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Novas drogas estimulam

comunicação em autistas
Apesar dos bons resultados experimentais, especialistas ressaltam
necessidade de mais pesquisas

Shutterstock

Duas drogas que afetam a atividade do hormônio vasopressina parecem melhorar a comunicação social em pessoas
com autismo. Os resultados vêm de dois ensaios clínicos independentes publicados hoje na revista Science
Translational Medicine.

Os resultados são encorajadores, mas alguns especialistas pedem cautela, dizendo que os métodos usados para
avaliar os medicamentos não foram projetados para essa finalidade.

A vasopressina está relacionada à oxitocina, um hormônio que se acredita governar os laços sociais. Mas a ligação
entre a vasopressina e o autismo não é nada clara. Algumas evidências sugerem que as pessoas com esta condição
tem grandes quantidades de vasopressina, outras evidências sugerem que elas têm carência do hormônio.

As duas drogas testadas atuam de formas opostas sobre a vasopressina. Uma delas, o balovaptan, bloqueia um
receptor de vasopressina no cérebro, amortecendo a atividade do hormônio. A outra droga é um spray nasal
contendo vasopressina. Apesar dos modos de ação opostos, ambas as drogas parecem potencializar a função social
em pessoas autistas e não têm efeitos colaterais graves.

As descobertas são notáveis porque não há drogas disponíveis para tratar as principais características do autismo,
diz Eric Hollander, professor de psiquiatria e ciências comportamentais da Faculdade de Medicina Albert Einstein, em
Nova York, que não esteve envolvido em nenhum dos estudos.

“Estes dois estudos fornecem informações importantes de que o sistema de vasopressina, ou o sistema de
vasopressina e oxitocina, são importantes para a comunicação em sociedade”, diz ele. “Diferentes agentes que
afetem esses sistemas podem ser úteis em termos de novos tratamentos para o autismo”.

Ainda assim, ambos os estudos contam com um questionário que não foi concebido para medir a eficácia de um
medicamento, diz Lawrence Scahill, diretor de ensaios clínicos do Marcus Autism Center, em Atlanta.

“Ambos os estudos sugerem que vale a pena estudar mais esse mecanismo de ação “, diz Scahill. “Mas eu acho que
devemos ter cuidado para não interpretar demais esses resultados.”

No estudo com o balovaptan, liderado pela farmacêutica suíça Roche, pesquisadores em 26 locais nos Estados
Unidos escolheram aleatoriamente 223 homens com autismo para receber o medicamento uma vez ao dia durante
12 semanas. As pílulas continham 1,5, 4 ou 10 miligramas de balovaptan, ou um placebo.

Os indivíduos que tomaram balovaptan não se saíram melhor do que os controles em um questionário chamado
Escala de Responsividade Social, a principal mensuração de resultados do estudo. Mas aqueles que tomaram as
duas doses mais altas mostraram uma melhora em suas habilidades sociais e de comunicação medidas a partir da
Escala de Comportamento Adaptativo de Vineland, uma medida secundária. Os homens não mostraram diferenças
nas escalas que mediram comportamentos repetitivos, ansiedade ou humor, entre outras características.
Os pesquisadores da Roche não estavam disponíveis para comentar, mas Hollander diz que esses resultados são
promissores.

“É difícil mostrar boas taxas de resposta em testes que envolvem vários locais, nos quais ocorrem respostas altas ao
placebo e efeitos específicos de cada local”, diz Hollander. “Mas os estudos mostram um bom efeito associado à
dose na questão da comunicação social.”

Os resultados do estudo levaram a Agência de Alimentos e Medicamentos dos EUA a conceder a permissão para
prosseguir com os testes em janeiro de 2018. Os pesquisadores irão realizar dois novos testes clínicos: um envolve
crianças autistas nos EUA e o outro inclui adultos na Europa, Canadá e EUA.

No teste do spray de vasopressina, os pais de crianças autistas, com idades entre 6 e 12 anos, ministraram a seus
filhos uma dose usando um spray nasal duas vezes ao dia durante quatro semanas. Das 30 crianças participantes
do estudo, 17 receberam o spray de vasopressina e as demais inalaram um placebo.

As crianças do grupo da vasopressina melhoraram significativamente em suas habilidades sociais, com base na
Escala de Responsividade Social, a principal medida de resultados. As classificações dessas habilidades por parte
dos clínicos, assim como as classificações de ansiedade dos pais e o desempenho das crianças em dois dos quatro
testes de cognição social também apontaram para uma melhoria. Nenhuma das crianças que recebeu vasopressina
tornou-se mais agressiva, como ocorreu com alguns roedores.

“Múltiplas avaliações independentes mostram que a droga foi mais eficaz do que o placebo”, diz Karen Parker,
investigadora co-principal, professora associada de psiquiatria e ciências comportamentais da Universidade de
Stanford, na Califórnia.

Paradoxalmente, as crianças com os níveis mais altos de vasopressina no sangue antes do tratamento tenderam a
mostrar os maiores efeitos, e somente essas crianças apresentaram melhoras em seus comportamentos repetitivos.
Parker não tem certeza do motivo, mas talvez a dose seja baixa demais para beneficiar aqueles com menos
vasopressina, diz ela.

“Os resultados de um pequeno estudo podem ser enganosos”, diz Scahill. “E quando há muitas medidas de
resultados em um pequeno estudo, é possível que algumas coisas se mostrem estatisticamente significativas por
acaso”.

Outras pessoas têm dúvidas sobre como duas drogas com modos de ação opostos levam a efeitos semelhantes.
“São abordagens realmente divergentes para atacar o sistema da vasopressina”, diz Elizabeth Hammock, professora
assistente de psicologia e neurociência da Universidade Estadual da Flórida, em Tallahassee. “E não sabemos ao
certo como está funcionando.”

No entanto, observam os especialistas, é difícil comparar testes com desenhos e conjuntos de participantes tão
diferentes. “O autismo é um distúrbio muito heterogêneo”, diz Antonio Hardan, professor de psiquiatria e ciências
comportamentais da Universidade de Stanford, que co-liderou o estudo do spray nasal. “Pode ser possível, com
autismo, ver anormalidades que se relacionam com excesso de vasopressina ou com falta.”

Hardan e Parker estão testando o spray em um novo teste com 100 crianças com autismo.

Nicholette Zeliadt

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