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A civilização humanista Liberal, na Europa Ocidental, foi a última forma da Velha Ordem a
qual foi efetivamente destruída nas grandes guerras e nas revoluções da segunda década
deste século e que continua a existir -- ainda que em uma forma mais atenuada e
"democrática" -- no mundo livre de hoje, pode ser caracterizada, principalmente, pela sua
atitude para com a verdade. Esta não é uma atitude de franca hostilidade, nem mesmo de
indiferença intencional, pois seus sinceros apologistas inegavelmente tem um verdadeiro
respeito por aquilo que consideram ser a verdade; em vez disso, é uma atitude em que a
verdade, apesar de certas aparências, já não ocupam o centro das atenções. A verdade em
que professa crer (além, é claro, dos fatos científicos) é, para ele, não uma moeda espiritual
ou intelectual em circulação, mas um capital inativo e sem frutos que sobraram de uma era
anterior. O Liberal ainda fala, ao menos em algumas ocasiões formais, de "verdades
eternas", de "fé", de "dignidade humana", da "vocação" do homem ou do seu "espírito
inextinguível", até mesmo da "Civilização Cristã"; mas é evidente que essas palavras não
mais dizem o que um dia significou. Nenhum Liberal as leva com toda seriedade; elas são,
na verdade, metáforas, ornamentos de uma linguagem que se destina a evocar uma resposta
emocional, não intelectual - uma resposta largamente condicionada pelo seu uso
prolongado, a uma memória que atende a um tempo em que essas palavras realmente tinha
um significado positivo e sério.
Hoje em dia ninguém que se orgulhe de sua "sofisticação" -- ou seja, muito poucos nas
instituições acadêmicas, no governo, na ciência, nos círculos intelectuais humanistas,
nenhum que queira ou afirme estar a par dos "tempos" -- pode ou acredita plenamente na
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1/6/2019 We Are Time
A mentalidade moderna não pode tolerar tal Deus. Ele é ao mesmo tempo muito íntimo -
muito "pessoal", muito "humano" - e demasiado absoluto, muito inflexível em suas
exigências para nós, e Ele se faz conhecido somente pela humilde fé - um fato que fere o
orgulho da inteligência moderna. Um "novo deus" é claramente necessário pelo homem
moderno, um deus mais atentamente modelado segundo o padrão das preocupações centrais
modernas, como a ciência e negócios; e, de fato, há uma importante intenção do pensamento
moderno para proporcionar tal deus. Esta intenção já é clara em Descartes, é materializado
no deísmo do Iluminismo, desenvolvido ao fim no idealismo alemão; o novo deus não é um
Ser, mas uma ideia, não revelado pela fé e humildade, mas construído por uma mente
orgulhosa que ainda sente a necessidade de "explicação" ao perder o seu desejo da salvação.
Este é o deus morto dos filósofos que apenas necessitam uma "causa primeira" para
complementar seus sistemas, bem como os "pensadores positivos" e outros sofistas
religiosos que inventam um deus pois "necessitam" dele, e pensam que podem usá-lo à
vontade. Quer seja "deísta", idealista, "panteísta", ou "imanentista", todos os deuses
modernos são construtos mentais, fabricados por almas mortas pela perda de fé no
verdadeiro Deus.
Os argumentos ateístas contra tais deuses são tão irrefutáveis quanto irrelevantes; pois tal
deus é, de fato, o mesmo que nenhum deus. Desinteressado no homem, impotente para agir
no mundo (exceto para inspirar um "otimismo" mundano"), ele é um deus
consideravelmente mais fraco que os próprios homens que o inventaram. Em tais alicerces,
não é necessário dizer, nada seguro pode ser construído; e é com boas razões que os liberais,
enquanto comumente professam crença nessa divindade, na verdade constroem sua visão de
mundo em cima do mais óbvio, dificilmente mais estável: a fundação do Homem. O
ateísmo Niilista é uma formulação explícita do que já estava, não de uma forma clara, mas
de uma forma confusa, presente no Liberalismo.
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possui ideia do que isso significa para a vida do fiel Cristão; para a maioria das pessoas de
hoje, a vida futura, como Deus, tornou-se uma mera ideia, e, por isso, custa pouco de dor e
esforço tanto para negá-lo quanto para afirmá-lo. Para o verdadeiro Cristão, a vida futura é
uma alegria inconcebível, alegria que supera a alegria que ele conhece através da comunhão
com Deus em oração, na Liturgia, no Sacramento; por que, então, Deus será tudo em todos
e não haverá distanciamento desta alegria que certamente será infinitamente melhor. O
verdadeiro crente tem o consolo de uma antecipação da vida eterna. O crente no deus
moderno, não tendo tal antecipação e, portanto, nenhuma noção da alegria cristã, não pode
acreditar na vida futura do mesmo modo, na verdade, se ele fosse honesto consigo mesmo,
ele teria que admitir que, no fundo, não acredita.
Existem duas formas principais de tal descrença que se passa pela crença Liberal: a
Protestante e a humanista. A visão Liberal Protestante da vida futura -- compartilhada,
infelizmente, por um número crescente dos que se professam ser Católicos ou até mesmo
Ortodoxos - é, como suas opiniões sobre tudo o mais que pertence ao mundo espiritual, uma
mínima profissão de fé que mascara uma fé em nada. A vida futura se tornou um sombrio
submundo na concepção popular, um lugar onde se pode ter um "descanso merecido" após
uma vida de trabalho. Ninguém tem uma ideia muito clara deste reino, pois corresponde a
nenhuma realidade; é, antes, uma projeção emocional, um consolo para aqueles que
preferem não enfrentar as implicações de sua descrença real.
Tal "céu" é fruto de uma união da terminologia Cristã com um mundanismo comum, e não é
convincente para ninguém que entende que tal compromisso é impossível; nem o verdadeiro
Cristão Ortodoxo nem o Niilista é seduzido por ela. O compromisso com o humanismo é, se
alguma coisa, ainda menos convincente. Até aqui, dificilmente há uma pretensa ideia de que
corresponde à realidade; tudo se torna metáfora e retórica. O humanista já não fala mais
sobre céu, pelo menos não de forma séria; mas ele se permite falar do "eterno", de
preferência através de figuras de linguagem: "verdades eternas", "eterno espírito dos
homens". Alguém pode, com razão, questionar-se se tais palavras tem algum significado
em tais frases. No estoicismo humanista o "eterno" foi reduzido a um conteúdo tênue e
frágil a ponto de ser praticamente indistinguível do Niilismo materialista e determinista que
tenta, com certa razão, seguramente, destruí-lo.
Em qualquer dos casos, tanto o Liberal "Cristão" e ainda mais o Liberal humanista, a
incapacidade de acreditar na vida eterna está enraizada no mesmo fato: eles acreditam
apenas neste mundo, não possuem nem experiência ou fé no outro mundo e, sobretudo,
acreditam em um "deus" que não é poderoso suficiente para ressuscitar os homens da morte.
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Se não há imortalidade, acredita o Liberal, ainda se pode levar uma vida civilizada; "se não
há imortalidade" - uma profunda lógica do Ivan Karamazov no romance de Dostoievski -
"tudo é permitido". O estoicismo humanista é possível para certos indivíduos por um certo
tempo: ou seja, até que eles percebam as implicações de se negar a imortalidade. O Liberal
vive em um paraíso de tolos que deve entrar em colapso quando de frente a verdade das
coisas. Se a morte é, como o Liberal e o Niilista acreditam, a extinção do indivíduo, então
este mundo e tudo que há nele - o amor, a bondade, a santidade, tudo - são como nada, nada
que o homem possa fazer é tem alguma importância última e o horror da vida está
escondido do homem apenas por sua força de vontade em enganar si mesmos; e "tudo é
permitido", nenhuma esperança transcendente ou medo impede o homem de experimentos
monstruosos e sonhos suicidas. As palavras de Nietzsche são verdades - e a profecia - de
um novo mundo resultante deste ponto de vista:
De tudo aquilo que antigamente se tinha por verdade, hoje nem uma palavra é ainda
merecedora de crédito. Aquilo que era desprezado como profano, proibido, desprezível e
fatal -- todas essas "flores" agora crescem sobre os mais charmosos caminhos da verdade.
Na ordem política, o cristianismo também foi fundada sobre a verdade absoluta. Nós já
vimos, no capítulo anterior, que a principal forma de governo onde havia união com a
Verdade Cristã foi no Império Cristão Ortodoxo, onde a soberania estava atribuída a um
Monarca, onde a autoridade procedia dele para baixo, através de uma estrutura social
hierárquica. Veremos no próximo capítulo, por outro lado, como uma política que rejeita a
Verdade Cristã deve reconhecer "o povo" como soberano e entender a autoridade como
procedendo de baixo para cima, em uma sociedade formalmente "igualitária”. É claro que
um é a inversão perfeita do outro; pois são opostos em concepções tanto quanto sua origem
como também ao propósito. A Monarquia Cristã Ortodoxa é um governo divinamente
estabelecido, e orientado, em última instância, para o outro mundo; o governo com o
ensinamento da Verdade Cristã e a salvação das almas como o seu propósito mais profundo;
o governo Niilista - cujo nome mais adequado, como veremos, é a anarquia --- é o governo
estabelecido pelos homens, e dirigido exclusivamente a este mundo, governo que não tem
nenhum objetivo maior do que a felicidade terrena.
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"monarquias constitucionais", uma tentativa - mais uma vez - de se casar uma velha forma
com um novo conteúdo; hoje, os principais representantes da ideia Liberal são as
"repúblicas" e "democracias" da Europa Ocidental e América, grande parte dessas
preservam um equilíbrio bastante precário entre as forças de autoridade e de Revolução,
enquanto professando a acreditar em ambas.
Dessa forma um governo está seguro na medida em que tem Deus como seu fundamento e
Sua Vontade como guia; mas isso, com certeza, não é uma descrição de um governo Liberal.
Trata-se, na visão Liberal, do povo que governa, e não Deus; o próprio Deus é um "monarca
constitucional" cuja autoridade foi totalmente delegada ao povo e cuja função é inteiramente
cerimonial. O Liberal acredita em Deus com o mermo fervor retórico com o qual acredita
no Céu. O governo erguido sobre tal fé é pouco diferente, em princípio, de um governo
erigido sobre total descrença, e qualquer que seja seu resíduo presente de estabilidade, está
claramente apontado na direção da anarquia.
Um governo deve governar pela graça de Deus ou pela vontade do povo, deve acreditar em
autoridade ou Revolução; desta forma um acordo entre os dois só é possível na aparência, e
apenas por um tempo. A Revolução, assim como a descrença que sempre a acompanhava,
não pode ser interrompida no meio do caminho, é uma força que, uma vez despertada, não
vai descansar até que ela termine em um reino totalitário deste mundo. A história dos
últimos dois séculos tem provado isso. Apaziguar a Revolução e oferecendo concessões,
como os liberais sempre fizeram, mostra, assim, que eles não possuem uma verdade para se
opor, mas apenas para, talvez adiar, mas não impedir, a realização de seu fim. E se opor a
Revolução radical com outra Revolução, quer seja "conservadora", "não-violenta", ou
"espiritual", não é apenas revelar a ignorância de todo escopo e a natureza da Revolução de
nossos tempos, mas também admitir o primeiro princípio da Revolução: de que a velha
verdade não é mais verdade, e uma nova deve tomar o seu lugar. No próximo capítulo
desenvolveremos este ponto, definindo mais de perto o objetivo da Revolução.
Na visão de mundo Liberal, portanto, em sua teologia, ética e bem como em outras áreas
que não examianos -- a verdade tem sido enfraquecida, amolecida, comprometida; em todas
as esferas onde a verdade um dia foi absoluta, agora se tem menos certeza, isso caso não
tenha sido totalmente relativizada. Dessa forma é possível - e isto, de fato, representa uma
definição do projeto Liberal - preservar por um tempo os frutos de um sistema e uma
verdade da qual estão incertos e céticos; nada de positivo pode ser construído sobre tal
incerteza, nem sobre uma tentativas de torná-lo intelectualmente respeitável nas várias
doutrinas relativistas já examinadas. Não existe e não pode haver apologia filosófica para o
Liberalismo; suas apologias, quando não são simples retórica, são emocionais e
pragmática.Mas, o fato mais impressionante sobre o Liberal, para qualquer observador
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relativamente imparcial, não é tanto a inadequação de sua doutrina mas também o próprio
esquecimento dessa inadequação.
Os regimes totalitários Niilistas deste século comprometeram, como parte integrante de seus
programas, a "reeducação" impiedosa de seus povos. Poucos sujeitos a este processo
durante qualquer período de tempo, escaparam inteiramente de sua influência; em uma
paisagem onde o cenário é o pesadelo, o senso de realidade e verdade inevitavelmente sofre.
A "reeducação" sutil, mais humana em seus métodos, mas ainda assim Niilista em suas
consequências, tem sido praticada há algum tempo no mundo livre, e não há lugar mais
persistente ou eficaz do que seu centro intelectual, o mundo acadêmico. Aqui coerção
externa é substituída pela persuasão interna; um ceticismo mortal reina, escondido atrás dos
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restos de uma "herança cristã", na qual poucos acreditam, e muito menos com profunda
convicção. A profunda responsabilidade que o estudioso uma vez possuiu, a comunicação
da verdade, tem sido renegada; fingem "humildade" para esconder esse fato por trás de uma
conversa sofisticada sobre "os limites do conhecimento humano", mas é apenas outra
máscara do Niilismo que o acadêmico Liberal compartilha com os extremistas de nossos
dias. A juventude que -- até que seja "reeducada" no ambiente acadêmico -- ainda tem sede
de verdade, é ensinada em vez da verdade, a "história das ideias", ou então o interesse é
desviado para estudos "comparativos"; assim, o relativismo que permeia tudo, e o ceticismo
impresso nesses estudos é suficiente para acabar praticamente toda sede natural pela
verdade.
O mundo acadêmico tornou-se hoje, em grande parte, uma fonte de corrupção. É corruptor
ouvir ou ler as palavras dos homens que não acreditam na verdade. É ainda mais corruptor
receber, no lugar da verdade, mais aprendizado e erudição que, se forem apresentadas como
fins em si mesmos, não são mais que paródias da verdade da qual foram feitos para servir,
não são mais do que uma fachada que por trás da qual não há nenhuma substância. É,
infelizmente, corruptor até mesmo estar exposto à virtude primária que ainda resta no
mundo acadêmico. Pois a integridade serve, não a verdade, mas a uma erudição cética, e
assim seduz os todos homens de forma mais eficaz com o evangelho do subjetivismo e
incredulidade que esta erudição esconde. É corruptor, por fim, simplesmente viver e
trabalhar em um ambiente inteiramente permeado por uma falsa concepção de verdade,
onde a Verdade Cristã é vista como irrelevante para os problemas centrais acadêmicos, onde
mesmo aqueles que ainda acreditam nesta Verdade pode apenas esporadicamente fazer que
suas vozes sejam ouvidas acima do ceticismo promovido pelo sistema acadêmico. O mal, é
claro, reside principalmente no próprio sistema, que é fundamentado em inverdade, e apenas
incidentalmente nos muitos professores que este sistema permite e incentiva a pregar.
O Liberalismo é o primeiro estágio da dialética Niilista, tanto por sua fé ser vazia e porque
esse vazio coloca em reação ainda mais Niilista -- a reação que, ironicamente, proclama
ainda mais alto que o Liberalismo, seu "amor pela verdade", enquanto carrega a
humanidade um passo adiante no caminho do erro. Esta reação é o segundo estágio da
dialética Niilista: o Realismo.
"Nihilism: The Root of the Revolution of the Modern Age", Seraphim Rose
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