de solo sujeito ao carregamento
especificado, o círculo de Mohr de tensões, o polo, os planos e as tensões principais.

A
(B ,) 

B
3 1 

ppm
P

(A,)
PPM

A + B
2

Figura 13.10: Elemento de solo sujeito a estado plano de tensões, círculo de Mohr correspondente,
polo, tensões e planos principais

Exemplo 13.1

Para o elemento de solo, sujeito às tensões principais assinaladas (Fig. Ex13.1-1),


determinar as tensões normal e tangencial no plano AA’ .

Notar que 1 = 400 kPa, 3 = 150 kPa,  = + 120o (Fig. Ex13.1-2) e que o plano principal
maior é vertical. O círculo de Mohr está representado na Fig. Ex13.1-3 e o polo P coincide com
1. Traçando-se, por P, uma paralela a AA’ encontra-se B, cujas coordenadas, 212,5 kPa e –108,3
kPa, correspondem respectivamente às tensões normal e tangencial desejadas.
150 kPa 150 kPa

A’ A’
 = 120o
400 kPa 400 kPa

30
o
30o
A A

PPM

Fig. Ex13.1-1 Fig. Ex13.1-2

14

(kPa)

200

100

100 200 300 500  (kPa)

Fig. Ex13.1-3

Os mesmos valores podem ser conseguidos algebricamente. Da expressão (13.6)

400  150 400  150


   cos 2 .120o  = 212,5 kPa
2 2

De (13.7)

400  150
  sen 2 .120o  = -108, 3 kPa
2

Notar que outra possibilidade de cálculo é considerar  = -60o o que conduziria


aos mesmos resultados.
Os sentidos das tensões são os mostrados na Fig. Ex13.1-3.

150 kPa

400 kPa

400 kPa

100 kPa

Fig. Ex13.1-3

15
Exemplo 13.2

Para o elemento representado a seguir na Fig. Ex13.2-1, determinar as tensões em


AA’.

a
0 kP
15

A’
30 o
Pa
0k
40 30o

A
Fig. Ex13.2-1

O círculo de Mohr correspondente encontra-se representado na Fig. Ex13.2-2. O polo P


pode ser encontrado traçando-se, pelo ponto representativo de 1 = 400 kPa, uma paralela ao plano
em que essa tensão atua e verificando a sua interseção com o círculo.
As tensões em AA’ são dadas pelas coordenadas do ponto B, ou,  = 212,5 kPa e
 = -108, 3 kPa.


(kPa)

200

P Pa A’
0k
100
15 o
2 0
 =1

100 200 300 500  (kPa) o


30 o
Pa 30 PP
M
0k
40
A

Fig. Ex13.2-2 Fig. Ex13.2-3

Analiticamente, como  = 120o, Fig. Ex13.2-3, tem-se os mesmos valores do


exemplo 13.1. A coincidência de valores é óbvia visto que se trata do mesmo estado de tensões e
do mesmo plano AA’, tendo ocorrido apenas uma rotação do elemento. Isto se reflete apenas na
rotação do polo, sem qualquer outra variação.

Exemplo 13.3

16
Para o elemento de solo sujeito ao estado de tensões esquematizado na Fig. Ex
13.3-1, pede-se determinar as tensões principais e os planos onde elas atuam, bem como as tensões
atuantes em HH’.

Pa Pa
0k 0k
15 10
Pa
0k
40

H H’
30o

Fig. Ex13.3-1

No ponto A (Fig. Ex13.3-2), contido no plano de Mohr, tem-se a representação do


estado de tensões  = +400 kPa e  = + 100 kPa; no B,  = + 150 kPa e  = - 100 kPa, ou
A(400;100) e B (150; - 100). Unindo-se A e B, encontra-se o centro do círculo de Mohr, C, sobre o
eixo das abcissas. O polo pode ser encontrado traçando-se por A uma paralela ao plano em que
essas tensões atuam (ou, analogamente, por B).


(kPa)

o
200 19,3

100 A (400; 100) pp m


R
P

100
3 200 C 400
1 500  (kPa)
300

B
(150; -100) PPM

Fig. Ex13.3-2

Os planos principais maior (PPM) e menor (ppm) encontram-se assinalados e


1=435,1 kPa e 3 = 114,9 kPa. Pelo polo, uma horizontal interceptará o círculo em R. Assim, as
tensões em AA’ são
 = 125,9 kPa e  = 58,4 kPa

Analiticamente, lembrando que a soma das tensões normais em planos ortogonais é


constante, tem-se:

17
1 + 3 =  + +90o = 400 + 150 = 550 kPa

Da expressão (13.8) e considerado as tensões dadas por A:

550 2   3 2
(400  ) + (100) 2 = ( 1 )
2 2

Donde

1  3
 160,1kPa
2

ou

1=435,1 kPa e 3=114,9 kPa

Direção dos planos principais


Partindo do pressuposto que o plano onde atua A (400;100) forma o ângulo 1
com o PPM, Fig. Ex13.3-3, tem-se, de (13.6):

1

Pa
0k
kP
a 10 Pa
0 0k
15 40

o
60
 horiz.
o
30
PPM

Fig. Ex13.3-3

550 320,2
400 = + .cos21
2 2

21=38,6o ou 1=+19,3o

100=160,1.cos21  21=38.6o ou 1=+19.3o

18
Assim, o ângulo  assinalado, entre o PPM e a horizontal vale 100,7o.
Considerando o plano onde atua B(150;-100), este forma um ângulo 2 com o PPM:

150=275+160,1cos22

-100=160,1sen22
O ângulo que satisfaz simultaneamente as duas equações é 2=109,3º. O mesmo
valor poderia ser obtido adicionando-se 90o a 1.

Tensões em HH'

As tensões em HH’, observando que  neste caso vale +79,3o, serão:

550 320,2
=  cos2.79,3o =125,9kPa
2 2
320,2
= sen2.79,30 =58,4kPa
2

Estes valores também podem ser conseguidos diretamente no círculo de Mohr,


traçando-se uma paralela à HH', pelo polo, e verificando-se a sua intersecção com o círculo (ponto
R).

Um último detalhe, extremamente importante, refere-se ao fato de que nos solos tem-se
tensões normais totais e efetivas. Isto enseja a possibilidade de traçar círculos tanto para tensões
totais, quanto para tensões efetivas, conforme se esquematiza na Figura 13.11 onde, no elemento
sujeito às tensões principais assinaladas, atua também a pressão neutra positiva u. Observar que o
círculo de Mohr de tensões efetivas tem o mesmo raio que o círculo de tensões totais e que cada
ponto do círculo de tensões efetivas encontra-se deslocado para a esquerda do valor da pressão
neutra, u, do correspondente ponto no círculo de tensões totais.

19
1 
3 u
u

3' 1' 3 1  '

Figura 13.11: Elemento de solo sujeito à pressão neutra u, círculos de Mohr em termos de tensões
totais e de tensões efetivas.

4. O CRITÉRIO DE RESISTÊNCIA DE MOHR-COULOMB

Diversos critérios de resistência têm sido desenvolvidos para retratar o comportamento dos
diferentes materiais. Alguns se aplicam melhor a determinados materiais e tem se constatado que o
critério de Mohr-Coulomb consegue reproduzir com boa fidelidade o comportamento resistente dos
solos.
A teoria de Mohr afirma que a resistência é função da tensão normal, ou seja, a ruptura
ocorre quando atua uma combinação crítica entre a tensão cisalhante e a tensão normal em um
determinado plano. A equação representativa dessa teoria é da forma:

s = f() (13.9)

Ao ensaiar vários corpos de prova de um mesmo solo, sob distintas condições de


solicitação, tem-se vários círculos de Mohr representativos das tensões nos corpos de prova no
instante de ruptura, como os representados em linha cheia na Figura 13.12. Dentre os diversos
estados de tensão representados estarão também as tensões nos planos de ruptura (R1, R2, R3). A
curva que passa por esses pontos constituirá então o lugar geométrico dos pontos correspondentes à
ruptura do solo e é denominada de envoltória de resistência do solo. Do ponto de vista prático, essa
curva se constitui na tangente comum aos diversos círculos, com o ponto de tangência fornecendo
as tensões no plano de ruptura. A Figura 13.12 ilustra esse critério e nela pode-se observar que o
círculo A representa um estado possível de tensões, enquanto o círculo B mostra uma situação
impossível, pois o solo já teria rompido antes de atingi-la.

20
Envoltória de
Mohr Coulomb
 r2
B 1
Envoltória de
R3 resistência
R2 A
R1

r1
'

Figura 13.12: Envoltória de resistência e envoltória de resistência de Mohr - Coulomb.

O critério de Coulomb admite que essa curva envolvente é uma reta. Assim, o ajuste de
uma reta (critério de Coulomb) aos pontos situados no diagrama  x  , dentro de uma determinada
faixa de tensões de interesse ao problema em estudo, permite obter uma envoltória, denominada de
Mohr – Coulomb, que segue a expressão geral:

s = r1 + r2 (13.10)

s - resistência ao cisalhamento
r1, r2 - parâmetros de resistência
 - tensão normal

Costuma-se denominar os parâmetros r1 e r2 de "intercepto de coesão" e de "coeficiente de


atrito", respectivamente, com a seguinte notação.

r1 = c (13.11)
r2 = tg  (13.12)

onde c corresponde a um valor de coesão e  a um ângulo de atrito do solo.


Assim a equação geral de resistência do solo assume a forma:

s = c +  tg  (13.13)

onde as tensões a considerar podem ser, em princípio, totais ou efetivas.

21
Esta expressão simples mascara uma série de características do solo que interferem na
resistência. Uma equação geral que representasse a resistência dos solos deveria considerar
diversas outras variáveis, como por exemplo, as listadas na relação funcional a seguir.

s = f(', e, w, , sucção, C, H, S, , T, 2...) (13.14)

Nesta equação: ' - tensão efetiva; e - índice de vazios; w - teor de umidade;  - ângulo de
atrito; C - composição; H -histórico de tensões; S - estrutura;  - deformação; T – temperatura; 2.-
tensão principal intermediária.
Na prática é impossível quantificar as interferências citadas, porém constata-se que a
utilização da envoltória de Mohr-Coulomb, obtida experimentalmente considerando as diversas
condicionantes do problema em análise, é uma maneira eficiente e confiável de representação da
resistência do solo, residindo justamente em sua simplicidade um grande atrativo para aplicação na
prática.
É necessário destacar o fato de que c e  variam para um mesmo solo com uma série de
fatores. Isto enseja o aparecimento de várias "coesões" e de vários "ângulos de atrito” dependendo
da faixa de carregamento aplicada ao solo, do tipo de ensaio efetuado e do histórico de tensões
experimentado pelo solo, dentre outras condições. Assim deve-se reconhecer que os parâmetros de
resistência não são intrínsecos do solo, devendo-se obtê-los em cada situação, atentando para as
condições peculiares do problema em estudo.
No critério de Mohr-Coulomb, incorpora-se a influência da tensão normal na resistência
dos solos e retrata-se essa influência através de uma relação linear. Muitas vezes, como
representado inclusive na Figura 13.12, constata-se, experimentalmente, a ocorrência de
envoltórias não lineares, que a menos de situações específicas, são representadas por retas. Isto
origina diferentes possibilidades de envoltória para um mesmo solo, dependendo da faixa de
tensões normais em que se está trabalhando, e se constitui numa das razões para a existência de
diferentes parâmetros de resistência para um mesmo solo.
A dependência da tensão normal levanta uma questão sobre qual tensão deve estar
expressa na equação da envoltória de Mohr-Coulomb, se a tensão normal total ou a efetiva. Os
estudos pioneiros de Terzaghi demonstram de forma cabal que as características mecânicas dos
solos (resistência e compressibilidade) dependem das tensões efetivas. Dessa forma, a resistência
deve estar expressa em termos dessas tensões, ou seja,

s = c' + '.tg' (13.15)

Não obstante, por diversas razões, é comum o emprego de envoltórias de resistência em


termos de tensões totais, como se comentará adiante.

22
Como características do critério de Mohr-Coulomb, deve-se ressaltar a desconsideração do
efeito da tensão principal intermediária (2), o que faz com que a resistência dependa apenas das
tensões principais maior e menor. Além disso, não são levadas em conta as deformações
decorrentes das solicitações, nem mesmo aquelas que determinam a ruptura do material.
Vale notar ainda que de acordo com a teoria de Mohr-Coulomb o ângulo teórico entre o
'
plano de ruptura (PB) e o plano principal maior corresponde a  cr  45  , tal qual se mostra
2
nos dois exemplos da Figura 13.13.
As situações particulares da equação de Mohr-Coulomb s = c e s= 'tg' correspondem aos
chamados solos puramente coesivos e solos puramente arenosos, respectivamente.

1
M M = M ,M PPM
 N = N ,N  3
N
ppm
 ' '
c+
 tg
s=
B B
M ' '
cr = 45 + cr = 45 +
P cr 2 2
c' c' P cr
PP M ' A 3' C 1' '
ppm
N

Figura 13.13: Envoltórias de Mohr-Coulomb, círculos de Mohr, polos e direção dos planos de
ruptura.

Além da expressão (13.15) o critério de resistência de Mohr-Coulomb pode ser expresso


em termos das tensões principais. Da Figura 13.13b, triângulo ABC, pode-se obter


 3''
1 
sen '  2 (13.16)
('  3' )
c'.cot ' 1
2

ou rearranjando
'1 - '3 = ('1+'3).sen' + 2c'.cos' (13.17)
ou ainda

 '   ' 
'1 = '3 . tg2  45   + 2c'.tg  45   (13.18)
 2  2

23
5. ENSAIOS PARA A DETERMINAÇÃO DA RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO DOS SOLOS

5.1 - Introdução

A medida da resistência de um solo é feita diretamente em laboratório através de diferentes


tipos de ensaios. Em campo, algumas medidas diretas de resistência são possíveis de obter através
de ensaios específicos e há uma variada gama de ensaios que permitem a inferência das
características resistentes do solo, através de correlações. Nos últimos anos tem crescido a
disponibilidade de opções de ensaios de campo, o que, associado ao desenvolvimento de modelos
analíticos mais precisos, tem melhorado a qualidade dos dados de investigação in situ.
Dentre os ensaios de campo, citam-se o vane test (ensaio de palheta), utilizado para medir
diretamente a resistência não drenada de argilas, e os ensaios de penetração, realizados tanto em
sondagens de simples reconhecimento (Standard Penetration Test - SPT), como em ensaios de
cone (Cone Penetration Test – CPT), onde se mede a resistência à penetração de um cone
padronizado. As medidas de resistência à penetração usualmente são correlacionadas com a
resistência do solo.
Obviamente, tanto os ensaios de laboratório como os de campo têm suas vantagens e
desvantagens, porém um adequado programa de investigação conjugará as melhores possibilidades
de cada uma dessas opções.
As principais vantagens dos ensaios de laboratório referem-se ao conhecimento das
condições de contorno do ensaio, e ao controle das condições de drenagem. Além disso, tem-se
estados de tensão e deformação relativamente uniformes durante os carregamentos e pode-se
aplicar distintas trajetórias de carga no corpo de prova.
Por outro lado, os inconvenientes decorrentes da amostragem, tais como perturbação da
amostra e alívio do estado de tensões in situ, associado ao pequeno volume de material utilizado
nos corpos de prova, onde determinadas particularidades podem não estar bem representadas, se
constituem em desvantagens dos ensaios de laboratório.
Os maiores volumes de solo envolvidos nos ensaios de campo ensejam a possibilidade de
ter-se uma melhor representatividade do maciço. Certos solos são extremamente difíceis, senão
impossíveis de amostrar, de sorte que os ensaios in situ se constituem na única possibilidade de
teste. Por fim, diversas técnicas, como a de penetração do cone, permitem um registro contínuo das
características do maciço sob investigação.
As desvantagens dos ensaios de campo referem-se ao fato de que as condições de contorno
nem sempre são adequadamente definidas e o controle (conhecimento) da dissipação de pressão
neutra nem sempre é possível em todas as modalidades de ensaio. Associadas a essas limitações,
encontram-se o desconhecimento do grau de perturbação do solo que a cravação do equipamento
provoca e o fato de que alguns métodos indiretos, como o ensaio de vane ou o CPT, por exemplo,
24
não permitem um reconhecimento direto do solo. Esta última deficiência pode ser superada com a
utilização conjunta de um processo de reconhecimento direto (sondagens de simples
reconhecimento, por exemplo).
Este capítulo trata essencialmente da utilização de ensaios de laboratório para determinar a
resistência ao cisalhamento do solo. Não obstante, o Apêndice A apresenta informações sobre
alguns ensaios de campo e a sua aplicação na estimativa preliminar de algumas propriedades dos
solos.

5.2 - Ensaios de Laboratório

Introdução

Ensaios de laboratório são realizados com amostras de tipo indeformado e com amostras
reconstituídas em laboratório, segundo diferentes técnicas, das quais a compactação estática e a
dinâmica se constituem em duas das opções mais utilizadas.
A obtenção da envoltória de resistência de um solo passa pela preparação de vários corpos
de prova moldados sob condições idênticas. Cada corpo de prova é solicitado segundo uma
determinada taxa de deformação controlada (medem-se as tensões provocadas) ou segundo tensões
controladas (medem-se as deformações produzidas pelas cargas). Obtém-se uma curva tensão-
deformação, a qual convenientemente interpretada fornece tensões que permitirão, num plano de
tensões adequado, a definição da envoltória de resistência.

Ensaio de Cisalhamento Direto

A Figura 5.1 permite uma visualização geral do ensaio de cisalhamento direto.

Força
Pedras
normal
porosas v

Força Transdutor
cisalhante de força

Rolamentos Plano de ruptura

Figura 5.1: Esquema do Ensaio de Cisalhamento direto

25
O corpo de prova é colocado num recipiente formado de dois moldes (circulares ou
quadrados) iguais e superpostos. Uma das partes permanece fixa na prensa e a outra é livre para
mover-se e aplicar tensões cisalhantes ao solo. Sobre o corpo de prova são aplicadas tensões
normais que permanecem constantes até o final do ensaio. Essas tensões variam para cada corpo
de prova, com o intuito de poder definir pares de tensões diferentes.
Três leituras são tomadas durante o ensaio: deslocamento horizontal (), força cisalhante
aplicada (Ft) e deslocamento vertical (v), o qual fornecerá a variação de volume do corpo de
prova. Dividindo-se a força cisalhante pela área do corpo de prova (normalmente admitida como
constante ao longo do ensaio) tem-se a tensão cisalhante , em cada instante do ensaio. As
deformações volumétricas são fornecidas pela variação de altura do corpo de prova em relação à
altura inicial deste. A Figura 5.2 ilustra resultados de ensaio de cisalhamento direto e a forma de
obtenção da envoltória, adotando-se neste caso como ruptura do solo os pontos de máximo das
curvas tensão-deslocamento. Estas, conjugadas com as tensões normais correspondentes, permitem
a definição de pontos num diagrama  x . Estes resultados referem-se a uma areia fina a média,
com corpos de prova moldados com d = 1,69 g/cm3.
130
 120
(kPa)
110
C
100
90
80
70 Amostra A B C

60 B
 (kPa) 36 80 146
r (kPa) 32 70 128
Ruptura

50
 (mm) 2,0 2,5 2,2
40
v (mm) -0,16 -0,15 -0,14
30 A
d (g/cm3)
cisalh.

1,70 1,70 1,71


Início

20
e 0,56 0,56 0,55
10

v -0,6
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 (mm)
(mm) A
-0,4 B
-0,2
C
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 (mm)
0,2

 ' = 41
(kPa)
C

100
B P

3 100 200 1 300


 (kPa)

26
Figura 5.2: Resultados típicos de ensaios de cisalhamento direto e definição da envoltória de
resistência. Areia fina a média, seca, com d = 1,69 g/cm3 (Head, 1981).

O ajuste de uma reta aos pontos obtidos permite definir a envoltória de resistência do solo.
Notar que o ensaio fornece diretamente a resistência e que só é possível definir o círculo de Mohr
no instante da ruptura, como por exemplo o círculo que passa pelo ponto B. As tensões
representadas pelas coordenadas do ponto B são as tensões que correspondem à ruptura, e, como o
plano de ruptura é horizontal, pode-se determinar o ponto P, que é o polo no ensaio de
cisalhamento.
Algumas deficiências limitam a aplicabilidade do ensaio de cisalhamento direto. A
primeira delas é o fenômeno da ruptura progressiva, que provoca uma distribuição não uniforme de
tensões e deformações ao longo do plano de cisalhamento. No início do ensaio ocorre uma
concentração de deformações próximo às bordas do corpo de prova, que tendem a decrescer em
direção ao centro da amostra. Obviamente as tensões despertadas em cada local serão diferentes,
de forma que quando nas bordas forem atingidas a deformação e a tensão de ruptura, tem-se
próximo ao centro da amostra tensões inferiores à de ruptura. À medida que aumentam as
deformações, a ruptura caminha em direção ao centro e uma vez que as extremidades já passaram
pela ruptura, ocorrem aí agora tensões menores que a de ruptura. A dificuldade de definição das
deformações presentes tornam o ensaio de cisalhamento direto de pouca ou nenhuma utilidade para
a determinação de parâmetros de deformabilidade do solo.
Outro aspecto que merece ser citado refere-se ao fato de que o plano de ruptura está
determinado a priori e pode não ser, na realidade, o mais, fraco. Por sua vez os esforços que atuam
em outros planos que não o de ruptura, não podem ser estimados durante a realização do ensaio
senão quando no instante de ruptura. Além disso, a área do corpo de prova diminui durante o
ensaio, o que usualmente não é levado em conta nos cálculos.
Por último, deve-se salientar a dificuldade de controle (conhecimento) das pressões neutras
antes e durante o ensaio. Embora existam pedras porosas (Figura 5.1) que permitam a dissipação
de pressões neutras, não existe nenhum mecanismo que permita avaliar o desenvolvimento dessas
pressões no corpo de prova, tal qual seria possível num ensaio de compressão triaxial.
A despeito dessas limitações trata-se de um ensaio extremamente útil para a definição dos
parâmetros de resistência dos solos, principalmente das areias, pela simplicidade de execução. O
ensaio também pode ser realizado em argilas ainda que não se tenha um controle eficiente da
geração e dissipação de pressões neutras.

Ensaio de Compressão Triaxial

27
Este tipo de ensaio é o que mais opções oferece para a determinação da resistência do solo.
Basicamente ele consiste num corpo de prova cilíndrico (H = 2 a 2,5D, sendo D = 5cm e D
=3,8cm, diâmetros usuais) envolvido por uma membrana impermeável e que é colocado dentro de
uma câmara, tal qual se esquematiza na Figura 5.3.
Deve-se notar a versatilidade do ensaio pois as diversas conexões da câmara com o
exterior permitem medir ou dissipar pressões neutras e medir variações de volume.

carga axial

válvula
pistão
para ar
manômetro

pedra porosa
água
membrana
corpo de
prova

pressão na pedra porosa


câmara drenagem ou
medida de
pressões neutras

Figura 5.3: Esquema do Ensaio de Compressão Triaxial

Preenche-se a câmara com água e aplica-se uma pressão na água que atuará em todo o
corpo de prova, confinando-o. Durante esta etapa, o corpo de prova pode ser adensado ou não, ou
seja as pressões neutras despertadas pelo confinamento podem ou não ser dissipadas. Utiliza-se o
símbolo U para designar que o corpo de prova não foi adensado, ou o símbolo C, no caso de
adensamento (consolidação) ou drenagem do corpo de prova.
Terminada a etapa de confinamento, e mantendo-se a tensão confinante constante, dá-se
início ao cisalhamento, que é produzido pelo acréscimo da tensão vertical. Nesta fase, também as
novas pressões neutras (agora induzidas pelo cisalhamento) podem ou não ser dissipadas. Os
símbolos utilizados para esta etapa são U para cisalhamento não drenado e D para cisalhamento
drenado.
Da combinação das formas de considerar as pressões neutras nas fases de confinamento e
de cisalhamento surgem as diferentes opções de ensaio, a saber, ensaio não drenado ou rápido
(confinamento e cisalhamento sem dissipação de pressão neutra - símbolo UU); ensaio
consolidado- não drenado ( confinamento drenado e cisalhamento não drenado: símbolo CU) e
ensaio drenado (tanto o confinamento, quanto o cisalhamento são totalmente drenados - símbolo
CD). Uma nomenclatura mais antiga emprega, respectivamente, a seguinte denominação para estes
tipos de ensaio: rápido (símbolo Q), adensado-rápido (símbolo R) e lento (S).

28
Medidas Realizadas Durante os Ensaios de Compressão Triaxial

Um ensaio de compressão triaxial envolve, como mínimo, as leituras de força aplicada ao


pistão (utilizando um anel dinamométrico ou uma célula de carga) e as leituras de deformação do
corpo de prova, conseguidas com o auxílio de um extensômetro ou de um transdutor de
deslocamento, além da pressão confinante aplicada ao corpo de prova. É muito comum, também,
efetuar a leitura de pressões neutras ou a leitura de variação de volume do corpo de prova.
As pressões neutras, nos ensaios não drenados, podem ser medidas através de manômetros
ou de transdutores de pressão em contacto com a água intersticial, seja pela base, pelo topo ou,
menos usualmente, pela lateral do corpo de prova. Em solos não saturados, a pressão na água pode
ser medida da mesma forma, dentro de certos limites. Para tanto é necessário incrustar no pedestal
da base de sustentação do corpo de prova uma pedra porosa especial que permita a continuidade da
água entre o corpo de prova e o equipamento de medida. Estas pedras porosas de granulação muito
fina e de poros muito pequenos, conhecidas como pedras de alto valor de pressão de entrada de ar,
permitem o fluxo de água porém não o de ar. No entanto este expediente fica limitado pela
cavitação da água do sistema de medida, governada pela pressão de vaporização da água do
sistema de medida (da ordem de -100 kPa, mas que na prática reduz-se a valores da odem de -70
kPa). Transdutores de pressão especiais que tiram partido da elevada resistência à tração da água e
que são capazes de medir pressões negativas inferiores aos limites citados têm sido desenvolvidos
(Ridley & Burland, 1993), no entanto o seu uso ainda é limitado, estando restritos quase que só a
trabalhos de pesquisa.
A variação de volume do corpo de prova, no caso de solo saturado e ensaio drenado, pode
ser conseguida pela leitura do volume de água que drena do corpo de prova, através de uma bureta
graduada conectada a uma ou a ambas as conexões de drenagem. Outra alternativa, consiste em
medir-se o volume de água que adentra ou que sai da câmara durante o cisalhamento. Este fluxo de
água é proporcionado pelo sistema de aplicação de pressões na água da câmara. Ao variar o
volume do corpo de prova, a pressão aplicada à água da câmara se altera, porém o sistema de
pressão tende a manter a pressão desejada no ensaio, enviando água para a câmara (quando o
volume de corpo de prova se reduz) ou retirando água (quando o corpo de prova aumenta de
volume).
Em ensaios onde é necessário caracterizar o solo para baixos níveis de deformação, a
deformabilidade do conjunto (câmara, pedras porosas, etc) afeta a precisão das medidas efetuadas
externamente à câmara e é necessário recorrer à instrumentação interna, colocada junto ao corpo de
prova. Esta instrumentação mais sofisticada envolve transdutores de deslocamento submersíveis
destinados a medir diretamente as variações de altura e as variações de diâmetro do corpo de prova.

29
Elementos para o Cálculo dos Ensaios de Compressão Triaxial

Uma análise das forças atuantes no corpo de prova durante o cisalhamento, que se
esquematiza na Figura 5.4, mostra que nos ensaios convencionais (cisalhamento por compressão
axial), a tensão confinante corresponde à tensão principal menor de ensaio que, no caso, também é
a tensão principal intermediária. A tensão principal maior atua no topo do corpo de prova e pode-
se deduzir que num determinado instante i tem-se a seguinte relação:

Fi
1   3  (5.1)
Ai

Fi
3

3 3

1

Ai

Figura 5.4: Tensões num corpo de prova submetido a ensaio de compressão triaxial.

A diferença de tensões (1 - )máx , analogamente ao que ocorre no ensaio de compressão


simples, corresponde à resistência a compressão do corpo de prova no ensaio de compressão
triaxial considerado.
A área do corpo de prova num instante i qualquer pode ser conseguida pelo conhecimento
da mudança de forma do corpo de prova (embarrigamento) e da variação de volume até aquele
instante. É fácil verificar que
1   vi
Ai  Ao (5.2)
1  i

Vi
 vi  (5.3)
Vo

30
H i
i  (5.4)
Ho

Ao - área inicial do corpo de prova;


vi - deformação volumétrica;
Vi - variação de volume do corpo de prova;
V0 - volume inicial do corpo de prova;
i - deformação axial do corpo de prova;
Hi - variação de altura do corpo de prova;
H0 - altura inicial do corpo de prova.

Caso se deseje, e na falta de medidas diretas, pode-se estimar a deformação radial (ri ),
sendo conhecidas as deformações volumétrica e axial do corpo de prova, através da seguinte
expressão:

ri = (vi - i)/2 (5.5)

Obtenção da Envoltória

As curvas tensão-deformação podem ser traçadas em função da diferença de tensões


principais (1 - 3) ou da relação 1’/3’, por exemplo, (Figura 5.5), dependendo da finalidade do
ensaio. No caso de leituras de pressões neutras aparecem também gráficos com estes valores, o
mesmo ocorrendo se houver leituras de variação de volume.
Geralmente, costuma-se definir a envoltória em função dos (1 -3)máx (máximos valores
das curvas ((1-3) x ) dos diversos corpos de prova, porém a segunda forma de representação
também é utilizada, como em ensaios a volume constante. De qualquer forma convém ressaltar,
que os valores de máximo podem não ocorrer para a mesma deformação, quando se observam as
duas formas de representação. Isso introduz diferenças nas envoltórias, mais ou menos acentuadas,
em função das pressões neutras despertadas.

31
1 - 3
Pico (1)
(1)
(2) Estado crítico (4)
(4)
(3) Residual (5)
(5)

Deformação máxima (3)

r a
lim Pico   ''  (2)
1

1'
3'


Vr V constante (drenado)
V u u constante (não drenado)
r
u
a

Figura 5.5: Diferentes critérios para definição de ruptura e determinação da envoltória de


resistência (Head, 1986).

Deve-se ressaltar que outras “opções de ruptura” podem ser escolhidas, como ilustrado na
Figura 5.5, como a resistência residual (opção 5) ou a resistência obtida para cisalhamento a
volume constante, ou seja, na condição de estado crítico (opção 4), que serão discutidas mais
adiante. Em qualquer caso, ainda, pode ser definida a ruptura a partir das deformações máximas
permissíveis no projeto em questão (opção 3).
Ensaiados vários corpos de prova com tensões de confinamento constantes para cada corpo
de prova, define-se a envoltória com os círculos de Mohr obtidos na ruptura, conforme se
exemplifica na Figura 5.6.

=s '

E T
C' C
3' 3 1' 1  '

uA

Figura 5.6: Obtenção da envoltória de resistência a partir dos resultados de ensaios de compressão
triaxial.

32
Evidentemente, dependendo do tipo de ensaio, é possível traçar os círculos de Mohr em
termos de tensões totais ou efetivas, podendo-se obter assim uma envoltória referida a tensões
totais (c,) e outra referida a tensões efetivas (c',').
Observar que o polo no ensaio de compressão triaxial, com tensão confinante constante,
coincide com o ponto representativo dessa tensão (3).
O aspecto que os corpos de prova mostram ao final do ensaio é bastante característico. Os
solos que apresentam ruptura do tipo frágil mostram uma superfície de ruptura bem definida,
podendo-se inclusive determinar a direção do plano de ruptura cr, já os solos de comportamento
plástico mostram um embarrigamento do corpo de prova, sem a possibilidade de distinção dos
planos de ruptura (Figura 5.7).

Plano de
ruptura

cr

Figura 5.7: Formas típicas de ruptura em corpos de prova submetidos a ensaios de compressão
triaxial.

Os corpos de prova nos ensaios de compressão triaxial geralmente são adensados em


condições hidrostáticas ou isotrópicas, isto é, a tensão confinante é aplicada na água da câmara e
atua com igual intensidade em todas as direções. O cisalhamento é obtido por um acréscimo de
tensão vertical. Existem diversas outras formas de conduzir um ensaio triaxial, das quais algumas
serão citadas a seguir.

Adensamento Anisotrópico

O adensamento do corpo de prova pode ser feito segundo tensões diferentes nas duas
direções principais, ao contrário do que ocorre convencionalmente quando se tem a mesma tensão
atuando em todas as direções. Esta modalidade constitui o adensamento anisotrópico, isto é, o
corpo de prova é adensado segundo uma relação 3/1  1, procurando-se retratar com mais
fidelidade o processo de deposição e consolidação de um solo no campo. Caso se impeça a
deformação lateral do corpo de prova, tem-se o adensamento segundo uma situação em repouso ou
tipo Ko (Ko - coeficiente de empuxo em repouso). Neste caso, procura-se impedir qualquer
deformação lateral do corpo de prova, ajustando a tensão confinante (3c). Para uma tendência de
expansão da amostra, aumenta-se a pressão na câmara; caso contrário, alivia-se a pressão. Quando
se deseja explicitar a condição de adensamento do corpo de prova, adiciona-se uma letra ao

33
símbolo do ensaio, gerando novos símbolos, como, por exemplo, CIU ou CKoU, indicando,
respectivamente, adensamento isotrópico (I) ou tipo Ko.

Ensaios segundo diferentes trajetórias de carregamento

Os ensaios de compressão triaxial podem ser realizados segundo diferentes formas


de aplicação de cargas ou trajetórias de tensões. Além da compressão axial já apresentada, onde a
tensão horizontal (ou tensão confinante), h, é mantida constante e a tensão axial vertical, v, é
aumentada até a ruptura, tem-se a compressão por descarregamento, em que v é mantido
constante e h é reduzido. Nestes dois casos, a tensão vertical corresponde à tensão principal maior
e a lateral, à tensão principal menor.
Outras formas de carregamento podem ser a extensão axial onde v é diminuída e h é
mantida constante ou de compressão lateral em que v é mantida constante e h é aumentada,
provocando o cisalhamento da amostra. Notar que nestas duas formas de ensaio, a tensão
horizontal tende a tornar-se a tensão principal maior e a tensão vertical, a principal menor, ou seja,
ocorre uma rotação de tensões em relação às condições ao final do adensamento.
A Figura 5.8 ilustra algumas dessas formas de carregamento em situações reais e o
correspondente esquema de cargas a que se sujeita o corpo de prova em laboratório, sendo 'vo e
'ho as tensões efetivas iniciais atuantes.

(a) 
vo'
Compressão
axial
(CA)
ho
'

movimento
(b) do muro
Compressão vo'
por descar-
regamento
(CDe) ' 
ho
Empuxo ativo

(c) 
Extensão
axial
vo'
(EA)
ho
'

Escavação

(d) movimento Compressão


do muro lateral vo'
(CL)

ho
' 

Empuxo passivo

34
Figura 5.8: Diferentes formas de carregamento em campo e correspondente solicitação em
laboratório.

O andamento das tensões nesses ensaios pode ser visualizado também no item 10 que
trata de trajetória de tensões.
Deve-se frisar que, na sequência do texto, a menos de citações específicas, todos os
aspectos referentes a ensaios de compressão triaxial correspondem à situação rotineira de ruptura
por compressão axial.

Saturação de corpos de prova

Em muitos casos faz-se necessário saturar corpos de prova de baixa permeabilidade, como
para estudar a resistência do maciço de uma barragem, que poderá saturar-se com o tempo, ou para
determinar os parâmetros efetivos de resistência. A simples percolação de água pelo corpo de
prova, contudo, não produz os efeitos desejados. Costuma-se nesses casos empregar a saturação
por contra pressão. Aplica-se na água do sistema de medida de pressões neutras uma pressão que
tenderá a aumentar a pressão neutra do corpo de prova. A progressiva dissolução do ar presente
conduz à saturação do corpo de prova o que pode ser constatado aplicando um incremento de
tensão confinante (3) e verificando o acréscimo de pressão neutra (u). A relação entre essas
tensões é conhecida como parâmetro B:

u
B (5.6)
 3

Para entendimento da adoção desse parâmetro recorrer à explicação da analogia mecânica


do processo de adensamento e dos parâmetros de pressão neutra (item 7 ). Valores de B superiores
a 0,95 são comumente assumidos como indicativos da saturação do solo.
Evidentemente a cada acréscimo de contra-pressão deverá ser aplicado um igual acréscimo
de tensão confinante, para que permaneça inalterada a tensão efetiva no corpo de prova. Maiores
detalhes sobre as várias técnicas de realização de ensaios triaxiais podem ser obtidas em Bishop e
Henkel (l957) e em Head (1991).

Ensaio de Compressão Simples

35
Este ensaio pode ser entendido como um caso especial do ensaio de compressão triaxial.
A tensão confinante é a pressão atmosférica, donde 3 = 0. O valor da tensão principal na ruptura,
1, recebe o nome de resistência à compressão simples, Rc e a Figura 5.9 ilustra uma curva tensão
deformação deste ensaio e o correspondente círculo de Mohr.

1 
Rc

 Rc 

Figura 5.9: Compressão Simples. Curva tensão-deformação e círculo de Mohr.

Costuma-se assumir que o ensaio de compressão simples representa uma situação de


ruptura não drenada, semelhante ao que ocorre nos ensaios de compressão triaxial não drenados ou
rápidos. Para que tal ocorra é necessário que o solo esteja saturado (de outra forma os vazios
preenchidos com ar podem comprimir), não contenha fissuras e que o cisalhamento se processe
num tempo curto (inferior a 15 minutos), para que não ocorra dissipação das pressões neutras. A
realização do ensaio está condicionada a que o corpo de prova possa ser moldado e permaneça
íntegro sem nenhum confinamento, o que o torna possível apenas em solos coesivos.

Exemplo 5.1

A areia submetida a ensaio de cisalhamento direto e cujos resultados encontram-se na Fig.


5.2 tem coeficiente de empuxo em repouso, Ko=0,34. Pede-se: a) Para um corpo de prova ensaiado
com =60kPa determinar os círculos de Mohr após adensamento e na ruptura do corpo de prova,
bem como as tensões principais na ruptura e os planos em que elas atuam. b) Caso se deseje ensaiar
essa areia, em compressão triaxial, com 3c=50 kPa, qual será a tensão principal maior a esperar
na ruptura?

A relação entre as tensões efetivas horizontal e vertical, na condição em repouso (sem


deformações laterais) é dada por Ko. Assim , as condições iniciais operantes no corpo de prova
correspondem a v=1==60kPa e h=K0.v=3 ou 3=0,34x60=20,4kPa
O círculo I, Fig. Ex. 5.1-1, representa essas condições.

36

o
41
(kPa)
+

100

+
M P

+ 

3 100 1 200  (kPa)


ppm PPM

Fig. Ex. 5.1-1

Na ruptura, a tensão normal continua sendo =60kPa e a tensão cisalhante será 52kPa
(=60tg41o kPa). O ponto M representa esse estado de tensões e o círculo de Mohr para esse
instante é o representado por II, cujo centro é obtido da intersecção entre o eixo das abcissas e a
perpendicular por M. Traçando por M uma paralela ao plano de ruptura (horizontal, no caso)
encontra-se o polo P. Unindo-se P a 3=36,2kPa tem-se o plano principal menor (ppm) e a
1=174kPa, o plano principal maior (PPM).

Para o ensaio de compressão triaxial, o polo coincide com 3c. A inclinação teórica do
'
plano de ruptura (c) é dada por c  450  . Como '=41o, c=65,5º (Fig. Ex. 5.1-2). Uma reta
2

traçada pelo polo, com inclinação c, determina o ponto R, onde o círculo de Mohr, na ruptura,
deverá tangenciar a envoltória de resistência. O círculo de Mohr (T) representa essas condições
donde, graficamente, pode-se obter 1=241kPa. O mesmo valor poderia ser obtido analiticamente
considerando a expressão (5.5) com c’=0, ou seja,

41
'1='3.tg2(45+'/2)= 50tg 2 (45  ) =240,7 kPa
2

37

o
41
(kPa)

100

R
T

c
3c 1
100 200  (kPa)
P

Fig. Ex. 5.1-2

Exemplo 5.2

Corpos de prova de uma argila siltosa compactada, com 5,0cm de diâmetro (D) e 10,0 cm
de altura (H), submetidos a ensaio não drenado (UU) mostraram , na ruptura, os valores tabelados
a seguir. Determinar a envoltória de resistência dessa argila, em termos de tensões totais.

CP 3c H V F
(kPa) (mm) (cm3) (N)
1 50 14,1 8,3 569
2 150 13,4 7,6 714
3 300 16,5 9,0 929
Obs.: H – variação de altura do corpo de prova; V – variação de volume do corpo de prova; F –
força axial aplicada no topo do corpo de prova

A área inicial do corpo de prova é 19,62 cm2 e o volume, 196,25 cm3. É possível, então,
calcular

H V
  .100% v  .100%
H V

1  v F
A  Ao e 1-3=
1  A

38
CP  v A 1-3
(%) (%) (cm2) (kPa)
1 14.1 4,3 21,86 260
2 13.4 3,9 21,77 328
3 16.5 4,6 22,42 414

A Figura Ex. 5.2-1 mostra os círculos de Mohr (tensões totais) e a envoltória de Mohr –
Coulomb ajustada para o intervalo de tensões em questão. A equação resultante é

s =95+tg12o kPa


(kPa)
o
kPa
 . tg 12
o
+ 12
s = 95
200

100

0
0 100 200 300 400 500 600 700
 (kPa)

Figura Ex. 5.2-1

Deve-se observar que o solo mostrou ganho de resistência com o aumento do


confinamento, pelo fato de não estar saturado (ver item 9.5(b). Caso estivesse saturado, o
confinamento geraria igual acréscimo de pressão neutra, sem alterar as tensões efetivas atuantes e a
envoltória resultante seria horizontal. As variações de volume durante o cisalhamento devem-se
também ao fato do solo não estar saturado.

Outros Tipos de Ensaios

39
Em várias situações especiais conduzem-se ensaios que procurem reproduzir com mais
fidelidade as condições de solicitação impostas ao solo, ou ainda ensaios que permitam medir um
aspecto definido, como no caso do ensaio de cisalhamento em anel (ring-shear). Neste ensaio,
empregado para medir a resistência residual do solo (ver item 13) é possível submeter o corpo de
prova a deslocamentos grandes de forma contínua. A Figura 5.10 ilustra referido ensaio.

'

Plano de
cisalhamento

Figura 5.10: Ensaio de cisalhamento em anel (ring-shear)

O ensaio de deformação plana tenta reproduzir situações nas quais uma das direções
encontra-se confinada, sem possibilidade de deformação, como ocorre, por exemplo, na ruptura de
um talude extenso ou numa sapata corrida. Neste ensaio o efeito da tensão principal intermediária
(2) pode ser aquilatado. A Figura 5.11 esquematiza o corpo de prova de um ensaio de deformação
plana.

1

2
2 = 0
2 = 0
3

Figura 5.11: Esquema do ensaio de deformação plana.

Outros ensaios em que um estado triaxial de tensões completo pode ser aplicado ao corpo
de prova são o triaxial cúbico e o do cilindro vazado (hollow cilinder). O triaxial verdadeiro é
realizado em amostras cúbicas onde as três tensões principais podem ser aplicadas
independentemente. O ensaio do cilindro vazado permite grande versatilidade na aplicação de
esforços e o controle independente das três tensões principais também. A Figura 5.12 esquematiza
os referidos ensaios e frise-se que se trata de ensaios empregados quase que exclusivamente em
pesquisa acadêmica, não fazendo parte do elenco de ensaios tradicionais dos laboratórios de
Mecânica dos Solos.

40
b

c C.P. P1

P2

a Pressão
a  b c neutra P2

(a) (b)

Figura 5.12: Esquema de ensaios: a) compressão triaxial verdadeiro; b) ensaio de cilindro vazado.

O ensaio de cisalhamento simples procura eliminar os problemas de concentração de


tensões típicos dos ensaios de cisalhamento direto. O corpo de prova é envolvido lateralmente por
uma membrana reforçada que permite a distorção da amostra e admite-se um estado de solicitação
no interior da amostra correspondente ao cisalhamento simples. Este ensaio tem sido utilizado para
a determinação de parâmetros do solo tanto para a condição estática, quanto para a condição
dinâmica. A Figura 5.13 ilustra dois esquemas de ensaios de cisalhamento simples.
Ensaios dinâmicos em solos encontram-se em franco desenvolvimento na atualidade e
dentre os mais utilizados situa-se o de coluna ressonante. Foge do objetivo deste livro discutir
ensaios dessa natureza. O leitor pode recorrer a Barros (1997) para uma descrição abrangente desta
categoria de ensaios.

Fa
Fa
Fac
Fac
Luva de Rótula
o ring Amostra borracha
reforçada
Transdutores Amostra
de força

Pressão neutra / Contacto


variação de volume deslizante

Figura 5.13: Esquemas do ensaio de cisalhamento simples. a) Modelo do Instituto


Geotécnico da Noruega; b) Modelo da Universidade de Cambridge.

No estudo da resistência a tração dos solos, um dos ensaios possíveis é o de compressão


diametral ou ensaio brasileiro. A Figura 5.14 esquematiza a realização do ensaio. A resistência a
tração t é fornecida pelos conceitos da resistência dos materiais.
Outras formas de realização de ensaios de tração podem ser vistas em Gaioto (l972).

41
Barra para uniformização
da carga

P P
t = 
2P
dt
C.P.
d d

Figura 5.14: Esquema do ensaio de compressão diametral utilizado para medir a resistência à
tração (ensaio brasileiro).

6. DIAGRAMAS s,s',t. TRAJETÓRIAS DE TENSÕES

Até o momento utilizou-se o círculo de Mohr para representar o estado de tensões em um


ponto em equilíbrio. Imagine que se quisesse representar os sucessivos estados de tensões porque
passa um solo em uma determinada obra ou mesmo em um corpo de prova.
Sirva de exemplo o que ocorre com um corpo de prova submetido a um ensaio consolidado
não drenado (CU), com leitura de pressões neutras (Figura 6.1) . Caso se quisesse conhecer os
estados de tensão a cada momento seria necessário traçar uma série de círculos de Mohr.
No diagrama , ' x  aparecem apenas seis desses círculos de Mohr (três para tensões
totais e três para tensões efetivas) correspondentes aos pontos assinalados por A, B e M, porém
pode-se notar que seria impraticável, por razões de clareza, representar todos os estados de tensões.
Uma representação mais elegante para o pretendido seria tomar apenas um ponto de cada círculo,
como, por exemplo, o ponto onde atua a tensão cisalhante máxima (máx). Em termos de tensões
efetivas este ponto tem coordenadas:

1'  3'
s'  (6.1)
2

'1 '3
t'  (6.2)
2

Em tensões totais

1  3
s (6.3)
2

42
1 3
t (6.4)
2

(a) 1 - 3
3 = cte.
M 1 - 3
u
B 3 = cte.
A

a

(b)  (c) t
1' + 3'
2 u

T
u
1 - 3
= E
2
1' - 3'
2
3M
' 3B
'  3A
' 1A
' 1B
' 1M
' 1M  ' s, s'

1 + 3 uM
2

Figura 6.1: Ensaio consolidado não drenado. a) curva tensão-deformação e pressão neutra-
deformação; b) círculos de Mohr em termos de tensões totais e efetivas; c) trajetória de tensões
num diagrama s,s',t.

O lugar geométrico dos pontos representativos dos diversos círculos de Mohr constitui
uma trajetória de tensões, que traduz o que ocorre no solo quando este passa de um estado de
tensões para outro. Ao invés de trabalhar num diagrama , ' x , fica mais conveniente definir
dois novos eixos coordenados (diagrama s, s', t) onde se tem as curvas representativas das
trajetória de tensões. Estas curvas representam o caminhamento das tensões totais (T) ou efetivas
(E). Observar que

t = t’ (6.5)
e
s = s’ + u (6.6)

Com muita frequência a tensão principal maior corresponde à tensão vertical (v = 1) e a
menor, à tensão horizontal (h = 3). Isto permite expressar s,s' e t como:

 v  h
s (6.7)
2

43
'v 'h
s'  (6.8)
2

 v  h
t (6.9)
2

o que facilita a representação, quando ocorre rotação de tensões. Agora, nos casos em que h  v ,
t assume um valor negativo.
A Figura 6.2 mostra uma série de trajetórias para distintas condições de carregamento de
um corpo de prova inicialmente adensado sob um estado hidrostático, ou seja, 'h/'v=1.
A Figura 6.3 ilustra o andamento das tensões desde a deposição de um solo de origem
sedimentar, adensamento ao longo de uma linha denominada Ko, até o ponto A, e posterior
descarregamento (que pode ser provocado por erosão das camadas superiores, amostragem, etc.).
Tem-se neste caso uma situação de adensamento anisotrópico ('h/'v1), com a particularidade
que o adensamento se dá sem deformação lateral, na situação denominada em repouso. Esta
situação também pode ser reproduzida em laboratório como já se referiu no item anterior, que
tratou dos ensaios de laboratório.

v a: h = 0 ; v aumenta (compressão vertical)


ou b: h = v
v c: h = - v
d: h aumenta ; v = 0
h e: h diminui ; v = 0
h ou
f: h = 0 ; v diminui (descompressão vertical)

t
c
a
e
o
45
v' + h'
so' = = 3c
'
b 2
s' v' - h'
o to = =0
2

-t f d

Figura 6.2: Exemplos de trajetórias de tensões

44
t Kr
t a
Ko
o
o
e 45 Ko

A
descarregamento

s' s'
deposição e consolidação
f d
-t
(a) (b)

Figura 6.3: a) Deposição e consolidação sem possibilidade de deformações laterais e posterior


descarregamento da amostra de solo: b) Exemplos de trajetórias a partir da condição de repouso.

Aparecem na Figura 6.3(b), diversas trajetórias que têm seu início no ponto A, sobre a
linha Ko . Observar que as trajetórias esquematizadas, tanto na Figura 6.2, quanto na 6.3 (b),
representam várias situações comuns na prática. Por exemplo, a trajetória a representa uma
solicitação de compressão axial em que a tensão lateral permanece constante, tal qual ocorre em
um ensaio de compressão triaxial convencional e a e esquematiza a situação de empuxo ativo.
É possível, analogamente ao que ocorre com as envoltórias de resistência obtidas a partir
dos círculos de Mohr, determinar uma envoltória de resistência (linha Kr – Fig. 6.3 (a), num
diagrama s, s',t, bastando considerar sobre a trajetória correspondente a cada corpo de prova as
condições correspondentes à ruptura. A Figura 6.4 ilustra as duas envoltórias determinadas para
um solo. Nesta figura, para maior clareza, apenas um círculo de Mohr está representado.

 = s = c '+  ' tg ' '



t s
Kr
' Linha K r : t = a ' + s ' tg '

Trajetórias correspondentes
a diferentes corpos de prova

c a'
3 1 
' s'

Figura 6.4 : Envoltória de resistência de Mohr Coulomb e linha Kr

No plano s'xt a linha envoltória (Kr ) tem a seguinte equação

t = a' +s'.tg' (6.10)

Existe uma relação entre as duas envoltórias, como é fácil verificar. Tomando a expressão
para sen ' (eq. 5.3 ) pode-se obter a seguinte equação:

45
t = c'.cos' + s'.sen' (6.11)

Pode-se verificar que

a
c'= (6.12)
cos '

sen' = tg' (6.13)

As mesmas expressões são válidas para tensões totais, devendo-se neste caso, obviamente,
definir a envoltória a partir das tensões totais.
Notar que é possível determinar além da envoltória das trajetórias determinada para a
ruptura, várias envoltórias que fornecem as resistências mobilizadas para dados níveis de
deformação (Figura 6.5).
Cabe destacar que a trajetória em termos de tensões efetivas (E) acha-se deslocada, na
horizontal, da trajetória de tensões totais (T), do valor correspondente à pressão neutra no instante
considerado. Caso E se situe à esquerda de T, as pressões neutras são positivas e caso ocorra o
contrário, as pressões neutras são negativas, como se mostra na Figura 6.6.

1 - 3 t = a ' + s ' tg  ' (pico)


* t
'
t2 = a2' + s ' tg 2' a = 2
* * 2'

* t1 = a1' + s ' tg 1' a = 1


'1
* *
1 2 a a'

a'1 s, s'

Figura 6.5: Trajetórias para diferentes níveis de deformação

u > 0
u < 0
T T
1 E
E
2

s, s'

46
Figura 6.6: Pressões neutras positivas e negativas nas trajetórias de tensões.

Por fim, deve-se frisar que em muitas situações já existe uma pressão neutra inicial (u o) no
solo, como ocorre, por exemplo, num perfil de solo submerso, ou quando se aplica contra pressão
em corpos de prova para saturá-los. Esta pressão pode ser considerada como a origem a partir da
qual as pressões neutras, despertadas pelos carregamentos, passam a ser medidas. Neste caso, é
possível definir três trajetórias: a total (T), a total, transladada do valor da pressão neutra inicial,
(T- uo) e a efetiva (E). A Figura 6.7 ilustra essas três trajetórias e é oportuno salientar que a
pressão neutra total é a correspondente à inicial mais a pressão adicional gerada no cisalhamento
(sobrepressão: ue), ou

u = uo + ue (6.14)
t
T - uo T
E

ue uo

s, s'

Figura 6.7: Trajetórias T, T- uo e E.

Diagramas p', p e q

As tensões normais e cisalhantes em um plano perpendicular à diagonal, num sistema


cartesiano ortogonal, cujos eixos são as três tensões principais, são conhecidas como tensões
octaédricas. As tensões octaédricas normal e tangencial são definidas como

oct 
1
1  2  3  (6.15)
3

oct 
1
1  2 2  2  3 2  3  1 2 (6.16)
3

Assim, além das alternativas anteriores (variáveis s, s' e t), outra forma de representação de
um certo estado de tensões tira partido das tensões octaédricas. Neste caso, utilizam-se as
coordenadas p',p e q para um estado triaxial de tensões, em que:

47
p' =
 '
1  '2  3'  (6.17)
3

q=
1
2
   
1 2
2
  2  3 2  3 1 2 
0, 5
(6.18)

O parâmetro p corresponde à tensão normal em um plano octaédrico (tensão normal


octaédrica ou tensão média - oct) e q, à tensão cisalhante nesse plano (tensão cisalhante octaédrica
- oct), multiplicada por (3/2).
É fácil verificar que, caso se deseje trabalhar com tensões totais, tem-se

q=q' (6.19)
e
p=p'+u (6.20)

Da mesma maneira que em um plano s e t, um estado de tensões triaxial passa a ser


representado por um ponto(ou por dois, se as tensões totais e efetivas estiverem sendo
representadas), caso se utilizem as coordenadas p e q. Esta forma de representação é a utilizada
pelo grupo da Universidade de Cambridge no desenvolvimento da Teoria do Estado Crítico e tem
como vantagens, além de incluir a tensão principal intermediária, o fato de que as tensões
octaédricas se constituem em dois invariantes de tensões, ou seja, seus valores não se alteram com
a variação dos eixos de referência.
A utilidade dessas formas de representação ficará mais evidenciada adiante quando do
desenvolvimento dos conceitos referentes à resistência ao cisalhamento dos solos.
Nos ensaios de compressão triaxial convencionais (1, 2 = 3), a expressão de q se reduz
a

q = '1 - '3 (6.21)

Analogamente ao que se fez entre os diagramas s'-t e ' x , pode-se obter uma envoltória
também num diagrama p’-q. Neste caso, tem especial interesse uma envoltória que passa pela
origem e que retrate as condições no estado crítico do solo. Essa envoltória tem a seguinte equação

q = M.p' (6.22)

A mesma envoltória, passando pela origem num diagrama ' x , tem como equação

48
s = 'tg'cv (6.23)

O parâmetro M relaciona-se ao ângulo de atrito ’cv de acordo com a seguinte equação,


para os casos de solicitação por compressão

6. sen 'cv
M (6.24)
3  sen 'cv

Estabeleceu-se esta relação para uma situação especial de solicitação correspondente ao


estado crítico, quando o cisalhamento se processa a volume constante (donde o subscrito cv), o que
normalmente ocorre para grandes deformações. O ângulo de atrito 'cv reflete portanto as condições
de estado crítico. Noções sobre a Teoria do Estado Crítico serão apresentadas no item 12 .

49
8. RESISTÊNCIA DAS AREIAS

8.1 - Introdução
Nas areias, por conta das elevadas permeabilidades, prevalecem as condições drenadas no
tocante à dissipação de pressões neutras. Em outras palavras, as pressões neutras despertadas
dissipam num tempo condizente com a aplicação dos carregamentos que as despertaram. Deve-se
frisar que em algumas situações, como em maciços de areia fina saturada, surge a possibilidade de
solicitações em condições não drenadas, com importantes conseqüências como a liquefação.
Este capítulo trata primeiramente da resistência drenada de areias e, posteriormente, são
abordados certos aspectos referentes à resistência não drenada desses solos.
Para ilustrar o tema, utilizar-se-ão resultados experimentais consagrados na literatura e que
se devem a Lee & Seed (1967) e Seed & Lee (1967). Estes resultados referem-se a uma areia fina
uniforme, com partículas sub-angulares e arredondadas, compostas de feldspato e quartzo. Os
diâmetros variavam entre 0,297mm e 0,149mm, a massa específica das partículas era de 2,68g/cm3
e os índices de vazios máximo e mínimo eram, respectivamente, 1,03 e 0,61.

8.2 – Curvas Tensão Deformação Típicas e Resistência Drenada

Os gráficos da Figura 13.35 mostram resultados típicos de ensaios de cisalhamento em


areias moldadas segundo distintas condições de compacidade. Tais resultados, embora
provenientes de ensaios de compressão triaxial, manteriam as mesmas características se fossem
obtidos por cisalhamento direto e, de uma maneira geral, representam o que ocorre no
cisalhamento drenado de areias.
No caso das areias fofas, todas as amostras apresentavam, após adensamento, um índice de
vazios (ec) de 0,87, o que corresponde a uma compacidade relativa (Dr) da ordem de 38%. Já as
amostras compactas tinham ec = 0,61 e Dr = 100 %. As curvas tensão deformação estão
apresentadas em termos da relação de tensões principais. Nos ensaios drenados, os valores das
tensões principais correspondentes aos picos das curvas tensão deformação serão os mesmos quer
se considere a relação '1 / '3 ou a resistência à compressão, 1 - 3 , pois '3 é constante.
Dessas figuras, observa-se que as curvas correspondentes às areias compactas apresentam
um valor máximo bem definido da relação de tensões, normalmente para pequenas deformações.
Com relação às variações de volume, após uma pequena redução inicial, verifica-se um aumento, à
medida em que o solo é cisalhado, fenômeno que recebe o nome de dilatância.
Nas areias fofas, após atingida determinada tensão, as deformações crescem continuamente
sem acréscimo de tensão. Contrário às areias compactas, ocorre agora uma redução de volume.
Por oportuno, registre-se que nas areias tidas como compactas, para as tensões confinantes mais

50
altas, a tendência é de diminuição de volume, enquanto nas fofas, ensaiadas com as menores
tensões confinantes, há uma tendência ao aumento de volume. Isto faz com que a compacidade
isoladamente não seja suficiente para a distinção entre areias fofas e compactas, devendo-se
reconhecer também a necessidade de considerar a influência da tensão confinante para uma
completa separação entre os dois estados.

6,0 4,0
1' 1' 0,1
3' 5,5 3' 0,2
0,1 3c' (MPa) e = 0,61 3,5
5,0 0,45
0,3
3,0 1,3
4,5
1,05 2,0
4,0 2,5
4,0
2,0
3,0
3,5 2,0
4,0 12,0 3c' (MPa) e = 0,87
3,0
12,0 1,5
2,5
1,0
2,0 0 5 10 15 20 25 30
2,5
1,5 0,1
v 0,2
1,0 (%) 0
0 5 10 15 20 25 30 35 40 0,45
compressão
-2,5
0,1 3c' (MPa)
10 -5,0
v (%) 0,3
1,3
5 -7,5
1,05 2,0
0 -10,0
2,0
3,0 compressão
-5 -12,5
4,0 4,0

-10 -15,0
12,0
3c' (MPa) 12,0

-15 -17,5
0 5 10 15 20 25 30 35 40 0 5 10 15 20 25 30
a (%) a (%)
(a) (b)

Figura 13.35: Curvas tensão deformação para a areia de Sacramento. a) estado compacto; b) estado
fofo (Lee & Seed, 1967).

Dos pontos de máximo das curvas tensão deformação das areias compactas e fofas pode-se
definir os círculos de Mohr e as envoltórias correspondentes a cada compacidade, o que é feito na
Figura 13.36.
O primeiro ponto importante a ressaltar é que caso se desejasse ajustar uma envoltória
tangente para toda a faixa de tensões considerada, verifica-se que ela seria curva. Adotando o
critério de Mohr-Coulomb, obtém-se a envoltória de resistência traçando retas passando pela
origem e tangenciando os círculos de Mohr incluídos na faixa de tensões normais de interesse.
Dependendo das tensões, tem-se ângulos de atrito variando e, em geral, eles tendem a diminuir
com o aumento das tensões normais.
Assim, a envoltória de resistência de Mohr-Coulomb, típica das areias, apresenta-se com a
seguinte forma

51
s = ' tg ' (13.68)

em evidente analogia com as leis que retratam o atrito entre corpos sólidos. Em algumas situações
pode ser interessante ajustar aos dados experimentais uma equação potencial com a seguinte forma

s = a.(')b (13.69)

onde a e b são parâmetros empíricos de ajuste.

41
6
 24
(MPa)
4

0
0 2 4 6 8 10 12 14
 ' (MPa)
(a)

6
 34
24

(MPa)
4

0
0 2 4 6 8 10 12 14
 ' (MPa)
(b)

Figura 13.36: Envoltórias de resistência para a areia de Sacramento a) estados compacto;


b) estado fofo (Lee & Seed, 1967).

No caso da areia compacta aqui tratada pode-se ajustar uma reta tangenciando os círculos
de Mohr, para as confinantes mais baixas (inferiores a 2 Mpa) e obter c’=0 e ’= 41o , resultando
para a equação da envoltória de Mohr-Coulomb:

s = '.tg 41o kPa (13.70)

Para a areia fofa tem-se, nas baixas tensões, um ângulo de atrito de 34o . A envoltória
resultante tem, portanto, por equação

52
s = '.tg 34o kPa (13.71)
Observar que para as duas condições de compacidade, os ângulos de atrito reduzem-se à
medida que aumentam as tensões normais: de 41o para 24o na areia compacta e de 34o para 24o na
areia fofa.
Estes resultados, acrescidos de ensaios com corpos de prova preparados em outras
compacidades (não mostrados aqui), surge uma importante constatação, que é o fato de que com a
redução do índice de vazios, aumenta o ângulo de atrito da areia.
As variações de volume, que se processam durante o cisalhamento, podem ser explicadas,
simplificadamente, de acordo com o modelo da Figura 13.37.

N
N V T

(a)

N
V N
T

(b)

Figura 13.37: Esquema para ilustrar a variação de volume das areias durante o
cisalhamento. a) areia compacta; b) areia fofa.

No caso a), solo compacto, os grãos de solo encontram-se entrosados. Iniciadas as


deformações cisalhantes os grãos deslizarão uns por sobre os outros de forma a atingir a posição de
menor compacidade, ocorrendo um aumento de volume. Já no caso b), solo fofo, as tensões
cisalhantes permitem um maior entrosamento dos grãos, com consequente redução de volume.
A redução de volume por um lado e o aumento por outro, conduzem à idéia de um estado
de compacidade intermediário, no qual não ocorressem variações de volume, ou seja o
cisalhamento passaria a acontecer a volume constante. Esse estado de compacidade é definido em
termos de um índice de vazios, denominado de índice de vazios crítico e diz-se que nessas
condições atinge-se um estado característico do solo chamado de estado crítico.
Assim, se as deformações forem levadas até valores suficientemente grandes (na prática
superiores a 15%, comumente) constata-se que as duas amostras da mesma areia, ensaiadas com a
mesma tensão confinante, tenderão a fornecer a mesma resistência e a prosseguir no cisalhamento
sem variação de volume. A propósito, esta tendência pode ser verificada nos dois ensaios efetuados

53
com tensão confinante de 2,0 Mpa (Figura 13.35). O ângulo de atrito obtido para o estado de
tensões correspondente às condições de estado crítico é simbolizado por ’cv. Na condição de pico
da curva tensão deformação (solo compacto), nota-se que o angulo de atrito (’) é maior do que
’cv, podendo-se atribuir esta diferença ao entrosamento entre as partículas e ao fenômeno de
dilatância decorrente.

Exemplo 13.6

Dois corpos de prova de uma areia grossa compacta foram submetidos a ensaios de
compressão triaxial drenado (CD) e mostraram os seguintes resultados na ruptura:

CP ’3c (1-3)máx
(kPa) (kPa)
1 100 430
2 300 1290

Pede-se:

a) determinar a envoltória de resistência do solo;


b) as tensões no plano de ruptura para o CP2;
c) a tensão cisalhante máxima para o CP2;
d) seria possível a essa areia, partindo de '3c=200 kPa, ser carregada, em compressão axial, até
1=800 kPa?
e) seria possível a essa areia, partindo de '3c= 400 kPa, numa solicitação de compressão por
descarregamento (v=ctc. e h decrescendo), atingir v=400 kPa e h=40 kPa.

a) Como ’3c permanece constante durante todo o ensaio, pode-se calcular 1, na ruptura, para
cada corpo de prova. Para o CP1, 1=530 kPa e para o CP2, 1=1590 kPa. Isto permite desenhar
os círculos de Mohr para os dois corpos de prova e ajustar uma envoltória passando pela
origem (Fig. Ex. 13.6-1). Obtém-se '=43o, donde a equação para a envoltória resulta

s='tg43o kPa.

b) As tensões no plano de ruptura para o CP2 ficam dados pelo ponto R2, onde o círculo tangencia
a envoltória. Do gráfico pode-se obter R=505 e R=470 kPa. Os mesmos valores podem ser
calculados analiticamente, bastando observar que
'1 '3c '1 '3c
'r= - sen '
2 2

54
r='rtg'

Substituindo,

1590  300 1590  300


'r= 
o
sen 43 =505,1 kPa
2 2

r =505,1tg43o=471 kPa

O polo (P2) coincide com ’3c, de sorte que P2R2 é o traço do plano de ruptura do CP2, que
'
tem uma inclinação correspondente a c  450  ou c=66,5o com o plano principal maior.
2

 o
(kPa) 43

800
T2
+
R2
400 2

1
0
0 P2 400 800 1200 1600 2000 ’ (kPa)

Fig. Ex. 13.6-1

c) A tensão cisalhante máxima é fornecida pelo ponto T 2, ou seja, máx=645kPa. máx corresponde a
'1 ' 3c
ou seja, ao raio do círculo de Mohr e está associada a =945 kPa. Observar que a tensão
2
cisalhante no plano de ruptura é inferior a máx.

d) O círculo de Mohr correspondente é o 3 (Fig. Ex. 13.6-2) e verifica-se que ele se situa
inferiormente à envoltória. Portanto, é possível aplicar esse estado de tensões, sem atingir a
ruptura.

e) Na compressão por descarregamento, v corresponde à tensão principal maior e h, à menor. O


círculo de Mohr correspondente é o 4 (Fig. Ex. 13.6-2) e verifica-se que a areia não pode suportar
esse estado de tensões.

55

(kPa)

o
800 43

400

3
4
0
0 400 800 1200 1600 2000 ’ (kPa)

Fig. Ex. 13.6-2

8.3 - Dilatância

O efeito da dilatância pode ser quantificado através do trabalho exercido pelas forças
presentes durante o cisalhamento. A partir das idéias de Taylor (1948), pode-se propor um
equacionamento para avaliar o efeito da dilatância, considerando as variáveis ocorrentes num
ensaio de cisalhamento direto, de acordo com o esquema da Figura 13.38.


dx
y dy

Hi
x

y
x dy
máx
dx

Figura 13.38: Forças atuantes num ensaio de cisalhamento direto.

Ao igualar o trabalho fornecido à amostra ao trabalho interno por atrito obtém-se


T.dx-N'.dy = .N'.dx (13.72)

onde  - coeficiente de atrito.

A expressão pode ser posta como

56
T dy
 (13.73)
N' dx

onde o termo dy/dx representa o efeito da dilatância. No caso em que dy/dx é nulo (cisalhamento a
volume constante),

T
   tg'cv (13.74)
N'

Assim, o máximo valor da relação T/N' ocorre quando a taxa de variação volumétrica é
máxima, ou

T  dy 
   tg'cv   (13.75)
  m'ax
N '  dx  max

A dilatância foi estudada com detalhes por Rowe (1962). A formulação proposta incorpora
a relação de tensões principais, o arranjo de partículas e as variações das deformações volumétricas
(v) e da deformação principal maior (1). A expressão que relaciona esses fatores é

'1 1  sen 'f  d 


 1  v  (13.76)
'3 1  sen 'f  d1 

O ângulo 'f é um ângulo de atrito do qual se deduz o efeito da dilatância e que


corresponde a um valor intermediário entre 'u (atrito mineral-mineral) e 'cv (atrito na condição de
estado crítico ou de cisalhamento a volume constante). Este valor depende das condições de
deformação permissíveis ou da possibilidade de rearranjo das partículas e de seu deslizamento
durante o cisalhamento. Observa-se, como na formulação proposta a partir das idéias de Taylor,
que a máxima relação de tensões principais corresponde à máxima taxa de dilatância, ressaltando-
se agora que variações de volume por expansão foram consideradas como negativas. A Figura
13.39 ilustra a faixa de variações de 'f para uma areia quartzosa.

8.4 - Fontes de Resistência nas areias

Do exposto, e em que pese a resistência das areias ser atribuída ao atrito, ela deve, na
verdade, ser creditada a duas fontes. Uma delas deve-se ao atrito propriamente dito, que por sua

57
vez se compõe de duas parcelas: a primeira, devida ao deslizamento mineral-mineral (representada
por ’u ) e a outra a devida ao rolamento das partículas, umas por sobre as outras. A segunda fonte
de contribuição refere-se à parcela de resistência estrutural representada pelo trabalho de dilatância,
como já discutido.
A Figura l3.39 esquematiza a contribuição das diversas fontes para a resistência de areias
quartzosas.

46
d'

cv' = Ângulo de atrito para


deformações a volume
42 constante

38

' ( )
Dilatância
34 cv
'

30

Rearranjos 'f
u'
Índice de Arranjos
Atrito
vazios mais
crítico densos

42 38 34 30 26
n (%)

Figura 13.39: Parcelas de contribuição de diversas fontes para a resistência das areias (Rowe,
1962).

Nesta figura, 'd é o ângulo de atrito medido em ensaios drenados, 'f é o ângulo de atrito
do qual se deduziu o efeito da dilatância e 'u é o ângulo de atrito decorrente do deslizamento
mineral-mineral. Pode-se notar que para altas porosidades ocorrem rearranjos das partículas uma
vez que é necessário que elas deslizem segundo planos de variadas inclinações, sem que isso
provoque efeitos apreciáveis de dilatância. Já para arranjos compactos, as possibilidades de
rearranjo são reduzidas, e os deslocamentos relativos, até a ruptura, requerem variações
volumétricas que se contraponham às tensões confinantes, gerando a grande parcela de
contribuição devida à dilatância.

8.5 - Fatores que interferem na resistência das areias

58
As principais características que interferem na resistência das areias são o índice de vazios
(ou a compacidade relativa associada), a forma e a rugosidade dos grãos e a distribuição
granulométrica.
A influência da compacidade pode ser bem esclarecida quando se observa a própria Figura
13..39: areias mais compactas apresentam maior resistência que as areias fofas. Quanto ao
tamanho das partículas, tem-se observado que as areias grossas e as finas, quando ensaiadas nas
mesmas condições de índice de vazios, tendem a apresentar ângulos de atrito próximos. Com
frequência encontram-se referências a valores maiores para as areias grossas, no entanto isto deve
ser creditado, dentre outros fatores, ao fato de que os depósitos de areias grossas atingem estados
de maior compacidade do que as areias finas. Nota-se também que areias compostas de grãos
angulares evidenciam maiores ângulos de atrito do que areias de grãos mais regulares e que
partículas mais rugosas mostram também maiores ângulos de atrito do que partículas mais lisas.
A seleção das partículas interfere, grosso modo, da mesma forma que a compacidade.
Compreende-se que um solo bem graduado oferece melhores oportunidades de entrosamento,
podendo propiciar um solo mais compacto e por extensão mais resistente que um solo mal
graduado.
Um fator que pouco influi na resistência da areia é a água: de uma maneira geral o ângulo
de atrito das areias úmidas é igual ao das areias secas, a menos de l ou 2, o que permite conhecer
o ângulo de atrito utilizando tanto amostras secas como saturadas, estas em condições drenadas
obviamente. Contrário ao que intuitivamente poderia parecer, a água não exerce efeito
lubrificante, de forma que o ângulo de atrito permanece praticamente inalterado. Isso enseja a
oportunidade de que diversas propriedades que dependem do atrito, como por exemplo a relação de
tensões principais na ruptura ou o coeficiente de empuxo em repouso, permaneçam inalterados
caso o solo esteja submerso ou seco.
Outro fator que interfere no ângulo de atrito, principalmente para altas resistências é a
tensão principal intermediária (2). Ensaios de deformação plana tendem a fornecer ângulos de
atrito ('ps) cerca de 4 a 8o maiores que os obtidos em ensaios de compressão triaxial. Para menores
resistências ('  34o, aproximadamente), os ângulos de atrito tendem a ser iguais. A Tabela 13.3,
extraída de Holtz & Kovacs (1981), sintetiza essas interferencias.
A Tabela 13.4, a seguir, mostra valores típicos do ângulo de atrito em solos
granulares, podendo-se notar ainda a interferência de alguns dos fatores citados e a Figura 13.40
mostra correlações entre o ângulo de atrito e diferentes índices físicos para areias de diferentes
composições.

Tabela 13.3: Síntese de fatores que interferem na resistência das areias (Holtz & Kovacs, 1981)

59
Fator Efeito
Índice de vazios (e) e ' 
Angularidade (A) A ' 
Graduação (Cu) Cu  ' 
Rugosidade (R) R  ' 
Água (W) W  '  (pouco)
Tamanho da partícula (T) Nenhum efeito (para mesmo e)
Tensão principal intermediária 'ps  'triaxial ('triaxial 34o)
Pré Carregamento Efeito mínimo

Tabela 13.4 : Valores típicos de ângulo de atrito em materiais granulares (composta a aprtir de
Terzaghi & Peck (1967) e Leonards (1962)).

solo compacidade Grãos arredondados/ Grão angulares/


Graduação uniforme Bem Graduado
Areia média Muito fofa 28o – 30o 32o – 34o
Med. Cmpacta 32o - 34o 36o – 40o
Muito compacta 35o – 38o 44o – 46o
Pedregulhos arenosos
G(65%) S(35%) Fofo ------- 39o
Med. Compacto 37o 41o
G(80%) S(20%) Fofo 34o -------
compacto ------ 45o
Fragmentos de rocha 40o – 55o
Areia siltosa Fofa 27o – 33o
compacta 30o – 34o
Silte inorgânico Fofo 27o – 30o
compacto 30o –35o

60
45

40
Dr = 100 %
' ( ) GW
GP
35 SW
75
SP
ML 50
SM
30
25

25
n (p/ s = 2,68 g/cm )
3

0,55 0,5 0,45 0,4 0,35 0,3 0,25 0,2 0,15

20
1,2 1,1 1,0 0,9 0,8 0,7 0,6 0,55 0,5 0,45 0,4 0,35 0,3 0,25 0,2 0,15 e

1,2 1,3 1,4 1,5 1,6 1,7 1,8 1,9 2,0 2,1 2,2 2,3 2,4

d (g/cm3)

Figura 13.40: Correlação entre características físicas, composição e ângulo de atrito em areias
(NAVFAC, 1971).

8.6 - Índice de Vazios Crítico

Existe um estado de compacidade no qual o cisalhamento se processa através de


deformações contínuas, porém sem variação de volume ou de resistência. Esse estado, conhecido
como estado crítico, é caracterizado pelo índíce de vazios crítico (ecrit).
Esse índice pode ser obtido através de diferentes técnicas em função das propostas de
diversos autores. Segundo Casagrande, o ecrit. corresponde ao estado inicial de compacidade de um
corpo de prova o qual, submetido a um ensaio triaxial com tensão confinante constante, não viesse
a apresentar variação de volume entre o início do carregamento de cisalhamento e o instante de
ruptura.
Outra especificação, devida a Taylor, prefere determinar o ecrit a partir de ensaios triaxiais a
volume constante. O ecrit seria representativo do estado inicial de compacidade do corpo de prova,
quando se verificasse serem iguais as tensões de confinamento tanto no início do cisalhamento,
como no instante da ruptura.
Os resultados apresentados a seguir são úteis para explicitar alguns aspectos acerca do
índice de vazios crítico. As variações de volume na ruptura, colocadas em função dos índices de

61
vazios após adensamento, encontram-se na Figura 13.41, considerando-se as distintas tensões de
confinamento.

Dr (%)
100 80 60 60 40 0
+5
1
ecrit = 0,555

0 0,2 0,1
0,3
v (%) 0,6
1,0
-5
1,3

2,0
-10

2,9
3c' (MPa)
4,0
-15
0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0
ec

Figura 13.41: Variações de volume na ruptura em função dos índices de vazios após adensamento,
para distintos valores de tensão de confinamento – Areia de Sacramento (Lee & Seed, 1967).

Por esta figura pode-se obter os índices de vazios críticos para a areia, bastando lembrar
que este índice corresponde à variação volumétrica nula na ruptura. Assim, para ’3c = 600 kPa,
pode-se verificar que ecrit = 0,76. Deve-se notar ainda, que ecrit decresce à medida que aumenta a
tensão confinante.
Uma nova relação pode ser obtida destes dados, considerando-se o índice de vazios crítico
e a tensão de confinamento correspondente, doravante chamada de tensão de confinamento crítica
’3crit, como se mostra na Figura 13.42.

0,9
W
ecrit
0,8

0,7

0,6

P
0,5
0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5
3crit
' (MPa)

Figura 13.42: Índices de vazios críticos em função das tensões confinantes críticas (Lee & Seed,
1967).

62
Outra opção de representação consiste em colocar os resultados de variação volumétrica
dos diversos corpos de prova, considerando-se as tensões de confinamento como variável
independente. Neste caso, obtém-se o gráfico da Figura 13.43, em que cada curva refere-se a um
determinado índice de vazios. Agora, para variação volumétrica nula, pode-se definir a tensão de
confinamento crítica ’3crit.

+5

v (%) ec = 0,5


0
0,6

0,7
-5
0,9 0,8

-10

-15
0 1 2 3 4
3c' (MPa)

Figura 13.43 : Variações volumétricas na ruptura em função das tensões de confinamento para
distintos índices de vazios iniciais (Lee & Seed, 1967).

8.7 - Comportamento de Areias em Solicitações Não Drenadas

Uma situação peculiar pode ocorrer com areias saturadas solicitadas em condições não
drenadas, sobretudo com as areias finas fofas, as quais, na impossibilidade de dissipação das
pressões neutras geradas, tendem a liquefazer-se. Um fenômeno desse tipo foi uma das causas da
ruptura da barragem de Fort Peck (EUA). Carregamentos dinâmicos, como provocados por sismos,
explosões ou máquinas e mesmo carregamentos estáticos podem induzir acréscimos de pressão
neutra capazes de instabilizar uma massa de solo arenoso saturado.
Tal fenômeno pode ser explicado pelas variações de volume a que estão sujeitos os solos.
No caso das areias fofas, o cisalhamento tende a provocar redução de volume do solo. Estando o
solo saturado e sendo relativamente baixa a sua permeabilidade, surge a possibilidade de
cisalhamento em condições não drenadas. A redução de volume estará impedida e aparecerão
pressões na água intersticial, que se não forem dissipadas a tempo, poderão reduzir a tensão efetiva
e provocar a liquefação do solo.
Em se tratando das areias compactas, ocorre o processo inverso, ou seja, aumento de
volume do solo. As pressões neutras despertadas agora serão negativas o que faz aumentar as
63
tensões efetivas e reduzir a possibilidade de liquefação, conforme os conceitos até agora expostos,
considerando carregamentos monotônicos (estáticos) e ensaios com deformação controlada. Na
verdade, como se explicará a seguir, mesmo areias compactas podem estar sujeitas a um processo
de liquefação, dependendo da natureza do carregamento aplicado.
Mostram-se, a seguir, informações adicionais acerca da liquefação, que essencialmente
ocorre em areias fofas, e destaca-se o efeito de solicitações cíclicas, que além de também liquefazer
areias fofas, podem provocar a instabilização de areias compactas.

Liquefação sob carregamento estático

Castro (1969), a partir de uma sugestão do Prof. Casagrande, passou a estudar o problema
da liquefação empregando ensaios com tensão controlada. O Prof. Casagrande intuiu que no
processo de liquefação há necessidade de uma força motora que atue continuamente na massa que
flui, o que pode ser conseguido com ensaios com tensão controlada (através da adição de pesos) e
não com deformação controlada, como originalmente proposto por ele na década de 30, pois
ocorreria relaxação das tensões (Casagrande, 1975). A Figura 13.44 mostra alguns dos resultados
de Castro donde se pode apreciar a ocorrência de liquefação sob carregamento estático, além de
certos aspectos referentes à resistência das areias, quando se consideram distintas condições de
drenagem.
Os corpos de prova são todos de uma areia quartzosa, com partículas variando de sub-
arredondadas a sub-angulares, com coeficiente de uniformidade de 1,8 e com 10%, em peso,
inferiores a 0,1mm e consolidados isotropicamente, com 400 kPa, até as compacidades assinaladas
na figura. Após adensamento, os incrementos de carga foram aplicados, em condições não
drenadas, a cada minuto, através de pequenos pesos agindo sobre o pistão de aplicação das cargas
axiais. No corpo de prova com menor compacidade (amostra A), observa-se um pico de tensão
para cerca de 1% de deformação, atingida após cerca de 15 minutos de carregamento, e um
acréscimo pronunciado de pressão neutra. Após o pico, o próximo incremento de carga provocou
subitamente o colapso da amostra, que em cerca de 0,2 segundos, deformou de 1 até 25%. As
tensões caíram para cerca de 30 kPa, a pressão neutra subiu para 385 kPa e esses valores não mais
se alteraram durante o processo de fluxo.
A amostra B, mais compacta que a A, teve um comportamento semelhante. Após um pico,
para cerca de 2% de deformação, o próximo carregamento provocou a liquefação, quando a
amostra deformou subitamente de 2 até 18% em cerca de 0,4s e todo o movimento cessou, tendo as
pressões neutras atingido cerca de 300 kPa. Nesta amostra a liquefação não se manifestou por uma
gradual diminuição de resistência, mas pela ocorrência abrupta de grandes deformações.

64
800

D ensaio CD: Dr = 30%


600
ensaio CU: Dr = 47%
C 47 min até a = 15%

 1 -  3 (kPa)
ensaio CU: Dr = 44%
400 0,4 s do pico até a = 18%

200 B
ensaio CU: Dr = 44%
0,4 s do pico até a = 18%

(1 - 3) r = 30 kPa


A
0
0 5 10 15 20
a (%)
, ,
3c = 400 kPa 3 r = 15 kPa
400 A

B
 u (kPa)

200

D
0
0 5 10 15 20
a (%)
,
(Os quatros corpos de prova adensados com 3c = 400 kPa)

Figura 13.44 : Ensaio drenado e ensaios consolidados não drenados com tensão controlada
(Castro, 1969).

Já a amostra C, mais densa que as anteriores, não se liqüefez. Pode-se observar nela uma
tendência a aumento de volume, manifestada pela redução das pressões neutras que caíram para
zero, para cerca de 14% de deformação. Evidentemente, no ensaio drenado (amostra D), não há
nenhuma possibilidade de liquefação.
A Figura 13.45 mostra outros resultados com corpos de prova preparados para ficar com o
mesmo índice de vazios, após o adensamento, e cisalhados também através da aplicação gradativa
de pequenos pesos. O corpo de prova A foi adensado isotropicamente (é o mesmo ensaio A da
figura anterior), o AN, anisotropicamente e o CY, sujeito a carregamento cíclico, tendo a ruptura
ocorrido repentinamente após o quinto ciclo de carga.

65
400

300

(kPa)
AN
200

1 - 3
A
CY
100
(1 - 3) r 30 kPa
o
5 ciclo
0
Primeiro 12 16 20
ciclo
Ensaio CY a (%)
-100
, ,
3c 3 r 15 kPa
400

300
(kPa)

CY
200 A
u

AN
100

0
0 4 8 12 16 20
a (%)

A : Ensaio CU adensado isotropicamente.


AN : Ensaio CU adensado anisotropicamente com 1 / 3 = 2,0.
CY : Ensaio CU carregamento cíclico, liquefação se desenvolveu durante o 5o ciclo.

,
Todos os corpos de prova com D r 30% e adensados com  3c = 400 kPa

Figura 13.45: Liquefação de areia fofa saturada sujeita a três tipos de carregamento
(Castro, 1975).

Nota-se em todos os corpos de prova um pico bem definido, seguido por uma queda
pronunciada de resistência. Para grandes deformações, a resistência é muito pequena e não se altera
com o aumento das deformações (atingiu-se a condição de estado crítico), além de ser a mesma
para os três corpos de prova (cerca de 30 kPa). Registre-se também que as deformações, desde o
pico de tensões até cerca de 20%, ocorreram em cerca de 0,20 segundos, o que caracteriza a
ruptura por liquefação. Este comportamento é semelhante ao que se observa durante sismos,
quando massas de areia saturada fluem. Neste caso ocorre uma redução substancial de resistência,
que afeta praticamente todo o maciço e este escoa como se fosse um líquido. O solo se espalha até
que haja uma compatibilidade entre as tensões atuantes e a baixa resistência disponível, o que
implica superfícies com pequenas inclinações.
Em síntese, a liquefação corresponde a um fenômeno em que uma areia saturada perde
grande parte de sua resistência e flui de uma forma semelhante a um líquido, até que as tensões
atuantes sejam tão baixas quanto a resistência disponível. Um talude que se liquefaz atinge o
equilíbrio quando a sua inclinação for significantemente reduzida e uma construção apoiada sobre
66
um solo liquefeito afundará ou flutuará enquanto as tensões aplicadas não forem consistentes com
a reduzida resistência disponível. (Castro & Poulos, 1977).

Mobilidade por Solicitação Cíclica

Quando uma vibração intensa atua sobre uma massa de areia, ela tende a reduzir de
volume, independentemente da compacidade ou do grau de saturação. Neste caso não se aplica o
conceito de índice de vazios crítico, estipulado para carregamentos estáticos, porque a natureza das
solicitações é diferente. Vibrações produzem deformações cisalhantes que alteram o índice de
vazios e as tensões efetivas, dependendo das condições de drenagem. Para ilustrar esse fato, o
gráfico da Figura 13.46 traz resultados referentes à areia do Rio Sacramento, ensaiada em
compressão triaxial sob carregamento cíclico. O corpo de prova foi moldado com Dr=38% e
submetido, em condições não drenadas, a um carregamento cíclico (=v - h) de  39 kPa, com
frequência de 2 ciclos por segundo, sendo a tensão efetiva de adensamento de 100kPa. Aparece
também nessa figura um esquema de aplicação de cargas durante o ensaio de compressão triaxial
cíclico, onde a amostra após adensada com '3c é carregada repetidas vezes com cargas de
compressão ou extensão iguais a  em módulo.

67


’3c

(a) ’3c

a (%) 30
a p/  = + 39 kPa

10
compressão
a p/  = 0
(b) 0

-10 extensão
e = 0,87 Dr = 38 %
3c' = 100 kPa
 = + 39 kPa a p/  = - 39 kPa
-30
1 2 4 10 20 40 100

u 150
(kPa)

3c' u p/  = 0
100

u p/  = + 39 kPa
(c) 50
u p/  = - 39 kPa

-50
1 2 4 10 20 40 100
Número de ciclos

Figura 13.46: Carregamento cíclico. a) Esquema de ensaio de compressão triaxial com


carregamento cíclico; b) deformações vs número de ciclos; c) pressões neutras vs número de ciclos
(Seed & Lee, 1966).

Pode-se notar que as deformações axiais são desprezíveis nos primeiros ciclos e que as
pressões neutras tendem a crescer continuamente. A partir do nono ciclo, quando  passa por
zero, a pressão neutra atinge o mesmo valor da tensão confinante e as deformações axiais
aumentam significativamente, atingindo, após o décimo ciclo, valores superiores a 20%.
Na Figura 13.47 tem-se a mesma areia, agora preparada com Dr = 78% e sujeita a
carregamento de  70 kPa. Até 10 ciclos, praticamente não ocorrem deformações, embora principie
a haver um acúmulo de pressão neutra. Em seguida, de forma semelhante ao ensaio anterior,
quando  =0, a pressão neutra cresce e iguala a tensão confinante, o que implica tensões efetivas
nulas na amostra. Note-se também que, em seguida, quando a carga de compressão ou de extensão
passa a atuar, a pressão neutra cai substancialmente e que o solo ainda resiste a carregamentos
68
adicionais sem que ocorra o colapso da amostra. Por exemplo, tem-se deformações da ordem de
10%, após cerca de 30 ciclos de carga.
O ponto em que a amostra passa por um estado hidrostático de tensões ( =0) e onde a
pressão neutra iguala a tensão de adensamento, determina a chamada liquefação parcial ou inicial.

compressão 15

10  para
a

 = + 70 kPa
5
 para
 a (%)

a
0  = 0
extensão

5 ei = 0,71, D r = 78 %
3c = 100 kPa  para
a

 = + 70 kPa  = 0 kPa
10

15
1 2 4 10 20 40 100
Número de ciclos

+150
u para
 ,3c  = 0
Pressão neutra,  u (kPa)

+100
u para
 = + 70 kPa
+50

u para
0  = - 70 kPa

-50
1 2 4 10 20 40 100
Número de ciclos

Figura 13.47: Areia compacta submetida a carregamento cíclico (Seed & Lee, 1966).

Além dos aspectos citados, o estudo de Seed & Lee (1966) analisou outros condicionantes
da liquefação de areias uniformes por carregamentos cíclicos que permitiram concluir, em síntese,
que : a) tensões cíclicas podem induzir liquefação total ou parcial para uma ampla faixa de
densidades. Comumente, quanto maior o índice de vazios, maior a possibilidade de liquefação; b)
quanto maior a tensão cíclica ou a deformação, menor é o número de ciclos necessários para
induzir a liquefação ou a ruptura; c) quanto menor a tensão confinante, menor a tensão cíclica, a
deformação ou o número de ciclos necessários para induzir a liquefação ou a ruptura; d) na
liquefação de areias fofas por carregamentos cíclicos de amplitude constante as deformações
tornam-se imediatamente elevadas; e) areias densas podem desenvolver uma condição de
liquefação parcial na qual, para acréscimo nulo de tensões, a pressão neutra pode igualar a tensão
confinante e a tensão efetiva cai, momentaneamente, para zero; f) durante a liquefação parcial as
deformações tendem a crescer nos ciclos subsequentes. Quando o acréscimo de tensões passa pelo
valor nulo, a pressão neutra iguala a tensão confinante, porém ela decresce quando a carga de
69
compressão ou de extensão passa a atuar. g) após a liquefação inicial, as deformações crescem
rapidamente nas areias fofas e lentamente nas areias compactas. Quando a deformação atinge 20%,
em um carregamento cíclico, admite-se a ocorrência de liquefação completa da massa de solo.
Casagrande conceituou a mobilidade por solicitação cíclica como correspondendo ao
progressivo afofamento, provocado por uma redistribuição de umidade e de compacidade, em uma
areia saturada, sujeita a um carregamento cíclico.
A Figura 13.48 mostra um diagrama de estado que ajuda a esclarecer as diferenças entre
liquefação e mobilidade por solicitação cíclica, conforme observado em laboratório. Nela está a
curva de estado permanente que representa a envolvente dos estados nos quais um solo pode fluir,
com índice de vazios, tensão confinante efetiva e resistência constantes. O índice de vazios nessa
condição corresponde ao índice de vazios de Casagrande.
Inicialmente é possível explicitar as condições de ocorrência do já conhecido fenômeno de
areia movediça através do ponto Q, quando a areia apresenta tensão efetiva nula e, portanto,
resistência nula. Para índice de vazios acima de Q, as partículas de solo já não estarão mais em
contacto.
A liquefação corresponde à ruptura não drenada de uma areia fofa (tende a sofrer redução
de volume), sob carregamento estático. O ponto C pode representar as condições iniciais de onde
principia o carregamento, com ruptura com as condições expressas pelo ponto A, onde se dá o
fluxo a volume constante. Ressalte-se, novamente, que um carregamento cíclico também pode
provocar o mesmo fenômeno.
Na areia compacta, com as condições iniciais representadas pelo ponto D, podem ocorrer
duas situações. Por ser dilatante, sob carregamento estático, as tensões encaminham-se para a
direita em direção à linha de estado permanente, em coerência com os aspectos relatados no item
referente a índice de vazios crítico. No entanto, se forem aplicadas tensões cíclicas de suficiente
magnitude, observa-se que cada vez que as tensões passam pelo valor nulo, surgem pressões
neutras que conduzem a amostra para o ponto B. Durante a ciclagem, desenvolvem-se deformações
e a amostra afofa. Caso as deformações sejam relativamente grandes, diz-se que ocorreu
mobilidade por solicitação cíclica.
Os aspectos relatados são apenas uma pequena síntese acerca da questão referente à
liquefação de areias saturadas. O tema reveste-se de grande importância no estudo de sismos e
outras solicitações dinâmicas e tem sido objeto de estudos por muitos pesquisadores. Aos
interessados recomenda-se a leitura dos trabalhos de Seed & Lee (1966), Lee & Seed (1967),
Castro (1975), Casagrande (1975) e Castro & Poulos (1977) para uma introdução ao assunto.

70
Q Fluxo a volume constante

Índice de vazios médio, e


Liquefação
A C
Solos contrativos
(fofos)

Linh
ad e estado
B D permanente

Carregamento
monotônico
Solos
Mobilidade dilatantes
cíclica (densos)
0
, , ,
3,
3r 3c 3c
(durante
fluxo)

Figura 13.48: Diagrama de estado ilustrativo da liquefação e da mobilidade por solicitação


cíclica a partir de ensaios não drenados (Castro & Poulos, 1977).

Resistência em Condições Não Drenadas

Os resultados da Figura 13.49 permitem observar as significativas diferenças de resistência


drenada e não drenada em uma areia. Considerando a resistência de pico da amostra A (Fig. 13.44)
é possível traçar os círculos de Mohr em termos de tensões totais (A1) e efetivas (A2), como
ilustrado na Figura . Para comparação, tem-se o círculo correspondente ao ensaio drenado (D) que
permite observar a maior resistência obtida nesse ensaio, em comparação ao ensaio não drenado, e
também obter o ângulo de atrito efetivo para a compacidade considerada. Tem-se também na
mesma figura os círculos durante o processo de liquefação ou de fluxo (AF1 – tensões totais e AF2
– tensões efetivas). O círculo de tensões efetivas fornece um ângulo de atrito igual ao obtido no
ensaio drenado ( o que possivelmente tenha sido uma coincidência, segundo Casagrande (1975)).
De qualquer forma é importante notar que: a) uma envoltória considerando as condições de pico
(círculo A2) tende a fornecer um ângulo de atrito inferior ao ângulo de atrito do ensaio drenado; b)
a resistência de pico de 200 kPa cai para 30 kPa, por conta do processo de liquefação e c) uma
envoltória em termos de tensões totais, durante o fluxo (círculo AF1), forneceria um ângulo de
atrito extremamente baixo, da ordem de 2o . Portanto, um fluxo de massa dessa areia se espalharia
até que a sua superfície atingisse inclinações bastante baixas, da ordem de alguns poucos
graus(Casagrande, 1975).

71
400
D

300

Ensaio CD
(para comparação)

(kPa)

o
30
200

Círculo de tensões Círculo de tensões


Círculo de tenões
efetivas durante o totais no pico
efetivas durante
fluxo (AF2)
o pico
100
A2 A1
Círculo de tensões
totais durante o
fluxo (AF1)
0
,
100 200 300 400 500 600 700 800  (kPa)
Resistência de
, (1 - 3)r = 30 kPa pico 200 kPa (1 - 3)r = 30 kPa
 3r = 15 kPa
u no pico
Resistência de
u durante o fluxo
pico 200 kPa

Figura 13.49: Comparação entre resistência drenada e não drenada e durante liquefação de uma
areia saturada (Casagrande, 1975).

Apresentam-se a seguir aspectos adicionais acerca da resistência não drenada de areias


saturadas, submetidas a carregamentos estáticos. O conceito de tensão confinante crítica (’3crit )
auxilia no entendimento deste assunto.
No cisalhamento das areias compactas, quando ’3c é inferior a ’3crit, a pressão neutra
tende a decrescer, em consonância com a tendência ao aumento de volume que essas areias exibem
quando cisalhadas em condições drenadas. Neste caso, a mínima pressão neutra que pode atuar é -1
atm (100kPa), pois este valor corresponde à pressão de vaporização da água em condições normais
de temperatura e pressão. A água cavita e o ar passa a ocupar os vazios do solo. A Figura 13.50
ilustra círculos de Mohr de tensões totais e de tensões efetivas para essa situação.


Tensões Totais
(kPa) Tensões Efetivas

'
-100 3c 3c+100  (kPa)

Figura 13.50: Círculos de Mohr para areias compactas em solicitação não drenada, quando existe a
possibilidade de cavitação da água intersticial.

72
O círculo de tensões efetivas deve tangenciar a envoltória efetiva e o círculo de tensão total
está deslocado para a esquerda do valor da pressão neutra que provoca a cavitação (-100 kPa).
Nota-se, que a envoltória em termos de tensão total é paralela à envoltória de tensões efetivas e
passa pelo valor de tensão normal correspondente à -100 kPa. Pode-se mostrar, teoricamente, que o
valor de tensão confinante (3c) para o qual isto ocorre deve ser (3c)  ('3crit – 100) kPa.
Nos ensaios em que a cavitação não ocorre, verifica-se que a resistência não drenada
independe da tensão confinante, ou seja, tem-se uma envoltória horizontal com o ângulo de atrito
não drenado ( u) valendo zero. Estes casos correspondem aos solos compactos nos quais as
pressões neutras decrescem, porém não atingem -100 kPa e a ruptura se dá sempre com uma tensão
efetiva de confinamento correspondente à tensão de confinamento crítico ou aos solos fofos, em
que o aumento da tensão confinante produz igual aumento da pressão neutra, sem qualquer
variação da tensão efetiva, donde a resistência mantém-se constante, qualquer que seja a tensão
aplicada na câmara.
A Figura 13.51 ilustra o exposto, onde estão esquematizadas a envoltória em termos de
tensões efetivas e a envoltória em termos de tensões totais.
 as
fetiv
(kPa) sE
õe
ens
T
Tensões Totais
máx
3crit 3c1 3c2 3c3  (kPa)

Figura 13.51: Envoltórias de resistência obtida a partir de ensaios não drenados (UU)

Seed & Lee (1967) propõe um método baseado no conceito de tensão confinante crítica
para a previsão da resistência não drenada de uma areia, conhecendo-se os parâmetros de
resistência drenada, bem como a sua tendência à variação de volume. A Figura 13.52 mostra
resultados experimentais com a areia de Sacramento e o ajuste da envoltória de acordo com a
proposição dos citados autores, donde se pode notar o bom ajuste do método proposto.
2,5


 (MPa) e = 0,71 Dr = 78 % ensaios UU
3c' = 0,3 MPa
1,5

0,5

0
0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0
(MPa)

Figura 13.52 : Comparação entre valores observados e previstos pelo método de Seed & Lee
(1967) para a resistência não drenada a partir de ensaios UU.

73
9. RESISTÊNCIA DAS ARGILAS

9.1.Introdução

Muitos fatores fazem com que o estudo da resistência dos solos argilosos seja mais
complexo que o dos solos arenosos. Inicialmente, deve-se enfatizar que o fator determinante da
resistência nos solos é a tensão efetiva. Qualquer ganho de resistência só pode ser justificado em
função de um acréscimo de tensão efetiva, já que a água não resiste a tensões de cisalhamento.
O histórico de tensões experimentado pelo solo desempenha um papel fundamental.
Alguns dos contactos entre partículas, gerados pelas tensões que já atuaram num solo sobre-
adensado, permanecem, mesmo após o descarregamento, e fornecem uma parcela de resistência
adicional, quando comparado ao mesmo solo em condições normalmente adensadas.
As baixas permeabilidades das argilas respondem por uma dissipação lenta das pressões
neutras despertadas por um acréscimo de cargas. Torna-se necessário representar essas condições
de dissipação de pressões neutras em cada caso para conhecer com precisão a resistência a utilizar
no problema em estudo. Para retratar as diferentes formas de ocorrência e de dissipação de
pressões neutras existem, como já citado no item 5.2, três formas clássicas de conduzir os ensaios
de resistência: ensaios não drenados (rápidos); consolidado-não drenados (adensado - rápidos) e
drenados (lentos).
Por outro lado, o mesmo comportamento que caracteriza as areias no tocante as curvas
tensão-deformação também ocorre nas argilas. Sendo permitida a drenagem, uma argila sobre
adensada experimenta expansões volumétricas quando cisalhada e o seu comportamento tensão-
deformação é muito semelhante ao das areias compactas drenadas. As argilas normalmente ou
levemente sobre adensadas assemelham-se às areias fofas e experimentam, portanto, reduções de
volume quando cisalhadas. Caso esteja impedida a drenagem, surgem pressões neutras nos corpos
de prova acompanhando a tendência à variação de volume que os solos exibiriam, ou seja, pressões
neutras positivas para compressão e negativas para expansão da amostra.
O histórico de tensões por que passou um solo, representado pela relação de pré-
adensamento ( RSA ou OCR – overconsolidation ratio), é um parâmetro utilizado como indicador
das condições de adensamento das argilas e é definida como:

RSA = 'p/' (13.77)

onde 'ad é a tensão de pré-adensamento e ', a tensão efetiva atuante.


Cabe destacar ainda as interferências da estrutura do solo responsável por uma série de
comportamentos peculiares, como ocorre nos solos residuais ou nas argilas sensíveis, por exemplo,

74
nas quais o amolgamento das amostras, quer provocado pela amostragem, quer pelo cisalhamento,
provoca reduções substanciais de resistência.
A apresentação de diversos tópicos referentes à resistência das argilas será baseada em
alguns resultados, tidos como clássicos na literatura geotécnica, que se referem a argilas preparadas
em laboratório e deixadas adensar isotropicamente desde umidades próximas ao seu limite de
liquidez, até a tensão de adensamento desejada. Especificamente, trata-se da argila de Weald que
apresenta LL = 43%, LP = 18%, peso específico de partículas de 27,4 kN/m3, 40% das partículas
com diâmetro inferior a 0,002mm e atividade de 0,6 (Henkel, 1956). Assim, as considerações que
se seguem referem-se a solos saturados e tidos como ideais. Incluem-se também, em determinadas
passagens, resultados referentes a outros solos em que comportamentos, que se afastam em maior
ou menor escala dessas condições ideais, são abordados.

9.2. Resistência em Termos de Tensões Efetivas

A resistência de argilas, com base nas tensões efetivas, pode ser conseguida através da
realização de ensaios do tipo drenado ou através de ensaios não drenados com medida de pressões
neutras, quando os resultados podem ser referenciados às tensões efetivas atuantes nos corpos de
prova. A concordância entre os resultados dos dois tipos de ensaios é bastante boa, embora em
certos casos algumas diferenças possam ocorrer, como se discutirá mais adiante.

a) Solos Normalmente Adensados

A Figura 13.48 apresenta resultados de ensaios de compressão triaxial efetuados com a


argila de Weald, normalmente adensada até a tensão de 207 kPa. Na parte a), estão as curvas
tensão deformação e variação de volume deformação, correspondentes ao cisalhamento em
condições drenadas (ensaio consolidado drenado - CD). Na parte b), estão as curvas
correspondentes ao cisalhamento em condições não drenadas (ensaio consolidado não drenado -
CU). Neste caso, em conjunto com a curva tensão deformação, aparece a curva de pressões neutras
ao longo das deformações, visto que neste ensaio, durante o cisalhamento, a drenagem está
impedida.
Algumas características se sobressaem de imediato. Nos ensaios drenados verifica-se um
acréscimo gradual de resistência com a deformação e a tendência a atingir-se um valor máximo de
tensão, que tende a se manter constante, para deformações da ordem de 20%. Ocorre uma redução
de volume, que tende a estabilizar-se também para deformações entre 15 e 20 %, quando o
cisalhamento tende a processar-se a volume constante, ou seja, na condição de estado crítico.

75
Por sua vez, nos ensaios não drenados, nota-se um comportamento semelhante no que se
refere à curva tensão deformação e, estando impedida a drenagem, um acréscimo de pressão neutra
que tende a atingir um máximo e estabilizar para deformações da ordem de 15%. A estabilização
das pressões neutras equivale à situação de volume constante dos ensaios drenados. Tem-se,
portanto, nessas condições, a situação de estado crítico. Note-se também, de passagem, que a
resistência atingida no ensaio drenado é superior à resistência no ensaio não drenado.

150
ruptura

100

3 (kPa)
300

1 - 
ruptura
3c' = 207 kPa


50
3 (kPa)

200
1 - 

3c' = 207 kPa




0 5 10 15 20 25
100 a (%)
150

0 5 10 15 20 25
a (%) 100
u (kPa)

0


50
v (%)

10
0 5 10 15 20 25 0 5 10 15 20 25
a (%) a (%)

Figura 13.48: Resultados de ensaios de compressão triaxial com a argila de Weald normalmente
adensada. Tensão de adensamento: 207 kPa. a) ensaio drenado (CD); b) ensaio não drenado (CU)
(Henkel, 1956).

Se vários corpos de prova são ensaiados com tensões de adensamento diferentes, pode-se
definir a envoltória correspondente a esse solo. Considerando, de início, apenas os ensaios
drenados e definindo-se a ruptura, por exemplo, a partir de (1-3)máx , é possível locar num
diagrama ' x  os círculos de Mohr correspondentes, pois já se conhece 3’, conforme se mostra
na Figura 13.49.

76
400

300
 (kPa)
200

100

0 100 200 300 400 500 600 700 800


 ' (kPa)

Figura 13.49 : Círculos de Mohr e envoltória de resistência a partir de ensaios drenados para a
argila de Weald saturada e normalmente adensada.

Nesta figura aparece o círculo correspondente ao resultado da Figura 13.48 a) , bem como
círculos obtidos dos dados apresentados no trabalho original de Henkel (1956).
O ajuste de uma reta envolvente, tangente aos diversos círculos de Mohr, dentro da faixa
de tensões de interesse, fornece a envoltória de resistência do solo. Observa-se que o
prolongamento dessa reta passa pela origem do sistema coordenado, ou intercepta o eixo  num
valor muito próximo de zero, de forma que c'  0, o que é uma característica dos solos saturados,
normalmente adensados. Assim, em termos práticos a envoltória de resistência desses solos, para
tensões efetivas, tem uma equação característica do tipo:

s = ' . tg 'd (13.78)

onde ' é a tensão normal efetiva e d' é o ângulo de atrito em termos de tensões efetivas, do ensaio
drenado. No caso presente, d' = 22o .
Uma envoltória poderia ser obtida de modo semelhante a partir dos ensaios não drenados,
representados em termos de tensões efetivas. Neste caso é necessário calcular 3’ (=3-u) para
desenhar os círculos de Mohr em termos de tensões efetivas. A Figura 13.50 mostra esta
alternativa onde estão os círculos correspondentes ao ensaio não drenado apresentado na figura
13.48 b) (um em termos de tensões totais e outro em termos de tensões efetivas) e círculos
correspondentes a outros ensaios (apenas os correspondentes a tensões efetivas). Reparar que a
envoltória tangente aos círculos de tensão efetiva passa pela origem, da mesma forma como
ocorreu nos ensaios drenados. A equação típica tem a forma:

s = ' . tg ' (13.79)

onde ' é o ângulo de atrito, em termos de tensões efetivas, obtido de ensaios não drenados.
77
400

300
 (kPa)
200

100
E
T

0 100 200 300 400 500 600 700 800


' (kPa)

Figura 13.50: Círculos de Mohr e envoltória de resistência em termos de tensões efetivas a partir de
ensaios não drenados (CU) para a argila de Weald saturada e normalmente adensada.

No presente caso, obtém-se para ' o valor de 23o, valor muito próximo ao obtido a partir
dos ensaios drenados.
A título de ilustração e em contra posição ao comportamento da argila ideal desestruturada,
a Figura 13.51 mostra resultados de uma argila em que a estrutura condiciona o comportamento
tensão deformação e a resistência.
60

8
50 7
8

7
40
(1 - 3 ), u (kPa)

30
6

20
Saint-Alban, 3m
1 -  3 u
10 6 3c' = 44 kPa
7 3c' = 66 kPa
8 3c' = 77 kPa
0
0 2 4 6 8 10 12 14 16
a (%)

Figura 13.51: Resultados de ensaios CU com uma argila normalmente adensada, de estrutura
sensível (Leroueil, 1977).

Trata-se da argila de Saint-Alban, Canadá, em que se nota um máximo na curva tensão


deformação e um decréscimo na resistência à compressão `a medida que as deformações
78
progridem. Associado a essas características está o fato de que as pressões neutras mostram-se
crescentes com as deformações. Esta argila tem um limite de liquidez de 50% e uma umidade
natural de 90% e apresenta uma estrutura sensível. A sensibilidade (St) de uma argila é definida
como a relação entre as resistências à compressão simples no estado natural e no estado amolgado,
ou seja, após destruição da estrutura, mantida a umidade. No caso presente, a sensibilidade dessa
argila, medida a partir de ensaios de vane é 14. A influência desses fatores sobre a resistência é
abordada no item 9.4, enquanto no item 9.5c) apresentam-se comentários adicionais sobre a
sensibilidade de argilas.

b) Solos Sobre Adensados

Tem-se na Figura 13.52 as curvas tensão deformação da argila de Weald sobreadensada.


Esta argila foi adensada até uma tensão correspondente a 828 kPa e depois descarregada e ensaiada
com uma tensão confinante de 34,5 kPa, donde o valor da relação de sobreadensamento (RSA) de
24.
Os aspectos a ressaltar dessas curvas típicas são, no caso drenado, um incremento da
tensão com as deformações até atingir-se um valor máximo e posterior decréscimo das tensões que
tendem a encaminhar-se para um valor constante. Por sua vez, o volume sofre uma pequena
redução inicial e, em seguida, aumenta e tende a estabilizar-se `a medida que as deformações
progridem.
No ensaio não drenado (CU) ocorre um crescimento das tensões com as deformações até
um valor aproximadamente constante, para deformações superiores a 20%. As pressões neutras
guardam um paralelo com as variações de volume dos ensaios drenados, ou seja, para a tendência
inicial de redução de volume surgem pressões neutras positivas e, em seguida, pressões neutras
negativas contrapondo-se aos aumentos de volume dos ensaios drenados. Notar ainda, que as
pressões neutras encaminham-se para um valor constante para grandes deformações, da mesma
forma que ocorre com as variações de volume (tendência a atingir-se o cisalhamento na condição
de estado crítico).
Por fim, notar, que contrariamente ao que ocorreu nos ensaios com solo normalmente
adensados, a resistência medida no ensaio não drenado supera a resistência fornecida no ensaio
drenado.

79
100
3c' = 34,5 kPa
3 (kPa)
OCR = 24 ruptura
ruptura 100

3 (kPa)
50
1 - 

1 - 


50 3c' = 34,5 kPa


OCR = 24
0 10 20
a (%)
0 5 10 15 20 25 30
-4 a (%)
25
-2
v (%)

u (kPa)
expansão
-25


0
-50
2
0 10 20 0 5 10 15 20 25 30
a (%) a (%)

Figura 13.52 : Argila sobre adensada. a)Curvas tensão deformação e variação de volume
deformação para o ensaio drenado (CD); b) Curvas tensão deformação e pressão neutra
deformação para o ensaio não drenado (CU) (Henkel, 1956).

A Figura 13.53 contém o círculo de Mohr correspondente à ruptura do ensaio drenado,


bem como círculos representativos de outros ensaios drenados. Nota-se que uma envoltória que
tangenciasse esses círculos deveria ser curva. Na prática, ajusta-se uma envoltória retilínea para a
faixa de tensões de interesse e no caso da argila de Weald, no intervalo sobre-adensado, a
envoltória tem a seguinte equação (Henkel, 1956):

s = 12,4 + ’ tg 21,5o kPa (13.80)

Verifica-se agora que as amostras sobre-adensadas mostram resistências maiores do que as


amostras normalmente adensadas exibem nessa faixa de tensões. Este acréscimo de resistência é
responsável pela introdução do parâmetro de coesão na envoltória de resistência do solo, o que é
característico dos solos sobre adensados. Portanto, para estes solos, a envoltória de Mohr-
Coulomb característica é do tipo:

s = c'd + ' . tg 'd (13.81)

Caso se incluíssem nessa figura os resultados dos ensaios não drenados, expressos em
termos de tensões efetivas, ou se determinasse outra envoltória apenas com esses ensaios, o
resultado seria praticamente o mesmo como ocorreu no intervalo normalmente adensado. Para
comparação, os parâmetros obtidos, considerando apenas os ensaios não drenados, foram c' = 9,6

80
kPa e ' = 22o . Assim a envoltória para solos sobre adensados e tensões efetivas, obtida de ensaios
CU, tem como equação típica:

s = c'+ ’ tg ' (13.82)

200

 (kPa)

100

0 100 200 300 400


' (kPa)

Figura 13.53: Envoltória em termos de tensões efetivas a partir de ensaios drenados para a argila de
Weald no intervalo sobre adensado.

As coincidências entre os resultados dos dois tipos de ensaios faz com que na prática haja
uma preferência pelo ensaio consolidado não drenado, com medida de pressões neutras, em relação
ao ensaio drenado. Contribuem para essa opção dificuldades tais como tempo de ensaio, vedação
da câmara e permeabilidade da membrana e obviamente um custo maior.
A título de ilustração do uso dos diagramas t,s', a Figura 13.54 mostra, para o solo
normalmente adensado, as trajetórias em termos de tensões efetivas, obtidas a partir dos ensaios
CU, para três corpos de prova e os pontos correspondentes às tensões na ruptura, por onde deve
passar a envoltória (vide item 6 ). Também está representada nesse diagrama, a trajetória de
tensões de um ensaio drenado, correspondente ao corpo de prova adensado sob a tensão de 360
kPa.
Verifica-se uma envoltória passando pela origem, analogamente ao que ocorreu no
diagrama ',. A relação entre os parâmetros das envoltórias nos diagramas t,s' e ', pode ser
conhecida através das expressões mostradas no item 6. Outro aspecto relevante, que pode ser
analisado, qualitativamente, em paralelo com as curvas da figura 13.48, refere-se às resistências
atingidas nos dois corpos de prova ensaiados com a mesma tensão de adensamento. O
desenvolvimento de pressões neutras positivas, no ensaio não drenado, faz com que as tensões
efetivas decresçam durante o cisalhamento, donde a menor resistência observada no ensaio não
drenado (ponto U) , em relação ao drenado (ponto D). Caso se estivesse trabalhando com círculos
de Mohr, pode-se compreender facilmente que as posições relativas entre os diversos círculos,
81
neste caso, é a representada na Figura 13.55 a), onde os círculos T (tensões totais) e E (efetivas)
referem-se ao ensaio não drenado e o círculo D, ao drenado.

600

3 ) / 2 (kPa)
450

300 D
+
t = (1-

150
U CD
CU

0
0 150 300 450 600 750 900 1050
s ' = (1' + 3' ) / 2 (kPa)

Figura 13.54: Trajetórias de tensões efetivas para a argila de Weald normalmente adensada e
envoltória de resistência (adaptado de Lambe & Whitman, 1969).

 D

T E
E T
D

 '  '


(a) (b)

Figura 13.55: Comparação entre os ensaios drenados e não drenados. a) solo normalmente
adensado; b) solo fortemente sobre adensado.

A Figura 13.56 mostra as trajetórias para o solo sobre-adensado em ensaios CU e uma


trajetória correspondente a um ensaio drenado, bem como os pontos correspondentes à ruptura. Da
mesma forma que no diagrama ', correspondente, verifica-se que a envoltória não passa pela
origem e situa-se superiormente à envoltória do solo normalmente adensado. Pode-se observar que
para altas RSA as pressões neutras são negativas, de sorte que as tensões efetivas na ruptura, no
ensaio não drenado, são maiores que aquelas que operam no ensaio drenado, donde a maior
resistência observada (ver pontos U e D). As posições relativas dos diversos círculos de Mohr são
as representadas na Figura 13.55b).

82
150

t = (1- 3 ) / 2 (kPa)


U
D

75 +
sobre-adensada
normalmente
CD adensada

CU

0
0 75 150 225 300
s ' = (1' + 3' ) / 2 (kPa)

Figura 13.56: Trajetórias de tensões efetivas para a argila de Weald sobre adensada e envoltória de
resistência (adaptado de Lambe & Whitman, 1969).

9.3. Relação entre o teor de umidade, a tensão efetiva principal média e a resistência

Os resultados experimentais de Henkel (1956, 1959) com as argilas de Weald e de Londres


corroboraram a constatação experimental, já anteriormente verificada por outros autores, de que há
uma relação entre o teor de umidade na ruptura e a resistência, independentemente da forma de
ensaio. Na Figura 13.57 tem-se a relação entre a resistência da argila de Weald, representada pelos
valores de (1-3)r, obtidos de diversos ensaios de compressão triaxial, e o teor de umidade na
ruptura. Encontram-se juntos tanto resultados de ensaios drenados, quanto de ensaios não drenados.
26
Normalmente adensado
Não drenado
Drenado - compressão axial
24 Sobre adensado - máx tensão 827 kPa
Não drenado
Drenado - compressão axial

22

wr (%)

20

18

16
50 100 500 1000 2000
q r (kPa)

Figura 13.57: Relação entre umidade na ruptura e resistência (1 - 3)r para ensaios de compressão
em amostras normalmente e sobre adensadas da argila de Weald (Henkel, 1959).

83
Estes resultados, mostram, que essas relações são distintas caso se considerem o solo
normalmente adensado (os pontos ajustam-se segundo uma reta, independentemente da forma de
ensaio) ou sobreadensado.
A Figura 13.58 a) relaciona o teor de umidade e a tensão principal efetiva média [p'r =
('1+'2+'3)r/3] na ruptura. Aparece também a reta de compressão isotrópica - wo vs p'o -(análoga
à reta de compressão virgem) e pode-se verificar que os pontos correspondentes à ruptura tendem a
se alinhar em uma reta paralela à curva de adensamento. Caso se lancem, no mesmo gráfico, os
pontos correspondentes ao gráfico da Figura 13.57, ou seja, teor de umidade e resistência
(superposta aos valores de p'r), pode ser constatado que também esta nova reta (wr vs qr) tende a
ser paralela às demais.
Na Figura 13.58 b) aparece a mesma relação para o intervalo sobre adensado da amostra.
Encontra-se também aí representada a curva de compressão da argila em seus ramos de carga e de
descarga. Neste intervalo, os pontos desviam-se da reta correspondente ao intervalo normalmente
adensado, mas de qualquer forma, para solos com a mesma tensão de pré adensamento é possível
estabelecer relações entre teor de umidade, resistência e tensão efetiva principal média (p’ r).
Estes resultados permitem a constatação de envoltórias únicas em termos de tensões
efetivas (independentemente do tipo de ensaio, se drenado ou não drenado), uma para o solo
normalmente adensado e outra para amostras sobre adensadas, estas com a mesma tensão de pré-
adensamento.

26
Não drenado
Drenado - compressão axial

24

22

wo, wr (%) ,
wo x po

20
wr x q r

18 ,
wr x p r

16
50 100 500 1000 2000
p 'o, p'r , q r (kPa)

84
28

26

wr - pr'
24
wo, wr wo - po'
(%)
22

20

Drenado - compr. axial


18
Não drenado

16
10 20 50 100 200 300 500 700 1000 2000
po' , pr' (kPa)

Figura 13.58: Argila de Weald. Relação entre o teor de umidade e a tensão principal efetiva média
(p’r) na ruptura para ensaios de compressão. a) amostras normalmente adensadas; b) amostras
sobre adensadas e tendo a mesma tensão de pré-adensamento (Henkel, 1959).

Henkel (1959) propõe utilizar estas constatações para obter-se previsões


quantitativas correspondentes à ruptura de um corpo de prova qualquer desse solo, pois basta ter-se
em conta o caminhamento das tensões e a forma de ruptura para ter-se as informações desejadas.
Para tanto, as relações mostradas nas figuras anteriores, considerando rupturas por compressão,
foram agrupadas na Figura 13.59, em escala natural, em conjunto com uma envoltória de
resistência no plano p'm. versus (1 - 3)r. Pode-se verificar a uniformidade de comportamento no
tocante à resistência, independentemente da trajetória seguida. Neste ponto cabe frisar que
informações semelhantes para outras trajetórias de carregamento (não mostradas aqui) foram
obtidos por Henkel (1959), confirmando este padrão de comportamento o que permite um alcance
bastante amplo para essas relações. Por fim, o conjunto de resultados obtidos por Henkel (1956,
1959) condiz à uma conclusão, extremamente importante, que é o fato de que a envoltória, em
termos de tensões efetivas, é única, para argilas com o mesmo histórico de tensões.
Vale salientar ainda que as relações entre a umidade, a tensão efetiva e a resistência
seguem o mesmo padrão de comportamento caso se utilizem os parâmetros s'o, s'r e tr, conforme se
ilustra na Figura 13.60 apresentada por Lambe & Whitman (1969).

85
26
w (%)

24
p'r - amostras normalmente adensadas
p'r - amostras sobre adensadas
22

C
20

P
18

16

200
q r =  1 -  3 (kPa)

100

0
0 200 400 600 800 1000
, , ,
,  + 2 + 3
p 1 (kPa)
3

Figura 13.59: Relação entre umidade, tensão efetiva e resistência para ensaios de compressão. a)
curvas de adensamento e de umidade na ruptura em função de p'm; b) envoltória de resistência solo
normalmente adensado e sobre adensado (Henkel, 1959).

26

24
wo - so'
22
wo, wr wr - sr'
(%)
20

wr - t r
18

16
10 20 40 60 100 200 400 1000 2000
so' , sr' , t r (kPa)

Figura 13.60: Argila de Weald normalmente adensada - Relação entre s'o, s'r e tr e a umidade
(Lambe & Whitman, 1969).

86
9.4 Aspectos complementares sobre a resistência em termos de tensões efetivas. Comparação
entre d e ' .

Ao longo do texto, vem-se comentando sobre as diferentes formas de definir ruptura. As


mais usuais recorrem à máxima diferença de tensões principais (1-3)máx ou à máxima relação de
tensões efetivas principais ('1/'3)max. Quando o ensaio é drenado, os dois critérios fornecem
resultados coincidentes. Em caso de ensaios não drenados, em solos normalmente adensados, se a
pressão neutra atinge o máximo junto com o ponto de ruptura e não mais se altera, também os dois
critérios fornecerão o mesmo resultado. No entanto, se a pressão neutra continua a crescer após a
tensão de ruptura então a relação ('1/'3)max atinge seu máximo para deformações superiores à que
forneceu (1-3)máx e os ângulos de atrito tenderão a ser diferentes. Isto ocorre com mais
intensidade principalmente em solos com estrutura particular, como as argilas sensíveis ou os solos
colapsíveis do centro-sul do Brasil. A Figura 13.61 ilustra esse fato através das curvas tensão
deformação para a argila de Drammen (Noruega), obtidas de ensaios CIU.

300
1 - 3 (1 - 3) máx
(kPa) (3c
' = 400 kPa

200
(1' / 3') máx

100

0
0 1 2 3 4 5
a(%)
300

u (kPa)

200

100

0
0 1 2 3 4 5
a(%)

Figura 13.61: Curvas tensão deformação e pressão neutra deformação para a argila de Drammen
(Bjerrum & Simons, 1960).

Esta argila tem uma sensibilidade da ordem de 4. Pode-se notar que as pressões neutras
tendem a crescer após o valor de (1-3)máx (setas dirigidas para baixo), de sorte que ('1/'3)max
87
(setas dirigidas para cima) ocorre para valores diferentes de deformação. Os ângulos de atrito para
os dois critérios são, respectivamente 290 e 31,50, mas essa diferença tende a crescer com a
sensibilidade e com o adensamento anisotrópico. O efeito de uma maior sensibilidade pode ser
apreciado quando se analisam os dados da argila de Saint Alban, mostrados na figura 13.51.
Este efeito é também marcante no exemplo a seguir que se refere a um ensaio com a argila
porosa colapsível da fundação das ombreiras da barragem de Água Vermelha (Ávila, 1980),
conforme se mostra na Figura 13.62.

700
3c = 800 kPa

600

500
Pressão Neutra (u) kPa

400
3 )kPa

300 3c = 400 kPa


( 1 -

3c = 800 kPa


200
3c = 200 kPa
3c = 400 kPa
100 3c = 200 kPa
3c = 100 kPa

0
0 4 8 12 16 20 24 28
a (%)

500

s =  ' tg 30 (1' / 3' ) máx


o
400
A=1
t (kPa)

300
s =  ' tg 20 (1' - 3' ) máx
o

A=2
200 1,7%
A=3 2,0% 0,9% 0,22%
0,53%
100
2,2%
1,7%
0
0 200 400 600 800 1000 1200 1400
s' (kPa)

Figura 13.62: a) Curvas tensão deformação e pressão neutra deformação para argila porosa
colapsível saturada; b) Envoltórias de resistência por diferentes critérios (Ávila, 1980).

Pode-se notar que os valores de (1-3)máx ocorrem para baixas deformações e que as
pressões neutras crescem continuamente. Estas atingem entre duas e três vezes os valores de (1-

88
3) aplicados, para as maiores tensões confinantes, ou seja, o parâmetro A de pressão neutra atinge
valores entre 2 e 3, nesses casos. O resultado em termos de envoltórias está representado na Figura
13.62 b), podendo-se notar uma diferença de 100 entre um caso e outro. Dessa forma é fundamental
na presença de solos desse tipo, ter-se em mente os diferentes fatores que condicionam a
resistência, como o nível de deformações, por exemplo, para eleger adequadamente a envoltória e o
método de abordagem mais adequado para o problema em análise.
Comentou-se também que os ângulos de atrito obtidos de ensaios drenados d' eram muito
próximos dos ângulos obtidos de ensaios não drenados ' e ilustrou-se esse fato com os resultados
da argila de Weald, remoldada em laboratório. Diversos resultados reportados na literatura, para
solos naturais e remoldados, confirmam esse padrão, principalmente quando nos ensaios não
drenados utiliza-se ('1/'3)max como critério de ruptura. A Figura 13.63 mostra essa comparação
donde se pode notar, que com bastante frequência, ' tende a ser maior que d'. Caso se utilize (1-
3)máx observa-se o contrário.

' p/ (1' / 3' ) máx 14


40
' p/ (1' - 3' ) máx 17
16 3
2
15 7
9
30 10
8
' - graus

19 11 10 1
12
6
4
18
20 13
5

10
10 20 30 40
' - graus

Figura 13.63: Comparação entre d e ' (Bjerrum & Simons, 1960).

Correlação entre ' e IP

A Figura 13.64 mostra uma correlação entre o ângulo de atrito em termos de tensões
efetivas e o índice de plasticidade de diversas argilas, onde, a despeito da considerável dispersão,
tem-se uma fonte de dados úteis de parâmetros preliminares para projeto, bem como para
verificação de resultados de ensaios.

89
50
+ Argilas da Escandinávia
40 + Argilas de outros países
+ Ensaios drenados
++

,
+ +
+
30 +
+ + +

20 + +

 1'
 3'
10

, 0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
IP (%)

40

30
desvio
méd padrão
ia
' ( )

20

10

5
0 20 40 60 80 100
IP (%)

Figura 13.64 : Correlação entre o índice de plasticidade e o ângulo de atrito em termos de tensões
efetivas. (US Navfac, 1971).

9.5 - Resistência Não Drenada

A resistência não drenada tem aplicação quando as pressões neutras despertadas por um
carregamento qualquer não são dissipadas num tempo condizente com o que se levou para aplicar o
carregamento. Se no caso das areias predomina a situação drenada, nas argilas pode-se dizer que a
situação típica de solicitação é a do tipo não drenado, em função da baixa permeabilidade desses
solos.
A resistência não drenada pode ser obtida através de suas formas principais de ensaio, os
ensaios consolidado não drenados (CU) e os ensaios não drenados (UU), além de alguns tipos de
ensaios de campo, como o vane test (ensaio de palheta). A consideração de que a resistência não
drenada independe da forma de ensaio, bastando apenas garantir que a ruptura se dê efetivamente
sem drenagem, se constitui num conceito antigo e ultrapassado. Sabe-se hoje que diversos fatores
interferem nessa medida e alguns deles serão discutidos no momento oportuno.

90
a) Ensaios Consolidado Não Drenados (CU)

Nestes ensaios, a primeira etapa é realizada com total dissipação das pressões neutras
geradas pela tensão confinante. Durante a fase de cisalhamento da amostra, as pressões neutras
desenvolvidas são impedidas de dissipar, ou seja não ocorrem variações volumétricas por
adensamento. Portanto, o cisalhamento se processa a volume constante (relembrar que se trata de
solo saturado, com água e partículas sólidas incompressíveis).
A Figura 13.65 apresenta o andamento esquemático do ensaio de compressão triaxial
consolidado isotropicamente e cisalhado em condições não drenadas (CIU).

Total,  = Neutra, u + Efetiva,  '


0 vo' = ur
Após
0 ho
' = ur
amostragem
-ur

Após c vc' = c = 3c'


confinamento
c/ drenagem
(ou ao final do
c 0 hc' = c = 3c'
adensamento)

 = 1 - 3
c v' = c + 
+
u = 1c
'
Durante
cisalhamento c h' = c + u = 3c'
s/ drenagem
+ u

Final do c vc' = c - uo
adensamento
(c/ contra- c uo hc' = c - uo
pressão - uo)

Figura 13.65: Etapas de um ensaio consolidado não drenado (CIU)

Suponha-se que a amostra estava inicialmente adensada in situ sob as tensões ’vo e ’ho ,
nas direções vertical e horizontal, respectivamente. Imediatamente após a amostragem, o
desconfinamento do solo tenderá a provocar um aumento de volume, quando então se contrapõe
uma pressão neutra -ui.
A aplicação da tensão confinante (3c ) gera pressões neutras que são deixadas dissipar.
Quando isto ocorre a pressão neutra é nula e a amostra estará adensada sob a tensão confinante
aplicada, isto é, ’3c = 3c = h . Como o cisalhamento ocorre em condições não drenadas surgem
pressões neutras, que podem ser positivas ou negativas.

91
Durante a realização dos ensaios são conhecidas, de imediato, as tensões totais atuantes. É
possível também efetuar leituras de pressão neutra e conhecer as tensões efetivas em cada fase do
ensaio.
É comum recorrer-se à saturação do corpo de prova por contra-pressão. Neste caso, após
adensamento, há uma pressão neutra inicial (ucp), que passa a ser o referencial para a medida das
pressões neutras despertadas durante o cisalhamento. Na saturação por contra pressão, a tensão
confinante é aumentada concomitantemente à contra-pressão. Ao final do adensamento, se é ucp o
valor da contra-pressão, a tensão efetiva de confinamento corresponde à diferença entre a pressão
na câmara (3c ) e a contra-pressão, ou seja, '3c = 3c - ucp. As pressões neutras durante o
cisalhamento corresponderão à diferença entre o valor medido no instante desejado e a pressão
neutra de referência, ucp.
As curvas típicas correspondentes aos ensaios consolidado não drenados já foram
apresentadas e discutidas no item anterior (Figuras 13.48 e 13.50), de sorte que remete-se o leitor a
elas nas discussões que se seguem e quando necessário.
Conforme já se discutiu em relação à envoltória drenada, os círculos de Mohr em termos
de tensões efetivas definem uma envoltória praticamente igual à obtida em ensaios drenados,
donde é muito usual determinar a resistência drenada nos ensaios consolidado não drenados com
leitura de pressões neutras
Com frequência, costuma-se determinar uma envoltória a partir das tensões totais em jogo.
Na Figura 13.66a) ilustram-se as envoltórias em termos de tensões totais, para os intervalos
normalmente adensado e sobre-adensado, para a argila de Weald. Na parte b) esquematiza-se uma
envoltória em termos de tensões totais e a correspondente envoltória para tensões efetivas, para um
solo normalmente adensado. A utilização das tensões totais fornece, para os solos normalmente
adensados saturados, uma envoltória cujo prolongamento também intercepta a origem do diagrama
 x , como no caso das tensões efetivas. Deve-se enfatizar que, neste caso, tem-se na verdade um
círculo de Mohr que conjuga uma tensão efetiva ( a tensão com a qual foi adensada a amostra, ’3c,
e uma tensão total, 1, correspondente à ruptura).

1000 normalmente
adensado
sobre-adensado
 (kPa)

cu = 12,7

0 500 1000 1500


 (kPa)

92

'

T 

E
T

 cr
3' 3a 1' 1  '
u

Figura 13.66: a) Envoltórias de resistência para a argila de Weald a partir de ensaios CU em termos
de tensões totais (Parry, 1995); b) posições relativas das envoltórias efetiva e total, para um solo
normalmente adensado.

Assim é possível obter duas envoltórias a partir dos ensaios consolidados-não drenados,
para os solos normalmente adensados. Em termos de tensões efetivas a equação característica é a
(13.79). Para tensões totais:

s =  tg cu (13.83)

O ângulo cu é denominado de ângulo de atrito aparente, ou ângulo de atrito em termos de


tensões totais e no caso da argila de Weald vale 12,8o . A relação entre ' e cu depende das
pressões neutras despertadas no instante da ruptura e pode ser conhecida quando se considera o
seguinte equacionamento, onde o subscrito r indica as condições na ruptura. Da expressão (13.16),
para c'=0, tem-se:

 1' r   '3r  1r   3r
sen '  ' '  (13.84)
 1r   3r  1r   3r  2u r

No ensaio CU

3r = '3c (13.85)


'3r = 3r - ur (13.86)

Lembrando que ur = Ar (1r - 3r) (13.87)

1r   3r
Como sen cu  (13.88)
1r   3r

93
sen '
Tem-se sen cu  (13.89)
1  2.Ar . sen '

Como nas argilas normalmente adensadas, comumente, ' varia entre 150 e 300 e Ar, entre
0,5 e 1,0, é lícito esperar que cu varie entre 50 e 70% de '. Por conta dos dois ângulos de atrito
possíveis é importante notar que o plano de ruptura (cr) é o definido a partir dos círculos e da
envoltória em tensões efetivas, uma vez que se reconhece ser a tensão efetiva a determinante das
características de resistência dos solos
A envoltória em termos de tensões totais, a partir de ensaios CU, às vêzes é utilizada, pela
facilidade que introduz nas análises, como por exemplo em estabilidade de taludes. Neste caso,
admite-se que as pressões neutras despertadas na obra são iguais às pressões medidas em
laboratório. Na verdade, para solicitações diferentes da compressão axial, a interpretação deste tipo
de ensaio, com base em tensões totais, traduz-se por resistências que dependem da trajetória de
tensões aplicadas (Pinto, 1987). A utilização mais apropriada dos resultados dos ensaios CU,
interpretados em termos de tensões totais, é conhecer a resistência não drenada cu = (1-3)r/2 em
função da tensão efetiva de adensamento ('3c). Isto poderia ser útil, por exemplo, para calcular o
acréscimo de resistência no solo argiloso de fundação de um aterro construído em etapas, quando
se permitisse o adensamento em cada estágio de construção. A título de ilustração, para a argila de
Weald, essa relação é (Parry, 1995):

cu
 0,28 (13.90)
'3c

A relação entre a resistência e a tensão efetiva de adensamento pode ser conhecida através
das equações a seguir.
Da relação ( 13.16) pode-se escrever, para c'=0,
1  sen '
1' r   '3r (13.91)
1  sen '
Subtraindo '3r a cada lado da expressão, tem-se
1  sen '
1' r   3' r   3' r   3' r (13.92)
1  sen '
ou,

 3' r .2. sen '


1r   3r  (13.93)
1  sen '
Considerando a equação (13.88), chega-se à seguinte expressão

94
cu sen '
 (13.94)
'3c 1  ( 2Ar  1). sen '

Em solos sobre adensados, as envoltórias, expressas em tensões efetivas, obtidas em


ensaios consolidado não drenados, resultam semelhantes às envoltórias drenadas, como já se
discutiu no item 9.2b), ou seja têm uma equação do tipo da expressa em 13.82.
Para tensões totais, à semelhança do que ocorre com tensões efetivas, verifica-se uma
envoltória que se situa superiormente à envoltória correspondente ao trecho normalmente adensado
(Figura 13.66b). Pode-se também, neste caso, ajustar uma envoltória, com uma equação análoga à
de tensões efetivas, ou seja:

s = cu +  tg cu (13.95)

No caso dos solos fortemente sobre adensados a tendência de variação de volume é no


sentido da expansão. Isto origina um aspecto interessante, pois estando a drenagem impedida
originam-se pressões neutras negativas e consequentemente a tensão efetiva torna-se maior que a
total. Os círculos de tensões efetivas (E) situam-se agora à direita dos círculos de tensões totais (T)
resultando para a envoltória em termos de tensões totais valores superiores aos da envoltória
drenada, como se mostra na Figura 13.67.
 '
Normalmente
sobre-adensado adensado 

T E cr
-a'  '
-u u

Figura 13.67: Envoltórias drenada e não drenada nos intervalos sobre adensado e normalmente
adensado
Nestes solos, é necessário cuidado na adoção de parâmetros de resistência, pois a longo prazo, após
o equilíbrio das pressões neutras pode-se ter uma situação em que a resistência seja inferior à que
operava na condição de curto prazo.

Exemplo 13.7

As curvas tensão deformação e pressão neutra deformação de um corpo de prova


normalmente adensado submetido a ensaio de compressão triaxial consolidado não drenado (CU)

95
encontram-se na Figura Ex. 13.7-1. Determinar as trajetórias de tensões totais e efetivas para o
corpo de prova e a envoltória de resistência considerando como ruptura o ponto de máximo de 1-
3.
400

1 - 3
(kPa) M
+
300

3c = 300 kPa


200

100

0
0 4 8 12 16 20
a(%)

Fig Ex. 13.7-1

1  3   3
A partir dos valores do gráfico é possível calcular t=t’= , s 1 e
2 2

 '1   ' 3
s'  . Os pares s’-t permitem obter a trajetória de tensões efetivas (E) e s-t, a de tensões
2
totais (T) que estão colocadas na Fig. Ex. 13.7-2. Observar que como 3c permanece constante
durante todo o ensaio, T é inclinada a 45o e que a distância na horizontal, entre T e E, equivalente
à pressão neutra, ou seja

s’=s-u

O ponto de máximo está assinalado por M. Como o solo é normalmente adensado,


a envoltória deve passar pela origem do sistema coordenado. Assim, tem-se a envoltória OM, com
inclinação ' = 24,2º .Como sen' = tg ' tem-se, ' = 26,7o. Assim

t=s'tg24,2o kPa e s='tg26,70 kPa

são duas possíveis expressões para a envoltória em termos de tensões efetivas do solo em questão.

96
’
200
M T

t, t’ E
(kPa)
100

0
0 100 200 300 400 500
s, s’ (kPa)

Fig. Ex. 13.7-2

Exemplo 13.8

Dois corpos de prova de um solo saturado foram submetidos a ensaios consolidado


não drenados (CU), tendo-se obtido os seguintes valores na ruptura

CP 3c 1-3 u

(kPa) (kPa) (kPa)

1 200 152 141


2 400 300 281

Determinar

a) a envoltória de resistência em termos de tensões efetivas;


b) a envoltória de resistência em termos de tensões totais
c) as tensões no plano de ruptura para o CP2
d) o valor do parâmetro de pressão neutra A.

Por se tratar de ensaio CU, a tensão efetiva de adensamento corresponde a 3c, ou seja,
’3c=3c (seria diferente se houvesse contra pressão (uo ) aplicada, quando então ’3c=3c –uo).
Assim, ao iniciar o cisalhamento, a pressão neutra é nula. Durante o cisalhamento, as pressões
neutras despertadas vão alterando a tensão efetiva nos corpos de prova. Com os dados fornecidos é
possível calcular

97
CP ’3r 1r ’3r ’1r
(kPa) (kPa) (kPa) (kPa)
1 200 352 59 211
2 400 700 119 419

Os círculos de Mohr, para tensões efetivas e totais, estão representados na Figura Ex. 13.8-
1, da mesma forma que as envoltórias correspondentes. Em termos de tensões efetivas s='tg33,7o
kPa e de tensões totais, s=tg15,8o kPa. As tensões na ruptura no CP2 são as dadas pelo ponto R2
no círculo de tensões efetivas, ou seja R=186 KPa e R=124 kPa. Observar que estes valores
poderiam ser calculados também analiticamente.

500

400 R (186; 124)


o
o
3 ,7 33,7
300 ’t g3
  o
s= 5,8 o
’ tg 1
s=
(kPa) 15,8
200
R2
100

0
0 P 200 300 400 500 600 700 800 900 1000
’(kPa)
Fig. Ex. 13.8-1

Estando o solo saturado, o parâmetro B vale 1. Assim, pode-se calcular A


Δu
A=
Δ σ 1  Δσ 3

141
Para o CP1, A= =0,928. Considerando a média dos dois corpos de prova, A=0,93.
152

Exemplo 13.9

Um corpo de prova de solo foi submetido à técnica de saturação por contra pressão. Ao
final da saturação, a tensão aplicada na câmara (3c) era de 600 kPa e a contra-pressão, 580 kPa.
Elevou-se, em condições não drenadas , 3c para 650 kPa e, em conseqüência, a pressão neutra se
alterou para 628 kPa. Em seguida, o corpo de prova foi adensado com 3c=800 kPa e uma contra-

98
pressão de 600 kPa e cisalhado em condições não drenadas. Quando 1-3 atingiu 390 kPa, a
pressão neutra chegou a 720 kPa.
Calcular os parâmetros A e B de Skempton, a tensão de adensamento do corpo de prova e
a tensão confinante efetiva no instante considerado.

Ao elevar 3c de 600 para 650 kPa, a pressão neutra passou de 580 para 628 kPa, assim.

u 628  580 48
B    0,96
 3 650  600 50

No cisalhamento, para carregamento de 390 kPa, a pressão neutra passou de 600 para 720
kPa. Portanto

u=B.A.(1-3) ou

u 120
A   0,32
B(1 - 3 ) 0,96.390

A tensão de adensamento (’3c) corresponde à diferença entre 3c e a contra pressão, ou


seja,

’3c=800-600=200kPa.

No instante considerado, como 3c permaneceu constante e a pressão neutra chegou a 720
kPa,
’3=800-720=80kPa

ou de outra forma

’3=’3c-u=200-(720-600)=80 kPa

b) - Ensaios Não Drenados ou Rápidos

Em todas as fases do ensaio não drenado, a pressão gerada no corpo de prova é impedida
de dissipar. Em geral, conhecem-se em cada instante as tensões totais aplicadas, se bem que seja

99
possível fazer leituras de pressão neutra. Mais uma vez é fundamental conhecer o papel
desempenhado pelas pressões neutras, o que será descrito a seguir, considerando o solo saturado.
A Figura 13.68 ilustra o andamento das tensões no ensaio não drenado, desde o instante da
amostragem.

Total,  = Neutra, u + Efetiva,  '


0 vo' = ur
Após
0 ho
' = ur
amostragem
-ur

c vc' = c + ur - c = ur
Após confinamento
(S r = 100%) c hc' = ur
sem drenagem
-ur + u c
B = 1; uc = c

 =  1 - 3
v' =  + c + ur - c +
u =1'
c
Durante
cisalhamento c h' = c + ur - c +
u = 3'
sem drenagem
-ur + c + u

Figura 13.68: Etapas de carga em um ensaio não drenado (UU)

Após a amostragem, as condições são iguais às dos ensaios consolidados não drenados. A
aplicação da tensão confinante gerará pressão neutra no corpo de prova. Estando a drenagem
impedida e como o solo se encontra saturado, toda a tensão confinante será suportada pela água
intersticial (lembrar da analogia mecânica do adensamento), o que implica dizer que houve um
acréscimo de pressão neutra igual à tensão confinante. Tal situação significa que não houve ganho
de resistência pelo confinamento do solo, já que não houve acréscimo na tensão efetiva.
Finalmente, durante a fase de cisalhamento, novas pressões neutras são geradas.
Assim, ao ensaiar vários corpos de prova, com distintas tensões confinantes, nota-se, de
imediato, que todos os círculos de Mohr tendem a apresentar o mesmo raio e fornecem uma
envoltória horizontal como as representadas na Figura 13.69.

100
Amostra  (c)
c = 38,8 kPa  = 0o
200
 (kPa)
100
(a)

0
0 100 200 300 400 500 600
 (kPa)
Amostra  (a) - remoldada
c = 104,4 kPa  = 0o
200
 (kPa)
100
(b)

0
0 100 200 300 400 500 600
 (kPa)

Figura 13.69: Exemplos de envoltórias não drenada de solos saturados. a) argila marinha mole –
LL=168%, LP=60%; w=105%; b) argila remoldada- LL=40%, LP=17%, wot=16,5%, w=17%
(Golder & Skempton, 1948).

A equação de resistência característica é:

su = cu (13.96)

onde cu recebe o nome de coesão não drenada e su é a resistência não drenada. Notar que para esta
situação o ângulo de atrito em termos de tensões totais (u) é igual a zero, e que, qualquer que seja
o círculo considerado:

1   3
s u  cu  (13.97)
2

Caso se determinem as pressões neutras, constata-se o anteriormente exposto, isto é, como


as tensões efetivas na ruptura independem da tensão confinante, o círculo de tensões efetivas é
único, independente de qual corpo de prova se considere. Isto impossibilita então definir a
envoltória de resistência em termos de tensões efetivas em solos saturados a partir do ensaio
rápido.
Os resultados de ensaios não drenados são apresentados, comumente, em função da
profundidade, ou mais apropriadamente, da tensão efetiva do ponto de amostragem. Constata-se
considerável dispersão nessa representação, por conta de problemas na amostragem e de

101
particularidades do solo. De qualquer forma, para solos normalmente adensadas, verifica-se o
crescimento da resistência não drenada com a tensão efetiva, de maneira análoga à que ocorre em
ensaios CU, onde a resistência depende da tensão efetiva de confinamento.
Em solos não saturados, onde coexistem água e ar nos vazios, embora não possa ocorrer
dissipação das pressões intersticiais, ocorre uma redução de volume quando da aplicação da tensão
confinante devido à alta compressibilidade do ar. Tem-se um ganho gradual de resistência que
depende do grau de saturação inicial e que continua até que todo o ar se dissolva na água
intersticial. Assim, o corpo de prova tende a se saturar por efeito das tensões confinantes
crescentes. A envoltória, anteriormente à saturação, tende a ser curva, porém, na prática, costuma-
se aproximá-la para uma reta de equação genérica

s = cu +  tg u (13.98)

Após saturação, a envoltória assume a equação típica dos solos saturados não drenados. A
figura 13.70 ilustra este fato através de resultados com a argila usada na barragem de Canyon
(EUA), compactada com distintos teores de umidade.

102
800
(A) w = 13,6 %
600

 400
(kPa)

200

0
0 400 800 1200 1600 2000
 (kPa)
600
(B) w = 16,2 %
400

(kPa)
200

0
0 400 800 1200 1600 2000
 (kPa)
600
(C) w = 18,2 %
400

(kPa)
200

0
0 400 800 1200 1600 2000
 (kPa)
400
 w = 19,0 %
(kPa) (D)
200

0
0 400 800 1200 1600
 (kPa)

Figura 13.70: Exemplos de envoltórias de resistência não drenada em solos não saturados. Argila
compactada com diferentes umidades. LL=34%, IP=15%; Proctor Normal: dmáx = 17,8 kN/m3 e
wot = 15,7% (Casagrande & Hirschfeld, 1960).

O Ensaio de Palheta (Vane Test)

O vane test ou ensaio de palheta foi originariamente desenvolvido por engenheiros


escandinavos, para medir a resistência ao cisalhamento não drenada de argilas in situ. O ensaio
consiste na cravação de uma palheta, Figura 86, e em medir o torque necessário para cisalhar o
solo, segundo uma superfície cilíndrica de ruptura, que se desenvolve ao redor da palheta, quando
se aplica ao aparelho uma velocidade constante e igual a 6 graus por minuto. Algumas hipóteses
devem ser feitas, a fim de que o valor medido possa representar a resistência ao cisalhamento não
drenada do solo: a) Drenagem impedida; b) Ausência de almongamento do solo, quando da
operação de cravação do equipamento; c) Coincidência de superfície de ruptura coma geratriz do
103
cilindro, formado pela rotação da palheta; d) Uniformidade da distribuição de tensão, ao longo de
toda superfície de ruptura, quando o torque atingir o seu valor máximo e e) Isotropia do solo.
O ensaio fornece também a sensibilidade da argila. Pode-se lançar em um gráfico torque x
rotação os valores, em seu estado indeformado e amolgado, Figura 87. Para este caso, considera-se
o amolgamento do solo, após sua ruptura, quando se dão dez rotações no equipamento, a uma
velocidade bem rápida.

FIGURA 86: Aparelho de Vane

FIGURA 87: Resistência de uma argila no estado indeformado e amolgado

O aparelho pode ser cravado diretamente no solo até a profundidade a ser ensaiada, ou em
furos de sondagens. Neste caso é aconselhável que a sondagem se processe até uma distância de
0,50m, aproximadamente, acima da cota de ensaio.
Para o cálculo de resistência não drenada da argila, considere-se a palheta esquematizada
na Figura 86.b. No instante de ruptura, o torque aplicado se iguala à resistência ao cisalhamento de
argila, representada, pelos momentos resistentes do topo e da base do cilindro de ruptura e pelo
momento resistente desenvolvido, ao longo de sua superfície lateral, ou seja:

T=ML+MB,

em que:

T= Torque máximo aplicado à palheta;


ML= Momento resistente desenvolvido ao longo da superfície lateral de ruptura;

104
MB= Momento resistente desenvolvido no topo e na base da superfície de ruptura;

Considerando que a resistência não drenada seja constante ao longo da lateral tem-se

ML= 1/2D2Hcu

2D 3
MB  cu
12

em que
cu = resistência não drenada de argila;
D= diâmetro do cilindro de ruptura;
H= altura do cilindro de ruptura;
ou,

T
cu 
H D
D 2 (  )
2 6

se H=2D

6 T
cu 
7 D3

O Vane test tem demonstrado fornecer resultados bem próximos dos reais, embora haja

necessidade de usar fatores corretivos, em função das características plásticas do solo como se

discutirá em 13.7.21. Em argilas médias e duras, a perturbação causada pela cravação do aparelho

afeta sensivelmente a estrutura do solo e invalida os resultados obtidos.

Ao dimensões de palheta preconizadas pela ASTM D2573 são as assinaladas na Tabela . No Brasil o

ensaio é normatizado pela NBR 1095 que adota como palheta padrão a de 65 mm de diâmetro por

130mm de altura.

Tabela : Dimensões de palheta normatizadas pela ASTM D2573

Diâmetro do Diâmetro da Espessura da

105
furo palheta – D (mm) palheta – e (mm)

AX 38,1 1,6

BX 50,8 1,6

NX 63,5 3,2

4" (101,6mm) 92,1 3,2

Além do ensaio de palheta, a resistência não drenada in situ pode ser estimada através de

outros ensaios, como o de penetração de cone, o pressiométrico e o dilatômetro Marchetti, além de

equipamentos mais simples, como penetrômetros de bolso.

c) - Compressão Simples

Trata-se de um dos ensaios de mais frequente realização, dada a sua simplicidade, sendo
comumente empregado para conhecer a resistência não drenada de solos argilosos. A tensão
confinante é a pressão atmosférica, donde 3 = 0, e o valor da tensão que provoca a ruptura do
corpo de prova é denominada de resistência a compressão simples (Rc).
A Figura 13.71, esquematiza as fases do ensaio:

Total,  = Neutra, u + Efetiva,  '


0 vo' = ur
Após
amostragem 0 ho
' = ur

-ur


0 v' =  + ur +
u

Durante
carregamento 0 h' = + ur + u

-ur + u

Figura 13.71: Etapas de carregamento no ensaio de compressão simples.

Embora a rigor ocorram diferenças entre os de ensaios de compressão simples e de


compressão triaxial não drenado, costuma-se admitir, em termos práticos, que os resultados são
iguais. Aliás, pode-se notar dos esquemas das Figuras 13.68 e 13.71 a grande semelhança entre os
dois tipos de ensaios. A Figura 13.72 mostra o círculo de Mohr característico do ensaio de

106
compressão simples e um círculo correspondente a ensaios não drenado sobre amostras idênticas
do mesmo solo saturado.


'

su = cu

cu

Rc 3 1 

Figura 13.72: Círculos de Mohr- ensaios de compressão simples e não drenado e envoltórias.

Da observação da Figura 13.72, a resistência não drenada resulta:

R c 1   3
s u c u   (13.99)
2 2

As argilas podem ser classificadas de acordo com a sua resistência não drenada conforme a
Tabela 13.5.

Tabela 13.5: Consistência das argilas em função da resistência não drenada (BS 8004)

cu (kPa) consistência
20 Muito mole
20-40 mole
40-50 Mole a média
50-75 média
75-100 Média a rija
100-150 rija
150 Muito rija a dura

Além da obtenção da resistência à compressão simples, o ensaio pode ser utilizado para
medir, em laboratório, a sensibilidade das argilas (St), que como definido no item 9.2, consiste na
relação entre as resistências à compressão simples da amostra natural e da amostra amolgada, ou
seja

107
R Cnatural
St  (13.100)
R Camo lg ada

Existem várias escalas para medir a sensibilidade dependendo da região e a Tabela 13.5
sintetiza a proposta de Skempton & Northey (1952)

Tabela 13.6: Sensibilidade de argilas (Skempton & Northey,1952)

Sensibilidade St
baixa 2-4
Média 4-8
alta 8 - 16
Muito alta 16

A Figura 13.73 mostra curvas tensão deformação de diversas argilas, ensaiadas em condições
naturais e após amolgamento.

w (%) LL (%) IP(%) St


Mexico 54 61 21 5,0
Detroit  24 29 13 2,5
Laurentian 85 66 41 14
Detroit  47 51 26 6

90

80

40
Indeformadas
 (kPa)

30

20

10
Amolgadas
5

0
0 2 4 6 8 10 12 14
a (%)

108
Figura 13.73: Ensaios de compressão simples – exemplos de curvas tensão deformação de argilas
naturais e amolgadas (Moretto, 1948).

9.6. Alguns limitantes dos ensaios não drenados

Durante muito tempo acreditou-se que a resistência não drenada poderia ser obtida através
de qualquer técnica que garantisse a manutenção do teor de umidade na ruptura, ou seja, uma
ruptura não drenada. Isto seria aplicável a ensaios de laboratório não drenados (UU), e a ensaios de
campo, como o ensaio de vane.
Estudos mais apurados principiaram a revelar que a perturbação da amostra ( alteração da
estrutura e/ou perda de umidade) durante o processo de amostragem tende a afetar a tensão efetiva
que atuava in situ, que não é reposta convenientemente num ensaio do tipo UU. Efeitos adicionais
decorrentes da anisotropia e da velocidade de ensaio contribuem também para uma grande
dispersão de resultados. Por outro lado, é necessário reconhecer que mesmo em amostras de boa
qualidade a reposição das tensões através do adensamento isotrópico conduz o solo a um estado
inicial diferente do existente in situ, onde o adensamento é anisotrópico.
Vários aspectos referentes à amostragem encontram-se ilustrados na Figura 13.73 onde o
caminhamento de tensões, em uma amostra de argila normalmente adensada, durante o processo de
amostragem e posterior moldagem de um corpo de prova para ensaio é esquematizado
12
,33

,6
=0

Tensões
=0

in situ 1
o

=
K
r

K
K

10 A
Per
f u ra
ção

8 Am
os
C tra
v' ge
m P ps' (Amostragem ideal)
Ex

6
tr u

B

o

4 D

+G r' (Amostragem real)


E
m
2 ge
F l da
o
M
FG - Confinamento em ensaio UU

0
0 2 4 6 8 10 12
'h

109
Figura 13.73: Trajetória de tensões hipotética em uma argila normalmente adensada durante
amostragem (Ladd & Foot, 1963).

Nesse diagrama, a linha K=1 corresponde ao estado hidrostático de adensamento, a linha


K0, ao adensamento anisotrópico ('3/'1) 1 e sem deformações laterais e a linha Kf representa a
envoltória de resistência do solo.
As tensões in situ, correspondentes a adensamento ao logo da linha K0, estão representadas
pelo ponto A. Durante o processo de perfuração, as tensões são aliviadas, e passam a ser
representadas pelo ponto P, que corresponderia a uma amostragem tida como ideal. No andamento
do processo de amostragem, a amostra é perturbada e passa por sucessivos estados de tensões até o
ponto D. A redistribuição de umidade e a incapacidade de reter integralmente as pressões neutras
negativas, levam a que a amostra passe a ter as tensões efetivas representadas pelo ponto E.
Finalmente, no processo de moldagem e montagem do corpo de prova chega-se ao estado de
tensões representado por F. Note-se que a tensão efetiva é em muito inferior à tensão efetiva que
atuava in situ ou após a condição de amostragem ideal. Para verificar o resultado nas resistências
que se mediriam em cada situação, basta considerar o que aconteceria com ensaios não drenados
que partissem dos pontos F ou A. Facilmente, pode-se verificar que um ensaio partindo de F
tenderia a atingir a envoltória de resistência (linha Kf) num ponto muito mais baixo, do que uma
medida efetuada a partir de A, correspondente à resistência in situ, obtida em um ensaio de palheta,
por exemplo. Para ilustrar esse fato, Lambe & Whitman (1969) relatam que a resistência não
drenada da argila de Kawasaki, medida em compressão simples, correspondeu a apenas 40% da
resistência medida in situ.
O emprego de um ensaio tipo CIU ajudaria a superar essas dificuldades, no entanto a
reposição das tensões durante a fase de consolidação, usualmente leva a amostra a um índice de
vazios (ou umidade) menor que a existente in situ, por conta do aumento da compressibilidade que
o amolgamento provoca e do adensamento isotrópico. Dessa forma, os ensaios CIU tendem a
superestimar a resistência não drenada, enquanto os ensaios UU, a subestimá-la. Ladd & Lambe
(1963) mostram, para várias argilas, que a resistência não drenada medida em ensaios UU variava
entre 40 e 80% da resistência obtida em ensaios CIU, adensados com a tensão efetiva in situ.
A velocidade de cisalhamento tem um efeito considerável nas resistências medidas.
Ensaios não drenados convencionais, com tempo de cisalhamento da ordem de uma hora, fornecem
resistências superiores a ensaios realizados com longa duração. Bjerrum (1973) apresenta um
elucidativo exemplo do acréscimo da resistência com o aumento do tempo de cisalhamento medido
em ensaios de palheta, os quais são apresentados na Figura 13.74:
Nesta figura, os dados estão normalizados em relação à resistência correspondente a uma
deformação de 0,6%/hora. A menor geração de pressões neutras nos carregamentos a maior
velocidade pode ser uma das razões desse efeito.

110
1,4

1,2

1,0

 0,8
rupt
0,6

0,4

0,2

0
0,001 0,01 0,1 1 10
Taxa de deformação ( % / h )

Figura 13.74 : Efeito da velocidade de cisalhamento sobre a resistência normalizada em ensaios de


palheta (Bjerrum, 1973).

O tempo de adensamento em ensaios do tipo CU também exerce influência significativa,


visto que solos adensados por mais tempo tendem a exibir maiores resistências. Este efeito
possivelmente é mais marcante em argilas em que a compressão secundária é expressiva.
A anisotropia responde por grandes diferenças na resistência não drenada. Neste ponto,
deve-se distinguir dois tipos de anisotropia. Uma de natureza micro-estrutural, decorrente do
processo de deposição e posterior consolidação da argila e outra, provocada pelas diferentes formas
de carregamento (anisotropia de resistência). A Figura 13.75 ilustra os tipos de solicitação que
podem ocorrer ao longo de uma superfície de ruptura provocada por um aterro.

Extensão Cisalhamento Compressão


simples

Figura 13.75 : Diferentes formas de solicitação ao longo de uma superfície de ruptura.

Até o momento foram abordados, quase que exclusivamente, as situações de carregamento


axial (ruptura por compressão) e enfatizou-se que a envoltória efetiva independe da forma de
solicitação. Infelizmente, tal não ocorre na ruptura não drenada. Como se pode notar da figura
111
13.75, a solicitação por compressão tende a ocorrer em determinadas regiões sob o carregamento.
À medida que se caminha ao longo da superfície, verifica-se que ocorrem solicitações do tipo
cisalhamento simples e de compressão lateral (extensão). As resistências em cada um dos casos
tendem a ser diferentes. Em geral, a compressão axial tende a fornecer maiores resistências,
seguida do cisalhamento simples e vindo por último a compressão lateral.
A Figura 13.76 ilustra essa afirmação onde a resistência normalizada em relação a tensão
de adensamento aplicada em laboratório ('vc) é mostrada para os distintos tipos de carregamento e
em função da plasticidade de argilas normalmente adensadas.

0,4

CA
0,3
CS
cu
0,2 CL
vc'
Compressão triaxial (CA)
0,1 Cisalhamento simples (CS)
Extensão triaxial (CL)
(compr. lateral)
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
IP (%)

Figura 13.76: Anisotropia de resistência em argilas normalmente adensadas e submetidas a ensaios


CKoU (Jamiolkowski et al., 1985).

Algumas técnicas foram propostas com o intuito de superar vários dos inconvenientes
associados à determinação da resistência não drenada em laboratório.
A técnica de recompressão da amostra, desenvolvida no Instituto Geotécnico da Noruega
(NGI) e apresentada por Bjerrum (1973), emprega ensaios do tipo consolidado não drenado, em
que algumas particularidades são observadas. Reconhecendo que os ensaios do tipo consolidado
não drenados, adensados isotropicamente (ensaio CIU), não são capazes de repor as tensões
originais, Bjerrum (1973) preconiza o adensamento da amostra exatamente com as tensões
existentes in situ, o que implica a adoção do adensamento do corpo de prova de forma anisotrópica
e com restrição de deformações laterais, isto é, que se conduza um ensaio do tipo CKoU
(consolidado num estado em repouso e cisalhado de forma não drenada). No cisalhamento devem
ser escolhidas as trajetórias pertinentes ao problema em estudo (compressão axial; cisalhamento
simples; extensão axial)) com velocidades controladas (entre 0,5 e 1%/h para os ensaios triaxiais e
5%/h para cisalhamento simples têm sido valores recomendados).
A partir desses procedimentos é possível determinar o perfil de resistência não drenada ao
longo da profundidade. A dificuldade associada ao conhecimento das tensões laterais in situ é

112
superada através da obtenção do coeficiente de empuxo em repouso por correlação com o IP e com
a RSA, conforme apresentado por Berre (1982).
De acordo com os procedimentos do NGI, tem-se aplicado uma correção (redução) para a
resistência não drenada, quando o IP da argila é superior a 30%. Esta correção baseia-se na retro-
análise da ruptura de taludes construídos sobre argilas normalmente adensadas. Em certos casos
(argilas com IP<30%), os resultados de ensaios de cisalhamento simples podem ser omitidos e
tomados como a média dos resultados dos ensaios de compressão e extensão. No entanto, quando
necessários, porém não disponíveis, os resultados de ensaios de cisalhamento simples são tomados
como iguais aos obtidos nos ensaios de extensão. Na definição da resistência não drenada, nas
duas variantes de ensaios de compressão triaxial, tomam-se valores correspondentes à mesma
deformação axial, o que implica que as resistência assim determinadas não necessariamente
correspondam às máximas de ensaio.
A técnica SHANSEP – Stress History And Normalized Soil Engineering Properties (Ladd
& Foot, 1974) se constitui em outra alternativa de obtenção dos perfis de resistência não drenada
de depósitos de argilas, em que o efeito da perturbação decorrente da amostragem é observado.
Trata-se de uma técnica que procura tirar partido do comportamento normalizado que certos
depósitos de argila apresentam e se baseia em alguns passos essenciais:
a) determinar o histórico de tensões in situ de sorte a conhecer-se as faixas de sobre
adensamento existentes no local e para as quais os dados são necessários;
b) realizar ensaios do tipo CKoU, de acordo com as trajetórias pertinentes ao projeto em
estudo, em amostras adensadas sob tensões correspondentes a 1,5; 2 e 4 vêzes a tensão
de pré-adensamento. Medir a resistência não drenada, correspondente ao intervalo
normalmente adensado, e, em amostras descarregadas após o adensamento, o
comportamento sobre adensado para distintas RSA. Verificar se o solo apresenta
comportamento normalizado, o que em essência significa relações entre a resistência
não drenada e a tensão de adensamento praticamente constantes, pelo menos para as
duas tensões maiores. Caso a relação varie com o nível de tensões, o solo não
apresenta comportamento normalizado e a técnica não é aplicável;
c) expressar os resultados em termos de parâmetros normalizados e estabelecer as
relações entre comportamento normalizado e sobre adensamento, isto é, entre as
relações entre cu/'o e RSA por exemplo;
d) usar as relações normalizadas e o histórico de tensões de sorte a obter as informações
desejadas do depósito, como o perfil de resistência não drenada dentre outras.
Em problemas em que todos os tipos de solicitações ocorrem, como na ruptura circular sob
um aterro, a média das solicitações em compressão e extensão pode ser utilizada como
representativa, visto que os resultados de cisalhamento simples se situam muito próximos desse
valor médio.

113
A Figura 13.76a ilustra a obtenção do perfil de resistência de acordo com a técnica
SHANSEP, a partir de ensaios de cisalhamento simples. Na parte a) tem-se as tensões in situ e as
tensões de pré-adensamento, obtidas de ensaios edométricos com amostras de boa qualidade. Na
parte b), tem-se as resistências não drenadas normalizadas, obtidas nos ensaios de cisalhamento
simples em função da razão de sobre-adensamento (RSA). A tabela na parte c), mostra o cálculo da
resistência não drenada pela técnica SHANSEP, para distintas elevações do perfil em análise e
considerando os elementos obtidos nas partes a) e b). por fim, na parte d) tem-se a resistência não
drenada ao longo do perfil.
vm
' - Tensão de pré-adensamento
vc' - Tensão adensamento laboratório
Tensão efetiva
0 2 4 6 8 10 1,0 Laboratório
100
Cu vm
'
Areia x
Cu 0,8
vc' vc'
90 vc'
0,6
80 e
Cota

Cu 0,4 Campo
70 Argila
vm
'
vo' Cu vm
'
x
vo' 0,2
vo' vo'
60
0
1 2 4 8
50 RSA = vm
' / vc' e vm
' / vo
'
(a) Perfil do solo e histórico de tensões (b) Resistência não drenada normalizada vs RSA

cu Resistência não drenada, cu


EL vo' vm
' RSA vo' cu 0,8 1,0 1,2 1,4
90
85 1,8 7,2 4,0 0,60 1,08
80
75 2,8 5,3 1,9 0,34 0,95
Cota

70
65 3,8 5,8 1,5 0,28 1,06
60
55 4,8 6,5 1,35 0,25 1,20
50

(c) Cálculo de cu pela técnica Shansep (d) Perfil de cu

Figura 13.76a: Exemplo ilustrativo para a obtenção da resistência não drenada pela técnica
SHANSEP. Ensaios de cisalhamento simples do tipo CKOU. (Ladd et al., 1977)

Os dois procedimentos apresentam vantagens e limitações, podendo-se destacar que a


técnica de recompressão aplica-se melhor a amostras de boa qualidade (blocos, por exemplo)
correspondentes a solos estruturados, cimentados ou fortemente sobre adensados. Já a técnica
SHANSEP parece mais apropriada a amostras obtidas por tubos amostradores e correspondentes a
solos normalmente adensados a levemente pré-adensados, por ações mecânicas. Outras limitações
dos procedimentos apresentados são amplamente discutidas em Jamiolkowski et al. (1978).

114
9.7. Estimativas para a resistência não drenada de argilas

Na discussão sobre a interpretação dos resultados de ensaios CU em termos de tensões


totais, referiu-se ao fato de que esta deve ser feita no sentido de retratar a resistência não drenada
em função da tensão com que foi adensada a argila. Verificou-se que para os solos normalmente
adensados, há uma proporção entre a resistência e a tensão de adensamento. Tal fato também é
verificado em depósitos de argilas sedimentares, onde se verifica que a resistência não drenada
cresce com a profundidade, por conta do acréscimo da tensão efetiva.
Uma das relações para estimativa da resistência não drenada, mais citada na literatura, é a
de Skempton, onde a resistência normalizada em relação à tensão efetiva in situ ('vo) é função da
plasticidade da argila, de acordo com a seguinte equação:

cu
 0,11  0,0037. IP (%) (13.102)
 'vo

Esta relação, estabelecida para argilas normalmente adensadas, baseou-se em resultados de


ensaios de vane e, originalmente, estava referenciada à tensão de pré-adensamento da argila, que
no caso corresponde à tensão efetiva in situ.
Bjerrum (1972) observou relações semelhantes para as argilas da Escandinávia, que
diferiam quando se consideravam argilas jovens e argilas envelhecidas (sujeitas à compressão
secundária). As primeiras revelam-se normalmente adensadas e as segundas sobre adensadas. As
curvas correspondentes encontram-se na Figura 13.77.
Estes resultados foram obtidos a partir de ensaios de vane, porém considerando-se as
influências que sofre a resistência não drenada, Bjerrum efetuou várias análises com o intuito de
verificar a coerência entre os resultados de ensaio e o comportamento in situ. Para tanto, fez uma
série de retro-análises em taludes rompidos nesses solos e verificou que para que as rupturas se
dessem com coeficiente de segurança unitário era necessário corrigir os valores de ensaio. A Figura
13.79 mostra a correção proposta onde estão embutidos o efeito de velocidade de cisalhamento e
de anisotropia. Dessa forma a resistência a usar em projeto refere-se à resistência de ensaio afetada
pelo fator de correção .

115
0,8

0,6
ida
hec
cu vel
En
0,4
vo'
Jovem
0,2

0
0 20 40 60 80 100
IP (%)

2,0
id a
hec
vel
vc' En
1,5
vo'
Jovem
1,0
0 20 40 60 80 100
IP (%)

Figura 13.77: a) Variação da resistência normalizada com o IP, para argilas jovens e envelhecidas;
b) Relação de sobre adensamento (Bjerrum, 1972).

(cu) projeto = (cu ) vane .


1,2

1,0

0,8

0,6

0,4
0 20 40 60 80 100 120
IP (%)

Figura 13.79: Fator de correção para ensaios de vane

.
Mesri (1975) reanalisou os resultados de Bjerrum e estabeleceu que a resistência
operacional (resistência do ensaio de vane normalizada pela tensão de pré-adensamento e afetada
pelo fator de correção) podia ser expressa por uma relação praticamente constante e independente
do índice de plasticidade, como se mostra na Figura 13.80:

116
0,4
Envelhecida

vp'
0,2

cu /
Jovem

0
0,4

 cu / vp'
0,2

0
0 20 40 60 80 100
IP (%)

Figura 13.80: Resistência operacional normalizada pela tensão de pré-adensamento (Mesri, 1975)

Esta relação pode ser expressa como

cu
 0,22 (13.102)
 'vo

Larsson (1980) determinou a resistência normalizada a partir da ruptura de 15 aterros em


argilas normalmente adensadas, com IP inferior a 60%, e obteve

cu
 0,23  0,04 (13.103)
 'vo

expressão praticamente idêntica à de Mesri.


O efeito do sobre adensamento também foi avaliado através de ensaios de cisalhamento
simples tipo CKoU (Ladd et al., 1977). A Figura 13.81 ilustra esses resultados para seis diferentes
argilas. Na parte a) está a resistência, normalizada em relação à tensão de adensamento aplicada ao
corpo de prova, para diferentes relações de sobre adensamento. Na parte b) estão a relação entre a
resistência normalizada para o solo sobre adensado e o solo normalmente adensado, onde pode-se
notar que os valores tendem a se agrupar.
A seguinte expressão descreve com razoável precisão a relação da figura

 cu 
 
 ' 
 vc  SA
 RSAm (13.104)
 cu 
 
 ' 
 vc  NC

com m = 0,8
117
6
1,8
Solo LL IP 1 Maine
no (%) (%)
1,6 1 65 34
2 65 41 5
2 Bangkok

' ) normalmente adensado


3 95 75 Solos 1 a 5
1,4 4 (1) 71 41 3 Atchafalaya

' ) sobre adensado


5 41 21
6
(2) 65 39
1,2 35 12 4 AGS (OH) 4
(1) MIT (1974) 5 Boston
cu dados inéditos

vp' 1,0 (2) Camadas de


argila e silte

(c u' / vc
Solos 6
6 Connecticut 3

(c u' /  vc
0,8
Valley

0,6

2
0,4

0,2
1
1 2 4 6 8 10 1 2 4 6 8 10
RSA = vp
' / vc' RSA = vm
' / vc'

Figura 13.81: Ensaios de cisalhamento simples. a) resistência não drenada normalizada em função
da relação de sobre adensamento; b) Incremento relativo na resistência não drenada em função de
RSA.

Alguns resultados de deformação plana e de compressão triaxial confirmam a tendência da


Figura 13.81.
Em vista dessas constatações, e finalizando este item, Jamiolkowski et al. (1985) enfatizam
que se o porte do projeto em análise não permitir um dispêndio com ensaios CKoU, cisalhados
segundo distintas trajetórias, é preferível recorrer a um ensaio de adensamento, ao invés de um
ensaio CIU convencional (compressão axial) e empregar a seguinte expressão para o cálculo da
resistência não drenada:

cu
 ( 0,23  0,04)( RSA ) 0,8 (13.108)
 vc
'

118
10 - Aplicação dos Resultados de Ensaios a Casos Práticos

As análises envolvendo ruptura de solos compreendem as análises em termos de tensões


efetivas e as análises em termos de tensões totais. Partindo da validade do principio das tensões
efetivas, é lícito imaginar que o mais correto seria empregar análises em termos de tensões
efetivas. Isto é possível caso se conheçam as pressões neutras, pois a partir daí, pode-se ter a
tensão efetiva e, com o emprego da envoltória em termos de tensões efetivas, determinar a
resistência disponível. Entretanto existem dificuldades de ordem prática pois conhecer as pressões
neutras existentes no problema em questão nem sempre é fácil. Medidas de pressão neutra na obra
se constituem em valiosa informação nesse tipo de análise. Alternativamente, tem-se as opções de
utilizar resultados de outras obras semelhantes ou empregar procedimentos teóricos para calcular
as pressões neutras, cujo acerto deve ser verificado através de monitoração da obra.
A análise em termos de tensões totais consiste em empregar resultados de ensaios não
drenados. Como premissa básica desse tipo de análise, supõe-se que as pressões neutras existentes
no problema real são as mesmas que se desenvolvem nos corpos de prova submetidos aos ensaios
pertinentes ao caso em estudo e, portanto, já estão representadas na envoltória de resistência. Se
nos dois tipos de análise os resultados provêm do mesmo ensaio (pressões neutras empregadas nas
análises por tensões efetivas e envoltória não drenada) as duas análises devem apresentar o mesmo
resultado, pelo menos em condições próximas à ruptura. Um amplo campo de aplicação de análises
por tensões totais se encontra nos problemas associados à presença de argilas moles, com as
considerações efetuadas nos itens 9.6 e 9.7. Em geral, este tipo de análise é mais rápida e mais
fácil de aplicar, contudo a tendência tem sido pela utilização de tensões efetivas, principalmente
pelo respaldo conceitual que esse tipo de análise carrega e pela possibilidade de confrontar valores
adotados com medidas de campo.
Quanto às envoltórias a empregar, é obvio que cada ensaio busca reproduzir situações
correntes na prática. O engenheiro deve contemplar as diversas fases porque passará a obra e
definir quais delas serão as mais críticas. Dentro dessa perspectiva, o ensaio não drenado busca
representar situações em que não há tempo para a dissipação de pressões neutras geradas pelo
carregamento aplicado. Trata-se então de situações a curto prazo ou de fim de período construtivo.
Assim, a estabilidade de aterros sobre solos moles, a estabilidade de barragens de terra no fim do
período construtivo (supõe-se que as pressões neutras de construção não foram dissipadas) e o
cálculo da capacidade de carga inicial de fundações apoiadas sobre argilas (Figura 13.82), se
constituem em exemplos de possibilidade de emprego de envoltórias obtidas de ensaios não
drenados.

119
A
argila mole

w
(a)

(c)

(b)

Figura 13.82: Exemplos de possibilidade de aplicação de ensaios não drenados: a) aterro


construído rapidamente sobre solo mole; b) barragem, final do período construtivo; c) sapata
apoiada sobre argila.

Os ensaios consolidado-não drenados seriam aplicáveis a situações onde o maciço


estivesse em equilíbrio com as tensões aplicadas e em seguida, ocorresse uma solicitação rápida,
sem possibilidade de dissipação das novas pressões neutras geradas. Exemplo clássico de
aplicação é na análise de estabilidade do talude de montante de uma barragem após rebaixamento
rápido, onde a ruptura não drenada é uma das possibilidades analisadas. (Figura 13.83). Ao ocorrer
o rebaixamento, o maciço, já adensado sob seu próprio peso, experimenta novas solicitações por
cisalhamento e, por conseguinte, novas pressões neutras. Em caso de baixa permeabilidade do
maciço não ocorre a dissipação de pressões neutras surgindo a possibilidade de uma ruptura não
drenada. Outro exemplo, seria o alteamento de um aterro sobre solo mole, onde o adensamento
correspondente ao primeiro carregamento já tivesse ocorrido.
h2
N.A.
h1

N.A. reb.
argila

(a) (b)

Figura 13.83: Exemplos de possibilidade de aplicação de ensaios consolidado- não drenados. a)


barragem sujeita a rebaixamento rápido; b) alteamento de aterro sobre solo mole.

120
Quanto ao ensaio drenado, evidentemente seus resultados se aplicam a análises de
estabilidade ditas a longo prazo, quando houver possibilidade de dissipação das pressões neutras
geradas, ou quando estas forem independentes das tensões totais atuantes.
Exemplos seriam a estabilidade do talude de jusante de barragens, após o fluxo de água ter
atingido a condição permanente e a estabilidade de cortes em maciços naturais, onde a
descompressão pela retirada de solo provoca reduções de resistência a longo prazo (Figura 13.84).

N.A.
Linha freática
escavação

(a) (b)

Figura 13.84: Exemplos de aplicabilidade de resultados de ensaios drenados: a) talude de jusante


de uma barragem em condições de fluxo permanente; b) talude de corte em solo normalmente
adensado.

A representação das trajetórias de tensões presentes no problema em análise se constitui


em elemento de grande utilidade para a escolha da envoltória a utilizar e para compreender os
exemplos apresentados.
Na Figura 13.85 tem-se um aterro construído sobre um depósito de argila normalmente
adensada, de baixa permeabilidade. Supondo uma hipotética superfície de ruptura, como a
assinalada, e um elemento representativo como o A, sujeito à compressão axial, tem-se no
diagrama s,s',t o ponto A, sobre a linha Ko, representativo das tensões iniciais in situ .

t Kr

Ko
C
F
A B D
argila mole
A

s, s’
(a) (b)

Figura 13.85: a) Construção de aterro sobre argila normalmente adensada; b) Trajetórias de tensões
do elemento A.

Supor que por conta do carregamento do aterro as tensões totais atinjam o ponto D e, como
as pressões neutras geradas são positivas, a trajetória de tensões efetivas poderia atingir o ponto B.

121
A título de ilustração, caso o aterro tivesse maior altura, as tensões totais poderiam atingir o ponto
F e as efetivas, o ponto C, quando então ocorreria a ruptura do solo.
Note-se que o ponto B encontra-se bastante próximo à envoltória de resistência, ou seja, a
relação entre a resistência disponível e a solicitação é mínima ao término da construção, quando
todas as pressões neutras geradas estão atuando. À medida que as pressões neutras vão sendo
dissipadas, as tensões correspondentes ao ponto B encaminham-se em direção ao ponto D,
aumentando a relação entre a resistência disponível e a solicitação e, portanto, melhorando as
condições de estabilidade. No presente caso, constata-se que a possibilidade de ruptura não drenada
(final de período construtivo) se constitui na situação mais crítica, podendo-se utilizar na análise de
estabilidade parâmetros de ensaios não drenados. Na verdade, também é possível utilizar a
envoltória drenada, caso seja possível calcular as pressões neutras presentes. Relembra-se também,
neste caso, que o elemento A representa apenas um dos casos de solicitação. A análise mais
completa de estabilidade deve contemplar os aspectos referidos no item 9.6.
Outro exemplo ilustrativo refere-se ao que pode ocorrer em uma argila sobre adensada, em
compressão axial, sujeita a solicitações expressas de acordo com as trajetórias de tensões da Figura
13.86.

t Kr
D B

Ko

s, s’

Figura 13.86: Trajetórias de tensões em argila sobre adensada, carregada axialmente.

As argilas sobre adensadas tendem a desenvolver pressões neutras negativas durante o


cisalhamento, o que está expresso pela trajetória AB, sendo AD a trajetória em termos de tensões
totais. Observar que para condições de final de período construtivo (ponto B), quando ainda atuam
as pressões neutras negativas, a relação entre a resistência e a solicitação tende a ser maior que a
unidade. À medida que as pressões neutras se equilibram, as tensões correspondentes ao ponto B
encaminham-se em direção ao ponto D, porém antes de lá chegar, ocorre a ruptura, pois atinge-se a
envoltória de resistência. Vê-se neste caso, que a condição de ruptura drenada é a mais crítica,
devendo-se considerar os parâmetros provenientes de ensaios drenados.
No caso de um talude de corte ocorre uma descompressão lateral ou uma possibilidade de
ruptura do elemento A em compressão por descarregamento. A Figura 13.87 ilustra o talude, o
elemento típico em análise e as trajetórias de tensões. As pressões neutras tendem a ser negativas
122
(ver item 11) e as trajetórias poderiam ser, para um certo estado de tensões, AB para as tensões
efetivas, e AD para as tensões totais.

t Kr

Ko
B
D
A
A

s, s’
(a) (b)

Figura 13.87: a) Talude de corte e elemento representativo ao longo da superfície da ruptura; b)


Trajetórias de tensões sobre o elemento A.

Observar que se trata de um caso semelhante ao anterior, da argila sobre adensada, pois a
situação crítica tende a ser a de longo prazo, ao ocorrer o equilíbrio das pressões neutras, quando o
ponto B tende a encaminhar-se em direção ao ponto D.
No exemplo seguinte, de uma escavação em solo normalmente adensado, o elemento típico
está sujeito a uma solicitação do tipo extensão axial. As pressões neutras despertadas tendem a ser
negativas e as trajetórias poderiam ser AB (efetivas) e AD (totais).

Kr
t

Ko
A

s, s’
D B
Kr

Figura 13.88: Trajetórias de tensões para uma solicitação do tipo extensão axial

Observar que ao final do período construtivo (situação não drenada) tem-se uma situação
mais favorável em termos de estabilidade. No entanto, a longo prazo, após equilíbrio das pressões
neutras, a trajetória de tensões efetivas tende a coincidir com a de tensões totais e tocará a
envoltória de resistência antes disso, ocorrendo, portanto, a ruptura.
As situações utilizadas como exemplo são, evidentemente, idealizadas. É importante
ressaltar que mesmo existindo algumas situações típicas não é possível padronizar roteiros pois

123
compete ao engenheiro detectar as situações criticas em cada problema e decidir que atitudes
tomar.

124
11. ENSAIOS DE COMPRESSÃO E DE EXTENSÃO

Ao apresentar os ensaios para determinação da resistência ao cisalhamento, comentou-se


sobre diferentes formas de carregamento que podem ocorrer nos problemas reais (Figura 13.21).
Várias trajetórias correspondentes a essas situações foram mostradas na Figura 13.29. Recorda-se
que o cisalhamento pode ocorrer por: a) compressão axial – CA – quando a tensão lateral é mantida
constante e a vertical é aumentada; b) compressão por descarregamento – CDe, a tensão vertical é
mantida constante e a lateral é diminuída; c) compressão lateral – CL, a tensão lateral é aumentada,
enquanto a vertical permanece constante e d) extensão axial – EA- quando a tensão lateral
permanece constante e a vertical é reduzida. Os dois primeiros tipos compreendem ensaios de
compressão, no sentido de que o corpo de prova diminui de altura e, os outros dois, de extensão,
por que a tendência é de aumento de altura do corpo de prova, durante o cisalhamento.
Nessas diferentes formas de solicitação a tensão principal intermediária (2) assume
diferentes valores. Nos ensaios de compressão ela é igual à tensão principal menor. Nos ensaios de
extensão ela corresponde à tensão principal maior. Em termos de tensões efetivas, essa rotação de
tensões não se traduz por grandes variações nos parâmetros de resistência. No entanto, em
solicitações não drenadas, essa variação pode responder por variações significativas nas
resistências, por conta das diferentes pressões neutras geradas.
A Figura 13.97a) mostra resultados de ensaios de compressão e de extensão efetuados com
uma argila normalmente adensada. Os corpos de prova foram adensados anisotropicamente, com
deformações laterais impedidas, portanto, em condições tipo Ko. A resistência à compressão está
representada pela diferença entre a tensão vertical (v) e a tensão lateral (h) atuantes no corpo de
prova. De imediato, dois fatos se sobressaem: a) as maiores resistências atingidas nos ensaios de
compressão, em relação aos ensaios de extensão e b) que os dois ensaios de compressão tendem a
fornecer as mesmas resistências, o mesmo ocorrendo com os dois ensaios de extensão. Isto fica
mais flagrante quando se observam as trajetórias de tensões totais e efetivas correspondentes a
estes ensaios na Figura 13.97b).
Verifica-se, como seria de se esperar, pressões neutras positivas na compressão axial e que
os corpos de prova submetidos à compressão seguem a mesma trajetória de tensões efetivas. Para
que isto ocorra, as pressões neutras no ensaio de compressão por descarregamento (CDe) devem
ser negativas.
O que pode parecer coincidência é passível de explicação lógica, bastando considerar as
tensões que operam nos corpos de prova durante o cisalhamento. A Tabela 13.9 mostra uma
comparação entre as tensões, durante o cisalhamento, nos ensaios de compressão. Para simplificar
a análise, serão considerados corpos de prova adensados isotropicamente sob c. Verifica-se que
para um mesmo incremento de tensão  (considerado como negativo, se de descarga), a
diferença de tensões principais é a mesma nos dois ensaios. Notar que as tensões sob as quais

125
foram adensados os corpos de prova não se alteram. A retirada de  na compressão por
descarregamento gera igual pressão neutra, de sorte que a tensão efetiva inicial c' não se modifica
por causa disso, ou seja, o cisalhamento se processa sob as mesmas tensões de adensamento. Dessa
forma, é lícito esperar as mesmas resistências e as mesmas curvas tensão deformação.

CA : 3 cte. , 1 aumenta
35 CA
CDe : 1 cte. , 3 aumenta
30 EA : 3 cte. , 1 diminui CDe
CL : 1 cte. , 3 aumenta
25

20 20
CDe ESP
15
Início 15 CA CA
cisalhamento
10
CDe
10
5 (kPa)
TTT

0 5

EA
2

-5
0

-10 CL
-5
-15 EA
TTE
CL
-10
-20 EA
CL
-25 -15
-5 -4 -3 -2 -1 0 1 2 3 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45

a(%) ‘ ‘
e (kPa)
2 2

(a) (b)

Figura 13.97: Ensaios de compressão e extensão em uma argila normalmente adensada. a) Curvas
tensão deformação; b) Trajetórias de tensões (Bishop & Wesley, 1975).

Como a magnitude de tensões é diferente nas duas direções, num e noutro ensaio, é de se
esperar que as pressões neutras durante o cisalhamento sejam diferentes como constatado na Figura
13.97b). Utilizando a equação (13.59) de Skempton e os incrementos de  pode-se obter as
expressões para o cálculo da pressão neutra colocadas na Tabela 13.9 . Evidentemente, se
conhecida a pressão neutra, os parâmetros Aca e Acd podem ser calculados Como nessa dedução, já
se levou em conta o sinal algébrico de , na aplicação dessas expressões deve-se utilizar  em
módulo.

Tabela 13.9: Tensões durante o cisalhamento não drenado em ensaios de compressão axial (CA) e
de compressão por descarregamento (CDe). Corpos de prova adensados sob c.

126

c c
TENSÕES E c 
uCA uCDe
PRESSÃO NEUTRA c

CA CDe

1 (V) c +  c
1  0
3 (H) c c - 
3 0 -
1 - 3  
u Aca (*) (Acd-1) (*)
V – direção vertical ; H – direção horizontal (*)
-  em módulo

A Figura 13.98 esquematiza as trajetórias de tensões nos ensaios de compressão e serve de


base para a dedução de outras características destes ensaios.

CDe
CA
uCDe uCA
P Q R

s, s’

Figura 13.98: Trajetórias de tensões em ensaios de compressão axial e de compressão por


descarregamento.

Da expressão (13.31) pode-se colocar


sR  c  (13.112)
2


sP  c  (13.113)
2

O segmento RP vale

127
RP  s R  s P   (13.114)

Por sua vez, considerando (13.30), tem-se

s'Q  s R  u ca  s P  u cd (13.115)

ou

s R  s P  RP    u ca  u cd (13.116)

Verifica-se que a diferença, na horizontal, entre as duas trajetórias de tensões totais


equivale ao incremento de tensões . Além disso, verifica-se também que as diferenças entre as
pressões neutras em compressão axial e compressão por descarregamento correspondem ao
incremento de tensões. Disso decorre outra implicação, pois pode-se escrever

A ca   ( A cd  1)   (13.117)

donde

A ca  A cd (13.118)

Assim, os parâmetros de pressão neutra são iguais nas duas formas de ensaios de
compressão. Com esses elementos, constata-se ser possível, a partir de um ensaio de compressão
axial, modelar o que ocorreria num ensaio de compressão por descarregamento, pois a curva tensão
deformação é a mesma e as pressões neutras podem ser facilmente calculadas através das relações
deduzidas.
Com relação aos ensaios de extensão, a Tabela 13.10 mostra as tensões atuantes na
compressão lateral e na extensão axial. Da mesma forma, nota-se que a diferença de tensões
principais nos dois ensaios é igual ao incremento , embora haja rotação de tensões durante o
cisalhamento, com a tensão principal maior posicionando-se, agora, na direção horizontal. Notar
também, que na compressão lateral o fato de 2 ser igual a 1 implica a geração de pressões neutras
positivas, de magnitude maior do que as observadas em compressão axial.

Tabela 13.10: Tensões durante o cisalhamento não drenado em ensaios de extensão axial (EA) e de
compressão lateral (CL). Corpos de prova adensados sob c.
128


c c
TENSÕES E
 uEA u CL 
PRESSÃO NEUTRA c c

EA CL

1 (V) c c + 
1 0 
3 (H) c -  c
3 - 0
1 - 3  
u (Aea-1) (*) Acl (*)
V – direção vertical ; H – direção horizontal (*)
-  em módulo

Conduzindo uma dedução análoga à efetuada para os ensaios de compressão, com auxílio
da Figura 13.99, pode-se chegar às seguintes relações:

  u cl  u ea (13.119)

A cl  A ea (13.120)

t
s, s’

T U V

CL
EA
uEA uCL

Figura 13.99: Trajetórias de tensões nos ensaios de extensão.

Assim nos ensaios de extensão, tem-se a mesma curva tensão deformação e os mesmos
parâmetros de pressão neutra e a diferença entre as pressões neutras geradas em compressão lateral
e em extensão axial corresponde ao incremento de tensão aplicado.

129
A Figura 13.100 mostra um equipamento desenvolvido para ensaios segundo distintas
trajetórias de tensões. Trata-se da câmara de Bishop & Wesley (1975) ou de trajetórias de tensões.
O equipamento independe de prensa, pois as tensões na direção vertical são aplicadas através de
pressão na água da câmara inferior. Nos ensaios de extensão, onde as tensões laterais são maiores
que as verticais, a compensação de tensões para manter a tensão vertical no valor desejado é
conseguida através da redução da pressão no reservatório inferior. Isto é necessário, porque um
aumento da tensão na câmara implica também um aumento na tensão vertical. Neste caso, o auxílio
de um cabeçote especial faz com que o corpo de prova não se desconecte da célula de carga.

Transd.
deform. Extensômetro

Célula de carga

Pressão na
câmara

Bellofram Pistão de
carga

Pressão neutra
ou drenagem
Bellofram

Câmara de
pressão inferior Pressão

Figura 13.100: Célula de Bishop & Wesley para ensaios segundo diferentes trajetórias de tensões
(Bishop&Wesley, 1975).

130
12 - RESISTÊNCIA RESIDUAL

Solos fortemente sobre adensados, após passarem por um máximo de tensão,


experimentam uma redução de resistência, que se encaminha para um valor limite, à medida que
crescem as deformações. A resistência medida nessas condições é conhecida por resistência
residual ou última (res ou ult). Na condição residual as partículas tendem a alinhar-se ao longo do
plano de cisalhamento, diferentemente do arranjo aleatório de partículas ainda presente no
cisalhamento a volume constante da condição de estado crítico.
A Figura 13.119 mostra as características de resistência citadas quando se trata de uma
amostra de argila sobre-adensada (P.A.) e outra normalmente adensada (N.A.).

 máx PA  PA
+
NA
máx NA  = cte +
’res
 res +
+ res

+ +
c’

 ,

Figura 13.119: Resistências máxima e residual

A envoltória obtida para as resistências residuais situa-se geralmente abaixo da envoltória


normalmente adensada e é do tipo:

s = ' . tg r' (13.179)

No caso das argilas normalmente adensadas a redução de resistência verificada é atribuída


a uma destruição dos vínculos adesivos e a uma reorientação das partículas. Para as argilas sobre-
adensadas, as razões apontadas são também a quebra dos vínculos de cimentação, bem como as
expansões volumétricas, que a longo prazo se traduzem num decréscimo de resistência. A
resistência residual nas argilas independe das condições iniciais (histórico de tensões), havendo
uma relação única entre a tensão efetiva, a umidade e a resistência residual. Tem-se constatado
haver uma redução de r’ com o aumento de IP e também que r’ é dependente do nível de tensões
aplicado. Por essa razão, quando se determina r’ é necessário reproduzir as condições de
solicitação reais, inclusive quanto aos deslocamentos a esperar. A Figura 13.121 mostra resultados
experimentais em que o ângulo de atrito residual está associado à fração argila.
131
40
o


Areias
(orientação
Quartzo
o aleatória)
30
Selset
Wiener
Tegel

Quartzo
’res
o
20 Jackfield
Jari
London
clay
Oxford Walton’s
clay Wood Clorita
o Weser-Elbe Little
10 Belt Talco
Biotita

0 20 40 60 80 100
Argila (< 2 m) (%)

Figura 13.121: Relação entre a resistência residual e a porcentagem de argila (Skempton, 1964).

A semelhança de comportamento tensão-deformação entre as areias compactas e as argilas


pré-adensadas e entre as areias fofas e as argilas normalmente adensadas permite estender às areias
as considerações da Figura 13.119. Importante notar que no caso das areias fofas não se observa a
redução de resistência mostrada nas argilas normalmente adensadas, pois naquelas a resistência
máxima praticamente iguala a resistência residual.
As primeiras determinações de r’ empregaram o ensaio de cisalhamento direto, fazendo
várias etapas de avanço e recuo, com o intuito de produzir as grandes deformações desejadas.
Outro alternativa utiliza o ensaio de cisalhamento em anel do qual possível produzir deformações
continuas em uma direção definida (vide Figura 13.23).
Um interessante exemplo de utilização da resistência residual ocorreu com o solo de
fundação (residual de basalto) de parte da ombreira direita da barragem de Água Vermelha. O solo
encontrava-se cisalhado devido a deslocamentos pretéritos e optou-se por não removê-lo para a
construção do maciço, efetuando-se contínuo monitoramento para prever medidas corretivas que
eventualmente se fizessem necessárias à medida que se construía o aterro. A Figura 13.122 ilustra
o resultado de um ensaio de cisalhamento direto efetuado com reversão no citado solo, em que se
pode apreciar a queda de resistência com o aumento dos deslocamentos.

132
500

400

300

 (kPa)
200

100

0
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55
Deslocamento horizontal (mm)

Figura 13.122: Curvas tensão deslocamento, ensaio de cisalhamento direto com reversão. Solo
residual de basalto (Pimenta et al. , 1978).

A Figura 13.123 mostra os pontos utilizados para definir as envoltórias correspondentes às


resistências de pico e residual, onde se pode notar uma dispersão de resultados, creditada à
dificuldade de proceder aos ensaios e à heterogeneidade do solo. As resistências de pico e residual
da argila de basalto da fundação utilizadas em projeto foram, respectivamente:
s = 50 + ' tg 22 kPa (13.180)
s = ' tg 10 kPa (13.181)

10 x 10 cm CESP Pico
10 x 10 cm CESP Residual
e 5x5 cm IPT Pico
5x5 cm IPT Residual
5x5 cm CESP Pico obs: Estes resultados foram os primeiros obtidos.
5x5 cm CESP Residual Dificuldade de execução prejudicaram os resultados.
Os números 1, 2 e 3 significam estimativas otimista, média e pessimista respectivamente.
Os ângulos da resistência residual foram obtidos ligando-se os pontos à origem.
500

Resistência média de pico


400
s = 50 + ’ tg 22 kPa
o

300
 (kPa)

200 1
(12,3o)
o
(19,9 ) 2 (10,0o)
1 (15,3o) 3 (7,5
o
)
100 o
(25,4 )
2
(12,0 )
o

3
o (8,5o)
(16,7 )

0
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 1000
’ (kPa)

Figura 13.123: Resistências de pico e residual a partir de ensaios de cisalhamento direto com
reversão. Solo residual de basalto (Pimenta et al., 1978).

SOBRA

p' =
 '
1   '2   '3 
3
1
 
1   2     2   3     3 1  
2 2 2 0, 5
q=
2
133
15. SOLOS NÃO SATURADOS

15.1. Introdução

Um solo não saturado caracteriza-se pela ocorrência de ar em seus vazios, em quantidade


que depende, obviamente, do grau de saturação e seu comportamento apresenta-se influenciado
pelas três fases (sólida, líquida e gasosa) presentes e suas interações.
Um aspecto característico dos solos não saturados refere-se à pressão da água intersticial
que sempre se encontra sujeita a pressões inferiores à atmosférica e muitas vêzes abaixo de -100
kPa, que é, aproximadamente, a pressão de vaporização da água à temperatura ambiente. Esta
pressão negativa decorre de fenômenos capilares e de adsorção, responsáveis pelo aparecimento da
sucção matricial, e de fenômenos osmóticos, devido à presença de solutos na água do solo,
responsáveis pela sucção osmótica.

15.2. Potencial da Água no Solo e Sucção

A ocorrência de água em um solo, e em particular em um solo não saturado, pode ser


descrita recorrendo-se à quantificação do estado de energia em que a água se encontra.
Reconhecem-se, classicamente, duas formas de energia a potencial e a cinética. Nos solos,
considerando-se a reduzida velocidade de fluxo nas situações corriqueiras, a energia cinética é
usualmente desprezada. A energia potencial, ou simplesmente, potencial da água, decorre da
interação da água com campos de força, como por exemplo o gravitacional.
O potencial total da água no solo () representa o trabalho útil que deve ser realizado em
uma quantidade infinitesimal de água pura, para conduzí-la, reversível e isotermicamente, desde
um reservatório sob condições padronizadas (isto é água pura, em uma determinada cota e sujeita à
pressão atmosférica) – Ponto A – até a água no solo, na cota de interesse (Ponto B) e sujeita à
pressão uB. A Figura 13.124 esquematiza essa definição.
Os componentes do potencial total são o potencial osmótico, o potencial gravitacional, o
potencial matricial e o potencial pneumático. Outros componentes podem ser incluídos, como, o
potencial de consolidação, porém serão descartados por terem importância menor no
comportamento geotécnico de solos não saturados.
O potencial osmótico ou de soluto (os) reflete a influência da presença de solutos na água
do solo. Ele equivale ao potencial total () atrás definido, quando tanto a água pura do reservatório
padrão quanto a solução de água do solo encontram-se à mesma cota (h = 0), à mesma pressão (uB
= patm) e não ocorrem efeitos da matriz do solo (solo saturado).

134
O potencial gravitacional (g) traduz a componente de posição, isto é, o fato de que a água
no solo esteja em cota diferente da água do reservatório padrão (h  0). Ele equivale ao potencial
total, quando a água do solo é idêntica à água do reservatório padrão (água pura ou solução com a
mesma composição da água do soo), está à mesma pressão e o solo se encontra saturado.

Figura 13.124: Esquema ilustrativo da definição do potencial total da água no solo

O potencial matricial (m) decorre das forças de capilaridade e de adsorção originadas da


interação entre a matriz de solo e a água. Ele equivale ao potencial total quando a água do solo é
idêntica à água do reservatório padrão (água pura ou solução com a mesma composição da água do
solo), está à mesma cota (h = 0) e sob a mesma pressão que o reservatório padrão.
O potencial pneumático (pn) origina-se de pressões externas de gás diferentes da pressão
atmosférica e tem especial importância quando se consideram os ensaios de placa de pressão ou a
técnica de translação de eixos. Ele é equivalente ao potencial total desde que a água do solo seja
idêntica à água do reservatório padrão, esteja à mesma cota (h = 0) que o reservatório padrão,
porém sujeita à pressão diferente da atmosférica (uB  patm) e que o solo esteja saturado.
Isso posto, pode-se escrever que:

 = os + g + m + pn (13.182)

A interação solo-água pode também ser quantificada a partir da avidez que um solo não
saturado tem por água. Se colocado em contacto com um reservatório de água pura livre, o solo
sorve água, pelo fato de exercer uma pressão de sucção sobre a água. Se uma pressão de sucção é
aplicada sobre o reservatório, de sorte a impedir que o solo sorva água (ou seja, que não ocorra

135
fluxo), tem-se uma pressão na água livre equivalente à pressão de sucção na água do solo. Essa
pressão (ou, simplesmente, sucção) se constitui noutra forma de representar o estado de energia da
água em um solo não saturado e ela é governada por duas componentes: a matricial e a osmótica.
A sucção total do solo (S) é definida como a pressão manométrica negativa, em relação à

pressão externa de gás sobre a água do solo, que deve ser aplicada a um reservatório de água pura

(à mesma cota e temperatura) de sorte a que se mantenha o equilíbrio, através de uma membrana

semi-permeável (permite o fluxo de água, porém não o de solutos), entre a água do reservatório e a

água do solo. A Figura 13.125 esquematiza essa definição.

Figura 13.125: Esquema ilustrativo da definição de sucção. Sucção: Corresponde a ua - uw de sorte


a não haver fluxo através da membrana semi-permeável. Comumente ua = patm.

É importante ressaltar que a analogia de pressão manométrica negativa fica limitada


a, praticamente, -100 kPa. De qualquer forma, deve-se frisar que as pressões inferiores
àquele valor podem ser obtidas através de outros métodos, como, por exemplo, por
diferenças de concentração de solutos ou por elevação da pressão na fase gasosa, acima da
pressão atmosférica.
A sucção total encontra correspondência no potencial total, quando os potenciais
gravitacional e pneumático podem ser desprezados. Dessa forma, a sucção total pode ser separada
em suas duas componentes, a sucção osmótica e a sucção matricial, que correspondem,
respectivamente, ao potencial osmótico e ao potencial matricial.

S = Sm + Sos (13.183)

A sucção osmótica (Sos) equivale à sucção total quando o solo se encontra saturado, ou

seja, quando a componente matricial não ocorre, restando apenas o efeito da concentração de

solutos. A Figura 13.126a ilustra o aparecimento da pressão osmótica entre duas soluções com

136
diferentes concentrações (cA < cB) postas em contacto através de uma membrana semi-permeável

ou seletiva, isto é, que permite o fluxo de água, porém não o de solutos.

membrana
semi-permeável

h

A B A B

CA CB

a) inicial após equilíbrio


CA < CB CA CB

membrana permeável
à água e aos solutos

A B A B

b) inicial após equilíbrio


CA < CB CA = CB

Figura 13.126: Ilustração da pressão osmótica. a) soluções em contacto através de membrana semi-
permeável; b) soluções em contacto com membrana permeável ao fluido e aos solutos.

A diferença de concentração entre as duas soluções (e, portanto, de potencial) obriga a que

se estabeleça fluxo de sorte a atingir-se o equilíbrio entre os dois recipientes. Como apenas a água

pode fluir, verifica-se o fluxo de água da solução A para a B (do maior para o menor potencial) e,

ao final, que os manômetros indicarão pressões diferentes. Por conta da diferença de pressões, as

concentrações finais não serão exatamente iguais, mas muito próximas. A pressão que seria

necessário aplicar à solução B, de sorte a não ocorrer fluxo, constitui a pressão osmótica (). A

sucção osmótica equivale à pressão osmótica, enquanto o potencial osmótico equivale à -.

Caso os dois reservatórios estivessem em contacto através de membrana permeável à água


e aos solutos (Figura 13.126b), verificar-se-ia o fluxo de soluto de sorte a igualar as concentrações
nas duas soluções. Isto traz uma consequência prática interessante nos problemas de fluxo, pois
uma diferença de potencial osmótico, na ausência de uma membrana semi-permeável, implica uma
movimentação de solutos e praticamente nenhuma movimentação de água.

137
Por sua vez, a sucção matricial (Sm) equivale à sucção total quando a água do solo é
idêntica à água padrão (água pura ou solução com a mesma composição da água no solo), restando
apenas o efeito da matriz do solo (capilaridade e adsorção). Caso se quisesse utilizar o esquema da
Figura 13.125, a sucção matricial equivalerá à diferença entre as pressões de ar e de água
necessária para não haver fluxo através, agora, de uma membrana permeável tanto à água, quanto
aos solutos. Embora a sucção total possa ser representada pela diferença entre as pressões de ar e
de água, conforme esquematizado na Figura 13.125 na prática geotécnica tem-se reservado essa
diferença para representar a sucção matricial ou

Sm = (ua – uw) (13.184)

de sorte que a sucção total passa a ser representada por

S = Sm + Sos = (ua – uw) +  (13.185)

Vale lembrar que as sucções matricial e osmótica são grandezas positivas, enquanto os
correspondentes potenciais são negativos. Uma constatação imediata para este fato pode ser obtida
na mesma Figura 13.116, considerando que atue a pressão atmosférica. O reservatório de água pura
livre se constitui num referencial para a medida de energia, ao qual se atribui o valor zero. Como a
água flui expontaneamente do reservatório para o solo, decorre que o potencial no solo deve ser
inferior ao padrão e, portanto, negativo.
A Figura 13.127 ilustra os conceitos de sucção matricial, osmótica e total.

Figura 13.127: Esquema ilustrativo da definição de sucção matricial, osmótica e total.

138
A despeito da importância que a sucção osmótica deve ter em várias questões da
Mecânica dos Solos, como no caso dos solos dispersivos ou dos expansivos, por exemplo, tem-se
admitindo que uma variação da sucção total corresponde quase integralmente a uma variação da
sucção matricial. Argumentos para validar este procedimento são apresentados por Fredlund &
Rahardjo (1993) que mostram dados experimentais acerca da contribuição da sucção osmótica na
sucção total. Além disso, consideram os citados autores que as técnicas usuais de laboratório,
quando simulam adequadamente os problemas reais, levam em conta o efeito da sucção osmótica,
embora se desconheça o seu valor.
Assim, em Mecânica dos Solos, a menos de citações específicas, alusões à sucção
do solo significam referência à sucção matricial, designada, doravante, simplesmente de sucção.
Comumente, expressa-se a sucção em altura de carga (dimensão: L). O logaritmo
da altura de carga, medida em centímetros, é designada por pF:

pF = log h [h: cm]


(13.186)

15.3. Técnicas para Medida da Sucção. Curva de Retenção de Água

Existem várias técnicas de medida da sucção e a Tabela 13.15 reúne as principais


características dessas técnicas e algumas referências básicas acerca delas.

TABELA 13.16: Síntese de Métodos de Medida de Sucção

MÉTODO FAIXA DE
OBSERVAÇÕES
SUCÇÃO MEDIDA
FUNIL DE PEDRA - sucção é aplicada diretamente à amostra;
POROSA 0 a 70 kPa - bom p/ baixas sucções onde precisão das panelas é
(MATRICIAL) limitada (Libardi, 1995)
- emprega a técnica de translação de eixos;
PLACA DE PRESSÃO - depende da capacidade da pedra porosa (pressão de
0 A 1500 kPa
(MATRICIAL) entrada de ar)
- continuidade da fase ar (Libardi, 1995; Kente, 1986)
MEMBRANA DE - técnica de translação de eixos;
PRESSÃO - emprega membrana de celulose (seletividade?) (Klute,
Até 10000 kPa
(MATRICIAL/TOTAL 1986)
(?))
- tempo de resposta: depende condutância da pedra
porosa; sensibilidade do elemento de medida (Cassel &
Klute, 1986);
TENSIÔMETRO - existem tensiômetros baseados em princípios
0 A 70 kPa
(MATRICIAL) osmóticos;
- tensiômetros de alta capacidade (medem pressões
abaixo de –1 atm): tiram partido da elevada resistência à
tração da água (Ridley & Burland, 1993),
PAPEL FILTRO TODOS OS - depende do contacto com o solo (garantir o contacto
139
(MATRICIAL/TOTAL) VALORES parece ser problemático);
- necessita calibração do papel; evitar a formação de
fungos;
- pesagem, precisão 0,0001 g. (Chandler & Gutierrez,
1986; ASTM D5298-94)
- baseia-se na condutividade elétrica de materiais porosos
(gesso; fibra de vidro, etc.); resist. elétrica (ohms x
BLOCOS POROSOS sucção);
10 a 1000 kPa
(MATRICIAL) - desvantagens: solubilidade do gesso;- histerese
pronunciada; mais sensível às altas sucções. (Rawlins &
Campbel, 1986)
- depende de rigoroso controle de temperatura,
principalmente nas baixas sucções; mais recomendado
PSICRÔMETROS
para laboratório;
(TOTAL/ 100 a 8000 kPa
- sucção osmótica; mede sucção de extrato da solução do
OSMÓTICA)
solo (confiabilidade precária) (Rawlins & Campbell,
1986; Fredlund & Rahardjo, 1993)
- cápsula cerâmica contendo sensor de temperatura e
SENSORES DE mini-aquecedor;
CONDUTIVIDADE - condutividade térmica do bloco varia com sua umidade;
0 A 400 kPa
TÉRMICA - equilíbrio solo – cápsula (bloco): sucção matricial
(MATRICIAL) medida a partir da condutividade térmica (Campbel &
Gee, 1986; Fredlund & Rahardjo, 1993)
- condutividade elétrica do extrato da solução;
EXTRATO DA
TODOS OS - concentração de solutos;
SOLUÇÃO DO SOLO
VALORES - extrato + psicrômetros: resultados precários (Rawlins &
(OSMÓTICA)
Campbel, 1986; Fredlund & Rahardjo, 1993)
-solução c/ concentração conhecida; umidade relativa;
EQUILÍBRIO DA FASE TODA A FAIXA sucção total
VAPOR ACIMA DE -amostra de solo em dessecador sem contacto com a
(TOTAL) 400 kPa solução até equilíbrio de peso
-equlíbrio demorado
- solo em contacto com solução com concentração
conhecida (umidade relativa conhecida) através de
PRINCÍPIOS membrana seletiva;
200 a 1600 kPa
OSMÓTICOS - solução de PoliEtilenoGlicol (PEG), peso molecular
(PEG 20000
(MATRICIAL) 20000
- útil para instalar e controlar sucção em ensaios (Kassif
& Bem Shalon, 1975; Dineen & Burland, 1995)

Por interessar às técnicas experimentais correntes em solos não saturados, apresenta-se, a


seguir, o princípio da placa ou panela de pressão utilizada para determinação das características de
retenção de água pelos solos. Isto é expresso através da relação entre a umidade e a sucção e a
curva resultante é conhecida como curva de retenção de água ou curva característica. O
equipamento consiste numa câmara (Figura 13.128) que pode ser hermeticamente fechada, e em
cujo interior se encontra uma placa porosa, com vazios bastante diminutos, e que permite, dentro
de certos limites, o fluxo de água, porém não o de ar. Estas placas, conhecidas como placas de alta
pressão de entrada de ar são o elemento chave para controle da sucção neste equipamento e,
praticamente, em todas as técnicas experimentais que empregam o princípio da translação de eixos,
que será explicada adiante. O limite de trabalho fica por conta da pressão de entrada de ar que é a
pressão capaz de dar início ao fluxo de ar através da placa e que pode atingir até 15 bar. Acima

140
dessas sucções tem-se o expediente de utilizar membranas de celulose como elemento de interface
para controle de sucção.

tampa

medidor de
pressão
P

tubo de saída câmara de pressão


de solução Patm + P
amostra
B de solo
Patm
placa
porosa
h

A ZB

suporte da ZA
placa tela de diafragma
náilon de borracha referência gravitacional

Figura 13.128: Esquema do Equipamento de Placa de Pressão (Libardi, 1995)

Para obtenção da curva de retenção de água, pode-se recorrer à drenagem ou ao

umedecimento do solo. No processo de drenagem, por exemplo, umedece-se o solo até próximo da

saturação e aplica-se uma determinada pressão no interior da câmara. Por conta disto, a água do

solo, em continuidade com a água do reservatório situado sob a placa, principia a fluir. A água do

reservatório e, por extensão, a água do solo encontram-se à pressão atmosférica. Uma vez cessado

o fluxo, tem-se a umidade de equilíbrio para aquela pressão e, recordando que a sucção

corresponde à diferença entre as pressões no ar e na água, tem-se que ela vale exatamente a pressão

de ar, pois na água atua a pressão atmosférica.

A Figura 13.1120a ilustra os principais elementos da curva de retenção de água,


destacando-se a umidade de saturação (s), a pressão de entrada de ar e a umidade residual (r). A
pressão de entrada de ar, quando atingida, implica o início do esvaziamento do maior poro. Para
valores inferiores a ela o solo se mantém saturado, embora com pressões na água negativas, e o
princípio das tensões efetivas é aplicável. A umidade residual representa um valor abaixo do qual,
praticamente, já não se consegue mais extrair água do solo com o aumento da sucção. Na curva de
retenção de água, para representar a quantidade de água presente, recorre-se à umidade em termos
de massa (w), ao grau de saturação (Sr) ou à umidade volumétrica (), relação entre o volume de
água e o volume total no solo,

141
 = Vw / V (13.187)

que se relaciona com w através de

 = d . w/w (13.188)

60
s Pressão de entrada de ar
Umidade volumétrica 50

Ar residual
40
Curva de drenagem
(a) 30

20
Curva de
sorção
10
Umidade
residual, r
0
0,1 1 10 100 1.000 10.000 100.000
Sucção matricial (kPa)

100

80
Umidade volumétrica

Solo argiloso

60
(b)
Solo
40
siltoso

20
Solo
arenoso
0
0,1 1 10 100 1.000 10.000 100.000
Sucção matricial (kPa)

Figura 13.129: a) Elementos da curva de retenção de água e histerese; b) Posições relativas das

curvas de retenção para diferentes solos

Outro aspecto importante refere-se à histerese que ocorre, caso se proceda a determinação
da curva por drenagem ou por umedecimento. Várias são as razões apontadas para a ocorrência da
histerese, podendo-se citar as variações de diâmetro dos canalículos, o aprisionamento de ar e
variações no ângulo de molhamento em processos de drenagem e de umedecimento, dentre outros.
Deve-se ressaltar que a cuva de drenagem apresenta umidades mais elevadas, para a mesma

142
sucção, do que a curva de umedecimento. Caso se interrompa um processo de drenagem (ou de
umedecimento) e se reverta o processo, a curva resultante não se superpõe à curva que vinha sendo
obtida. Forma-se uma nova curva intermediária conhecida como “scanning curve”. Encontram-se
também na Figura 13.129 b) curvas de retenção referentes a diferentes solos onde se pode observar
que os solos argilosos apresentam maior capacidade de retenção de água para a mesma sucção e
pressão de entrada de ar muito maior que a dos solos arenosos. Além disso, pequenas variações de
sucção respondem por praticamente toda a variação de umidade nos solos arenosos, diferentemente
dos argilosos que necessitam de amplas variações de sucção para apresentar modificações sensíveis
de umidade.

15.4. Técnicas de Ensaio para Determinação da Resistência de Solos não Saturados

Nos ensaios de resistência é necessário utilizar técnicas que possibilitem conhecer ou


controlar a pressão na água, visto que a água dos sistemas convencionais de medida pode cavitar
quando em contacto com solos cuja pressão na água é inferior a -100 kPa ( na prática, inferior a -70
kPa, aproximadamente). Com frequência, tem-se recorrido à técnica de translação de eixos
proposta, em Mecânica dos Solos, por Hilf (1956) através da qual se aumenta a pressão no ar e
tem-se, concomitantemente, um aumento na pressão da água, de sorte a trazê-la a valores
mensuráveis de forma convencional. A diferença ua - uw permanece a mesma, ou seja, a sucção
permanece igual.
Para que a técnica seja exeqüivel, é necessário contar com placas porosas especiais que
permitem o fluxo de água, porém não o de ar. A aplicação da técnica de translação de eixos,
usualmente, envolve, o controle da pressão de ar e o controle ou a medida da pressão de água. A
Figura 13.130 ilustra o arranjo utilizado para ensaiar solos não saturados, onde tem-se uma pedra
porosa de alta pressão de entrada de ar incrustada na base para controle da pressão na água. No
topo é colocada uma pedra porosa de granulação grossa, por onde o ar pode fluir livremente, sem
que ocorra atração de água por capilaridade.
Por esta técnica, como se tem a possibilidade de movimentação de solutos através da placa
porosa, o que se controla ou se impõe à amostra é a sucção matricial.
A técnica tem-se revelado útil, contudo deve ser ressalvado que ela é mais indicada quando
existe a continuidade da fase gasosa através da amostra. Caso exista ar ocluído na água do solo, os
valores obtidos podem estar distorcidos, com uma sobreavaliação da sucção medida (Bocking &
Fredlund, 1980). Assim, deve-se cogitar, para graus de saturação altos (ou baixas sucções), da
possibilidade de valores incorretos de sucção, a partir do uso desta técnica.
Uma vez sendo possível o controle ou a medida da sucção, as técnicas de ensaios guardam
estreita semelhança com as utilizadas em solos saturados. Nos ensaios drenados, as pressões na
água e no ar são mantidas constantes durante todo o ensaio. Os ensaios consolidado não-drenados

143
compreendem duas variantes: os convencionais, quando após adensamento se promove o
cisalhamento e medem-se as pressões no ar e na água e os a umidade constante, em que a pressão
do ar é mantida constante e lêem-se as pressões geradas na água. Por fim, tem-se os ensaios não
drenados convencionais, quando tanto a pressão no ar, quanto na água variam durante o ensaio,
sem contudo serem medidas, e os resultados são interpretados segundo tensões totais. Um aspecto
cuja influência não está esclarecida é a trajetória de imposição de sucção ao solo. Alguns autores
se utilizam do umedecimento inicial da amostra, buscando reduzir a sucção a zero, e posterior
drenagem por aumento da pressão de ar. Outros preferem levar a amostra, a partir de suas
condições iniciais, diretamente à sucção desejada em trajetórias que podem corresponder a
drenagem ou umedecimento, dependendo da sucção que se vai impor. Os tipos de ensaio, com
controle de sucção têm compreendido os ensaios de cisalhamento direto e os ensaios de
compressão triaxial.

Célula de carga

Pedra porosa grossa


C.P.
Pedra porosa de alta
pressão de entrada de ar
u ; v
Pressão de ar
A C
Retirada de ar
B D
em difusão
Pressão na câmara
u

Figura 13.130: Adaptações na câmara de compressão triaxial para ensaios com solos não saturados.

15.5. Interpretação dos Ensaios de Resistência em Solos não Saturados

O sucesso do princípio das tensões efetivas de Terzaghi, para solos saturados, levou
diversos pesquisadores a tentar estender aos solos não saturados a mesma idéia. Várias são as
contribuições e a de Bishop (1959), aqui utilizada como uma síntese dessas diferentes propostas,
estipula que a tensão efetiva num solo não saturado pode ser expressa como:

’= ( - ua) +  (ua – uw) (13.189)

144
Nesta equação ’ é a tensão efetiva do solo,  é a tensão total ua, é a pressão de ar nos
vazios do solo, uw é a pressão de água nos vazios do solo e  é um parâmetro que reflete a
influência da sucção na tensão efetiva do solo.
Bishop et al. (1960) mostram resultados de ensaios de compressão triaxial em que a
resistência é analisada considerando essa equação e discutem as influências sobre o parâmetro .
Constata-se que ele é dependente do grau de saturação e, que, se seguidas as mesmas trajetórias de
carregamento e de umedecimento, é possível retratar a resistência ao cisalhamento de solos não
saturados, considerando a envoltória de Mohr-Coulomb e a tensão efetiva expressa de acordo com
a equação (13.189). A Figura 13.131a) ilustra a relação entre  e o grau de saturação obtida para
três solos compactados (Bishop et al., 1960), donde se pode depreender que não há uma relação
simples entre esses valores e a Figura 13.131b), o modo de obtenção de .

1,0

0,8

0,6

S
Fator

=
(a) X
0,4

0,2

0
0 20 40 60 80 100
Grau de saturação S r (%)

Compressão simples ( argila de Boulder


compactada - argila 4 % )
Ensaios a umidade constante ( argila de
Boulder compactada - argila 18 % )
Ensaios a umidade constante ( xisto
compactado - argila 22 % )

a 1 ( +  ) - u
2 1 3 a
b
c
1 ( - )
2 1 3

1
(1 + 3) - uw
2

(b)
d  = b-c
a-c

‘
a‘
0 1 ( +  ) - u 1 ( +  ) - u
&
2 1 3 a
2 1 3 w

145
Figura 13.131: a) Relação entre o grau de saturação e o fator  para três solos compactados; b)
forma de obtenção de  a partir de ensaios com umidade constante (Bishop et al., 1960).

Em que pese a razoável eficiência dessa equação para a resistência ao cisalhamento, ela
não se revelou satisfatória para representar variações volumétricas em solos não saturados, o que
relegou a segundo plano as tentativas de reproduzir o comportamento de solos não saturados
através de uma única variável de tensão, como ocorre num solo saturado.
De acordo com Fredlund (1973), qualquer combinação de duas das variáveis de estado
seguintes,  - ua, ua – uw e  - uw, é capaz de retratar a resistência e a compressibilidade de um solo
não saturado. O uso das variáveis  - ua e ua – uw tem sido preferido por que variações na tensão
total e na pressão na água podem ser avaliadas separadamente e por que, com frequência, a pressão
de ar corresponde à atmosférica, ou seja, é zero. A partir dessa premissa, Fredlund et al. (1978)
propuseram uma equação alternativa para a resistência ao cisalhamento, que nada mais é do que
uma extensão do critério de Mohr-Coulomb para os solos não saturados. Essa proposta pode ser
expressa como:

 = c’+ ( - ua) . tan’+ (ua – uw) . tanb (13.190)

Na equação 13.190, c’ é o intercepto de coesão do solo para a condição saturada ’ é o


ângulo de atrito do solo e b é o ângulo de atrito do solo com relação à sucção matricial. A equação
13.190 pode ainda ser escrita da seguinte forma:

 = c + ( - ua) . tan ' (13.191)

onde:
c = c’ + (ua + uw) . tanb (13.192)

A Figura 13.132 ilustra a proposta original de Fredlund et al. (1978).

146
 
b

Envoltória de w ’
Mohr-Coulomb -u
extendida ua

b

b
(ua - u w) r tan 
c’
’

c’

( - ua )

Figura 13.132: Envoltória de Resistência para Solos não Saturados (Fredlund et al., 1978)

A Figura 13.133 mostra resultados correspondentes a um solo residual de riolito, obtidos a


partir da técnica proposta por Ho & Fredlund (1982) e interpretados de acordo com a equação
13.190. A técnica experimental consiste em reduzir a zero a sucção do corpo de prova (por
umedecimento) e posterior condução do corpo de prova a um certo nível de sucção, pela aplicação
de pressões na água e no ar conhecidas. Estas pressões são mantidas constantes durante todo o
cisalhamento, o que corresponde a um ensaio drenado. Como se emprega a técnica de múltiplos
estágios, ao atingir o ponto de máximo da curva tensão-deformação, a amostra é descarregada e
uma nova sucção é aplicada ao corpo de prova. Tem-se assim, com um único corpo de prova,
diferentes combinações de ua – uw e 1 - 3, donde é possível traçar diferentes círculos de Mohr e
conhecer os resultados de interesse. Para cada sucção, pode-se determinar a coesão correspondente
(Figura 13.133b) a partir de uma envoltória tangente ao círculo correspondente a essa sucção e
paralela à envoltória do solo saturado, que neste exemplo apresenta ' = 35,3º. Os valores de
resistência assim determinados permitem obter o ângulo b (Figura 13.133c).

147
1000

 1 -  3 (kPa)
800 3
2
600 1 estágio n o 1 2 3
(a)
400 3 (kPa) 241 345 448

200 ua (kPa) 103 207 310


uw (kPa) 69 69 69
0
0 4 8 12 16
(%)

1000

800 2
3 ’ = 35,3 o

1
 (kPa)
600
o
(b) N (ua - uw) r c
400 (kPa) (kPa)
1 34,5 45
200 2 137,9 77
3 241,3 104
0
0 400 800 1200 1600
 - ua (kPa)

200
c (kPa)

(c) 100
b = 15,9o

0
0 100 200 300
ua - uw (kPa)

Figura 13.133: Resultados de ensaios de resistência em solos não saturados. a) Curvas tensão-
deformação obtidas em ensaios de múltiplos estágios; b) Projeção da envoltória de resistência no
plano ,  - ua; c) Resistência em função da sucção (Ho & Fredlund, 1982).

A Tabela 13.15 mostra valores do ângulo b reportados por diversos autores.

Tabela 13.15: Valores do ângulo b (Fredlund& Rahardjo, 1993)

Solo c' ' b Tipo de Ensaio


Referência
(kPa) (o) (o)
Folhelho Compactado; 15,8 24,8 18,1 Triaxial, umidade Bishop et al.
w = 18,6% constante (1960)
Argila de Boulder; w = 11.6% 9,6 27,3 21,7 Triaxial, umidade Bishop et al.
constante (1960)
Argila de Dhanauri; 37,3 28,5 16,2 Triaxial, CD Satija, (1978)
w = 22.2%; d = 1580 kg/m3
Argila de Dhanauri; 20,3 29,0 12,6 Triaxial, umidade Satija, (1978)
w = 22.2%; d = 1478 kg/m3 constante
Argila de Dhanauri; 15,5 28,5 22,6 Triaxial, CD Satija, (1978)
w = 22.2%; d = 1580 kg/m3
Argila de Dhanauri; 11,3 29,0 16,5 Triaxial, umidade Satija, (1978)

148
w = 22.2%; d = 1478 kg/m3 constante
Argila cinza de Madrid; 23,7 22,5a 16,1 Cisalhamento Escario (1980)
w = 29% Direto, CD
Granito decomposto de Hong 28,9 33,4 15,3 Triaxial, CD Ho & Fredlund
Kong (múltiplos estágios) (1982a)
Riolito decomposto de Hong 7,4 35,3 13,8 Triaxial, CD Ho & Fredlund
Kong (múltiplos estágios) (1982a)
Silte de Tappen-Notch Hill; 0,0 35,0 16,0 Triaxial, CD Krahn et al.
w = 21.5%, d = 1590 kg/m3 (múltiplos estágios) (1989)
Till glacial compactado; 10,0 25,3 7-25,5 Cis. Direto CD Gan et al.
w = 12.2%, d = 1810 kg/m3 (múltiplos estágios) (1988)
a
Valor médio

De acordo com a equação 13.118, a influência da sucção na resistência reflete-se por um


aumento da coesão e revela-se linear, fato contestado por resultados experimentais divulgados por
diversos autores como Escario & Saez (1986); Abramento (1988) e Röhm & Vilar (1995), dentre
outros. Na Figura 13.134 tem-se os resultados de Escario & Saez (1986) para uma areia argilosa
de Madrid submetida a ensaios de cisalhamento direto com sucção controlada. Nela os efeitos da
não linearidade entre sucção e resistência podem ser apreciados. Aparece também nessa figura a
relação entre resistência e a tensão normal líquida,  - ua, que, em geral, pode ser bem representada
através de um ajuste retilíneo. Estes resultados foram obtidos utilizando-se vários corpos de prova
sujeitos a diversas combinações de  - ua e de sucção, de maneira diferente da técnica de Ho &
Fredlund (1982).

800
800
(ua - uw) (kPa) = 735,5 ( - ua) (kPa) = 588,4
490,3
294,2 600
600 98,1 441,3
49,0
0
(kPa)

(kPa)

294,2
400 400

117,7
200 200

0 0
0 200 400 600 800 0 200 400 600 800
 - ua (kPa) ua - uw (kPa)

(a) (b)

Figura 13.134: Resultados de ensaios de cisalhamento direto com uma areia argilosa compactada.
a) representação no plano  vs (-ua); b) representação no plano  vs( ua - uw) (Escario & Saez,
1986).

Pode-se mostrar que o ângulo b relaciona-se com o parâmetro  de Bishop através da


seguinte equação:

149
 = tan b/tan ' (13.193)

Ora, se  não é constante com o grau de saturação (e com a sucção, por extensão) não há
razão para que b seja constante. Fredlund et al. (1987) reconhecem a limitação de sua proposta
inicial e a reformulam conforme a Figura 13.135. Tem-se agora uma envoltória curva, com um
trecho inicial determinado pelo ângulo de atrito do solo saturado. Admite-se que, anteriormente ao
início da dessaturação, permanece válido o princípio das tensões efetivas e o ângulo b equivale ao
ângulo de atrito drenado. Quando a pressão de entrada do ar do solo é superada, ou seja, o solo
começa a ser drenado, a resistência passa a ser governada por uma relação não linear com a sucção,
que tende a um valor assintótico.
A Figura 13.135 retrata a proposta alternativa no espaço ,  - ua e ua – uw.


Saturado Não Saturado
Pressão na água decrescendo D

E
B
C
A
(ua - uw)b tan ’

( - ua) r tan ’ ( - ua) r constante


Pressão de entrada
de ar aproximada
(ua - uw)b
c’

(ua - uw)b (ua - uw)

Figura 13.135 – Envoltória de resistência curva para solos não saturados (Fredlund et al., 1987)

Mesmo com as limitações citadas, a proposta original de Fredlund et al. (1978) surge como
atraente pela sua simplicidade matemática e poderia ser utilizada considerando-se diferentes
envoltórias retilíneas, função do nível de sucção, como, por exemplo, os trechos AB e BD da figura
13.135. Uma alternativa conservadora consistiria em adotar uma envoltória retilínea para todos os
valores de sucção, como a envoltória AE mostrada. A não linearidade na relação entre resistência e
sucção tem sido retratada na prática através de relações empíricas e algumas delas são mostradas
na Tabela 13.17 que reúne resultados de alguns solos brasileiros.

15.6. Métodos de Previsão da Resistência não Saturada

150
As dificuldades de experimentação têm ensejado o aparecimento de métodos indiretos para
a obtenção da envoltória de resistência em solos não saturados, como os propostos por Öberg &
Sällfors (1995; 1997) e Fredlund et al. (1995). Comumente, os métodos se apoiam na curva de
retenção de água. A proposta de Öberg & Sällfors (1995; 1997), expressa através da equação
13.194 a seguir, será utilizada para ilustrar um desses métodos de estimativa da resistência do solo
não saturado.

 = c’ + ( - Sr . uw – (1 – Sr) . ua) . tan' (13.194)

A parte em parênteses desta equação é semelhante à equação de Bishop (eq. 13.189) com
a particularidade que o parâmetro  é tomado como equivalente ao grau de saturação. A relação
entre uw e o grau de saturação é obtida a partir da curva de retenção de água no solo. A histerese
típica desta curva, observada quando ela é obtida por secagem ou por umedecimento, em conjunto
com as limitações da equação de Bishop, são dois fatores limitantes da proposta. Não obstante
essas limitações, algumas aplicações têm mostrado uma razoável concordância entre resultados
experimentais e as propostas alternativas, o que as tornam interessantes para uma primeira
estimativa da resistência não saturada. A Figura 13.136 mostra a curva de retenção de água (obtida
por drenagem), a variação da coesão com a sucção e o ajuste obtido para um solo arenoso
(Machado & Vilar, 1999) onde se empregaram as propostas de Öberg & Sällfors (1995; 1997) e de
Fredlund et al., (1992). O solo é uma areia argilosa (residual de arenito) com LL=28%; LP=17%:
=19,2 kN/m3 e w=16,7%.

100
80
Coesão aparente (kPa)

90 Profundidade de 8m
Grau de saturação (%)

70
80
60
70 Prof. = 2m
50
60 Prof. = 5m
40
50 Prof. = 8m
30
40 20
30 0 50 100 150 200
1E-1 1E0 1E1 1E2 1E3 Sucção (kPa)
Sucção matricial (kPa)
Pontos experimentaisÖberg & Sallfors (1995)
Fredlund et. al (1995)

a) b)

151
Figura 13.136: a) Curva de retenção de umidade; b) Variação da coesão com a sucção para um solo
arenoso resultados experimentais e previsão segundo as propostas de Öberg & Sällfors
(1995;1997) e de Fredlund et al.(1995) ( Machado & Vilar, 1998).

Tabela 13.17: Influência da sucção sobre a resistência de alguns solos brasileiros

Solo Equação Observações


Areia silto argilosa c' = 0; ' = 38o (ensaios de compressão
(colúvio), Serra do Mar, triaxial); (3- ua)= 10 e 20 kPa; (ua-uw)
o 0,5
S.Paulo, LL=39%; s=(-ua).tg38 +2,5(ua-uw) kPa = 5 a 60 kPa
LP=25%: =16,65 kN/m ; 3
(Abramento, 1988)
w= 26%
Areia argilosa (colúvio) , c' = 0; ' = 23,1o (compressão triaxial
S. Carlos; LL=38%; ua  uw (3- ua)= 50 kPa;
t  24,3  kPa
LP=24%: =16,5 kN/m ; 3
5,2  0,009(u a  u w ) (ua-uw) = 20 a 400 kPa; t = (1-3)/2
w= 20% (Rohm & Vilar, 1995)
Areia argilosa amarela c' = 0; ' = 23,1o (cisalhamento direto);
(colúvio), Vista Chinesa, s = 2,27.10-8(ua-uw)4- 5,02.10-6(ua-uw)3 – (- ua)= 50 kPa
Rio de Janeiro. LL=46%; 1,54.10-3 (ua-uw)2 + 0,53(ua-uw)+30,8 kPa (ua-uw) = 30 a 210 kPa
IP=23%: =15,4 kN/m3; (Campos & Carrillo, 1995)
w= 24,1%
Areia argilosa amarela c' = 13,7kPa; ' = 23,1o (cisalhamento
(residual maduro), Vista s = 2,84.10-8(ua-uw)4- 1,95.10-6(ua-uw)3 – direto); (- ua)= 50 kPa
Chinesa, Rio de Janeiro. 4,68.10-3 (ua-uw)2 + 0,55(ua-uw)+45,2 kPa (ua-uw) = 30 a 210 kPa
LL=51%; IP=14%: =16 (Campos & Carrillo, 1995)
3
kN/m ; w= 16,9%
Areia argilosa c' = 24 kPa; ' = 29,6o (compressão
compactada (colúvio) , S. s  24  (  u )tg 29,6 o  triaxial); (3- ua)= 0 a 300 kPa
a
Carlos; LL=33%; u u a w
(ua-uw) = 50 a 200 kPa
kPa
LP=23%: d=17,3 kN/m ; 3
0,64  0,0085(u a  u w ) (Teixeira & Vilar, 1997)
w= 15,5%
Areia argilosa (residual de c' = 26,9 kPa; ' = 26,4o (compressão
arenito), S. Carlos. c = 28,3 + triaxial); (3- ua)= 50 a 200 kPa
LL=28%; LP=17%: ua  uw (ua-uw) = 40 a 160 kPa
kPa
=19,2 kN/m3; w= 16,7% 1,35  0,024(u a  u w ) (Machado & Vilar, 1998)

152
Influência da sucção nas curvas tensão deformação

Além do aumento da resistência, a sucção tende a promover um enrijecimento do solo, como se


pode constatar da observação de algumas curvas tensão – deformação. As Figuras ilustram essa deformação
e refere-se a resultados de ensaios de compressão triaxial com controle de sucção, dos tipo CD, em que após
adensamento, o cisalhamento se processa mantendo constante as pressões no ar e na água e CW, ou seja,
adensado e cisalhado com umidade constante (Rhom, 1992). O solo em questão é uma areia fina argilosa,
com LL = 38%, LP = 24% e IP = 14% e foi ensaiada a partir de amostra indeformada. Seu índice de vazios é
1,0, peso específico 16,5 kN/m3 e grau de saturação de 50%, na ocasião da coleta.

153

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