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A importância

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socialização das crianças

Francione Oliveira Carvalho


Francione Oliveira Carvalho1

A natureza dos jogos e das brincadeiras

A variedade dos fenômenos considerados como jogo mostra a complexidade da tarefa de defini-los.
Assim, para uns, atirar com um arco e flecha é jogo; para outros, é preparo profissional. Uma mesma condu-
ta pode ser jogo ou não, em diferentes culturas, dependendo do significado atribuído. Para compreender a
natureza do jogo e da brincadeira, é preciso classificar situações entendidas como tais. Embora a brincadeira
seja uma atividade livre e espontânea, ela não é natural, mas uma criação da cultura. O mesmo podemos
dizer a respeito do jogo. Assim, o aprendizado das brincadeiras se dá por meio das interações e do convívio
com os outros.

Entre os autores que discutem a natureza do jogo e suas características encontram-se Huizinga (1951) e
Brougère (2008). Ambos assinalam pontos comuns: o prazer ou o desprazer; as regras, que podem ser explí-
citas ou implícitas; a relevância do processo de brincar; o caráter improdutivo; a incerteza de seus resultados;
a não literalidade ou a representação da realidade, a imaginação e a contextualização no tempo e no espaço.

O jogo, como desenvolvimento infantil, evolui de um simples exercício durante os primeiros 18 meses
de vida, passando pelo simbólico a partir dos 2 anos e pelo aparecimento das representações e da linguagem.
Finalmente temos o jogo de regras, caracterizado pela transição da atividade individual para a socializada.
No primeiro deles, a atividade lúdica refere-se ao movimento corporal sem verbalização; o segundo é o faz
de conta, a fantasia, enquanto o jogo de construção é uma espécie de transição para o jogo social, marcado
pela atividade coletiva de intensificar trocas e regras, caracterizado pela transição da atividade individual para
a socializada. Portanto, os jogos e a ludicidade são elementos-chave para o amadurecimento intelectual e
afetivo das crianças, como já afirmava o epistemólogo e educador Jean Piaget:

Obrigamos a criança a se adaptar sem cessar a um mundo social dos mais velhos, cujas regras
lhe permanecem exteriores, e a um mundo físico, que ela ainda mal compreende; a criança para
seu equilíbrio afetivo e intelectual precisa dispor de um setor de atividade cuja motivação não seja
a adaptação ao real senão, pelo contrário, a assimilação do real ao eu sem coações nem sanções, tal
é o jogo (Piaget, 1957, p. 51).

Os jogos de exercício têm como finalidade o prazer e o divertimento, como o ato que muitas crianças
têm de empurrar o carrinho para longe e depois ir buscá-lo várias vezes. Quando esses jogos não oferecem
mais nenhum tipo de aprendizagem, a criança se cansa e, a partir do momento em que ela começa a se apro-
priar da fala, o jogo de exercício passa a ser menos utilizado.

Os jogos simbólicos caracterizam a fase que vai desde o aparecimento da linguagem até aproximadamente
os 6 ou 7 anos. Eles implicam a representação de um objeto ausente ou um personagem do dia a dia, tal como

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Professor no curso de Pedagogia da Uniradial Estácio e de Arte no Colégio Notre Dame, ambos
em São Paulo.

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alguém da família, da escola ou o super-herói preferido. As funções dos jogos simbólicos (compensação, rea-
lização de desejos, liquidação de conflitos) somam-se ao prazer de se sujeitar à realidade. A criança utiliza esse
tipo de jogo como estímulo para exercitar com segurança e liberdade suas habilidades e pensamentos.

Os jogos de regras iniciam-se a partir dos 6 anos e extrapolam a infância, permanecendo no cotidiano das
pessoas durante toda a vida. Esses jogos são fundamentais para a socialização, pois envolvem acordos e nego-
ciações. Para que os jogos de regras aconteçam, as crianças precisam se organizar em grupos e, coletivamente,
decidir sobre seu funcionamento. Para Piaget, tais jogos podem ser combinações sensório-motoras, como cor-
ridas e jogos de bolinhas, ou intelectuais, como os jogos de cartas ou damas, com competição e interação entre
indivíduos, regulamentados por um código transmitido de geração a geração ou por acordos momentâneos.

É, portanto, na situação de brincar que as crianças podem propor desafios e questões que ultrapassam
seu comportamento diário, levantando hipóteses que procuram compreender os problemas que lhes são
propostos pelas pessoas e pela realidade com a qual interagem.

A brincadeira pode ser um espaço privilegiado de interação e confronto de diferentes crianças


com diferentes pontos de vista. Nessa experiência elas tentam resolver a contradição da liberdade
de brincar no nível simbólico em contraposição às regras por elas estabelecidas, assim como o
limite da realidade ou das regras dos próprios jogos aos desejos colocados. Na vivência desses
conflitos, as crianças podem enriquecer a relação com seus colegas, compreendendo e agindo na
realidade de forma ativa e construtiva (Wajskop, 2007, p. 33).

Os jogos e o processo educacional


O processo educacional é essencial para a aquisição de conhecimentos sistematizados, a socialização e
a formação de seres críticos, pensantes e reflexivos. Dessa forma, é necessário priorizar o brincar, as criações,
os jogos e as descobertas, para o desenvolvimento e a construção da liberdade e da expressão da criança. É por
meio do jogo e da brincadeira que a criança constrói o real em função de seus desejos e fantasias.

As emoções do jogo geram necessidades de ordem afetiva, e é a afetividade a mola dessas ações. Ela mobiliza
o indivíduo em determinada direção como o objetivo de obter prazer. Os desafios proporcionados pelo jogo
mobilizam o indivíduo na busca de soluções ou de formas de adaptação a situações problemáticas e, gradativa-
mente, o conduzem ao esforço voluntário. A atividade lúdica pode ser, portanto, um eficiente recurso didático do
educador interessado no desenvolvimento da inteligência de seus alunos, quando mobiliza sua ação intelectual.

A definição educacional dos jogos é permeada de divergências relacionadas à presença de duas fun-
ções. Por meio da função lúdica o jogo propicia a diversão, o prazer e até o desprazer quando escolhido
voluntariamente. Já por meio da função educativa o jogo ensina qualquer coisa que complete o indivíduo
em seu saber, seus conhecimentos e sua apreensão do mundo. A aspiração do jogo educativo é o equilí-
brio entre essas duas funções.

Para o psicólogo russo Lev Vigotsky, o brinquedo e os jogos são considerados uma importante fonte de desen-
volvimento e aprendizado. A atividade lúdica possibilita à criança satisfazer seus desejos por meio da imaginação e do
faz de conta. Logo, uma das características do jogo e do brincar é poder explorar o que Vigotsky (1984) chamou de
zona de desenvolvimento proximal, ocasião em que a criança vai além do que sua experiência permite. Percebe-se,
dessa forma, que as atividades lúdicas – jogos e brincadeiras – influenciam amplamente e de maneira surpreen-
dente o desenvolvimento cognitivo, intelectual, moral e físico da criança.

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Em nossa sociedade, há uma cultura de muitos brinquedos e de poucas brincadeiras, muita tec-
nologia e pouco artesanato, muita impessoalidade e pouco respeito à individualidade, muita solidão
e pouca troca entre as pessoas; uma cultura mais competitiva do que cooperativa; uma cultura lúdica
violenta, impassível, indiferente ao outro, medrosa; uma cultura em crise, que não mais se adapta às
atuais gerações, que possui inúmeras dúvidas a respeito de como restituir ou recriar um brincar mais
saudável (Friedmann, 2006, p. 123).

A fala de Friedmann aponta que o brincar está diretamente associado à afetividade e à cultura, sendo, por
isso, um ato importante na relação entre pais e filhos ou professores e alunos. É por meio da transmissão que
as brincadeiras se perpetuam, e do afeto e das emoções que elas se eternizam. Ao pensarmos sobre as brin-
cadeiras ou os jogos que marcaram nossa infância, inevitavelmente resgataremos os sentimentos e as pessoas
que dividiram esses momentos conosco. Portanto, é necessário estimularmos brincadeiras que potencializem
tanto as capacidades cognitivas como as afetivas das crianças, pensando no papel dos brinquedos e dos jogos
em sua formação humanista.

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RefeRêNcias bibliOgRáficas

BROUGÈRE, Gilles. Brinquedo e cultura. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

FRIEDMANN, Adriana. Brincar, crescer e aprender: o resgate do jogo infantil. São Paulo: Moderna,
1996.

HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 2008.

PIAGET, Jean. A construção na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.

VIGOTSKY, Lev S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

WAJSKOP, Gisela. Brincar na pré-escola. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2007.

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