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Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da Vara no Ceará.

Ação Civil Pública 9019 /13


Ref Procedimento Administrativo 1.15.000.1548/2012-31

“Para vetar a construção de via paisagística no Cocó, o prefeito


Roberto Cláudio (PSB) considerou as muitas indefinições sobre a Área
de Relevante Interesse Ecológico (Arie) das Dunas do Cocó e a
demarcação do Parque. Entendimento bastante razoável. Diante da
complicação que já existe, não faz sentido criar ainda mais problema,
mais motivo para confusão. Nesse cenário, a prudência é o
comportamento mais lógico. O ilógico nessa história toda é,
justamente, que a região do Cocó seja motivo de tantos conflitos,
indefinições, impasses, embates e tentativas de destruí-lo. O que ali
resta de área preservada é hoje o maior tesouro de que Fortaleza
dispõe. O local já foi destruído demais. Não é mais tolerável que a
devastação continue a avançar. O fenômeno é recente, mas cada vez
mais gente começa a se dar conta da importância inegociável daquele
pedaço ainda verde da cidade.”

(coluna Política do Jornal O POVO, 01 de maio de 2013, Jornalista


Érico Firmo)

O Ministério Público Federal, pelos Procuradores da


República alfim assinados, comparece à presença de Vossa Excelência para propor a
presente Ação Civil Pública contra a UNIÃO, o IBAMA, a SEMACE e o Município
de Fortaleza e , expondo e, ao final, requerendo o que se segue:1

1
Endereços para citação dos demandados: União : Rua Guilherme Rocha, Nº 1342 - - Centro - Fortaleza - CE -
Cep. 60030-141; IBAMA: Av. Visconde do Rio Branco, Nº 3900 Bairro de Fátima 60055-172 Fortaleza – CE;
SEMACE: R. Jaime Benévolo, 1400 - Fátima Fortaleza - CE, 60050-081 e PGM: Avenida Santos Dumont, 5335,
11 s 1117. Papicu. Fortaleza/CE. CEP 60175-047.

Rua João Brígido, 1260 - Joaquim Távora - CEP: 60135-080 - Fortaleza/CE – Tel.: 3 266.73.00 - www.prce.mpf.gov.br
MPF - Procuradoria da República no Estado do Ceará

1 – No seio de procedimentos administrativos que tramitam no âmbito do Ministério


Público Federal, detectou-se sérias irregularidades, no que tange a questões de natureza
ambiental e patrimonial, relacionadas com a construção de empreendimentos imobiliários
nas imediações da área proposta para a criação futura e definitiva do denominado “Parque
do Cocó”, na cidade de Fortaleza.

2. De posse das informações técnicas que atestam tais situações, o Parquet efetivou
diversas Recomendações ao IBAMA, a fim de que este órgão efetivasse embargos
administrativos, com supedâneo no princípio da precaução de danos ambientais, em várias
interferências na área e em algumas áreas contíguas.

3. Entende o MPF que a referida área urbana, uma das mais nobres de Fortaleza e que, em
face desta peculiaridade, sofre enormes pressões por parte da especulação imobiliária,
precisa de uma urgente e firme intervenção estatal, da União, do Município de Fortaleza e
dos órgãos ambientais, no sentido de preservar seus atributos ambientais e de implementar
uma adequada gestão, a partir da exata definição de sua titularidade patrimonial.

4. Em face desse cenário, a presente demanda tem por objetivo a obtenção de provimentos
jurisdicionais que imponha à administração pública, nas suas respectivas esferas de
competência, a obrigação de implementar, com fundamento no princípio da precaução,
instrumentos de concretização do direito fundamental à proteção ambiental e à preservação
do patrimônio público, presente na titularização de bens sob domínio da União, medidas
que consigam conter a apropriação indevida destes espaços, de interesse ou de titularidade
pública, por particulares, o que vem resultando, na verdade, numa acelerada degradação
ambiental de uma área que, em futuro próximo - se persistirem estes comportamentos
violadores, que tendem a se agravar pela ganância especulativa -, não terá mais nenhuma
utilidade para a sociedade de Fortaleza.

DO “PARQUE DO COCÓ”

5.A imprensa local, em uma série de reportagens, tem chamado a atenção da sociedade

cearense sobre o acelerado processo de devastação, patrocinado pela especulação

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imobiliária, de um importante ecossistema encravado em uma das áreas urbanas mais

nobres de Fortaleza. Concluem os jornais da cidade que é cada vez mais urgente uma

mobilização efetiva da sociedade para salvar este espaço, evitando-se assim sua “morte

anunciada”.

6.O teor das reportagens pode fazer a sociedade pensar que as situações ali estabelecidas -
construções de grandes complexos residenciais - contam com a conivência, ou no mínimo
com a omissão do poder público, sobretudo do Ministério Público. Todavia, esta conclusão
é apenas parcialmente correta. Com efeito, a grande verdade é outra e se revela até
chocante, pois, o que hoje notoriamente é conhecido como Parque do Cocó, juridicamente
não existe.

7.Um Parque, sob a perspectiva estritamente jurídica, é uma unidade de conservação, um


espaço especialmente protegido, visando manter a integridade dos atributos ambientais que
justifiquem sua proteção. Estes espaços, diz a Constituição Federal, devem ser criados por
lei ou por ato do executivo (Decreto). Segundo a Lei Federal 9.985/2000, o Parque é uma
unidade de conservação de proteção integral, onde somente podem ser realizadas pesquisas
científicas e atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com
a natureza e de turismo ecológico, sendo públicos a posse e o domínio destas áreas,
devendo a dominialidade privada incluída em seus limites ser desapropriada.

8.Não existe, em verdade, nenhum ato formal de criação do Parque do Cocó enquanto
unidade de conservação. O que existe são apenas decretos do executivo estadual
estabelecendo a provável área de futuras desapropriações para sua implantação efetiva. A
própria SEMACE, em seu sitio oficial na internet, diz que esta área ainda “está em processo
de adequação” à legislação federal acima citada.

9.Portanto, há uma omissão dos poderes executivo e legislativo, estadual e municipal, que
não criam, definitiva e juridicamente, o tão famoso Parque. Se já o tivessem feito, toda a
sociedade e o poder público - principalmente o Ministério Público e os órgãos ambientais -
poderiam atuar, exigindo o cumprimento da legislação vigente e impedindo a atuação
devastadora da iniciativa privada.

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10.Não se pense, no entanto, que o fato do Parque não ter sido formalmente criado
possibilita a apropriação de toda sua extensão, uma vez que ali se pode localizar diversas
áreas de preservação permanente (tipo de vegetação, dunas fixas, margens do rio,
manguezais, etc.), ou públicas, (principalmente terrenos de marinha) que tornam aquele
espaço suscetível de reduzido aproveitamento econômico privado, o que facilita
demasiadamente a realização das desapropriações necessárias, sem o pagamento de
significativas indenizações.

11.Uma medida administrativa concreta e eficaz seria a demarcação física da área que um
dia se transformará em Parque, o que, até hoje, não aconteceu. A par disso, torna-se
necessária a identificação de todas as Áreas de Preservação Permanente existentes naquele
perímetro e em seu entorno, a definição de sua zona de amortecimento e respectivas formas
de utilização, bem como a especificação de toda a titularidade pública (terrenos de marinha,
por exemplo) existente na região.

12.Assim, observa-se que com um pouco de vontade política e administrativa, é possível


criar, verdadeiramente, o Parque do Cocó, conferindo-lhe definitivamente a indispensável
proteção. No entanto, sem a criação desses instrumentos tudo ficará apenas na publicidade,
enquanto a iniciativa privada avança ferozmente sobre o verde, sob os olhares atônitos da
sociedade e, infelizmente, coniventes, do Poder Público.

13. A omissão do poder público criou uma situação inusitada. O Governo do Estado do
Ceará, muito embora tenha expedido dois Decretos em 1989, para as devidas
desapropriações na área destinada à implantação do Parque, até a presente não concretizou
nenhuma destas desapropriações, em que pese defender, através de sua atuação ambiental, a
área em referência, restringindo sua utilização. Em face desta singular situação, vários
particulares que alegam possuir a titularidade do domínio (pleno ou somente útil) de parte
dessa área, ingressaram com ações contra o Estado do Ceará alegando que foram
indiretamente desapropriados, exigindo no Judiciário indenizações estimadas em valores
absurdos, considerando-se que as possibilidades de utilização desses imóveis, em face das
restrições ambientais ali existentes, são mínimas.

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14.Ademais, importante frisar, que, não se tem conhecimento de qualquer atuação


administrativa por parte do Estado do Ceará, no sentido de criar, efetivamente, o tão
decantado Parque. Parece ser mais conveniente para o governo estadual manter as restrições
de uso, fazendo de conta que existe uma unidade de conservação, ao invés de despender os
necessários recursos públicos na criação definitiva do parque.

15.Assim, enquanto a sociedade acredita, pela publicidade oficial desencadeada ao longo


destes anos, que a cidade de Fortaleza conta, efetivamente, com uma unidade de
conservação que tem por objetivo preservar uma de suas paisagens e ricos ecossistemas
mais exuberantes, o governo estadual faz de conta que o parque foi implantado. Nesse
desencontro entre a sociedade e o governo, a iniciativa privada vai se apropriando das zonas
mais nobres que estão localizadas no limite da área destinada à desapropriação e, sem mais,
vai erguendo edificações luxuosas que já exercem uma pressão significativa nos
ecossistemas que, futuramente, poderão vir a ser incluídos na definição da unidade de
conservação a ser ali instalada.

16.Segundo informações extraídas do próprio endereço eletrônico da SEMACE na rede


mundial de computadores, a situação do Parque do Cocó, atualmente, é a seguinte:

1.APRESENTAÇÃO
O Rio Cocó faz parte da bacia dos rios do litoral leste cearense, tendo sua
bacia hidrográfica uma área de aproximadamente 485 km² , com um
comprimento total do rio principal de cerca de 50 km. A preservação do
ambiente natural da área de influência do Rio Cocó, sempre foi o objetivo de
grupos da sociedade civil e de governos estaduais e municipais,
principalmente seu trecho inserido no Município de Fortaleza. Dessa forma,
o governo estadual através do DECRETO Nº 20.253, de 05 de Setembro de
1989 declarou de interesse social para fins de desapropriação as áreas de
terra que indica compreendidas no contorno do Projeto do Parque Ecológico
do Cocó e do DECRETO N° 22.587, 08 de Junho de 1993, declarou de
interesse social, para fins de desapropriação, as áreas destinadas a ampliação
do Parque Ecológico do Cocó.

A área do Parque Ecológico do Cocó abrangida pelos decretos compreende o


trecho da BR-116 à foz do Rio Cocó, localizado no Município de Fortaleza,
Estado do Ceará, perfazendo um total de 1.155,2 hectares . O Parque
Ecológico do Cocó está em processo de adequação ao Sistema Nacional de

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Unidades de Conservação – SNUC, Lei Federal n° 9985, de 18 de julho de


2000, com proposta de denominação de Parque Estadual do Cocó.

2. JUSTIFICATIVA DE CRIAÇÃO. Proteger e conservar os recursos


naturais existentes, de forma a recuperar e manter o equilíbrio ecológico
necessário à preservação da biota terrestre e aquática e propiciar condições
para atividades de educação, recreação, turismo ecológico e pesquisa
científica. A criação do parque também objetiva proporcionar o contato
direto da população com o ambiente natural, envolvendo-a nas suas ações de
preservação e controle, despertando o espírito conservacionista das
populações ribeirinhas.

3. CARACTERÍSTICAS GERAIS . O Rio Cocó nasce na vertente oriental


da Serra da Aratanha e nos seus 50 km de percurso passa por três
municípios, Pacatuba, Maracanaú e Fortaleza, para desaguar no Oceano
Atlântico, nos limites das praias do Caça e Pesca e Sabiaguaba. A área do
parque está inserida apenas no Município de Fortaleza e inclui as áreas de
maior fragilidade do ponto de vista ambiental. No parque podemos
identificar várias unidades geoambientais, tais como: planície litorânea,
planície flúvio-marinha e superfície dos tabuleiros litorâneo. A planície
litorânea está caracterizada por duas feições geomorfológicas distintas, mas
intrinsecamente relacionadas: as praias e as dunas fixas e móveis. A planície
flúvio-marinha, ocupa desde os trechos do rio localizados na BR-116 até a
sua foz, onde forma um estuário. Nessas áreas, pelas condições adversas,
com alta salinidade da água e do solo, níveis muito baixos de oxigênio no
solo, freqüentes inundações pela maré alta, as espécies vegetais mais
dominantes são os mangues Rhizophora mangle L, Avicenia Schaveriana
Stapf. e Leech, e Laguncularia racemosa.
O manguezal do Rio Cocó em seus trechos preservados formam uma mata
de mangues de rara beleza, situado no coração de Fortaleza onde várias
espécies de moluscos, crustáceos, peixes, répteis, aves e mamíferos
compõem cadeias alimentares com ambientes propícios para reprodução,
desova, crescimento e abrigo natural.

4. PLANTAS E MAPAS. Mosaico de fotografias aéreas, mapas e plantas.

5. ATIVIDADES PROIBIDAS • Na zona de amortecimento a implantação


ou ampliação de quaisquer tipos de construção civil sem o devido
licenciamento ambiental • Supressão de vegetação e uso do fogo •
Atividades que possam poluir ou degradar o recurso hídrico, como também o
despejo de efluentes, resíduos sólidos ou detritos capazes de provocar danos
ao meio ambiente; • Tráfego de veículos no interior do parque • Intervenção
em áreas de preservação permanente, como: margens do rio, campo de dunas
e demais áreas que possuem restrições de uso • Pesca predatória; • Uso de
veículos náuticos motorizados, salvo para fins de interesse público • Demais
atividades danosas previstas na legislação ambiental.

6. PROBLEMAS AMBIENTAIS • Ações judiciais contra o Estado do


Ceará requerendo indenizações em função dos decretos de desapropriação •
Ocupações irregulares e invasões em área de preservação permanente •

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Projeto de construção da ponte sobre o Rio Cocó • Disposição de resíduos


sólidos • Estações de Tratamento de Esgoto da Lagoa da Zeza, Lagamar e
Dendê e lagoa de estabilização do Tancredo Neves • Lançamento de
efluentes de ligações clandestinas

7. ADMINISTRADOR(A) Gerente do Parque Ecológico do Cocó: Maria


Lucilene Maranhão Garcêz Formação Profissional: Geógrafa - Esp. Turismo
e Meio Ambiente E-mail: lucilene@semace.ce.gov.br Telefone: (85)
3101.5550 / 3101.5548 Disque Natureza: 0800 85 22 33

8. LAZER O Parque possui três áreas disponíveis para atividades de lazer,


esporte e cultura. • Parque Ecológico do Cocó: área urbanizada com
anfiteatro, quadras esportivas, pistas para Cooper, dois parques infantis;
promoção de shows e eventos, competições esportivas e educação ambiental
• Parque Adhail Barreto: área administrada pela Prefeitura Municipal de
Fortaleza, com Núcleo de Conscientização ambiental, playground ,
promoção de eventos culturais e artísticos, bem como educação ambiental,
pista de Cooper e trilha ecológica • Área urbanizada do Tancredo Neves:
Após remoção de famílias em áreas do parque, o governo do estado
implantou na área, duas quadras esportivas, campos de futebol, pistas para
Cooper, ciclovias, praças e áreas de brinquedos

9. PARCERIAS • Câmara Técnica do Cocó, criada pela Resolução


COEMA n° 08/2003 , em 27/03/2003 • Companhia de Polícia Militar
Ambiental – CPMA • Prefeitura Municipal de Fortaleza
• Empresa PARQUI - Paisagismo e Arquitetura Ltda. contratada para
desenvolver serviços de manutenção do Parque • Associações Comunitárias
• Comitê Gestor da Sociedade Civil do Cocó

10. ATIVIDADES 10.1 Permanentes

•Monitoramento e Fiscalizações semanais


• Monitoramento de 07 pontos de degradação do rio Cocó, da nasente a foz,
incluindo os principais contribuintes • Acompanhamento dos serviços de
recuperação, conservação e manutenção do Parque • Licenciamento
ambiental, nas áreas de amortecimento do Parque • Realização de campanhas
educativas/informativas junto às escolas, comunidades locais e população
flutuante
• Palestras educativas nas escolas e associações comunitárias localizadas nas
áreas adjacentes do Parque.

10.2 Realizadas em 2003 / 2004 / 2005 • Elaboração do Documento


“Proposta de Proteção, Conservação e Recuperação do Rio Cocó •
Campanhas Educativas: Abertura da Semana Nacional da Árvore, Dia
Nacional do Meio Ambiente e Dia Nacional de Limpeza de Praias, Rios,
Lagos e Lagoas • Limpeza do Rio Cocó em parceria com a Prefeitura
Municipal de Fortaleza e o DERT • Reuniões da Câmara Técnica do Cocó •
Sinalização das trilhas ecológicas • Delimitação “in loco” da área do Parque
Estadual do Cocó • Obras de recuperação dos passeios • Lançamento do
Projeto Domingo no Parque • Projeto de revitalização do rio Cocó •

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Repovoamento do estuário • Implantação de um laboratório de larvicultura


•Recomposição vegetal de algumas áreas do manguezal e mata ciliar.

10.3 Programadas para 2006


• Intensificação do Projeto Domingo no Parque
• Criação oficial do Parque Estadual do Cocó
• Campanhas Educativas: Semana Nacional da Árvore, Dia Nacional do
Meio Ambiente e Dia Nacional de Limpeza de Praias, Rios, Lagos e Lagoas
• Construção de um centro de Referência Ambiental
• Implantação de infra estrutura de apoio, através de obras de saneamento
(sanitários públicos), e ações turísticas de lazer
• Revitalização do anfiteatro e a sinalização ambiental e turística da área
urbanizada
• Intensificação do processo de recomposição vegetal das áreas do
manguezal e mata ciliar.

17. Desta forma, pelo que restou exposto, o Parque do Cocó ainda não existe,
juridicamente, como unidade de conservação. Para que isto efetivamente ocorra, algum
legitimado para efetivar sua criação deverá formalizar o ato criador (Lei ou Decreto),
primeiramente delimitando a área respectiva e, após esta delimitação, regulando as formas
de utilização da nova unidade de conservação criada.

18.Quando isto for, de fato, realizado, o parque estará legalmente criado e passará a ser
qualificado, sob uma perspectiva estritamente jurídica, como unidade de conservação, um
espaço especialmente protegido, visando manter a integridade dos atributos ambientais que
justifiquem sua proteção.

19. Com o objetivo de definir, de uma vez por todas, a área ideal para delimitação do futuro
Parque do Cocó, bem como o tipo de unidade de conservação mais adequado para a
proteção efetiva dos ecossistemas compreendidos na sua definição territorial, o Governador
do Estado do Ceará resolveu solicitar ao Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente
– CONPAM – a realização de profundo estudo técnico capaz de subsidiar a criação
definitiva do multicitado Parque do Cocó. Este estudo foi efetivamente realizado e, uma vez
concluído, encaminhado ao Governador que, até a presente data não tomou nenhuma
providência administrativa para sua utilização. Analisaremos, em seguida, as atividades
desenvolvidas pelo GT do Rio Cocó do CONPAM.

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OS ESTUDOS TÉCNICOS DO CONPAM PARA A DELIMITAÇÃO DA NOVA


POLIGONAL DO PARQUE DO COCÓ

20. Em 19 de abril de 2007 foi realizada a primeira reunião, no CONPAM, do GT do Rio


Cocó. Este GT teve como integrantes o IBAMA, a Secretaria de Infraestrutura do Estado do
Ceará - SEINFRA, a Secretaria das Cidades do Estado do Ceará, a então Gerência Regional
do Patrimônio da União - GRPU, hoje Superintendência do Patrimônio da União - SPU, a
SEMACE, a Secretaria de Turismo do Estado do Ceará - SETUR e o CONPAM, tendo este
último órgão atuado na coordenação dos trabalhos.

21. Nesta primeira reunião, consta da ATA a seguinte manifestação da Dra. Lúcia Teixeira,
Procuradora do Estado e na ocasião superintendente da SEMACE: “foi lavantado pela
Dra. Lúcia que aproximadamente 90% dos terrenos do parque sofrem a influência
das marés e portanto são considerados terrenos de marinha - “são bens imóveis de
propriedade da União...”como consta do documento “Proposta de Proteção.
Conservação e Recuperação do Rio Cocó”realizado no ano de 2003 pela SEMACE – o
que determina a impossibilidade de direito à indenização.” Em seguida, deliberou-se
que o CONPAM deveria oficiar solicitando a PGE (Procuradoria Geral do Estado) que
fosse encaminhado junto a GRPU o levantamento dos terrenos quanto a dominialidade.

22. Percebe-se, assim, que, desde a primeira sessão do GT do Rio Cocó, surgiu a
preocupação com a definição da dominialidade dos imóveis compreendidos na área
destinada à futura implantação do Parque do Cocó, isto porque o Governo do Estado
sempre argumentou que para a efetiva implantação do Parque deveriam ser
empregados vultosos recursos públicos para o pagamento das indenizações. Contudo,
em se tratando de bens da União, caberia ao Estado apenas indenizar, se fosse o caso,
as benfeitorias decorrentes do exercício do domínio direto de tais bens, o que tornaria
muito menos dispendiosa a implantação da futura unidade de conservação.

23. Na quarta reunião do GT do Rio Cocó, ocorrida em 15 de junho de 2007, deliberou-se


por solicitar à GRPU a concessão, ao Estado do Ceará, do domínio pleno dos terrenos de
marinha da área do parque, através de um dos mecanismos legais existentes para isso
( aforamento, enfiteuse, etc). Definiu-se, ainda, ser de suma importância delimitar as Áreas

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de Preservação Permanente (APP) do Rio Cocó, estender os estudos do GT até a foz do Rio
Cocó e realizar um levantamento dos empreendimentos licenciados na área do parque e os
que estão georreferenciados. Por fim, decidiu o GT que para definir o parque, sob o ponto
de vista jurídico, haveria necessidade de rever o acervo existente sobre o rio Cocó, sendo
sugerido que fosse solicitado da GRPU a LPM (linha de preamar média) para se verificar se
existiam áreas privadas, sendo ainda essencial definir se o parque deveria ser delimitado
pelas APP`s do rio e onde houvesse vegetação de mangue.

24. Evidencia-se, assim, que o GT, desde o início, concluiu ser indispensável para a efetiva
criação do Parque do Cocó a definição de dois elementos essenciais: 1) a definição de todas
as Áreas de Preservação Permanente (APPs); e, 2) dos terrenos de marinha. Definidas as
APP`s e os terrenos de marinha, o que restasse seria propriedade privada passível de
indenização decorrente de desapropriações necessárias para a criação de uma unidade de
conservação de proteção integral. Desta forma, definindo bem a dominialidade pública, as
APPs e a dominialidade privada se teria uma ideia do custo necessário a ser assumido pelo
ente criador do Parque, a título de pagamento das desapropriações devidas.

25. Ainda na quarta reunião, em 15 de junho de 2007, o GT começou a discutir qual o tipo
de unidade de conservação que melhor se adequaria às condições da área proposta para
proteção, em razão dos aspectos locacionais, legais e culturais. Nesta mesma ocasião, de
acordo com as memórias extraídas das atas de reunião, já concluía o GT pela necessidade
de criação de “mosaicos” entre as distintas unidades de conservação e de “corredores
ecológicos” para facilitar o convívio entre ecossistemas que poderiam ser seccionados.

26. Na quinta reunião do GT, realizada em 22 de junho de 2007, surge a primeira minuta de
Decreto de criação da nova unidade de conservação, a ser qualificada como Parque do
Cocó.

27. A sexta reunião do GT, em 29 de junho de 2007, foram propostos encaminhamentos


interessantes. Criou um GTzinho V - com a participação da SEINF (Secretaria de
Infraestrutura do Município de Fortaleza) - para iniciar estudos destinados à elaboração do
Termo de Referência do Concurso Público para o Projeto Executivo da Via Paisagística e
de Contenção que fará a delimitação do parque. Mencionada via deverá ser traçada,
segundo a proposta, aproveitando as vias existentes, no que for possível, e procurando

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sempre minimizar os impactos sócio-ambientais e de acordo com as disposições do Plano


Diretor do Município de Fortaleza, sendo importante a atualização do trabalho da SEDURB
sobre os acessos ao parque e, ainda, decidiu considerar, como referência inicial, a faixa de
2ª categoria definida pela SEDURB, como área de amortecimento do parque. Ademais,
nesta ocasião o GT resolveu que deveria ser elaborado um Plano Diretor específico para o
Parque do Cocó, o levantamento das áreas passíveis de recuperação e a demarcação física
das Áreas de Preservação Permanente.

28. Após ampla discussões em mais quatro reuniões, resolveu o GT apresentar a sua
proposta final de delimitação da nova poligonal do Parque do Cocó a ser criado por ato do
Governo do Estado. A primeira conclusão do GT foi sobre o tipo de unidade de
conservação a ser criada. Neste particular, decidiu-se pela criação de uma unidade de
conservação de proteção integral, de tipologia Parque, que deveria ter, inclusive, uma zona
de amortecimento. A partir desta decisão se construiu a nova poligonal.

29. Portanto, todos os estudos técnicos necessários para definir o tipo de unidade de
conservação e para delimitar a área que deve abrigá-la foram efetivamente concluídos,
tendo o CONPAM encaminhado estes estudos ao Governo do Estado, por duas razões: 1º)
foi o próprio Governador do Estado que determinou a realização destes estudos; e, 2º)
detém o Governador competência para criar a unidade de conservação, através de decreto.

30. Desse modo, tendo sido produzida pelo Governo do Estado do Ceará, através do
CONPAM, a fundamentação técnica necessária para a criação efetiva do Parque do Cocó, o
ato de criação envolve juízos de conveniência e oportunidade que estão compreendidos na
competência do Governador. Isto significa que o Governador do Estado deve fazer um juízo
de ponderação sobre o momento adequado da criação do Parque, podendo até mesmo
dcidir, no livre exercício de sua competência exclusiva, por não criá-lo. No entanto, se
decidir criar o parque deverá oferecer, no ato de criação, uma fundamentação técnica
razoável que justifique o tipo de unidade de conservação a ser criada e seus limites
territoriais.

31. Nesta perspectiva, caso o Governador do Estado decida não criar o Parque, outros atores
poderão fazê-lo. O Prefeito de Fortaleza poderá fazê-lo por Decreto, ao passo que a
Assembléia Legislativa do Ceará e a Câmara Municipal de Fortaleza poderão fazê-lo por

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Lei ordinária. No entanto, nenhum destes legitimados para a criação de unidades de


conservação podera fazê-lo sem uma justificativa razoável capaz de dar sustentação técnica
e jurídica ao ato de criação. A decisão sobre a criação ou não de uma unidade de
conservação é de natureza política. Todavia, decidida a criação, esgota-se o juízo político e
o ato criador passa a exigir uma fundamentação técnica. Neste sentido dispõe a Lei
9.985/2000.
Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder
Público.

§ 2o A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de


estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a
localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade,
conforme se dispuser em regulamento.

32. Embora a etapa técnica de elaboração de estudos tenha sido concluída em 2008, até o
presente nada foi feito, em termos de decisão política, para criar definitivamente o Parque
do Cocó.

33. Sem a criação jurídica e definitiva do Parque, a fiscalização empreendida pela


SEMACE ainda trabalha nos dias atuais com a delimitação realizada pelos decretos
editados em 1989 e 1993, que se destinavam a definir as desapropriações necessárias para a
implantação do Parque, os quais já perderam validade. Por estes decretos, a área total do
futuro Parque seria de 1.040 hectares. A nova poligonal estabelecida pelo GT do CONPAM
acresce 266 hectares a área total definida nos citados decretos.

34. Em 14 de março de 2013, o Presidente do CONPAM, Paulo Henrique Lustosa, afirmou


ao Jornal O POVO que a missão do Governo do Estado do Ceará “ é deixar o Parque do
Cocó criado até o fim da gestão do Governador Cid Gomes”. Ainda segundo Lustosa “é
possível encontrar uma solução viável para que, até o fim de 2014, a área seja
oficialmente delimitada, com uma área maior que a demarcada atualmente”,
esclarecendo, ainda, que a meta do governo é “que tenhamos uma área
significativamente maior que a determinada pelos decretos de 1989 e 1993”.

35. A imagem a seguir demonstra a delimitação feita pelos decretos de 1989 e 1993, para a
futura implantação do Parque do Cocó, compreendendo 1.046,22 hectares.

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36. A figura abaixo mostra a nova proposta de poligonal feita pelo CONPAM,
compreendendo 1.312,30 hectares. Valendo salientar que esta nova definição realizada pelo
CONPAM foi amplamente exposta à sociedade antes de ser encaminhada, como definitiva,
ao Governo do Estado. Assim, abriu-se a oportunidade de contestação sobre a poligonal
nova, contudo, não houve qualquer consideração em contrário. Em geral, como era de se
esperar, a sociedade aceitou como adequada esta nova proposta, mesmo porque decorrente
de profundo estudo sobre a região, com a utilização de modernos equipamentos e
compilação de diversos estudos já produzidos sobre a situação passada, presente e futura de
toda a extensão do Rio Cocó.

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37. Comparando as duas imagens, percebe-se, nitidamente, que os estudos realizados pelo
CONPAM levaram em consideração, para o desenho da nova poligonal, a realidade atual de
ocupações em toda a área e entorno da delimitação feita pelos Decretos de 1989 e 1993.
Desta feita, pode-se ver que a nova poligonal é, às vezes e em alguns trechos, coincidente
com a poligonal antiga, em outros trechos, a nova é mais protetiva, portanto maior que a
antiga e, em outros trechos, a nova poligonal é menor que a anterior, neste último caso tal
situação acontece porque, como dito, ocupações hoje existentes e já consolidadas não
permitem o alcance da nova poligonal.

38. A próxima figura demonstra o confronto das duas poligonais, evidenciando seus pontos
comuns e divergentes, deixando claro ao observador que, mesmo tendo ocorrido acréscimo
total de área na nova poligonal sugerida pelo CONPAM, em alguns trechos esta divergência
ocorre para menos, com o objetivo de preservar a situação atual já consolidada.

39. Resta claro, portanto, que o exaustivo trabalho técnico de delimitação da nova poligonal
realizado pelo CONPAM oferece um conforto técnico ao Governador para a criação do

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Parque, tendo em vista que tal estudo é, ao mesmo tempo: 1) dotado de total cientificidade,
vez que elaborado por técnicos especialistas na matéria, vinculados a diversos órgãos e
entidades do setor público, nas esferas federal, estadual e municipal; 2) atual, ou seja,
realizado sobre uma situação dos dias de hoje, com respeito às edificações já existentes em
uma área extremamente adensada da cidade e com equipamentos urbanos, públicos e
privados, já consolidados; e, 3) dotado de uma preocupação principal que salta aos olhos:
preservar os ecossistemas que ainda cumprem funções ambientais importantes dentro da
área estudada, em face de seu valor natural ou paisagístico, sem a pretensão de criar uma
proteção exagerada, vale dizer, sem a correspondente visualização de um benefício coletivo
imediato.

40. Sem dúvida, a proposta formulada pelo CONPAM de nova poligonal para a
implantação do Parque do Cocó é, ao mesmo tempo, técnica, atual e viável, tanto sob a
perspectiva ambiental como urbanística. Consolida diversos estudos sobre a área destinada
a implantação futura do Parque do Cocó e é apta a ser utilizada por qualquer legitimado a
criar o Parque ( executivo ou legislativo, estadual ou municipal) como fundamentação
técnica da iniciativa política de criação. Pode-se afirmar, com segurança, que a proposta do
CONPAM encaminhada ao Governador desenha completamente aquilo que deverá ser, um
dia, o tão almejado “Parque do Cocó”.

41. Para chegar a este resultado, o CONPAM fez questão de destacar os principais
problemas hoje vivenciados na área proposta para definição da nova poligonal do Parque,
que são os seguintes:

c) Poluição hídrica: lançamento de efluentes urbanos, domésticos e industriais,


especialmente através do lançamento de esgoto domiciliar clandestino na rede
de drenagem pluvial;
ci) Perda de habitat (manguezais, mata ciliares, matas de dunas e de tabuleiro)
dentro do parque (expansão urbana, salinas abandonadas, queimadas e
retirada de madeira para carvoarias) e no entorno (aterros com alteração do
relevo e construções);
cii) Alterações na dinâmica fluvio-marinha por aterros para edificações e
construções de vias de acesso, limitando a área de influência natural das marés,
com alterações na drenagem e salinidade do sistema;

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ciii) Estrangulamento da vegetação de manguezal, limitando a circulação de


fauna e prejudicando ainda mais as trocas de fluxos energéticos entre o sistema
flúvio-marinho e o sistema do lagamar.

42. Vê-se, pois, que há urgência na criação do Parque do Cocó como unidade de
conservação de proteção integral. Como sustenta o GT do CONPAM que estudou
profundamente a área proposta para a nova poligonal, os expedientes de degradação
avançam e se consolidam com extrema rapidez, fazendo com que ecossistemas relevantes
sofram danos ambientais muitas vezes irreversíveis, como ocorre com a supressão de
vegetação de dunas, mangues e matas ciliares. Essa gradativa e perene perda da qualidade
ambiental dos ecossistemas da área proposta para receber o Parque é muito interessante
para a iniciativa privada, pois lhe confere o discurso do fato consumado, pela
impossibilidade, em muitos casos, de regeneração natural destes ecossistemas degradados.
A lógica perversa posta em prática parece óbvia: degradar para depois ocupar, podendo
assim auferir os enormes lucros da especulação imobiliária.

43. Tudo isso já foi detectado pelo CONPAM, tendo o GT, inclusive, desmembrado a área
da nova poligonal em sete zonas de intervenção, estudado os probemas específicos de cada
região e proposto as medidas que devem ser executadas com a criação do Parque, para
recuperar e preservar seus ecossistemas relevantes.

44. Sem embargo, mesmo com todos os estudos técnicos já produzidos, bem assim com a
constatação inequívoca de que a área proposta carece de ser preservada, que isto correponde
ao anseio de toda a sociedade cearense, mormente a de Fortaleza, os poderes executivo e
legislativo, estadual e municipal permanecem inertes, como se nada fosse possível fazer,
sem coibir os expedientes de degradação acima descritos e, mais grave, propondo
intervenções para a área que deve ser protegida, como vimos recentemente com a aprovação
do projeto de construção da nova ponte estaiada sobre a respectiva área proposta para
receber o Parque.

45. Todo este quadro de inércia estatal incentiva a iniciativa privada que, usando de
artimanhas, consegue avançar sobre as áreas protegidas. Inicialmente degradando-as
(colocação de lixo, realização de aterros, disposição de entulhos, desmatamentos,
queimadas, despejos de esgotos não tratados, etc) para depois ocupá-las. Muitas vezes

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contam até com a conivência do poder público, como ocorreu recentemente quando a
Procuradoria Geral do Município de Fortaleza firmou um termo de ajustamento de conduta
com uma associação de empresários que, mediante pagamento de cerca de 600 mil reais,
ganhou, da Prefeitura de Fortaleza, no final do mandato da gestão anterior (dezembro de
2012) o reconhecimento de que poderiam ser realizadas intervenções (construção de
condomínio) na área de dunas vegetadas, consoante amplamente noticiado na imprensa
local.

46. Também recentemente a imprensa local noticiou que uma área foi degradada dentro das
duas propostas de poliginal (a antiga e a nova) por uma pessoa que integra o primeiro
escalão da administração estadual e que já teriam sido propostas, pelo Ministério Público
Estadual, ações cíveis e criminais pelo dano ambiental verificado, consistente em
desmatamento e aterramento de áreas de preservação permanente, principalmente de
nascentes d'água. Neste caso, a área continua degradada e sendo constantemente aterrada de
forma ilegal, enquanto o Governo do Estado insiste em afirmar, em coro com o
empresário/secretário de governo, que tais intervenções estão fora das poligonais, quando,
na verdade, estão, sim, incluídas em ambas, na antiga e na nova proposta de delimitação do
Parque, como demonstram as figuras acostadas nesta peça processual.

47. Por tudo isso é que a sociedade não acredita mais na boa vontade política para a criação
do Parque do Cocó. Embora o Governo do Estado venha repetindo, sistematicamente, que
vai criá-lo, desde 2008 o estudo do CONPAM dorme nas gavetas do gabinete do
Governador. Nada foi efetivamente realizado no sentido de conferir concretude a esta nova
proposta de delimitação da área, desta feita embasada em relevantes estudos técnicos mais
aprofundados e atuais. Nada além de promessas, palavras que não se confirmam, gerando
uma situação que permite a cada dia novos expedientes de ataque aos ecossistemas ainda
íntegros da região do cocó.

48. Sem dúvidas estamos na iminência de constatarmos, com espanto, que os estudos
realizados pelo CONPAM não passaram, para o próprio governo que os encomendou, de
um mero espediente para ganhar tempo e adiar indefinidamente a tão almejada criação do
Parque. Em face dessa realidade inconteste, a única opção é buscar a intervenção judicial
adequada, capaz de preservar a integridade dos ecossistemas ainda existentes na região
mencionada, até que haja vontade política de concretizar a nova poligonal proposta.

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49. Todavia, para que não mais subsistam motivos absurdos para, através de uma atuação
política, se justificar a inércia na criação definitiva do Parque e a proteção imediata de seus
ecossistemas, necessário que sejam adotadas, de imediato, três providências cruciais: 1) a
imediata paralisação de novos licenciamento ambientais, prévios e de instalação, para
empreendimentos públicos e privados na área definida pelo CONPAM para a criação do
Parque; 2) a delimitação de toda a dominialidade da União, principalmente de terrenos de
marinha e seus acrescidos, para a definição exata da dominialidade pública na região
definida pelo CONPAM; e, 3) a delimitação inequívoca de todas as áreas de preservação
permanente (dunas, mangues, margens de rio, nascentes, olhos d'água, etc), para a exata
dimensão dos ecossitemas que não podem sofrer qualquer tipo de intervenção pela
iniciativa privada. Uma vez tomadas estas providências, se saberá, inclusive, qual a
dominialidade privada presente na região delimitada, se houver, que deve ser indenizada
(porque não seria APP) com a criação do Parque. Sem estas providências - todas de
natureza administrativa - que os poderes executivos estadual, municipal e federal não irão
realizar por vontade própria, mesmo porque até a presente data não fizeram, nada poderá
ser feito em termos de implantação definitiva do Parque do Cocó.

DA NECESSIDADE DE DEFINIÇÃO DA DOMINIALIDADE DA UNIÃO NA


ÁREA PROPOSTA PELO CONPAM PARA DEFINIÇÃO DA NOVA POLIGONAL
DO FUTURO PARQUE DO COCÓ

50. Segundo o discurso oficial, uma das maiores dificuldades para a implantação definitiva
do parque do Cocó é o grande valor a ser pago a titulo de indenização pela titularidade
imobiliária existente na região. Alega o Governo Estadual que os imóveis presentes na
região são extremamente valorizados, uma vez que localizados em uma área nobre da
cidade, muito procurada para a instalação de emprendimentos residenciais e comerciais.
Assim, caso implantado o parque, como esta tipologia de unidade de conservação não
convive com a propriedade privada, toda a titularidade imobiliária inserida na área de sua
delimitação deverá ser desapropriada, o que acarretará a aplicação de vultosa soma de
dinheiro público. A alta onerosidade destas desapropriações, alega o Estado, impediria a
criação do Parque.

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51. Esse discurso, no entanto, é apenas parcialmente verdadeiro. Não se desconhece que a
área proposta para a criação do Parque do Cocó é demasiadamente valorizada, por conta de
sua localização privilegiada, uma vez que seu entorno abriga caros imóveis residenciais,
diversos e importantes segmentos comerciais (inclusive o maior shopping center da cidade,
hoje em processo de expansão) e considerável infraestrutura, com equipamentos públicos e
privados – de saúde e lazer - diversificados e relevantes. Por seu turno, também é verdade
que, uma vez criada uma unidade de conservação de proteção integral, toda a propriedade
privada localizada dentro de seus limites deve ser desapropriada, com o pagamento da justa
indenização, prévia e em dinheiro. São afirmações incontestáveis!

52. Todavia, cumpre destacar que a grande verdade não é revelada. Ou seja, em
nenhum momento, nem o Governo do Estado nem a União, através da SPU no Ceará,
realizaram qualquer levantamento para identificar todos os bens da União situados no
perímetro delimitado pela proposta do CONPAM. Assim, mesmo que esta
preocupação tenha estado presente já desde a primeira reunião do GT do CONPAM
responsável por apresentar a proposta da nova poligonal, o GT não teve condições de
realizar tal levantamento, não se podendo precisar, atualmente, a dominiliadade da
União, portanto, a existência de bem público, existente na área compreendida na
poligonal proposta.

53. Importante destacar que o Rio Cocó nasce na vertente oriental da Serra da Aratanha, na
cidade de Pacatuba, e nos seus 50 km de percurso passa por Maracanaú, Itaitinga e
Fortaleza, desaguando no Oceano Atlântico, nos limites das praias do Caça e Pesca e da
Sabiaguaba. Em grande parte de seu percurso o rio sofre influência das marés e, por conta
disso, há necessidade de determinação dos terrenos de marinha que nascem desta especial
condição. Segundo o Decreto-Lei 9.760, de 05 de setembro de 1946, incluem-se entre os
bens imóveis da União “os terrenos de marinha e seus acrescidos”, defindo-os da seguinte
forma :

Art. 2º. são terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e


três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição
da linha do preamar-médio de 1831:
a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e
lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés.

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Parágrafo único: para efeitos deste artigo a influência das marés é


caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo
menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano.

54. A identificação dos terrenos de marinha deve ser realizada pela Secretaria do
Patrimônio da União, através de metodologia devidamente regulamentada e que confira o
direito de ampla defesa a todos os interessados de afirmarem sua titularidade perante à
União. Demarcado o terreno de marinha, passa este a ser submetido a um regime jurídico
especial, de direito administrativo, através do qual o domínio direto pode ser exercido pelo
particular ocupante, cabendo à União a titularidade do domínio indireto. Esta peculiar
relação jurídica atribui ao titular do domínio direto as prerrogativas próprias da condição de
proprietário, podendo usar, gozar e dispor do bem, inclusive mediante alienação do domínio
útil.

55. Nada obstante, na área destinada à implantação do futuro parque do cocó, muitos
particulares se julgam detentores legítimos da titularidade direta de terrenos de marinha, por
terem regularmente estabelecido uma relação jurídica válida com a União, de acordo com a
legislação em vigor, tratando-se, portanto, de um ato jurídico perfeito. Alguns destes
pretensos titulares do domínio útil de terrenos de marinha, quando editados os decretos de
1989 e 1993 que delimitavam a área para futuras desapropriações destinadas à implantação
do parque, sentiram-se prejudicados porque, no entender deles, não puderam mais
desempenhar suas atividades. Concluiram que teria havido uma desapropriação indireta e
ingressaram com ações judiciais pleiteando o reconhecimento do direito à percepção de
vultosas indenizações. Ditas demandas tramitam há mais de 20 (vinte) anos nas instâncias
judiciais estaduais, sem que sobre elas se tenha uma decisão final, no sentido de solucionar
a pendência.

56. Analisando o processo histórico de ocupação da área hoje proposta para a implantação
do parque do cocó, chega-se à inarredável conclusão de que a União permitiu a exploração
dos terrenos de marinha daquela região, para o desenvolvimento de uma atividade
econômica específica, no caso, a atividade salineira (produção de sal a partir do processo
natural de evaporação de água salgada), que ali foi realmente desenvolvida durante muito
tempo. Com o declínio econômico da atividade de extração de sal, as áreas de exploração
foram abandonadas, tendo ressurgido, em grande extensão, a vegeteção típica de mangues.

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Com a expansão urbana de Fortaleza, estas áreas passaram a experimentar considerável


valorização, iniciando-se desta feita toda a conflituosidade hoje presente para o seu
aproveitamento econômico. Antigos detentores de um domínio direto que exploravam a
extração de sal, alegam ser ainda titulares deste domínio e, assim, mesmo sem qualquer
benfeitoria erguida na área alegam ter direito à desapropriação.

57. No entanto, este suposto direito à indenização deve ser analisado com as limitações
próprias do regime especial que rege a relação jurídica entre a União e os detentores das
inscrições já realizadas para exploração dos terrenos de marinha presentes na região.

58. A Lei 9.636/98, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e


alienação de bens imóveis de domínio da União, estabelece em seu art. 7º que: “ a
inscrição de ocupação, a cargo da Secretaria do Patrimônio da União, é ato
administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, que pressupõe o efetivo
aproveitamento do terreno pelo ocupante, nos termos do regulamento, outorgada pela
administração depois de analisada a conveniência e oportunidade, e gera obrigação de
pagamento anual da taxa de ocupação”.

59. Esta mesma Lei ainda dispõe, o seguinte:

Art. 9o É vedada a inscrição de ocupações que:

I - ocorreram após 27 de abril de 2006;

II - estejam concorrendo ou tenham concorrido para


comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de
segurança nacional, de preservação ambiental ou necessárias à
preservação dos ecossistemas naturais e de implantação de
programas ou ações de regularização fundiária de interesse social
ou habitacionais das reservas indígenas, das áreas ocupadas por
comunidades remanescentes de quilombos, das vias federais de
comunicação e das áreas reservadas para construção de
hidrelétricas ou congêneres, ressalvados os casos especiais
autorizados na forma da lei.

Art. 10. Constatada a existência de posses ou ocupações em


desacordo com o disposto nesta Lei, a União deverá imitir-se
sumariamente na posse do imóvel, cancelando-se as inscrições
eventualmente realizadas.

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Parágrafo único. Até a efetiva desocupação, será devida à União


indenização pela posse ou ocupação ilícita, correspondente a 10%
(dez por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno,
por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da
posse ou ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções
cabíveis.

60. A mesma legislação acima citada fixa, ademais, regras sobre o poder de fiscalização da
União, no que diz respeito a correta utilização de seus bens dominiais. Neste particular,
determina, que:

Art. 11. Caberá à SPU a incumbência de fiscalizar e zelar para


que sejam mantidas a destinação e o interesse público, o uso e a
integridade física dos imóveis pertencentes ao patrimônio da
União, podendo, para tanto, por intermédio de seus técnicos
credenciados, embargar serviços e obras, aplicar multas e demais
sanções previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal
e solicitar o necessário auxílio de força pública estadual.

§ 1o Para fins do disposto neste artigo, quando necessário, a SPU


poderá, na forma do regulamento, solicitar a cooperação de força
militar federal.

§ 2o A incumbência de que trata o presente artigo não implicará


prejuízo para:

I - as obrigações e responsabilidades previstas nos arts. 70 e 79, §


2o, do Decreto-Lei no 9.760, de 1946;

II - as atribuições dos demais órgãos federais, com área de


atuação direta ou indiretamente relacionada, nos termos da
legislação vigente, com o patrimônio da União.

§ 3o As obrigações e prerrogativas previstas neste artigo poderão


ser repassadas, no que couber, às entidades conveniadas ou
contratadas na forma dos arts. 1o e 4o.

§ 4o Constitui obrigação do Poder Público federal, estadual e


municipal, observada a legislação específica vigente, zelar pela
manutenção das áreas de preservação ambiental, das necessárias
à proteção dos ecossistemas naturais e de uso comum do povo,
independentemente da celebração de convênio para esse fim.

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61. Resta claro, pelas disposições legais acima transcritas, que: 1) na região proposta para a
implantação futura do Parque do Cocó existem áreas compreendidas no domínio da União,
vez que o Rio Cocó sofre influência das marés e, portanto, devem ser demarcados, nestas
localidades, os terrenos de marinha; 2) cabe à União proceder as inscrições devidas para
utilização de terrenos de marinha; 3) cada inscrição é vinculada ao tipo de utilização
determinada no momento da sua constituição e tal finalidade deve ser mantida enquanto
perdurar a inscrição; 4) muitas inscrições realizadas pela União na área são muito antigas,
destinadas a conceder a utilização dos terrenos de marinha - portanto, bens da União -, para
a exploração de uma atividade econômica determinada, consistente na exploração de
salinas; 5) estas inscrições somente mantém a validade se vinculadas à utilização constante
do ato de inscrição, o que hoje inexiste, pois não há, atualmente, exploração desta atividade
na região, o que torna tais inscrições inválidas; 6) mesmo admitindo a validade destas
inscrições antigas desvinculadas da manutenção da utilização que fundamentou sua origem,
muitas delas incidem em áreas de preservação permanente (dunas, mangues, nascentes e
olhos d'água, matas ciliares, etc) e, assim, concorerram ou estão concorrendo para a
diminuição da integridade destes bens ambientais; 7) cabe à União, no exercício regular de
seu poder de fiscalização, detectar todas as ocupações ilegais, notadamente aquelas que
estejam a incidir sobre bens ambientais protegidos (APP`s) e, confirmada essa assertiva,
cancelar as respectivas inscrições e imitir-se imediatamente na posse destes imóveis; e, 8) é
dever do Poder Público perservar todas as áras ambientalmente protegidas por Lei.

62. Portanto, para que se torne possível o exercício regular deste poder de polícia, de cunho
patrimonial e ambiental, por parte da União, no que diz respeito aos terrenos de marinha
existentes na área proposta pelo CONPAM para abrigar futuramente o parque do cocó, cabe
à União: 1) demarcar a sua dominialidade em toda a área em comento, definindo com
absoluta clareza os terrenos de marinha existentes, através do procedimento legal utilizado
para fins desta especial forma de declaração da dominialidade pública; 2) definidos os
terrenos de marinha, analisar a legalidade de todas as inscrições ainda existentes para
verificar se estão mantendo a utilização prevista no ato de inscrição e se incidem ou não em
áreas de preservação permanente, ou, se limitam a utilização de bens de uso comum; 3)
anular todas as inscrições que não estejam mais cumprindo a utilização fixada no momento
da inscrição e/ou que estejam incidindo em áreas de preservação permanente, ou, ainda, que
estejam limitando a utilização de bens de uso comum.

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63. Realizado este trabalho de identificação e demarcação dos terrenos de marinha, com a
respectiva análise da legalidade das inscrições existentes, sobrarão apenas como válidas as
inscrições que mantêm a utilização fixada no momento da inscrição e que não recaiam em
áreas de preservação permanente, ou que limitem os bens de uso comum. Em tais situações,
as inscrições deverão ser consideradas válidas.

64. Com relação as inscrições que ainda restarem válidas, uma vez editado o decreto
criando o Parque do Cocó, deverá o ente criador, União, Estado ou Município, avaliar o
aproveitamento econômico de cada um destes bens. Tratando-se, por seu turno, de terrenos
de marinha, não poderá ser desapropriada a dominiliadade da União, mas apenas o domínio
direto destes bens, a partir da definição de seu aproveitamento econômico, sendo certo
estabelecer a possibilidade, nestes casos, de indenização das benfeitorias existentes, após a
devida avaliação.

65. Percebe-se, assim, que muitas inscrições hoje ainda existentes em terrenos de marinha
irão perecer, quer por não manterem a utilização definida no ato de inscrição, quer porque
estão localizadas em áreas de preservação permanente ou impedem a livre utilização de
bens de uso comum do povo. Em tais casos, canceladas as inscrições, estes bens retornam,
em sua integralidade – domínio pleno -, ao domínio da União, que poderá então efetivar a
sua cessão, sem ônus, ao ente criador do Parque. Reduzem-se, dessarte, de forma
significativa, os valores a serem despendidos na regularização fundiária do Parque do Cocó,
viabilizando-se, economicamente, sua criação. Mas, isto somente será possível se a União,
através da SPU no Ceará, realizar todas as providências administrativas acima relacionadas,
o que não acontecerá sem uma determinação judicial obrigando-a a assim agir. Enquanto
todas estas providências não são realizadas, detentores de inscrições junto à União
entendem que podem se utilizar das prerrogativas inerentes à titulariade do domínio útil de
tais bens da União para edificar na área do cocó, alterando a utilização permitida no
momento da inscrição, degradando áreas de preservação permanente e impedindo o livre
acesso de todos a bens de uso comum do povo.

DA NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DE TODAS AS ÁREAS DE


PRESERVAÇÃO PERMANENTE NA ÁREA PROPOSTA PELO CONPAM PARA
DEFINIÇÃO DA NOVA POLIGONAL DO FUTURO PARQUE DO COCÓ

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66. Além de ser necessária a demarcação de toda a dominialidade da União na área proposta
para a criação definitiva do Parque do Cocó, é imprescindível, por seu turno, que se
identifiquem todas as áreas de preservação permanente existentes na região.

67. Como já salientado anteriormente, se for localizada uma área de preservação


permanente em um bem da dominialidade da União – como um terreno de marinha, por
exemplo – a legislação que regula o regime de gestão dos bens da União determina que, de
imediato, se anule qualquer inscrição realizada e que a União se imita na posse do imóvel
em questão, pois a legislação não tolera esse tipo de exercício do domínio direto de um
particular, sobre um terreno de marinha, considerando-se que a utilização do bem não é
possível, por recair em área de preservação permanente.

68. No entanto, na região destinada à implantação do futuro Parque do Cocó, conforme


poligonais traçadas pelo GT do CONPAM, podem existir bens que não estão
compreendidos no domínio da União, do Estado ou do Município e que, estando
legitimamente titulados ao particular, venham a se localizar em áreas de preservação
permanente. Se assim for, estes bens privados não devem sofrer processo de desapropriação
para fins de criação do Parque, já que, embora sejam particulares, como estão localizados
em APP`s não podem ser economicamente aproveitados por seu titular. O STJ já decidiu
diversas vezes nestes sentido:

ADMINISTRATIVO. LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS.


INDENIZAÇÃO. PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO MAR.

1. O apossamento administrativo de propriedade privada, ainda


que não acompanhado de ocupação física, se restringirem os
poderes inerentes ao domínio, justificam o direito à indenização,
salvo quando se tratar de área de preservação permanente (APP)
ou de reserva legal (RL), exceto quanto a esta se o proprietário
contar com plano de manejo devidamente aprovado pela
autoridade competente. Precedentes de ambas as Turmas de
Direito Público.

2. Recurso especial provido

Processo: REsp 905410 SP 2006/0244210-7 Relator(a): Ministro


CASTRO MEIRA

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69. O tema – impossibilidade de indenização de áreas de preservação permanente – é tão


pacífico no Superior Tribunal de Justiça que em notícia divulgada no site do próprio STJ
em 23/03/2011, em seminário sobre a jurisprudência ambiental do STJ, restou consignado
que o Ministro Herman Benjamin “apontou a pacificação do entendimento de ser
incabível a indenização por desapropriação de APP, porque não podem sofrer
exploração econômica. Nos casos de reserva legal, a indenização é possível, mas não
pode levar em consideração o mesmo valor da terra nua, já que preexistem restrições.
Também não são indenizáveis os terrenos marginais a cursos d’água, por que são
terrenos públicos”.

70. A Lei Nº 12.651/2012, conhecida como o novo código florestal, define como Área de
Preservação Permanente – APP a “área protegida, coberta ou não por vegetação
nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a
estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora,
proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. Demais disso, ao
estabelecer que áreas devem ser consideradas como APPs, pelo só efeito da Lei (APPs
Legais), a mesma legislação se refere a diversos ecossistemas e bens ambientais que, sem
dúvida, estão presentes na área proposta pelo GT do CONPAM para a criação do Parque do
Cocó, como, por exemplo: as faixas marginais de cursos d'água perenes ou
intermitentes; as áreas no entorno das nescentes e de olhos d'água perenes; os
manguezais, em toda a sua extensão; as restingas como fixadoras de dunas ou
estabilizadoras de mangues, as dunas, etc.

71. Portanto, a criação do Parque do cocó não pode prescindir de um levantamento técnico-
científico capaz de identificar todas as áreas de preservação existentes. Esse estudo deve ser
feito para demonstrar que existem diversas APPs na área definida pela nova poligonal do
CONPAM, algumas localizadas em bens públicos e outras em áreas sob o domínio pleno do
particular. No primeiro caso – APP em área pública – a questão é facilmente resolvida com
o retorno do bem ao domínio público e, no caso de terrenos de marinha, com o
cancelamento das inscrições porventura existentes. No segundo caso – APPs em áreas
privadas -, como estas áreas não podem ser utilizadas pelo particular, nada resta a indenizar
quando da criação do Parque, conforme entende, pacificamente, tanto a doutrina como a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

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72. Desta forma, cabe aos órgãos ambientais (SEMACE, SEUMA e IBAMA) definirem,
com absoluta precisão, em trabalho técnico conjunto, todas as áreas de preservação
permanente existentes na área delimitada pela nova proposta de poligonal feita pelo GT do
CONPAM. Com esta definição, aliada à demarcação dos terrenos de marinha, tarefa esta a
cargo da União através da SUP no Ceará, se terá um panorama definitivo sobre o que, de
fato e de direito, existe na área definida pelos estudos do CONPAM. Portanto, restará
evidenciado: 1) quais os terrenos de marinha da União, as inscrições realizadas, os titulares
do domínio útil, a situação atual, em termos patrimoniais, destes imóveis, se mantém, ou
não, a finalidade que foi estabelecida no ato de inscrição, se foram construídas benfeitorias,
etc; 2) todas as APPs existentes, compreendidas em bens sob o domínio público ou privado.
Com esse retrato, será possível ter uma idéia clara e objetiva da real situação da área
proposta pelo próprio Governo do Estado do Ceará, através do CONPAM, para implantação
futura do Parque do Cocó.

73. Porém, como já afirmado no decorrer desta exposição, a criação definitiva do Parque do
Cocó depende de um ato de natureza política, melhor dizendo, de um decreto assinado pelo
Governador do Estado ou pelo Prefeito de Fortaleza, ou de uma Lei, elaborada pela
Assembléia Legislativa, ou pela Câmara Municipal de Fortaleza. Tais atos, por
comportarem conveniência e oportunidade, não podem ser impostos por determinação
judicial. Contudo, a inércia política, no que diz respeito à criação do Parque não impede que
as providências administrativas acima listadas sejam imediatamente realizadas com a
finalidade de, somando-se aos estudos técnicos realizados pelo CONPAM, subsidiar a
adoção da decisão política criadora da unidade de conservação anciosamente aguardada por
toda a população de Fortaleza e do Estado do Ceará.

74. É certo que todo o processo de criação do Parque do Cocó consome tempo considerável
para a sua finalização. Enquanto a Administração atua com observância da legalidade e
atendendo a uma burocracia própria do setor público, a iniciativa privada é muito mais
veloz na busca do atingimento de suas metas e atua, sistematicamente, na concretização de
expedientes predatórios que visam a criação de situações de fato consumado de ocupação
das áreas ambientalmente nobres que virão a constituir, futuramente, o Parque do Cocó.

75. No descompasso entre a lentidão do setor público e a rapidez da iniciativa privada, as


áreas verdes, ambientalmente relevantes para a implantação futura do Parque vão

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perecendo, sujeitas a um processo intenso e constante de degradação. Em pouco tempo,


dada a fragilidade desses importantes ecossistemas (principalmente dunas e manguezais),
muitos dos bens ambientais perecerão, pois, serão totalmente degradados e sem qualquer
possibilidade de recuperação natural, por intervenções privadas e públicas, estas últimas
muitas vezes totalmente desnecessárias.

76. Como se vê, as providências administrativas necessárias para a identificação dos


terrenos de marinha e das áreas de preservação permanente devem ser iniciadas o mais
rápido possível e devem se desenvolver com a paralisação de novas intervenções dentro da
área delimitada pelo estudos técnicos do CONPAM, a fim de que seja realizada a
delimitação definitiva do Parque. Caso contrário, de nada adiantarão tais providências
administrativas, visto que a área em comento estará sujeita a permanentes alterações, sendo
constante a modificação fática da realidade, pois, a iniciativa privada continuará a
promover, até mesmo com autorização do poder público ou, com a sua conivência, a
realização de novas intervenções - isto quando não é o próprio poder público que intervém
-, dificultando ou impossibilitando a criação futura do tão esperado Parque do Cocó.

DA ANTERIOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MPF VISANDO A


PROTEÇÃO DE UMA ÁREA PARA FUTURA CRIAÇÃO DO PARQUE DO COCÓ

77. O Ministério Público Federal ajuizou, em 15 de junho de 2007, Ação Civil Pública
contra o Estado do Ceará, Município de Fortaleza, IBAMA, SEMACE e UNIÃO (processo
200781000105262) objetivando a paralisação de qualquer atividade econômica em uma
extensão correspondente a um raio de 500 metros, a partir das poligonais traçadas pelos
decretos de 1989 e 1993. A dimensão total em que se requeria a paralisação correspondia a
uma área de um quilômetro de largura por 11 quilômetros de extensão.

78. Ao ajuizar esta ação, partiu o MPF do pressuposto de que a área destinada a criação do
Parque do Cocó corresponderia a que fora delimitada pelos decretos de 1989 e 1993. No
entando, argumentava-se na ação, como os parques devem possuir uma zona de
amortecimento, esta deveria corresponder a um raio de 500 metros, traçado a partir das
poligonais definidas nos decretos acima citados, onde, até a efetiva criação do Parque,
deveria ser impedido o início de novas atividades imobiliárias bem como paralisadas em
andamento.

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79. O objetivo da ação em referência era evitar que toda a área do entorno das poligonais
definidas nos decretos de 1989 e 1993 fosse ocupada, inviabilizando a criação de uma zona
de amortecimento para o futuro Parque. Até aquele momento, não possuia o MPF qualquer
dado técnico-científico sobre a delimitação da área do Parque e de sua zona de
amortecimento, razão pela qual se utilizou, por razoabilidade e proporcionalidade, o
parâmetro de 500 metros.

80. A demanda referida foi distribuída à 7ª Vara Federal que, ao apreciar o pedido de
liminar formulado pelo MPF, resolveu deferí-lo, em decisão proferida pelo então Juiz
Titular, Dr. Francisco da Chagas Fernandes, que compreendeu a importância da
manutenção da integridade dos ecossistemas da área destinada à futura implantação do
Parque e de todo o seu entorno. A decisão liminar paralisou o exercício de novas atividades
econômicas em todo o entorno, em uma raio de 500 metros, a partir da área definida pelas
poligonais constantes dos decretos de 1989 e 1993.

81. Esta decisão liminar, submetida à apreciação do Tribunal Regional Federal da 5a.
Região, em face de agravo de instrumento interposto pelo Estado do Ceará, foi alterada em
parte, mantendo o TRF a paralisação de novas atividades no raio de 500 metros a partir da
área definida nos decretos citados, somente quando esta área podia ser configurada como
área urbana não-consolidada.

82. O Processo tramitava regularmente até ser determinado pela 7ª Vara Federal no Ceará, a
citação de todas as pessoas, físicas e jurídicas, que possuiam ou eram proprietárias de
imóveis no raio de 500 metros a partir da área definida nos decretos de 1989 e 1993. Tal
providência processual, por óbvio, inviabilizaria a demanda, pois este perímetro fixado por
decisão judicial é consideravelmente adensado e isto resultaria no chamamento ao processo
de milhares de réus. Argumentou-se acerca da desnecessidade da citação dessas pessoas e,
caso fosse a decisão de citação mantida que esta se fizesse por edital. O pleito do MPF não
foi atendido e como não foi realizada a citação pessoal de todas estas pessoas, que a Juíza
do processo entendeu serem litisconsortes passivos necessários, foi proferida uma decisão
de extinção do processo sem julgamento de mérito.

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83. O MPF ingressou com recurso de apelação junto ao TRF-5ªR, todavia, a decisão de
primeira instância foi mantida, confirmando a extinção do processo, decisão esta que,
inclusive, transitou em julgado.

84. Como o GT do CONPAM sobre o Parque do Cocó já estava trabalhando tecnicamente


na definição das novas poligonais, resolveu o MPF aguardar a conclusão dos estudos, firme
na convicção de que, de posse deles, o Governador do Estado fosse, efetivamente, criar o
Parque do Cocó. Sem embargo, como já evidenciado nesta peça, até o momento o
Governador permanece inerte, circunstância esta que obriga o retorno do MPF ao
Judiciárioa buscando uma nova tutela jurisdicional capaz de preservar os ecossistemas
ainda íntegros na área definida para a criação do multicitado Parque. Definição esta que
agora conta com mais embasamento técnico-científico do CONPAM, tendo em vista que, se
algo não for feito com urgência a inciativa privada continuará tentando se apropriar destes
espaços nobres, com o intuíto exclusivo de lucro. Ademais disso, a presente demanda busca
a proteção de uma área que, hoje, sabe-se ser a área mais apta a receber o Parque do Cocó.
Os estudos técnicos produzidos pelo CONPAM retiram desta demanda qualquer
controvérsia de ordem técnica sobre as novas poligonais. Sabe-se, agora, o que se deve
efetivamente preservar.

85. Na ação Civil Pública ajuizada em 2007 o MPF não possuia estes dados técnicos.
Apenas sabia das áreas delimitadas pelos decretos de 1989 e 1993 – delimitação esta feita
sob o ponto de vista preponderamente político e sem uma sustentação técnica mais
consistente – e adotou, como critério razóvel para a definição da zona de amortecimento um
raio de 500 metros ao redor destas poligonais. Atualmente a situação é diferente, pois o
MPF possui um estudo técnico-científico, elaborado sob a coordenação de um órgão
componente do próprio poder executivo estadual, o CONPAM, que demonstra duas coisas:
1) que o tipo de unidade de conservação a ser criado é de Parque, ou seja, uma unidade de
conservação de proteção integral; e, 2) foram traçadas, cientificamente, as novas poligonais
desta unidade de conservação. Faltam ainda duas coisas a serem feitas na área delimitada
por este estudo do CONPAM: 1) definir todos os bens compreendidos no domínio da
União; e, 2) definir e caracterizar todas as áreas de preservação permanente.

86. Desse modo, a ação que ora se propõe não repete a demanda ajuizada em 2007. O
MPF comparece a juízo com mais fundamentos técnicos para requerer uma proteção mais

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efetiva para os ecossistemas localizados na área definida para receber o futuro Parque do
Cocó. Com efeito, de posse de um substancial estudo técnico-científico, o MPF apresenta a
esse Juízo a definição do tipo de unidade de conservação a ser ali criada e seus limites,
vindo buscar, mediante um provimento judicial, a concretização de providências
administrativas adicionais e imprescindíveis à criação do Parque – definição de terrenos de
marinha e APPs – e a manutenção dos ecosssitemas como hoje se encontram, até a criação
definitiva do Parque do Cocó.

RESUMO DOS FATOS E ARGUMENTOS DA PRESENTE AÇÃO

87. Por tudo o que foi exposto, podemos resumir os fatos e argumentos que sustentam
a presente Ação Civil Pública da seguinte forma:

1) A cidade de Fortaleza necessita, com urgência, da criação efetiva de uma unidade de


conservação que proteja os ecossistemas ambientalmente relevantes (margens de rio,
mangues, dunas, nescentes, etc) que se localizam nas imediações do Rio Cocó, área esta que
a cidade se acostumou a denominar de Parque do Cocó;
2) O Parque do Cocó, em verdade, nunca foi efetivemente criado. Em 1989 e 1993, o
Governo do Estado do Ceará editou dois Decretos declarando de utilidade pública, para fins
de desapropriação uma área definida para a implantação do Parque do Cocó. As
desapropriações necessárias nuca foram concretizadas e os decretos caducaram. O Parque
nunca foi criado, nem por Decreto e nem por Lei;
3) O governo do Estado resolveu, então, em 2007, incumbir o CONPAM da
coordenação de um grupo de trabalho que teria a missão de produzir um estudo técnico-
científico que atingisse a duas finalidades: definir o tipo adequado de unidade de
conservação a ser criada e traçar suas poligonais, criando assim seus limites físicos;
4) Este Grupo de Trabalho, coordenado pelo CONPAM e composto dos diversos
órgãos e entidades da administração pública federal, estadual e municipal vinculados a
questão ambiental concluiu seus trabalhos em 2008. Este trabalho técnico-científico
concluiu que deveria ser criada uma unidade de conservação de proteção integral, do tipo
Parque, tendo definido seus limites, passando a sua área total a ser de 1.312,30 hectares.
Ditos estudos foram então entregues ao Governador do Estado em 2008, mas, até a presente

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data não geraram qualquer consequência, uma vez que o Governador não adotou nenhuma
iniciativa para a criação do parque.
5) Muita embora os estudos técnicos realizados pelo GT coordenado pelo CONPAM
tragam informações suficientes para a criação do Parque, não foi realizado nenhum estudo
sobre a definição dos terrenos de marinha e das áreas de preservação permanente em toda a
extensão da área total definida pela nova proposta de poligonais encaminhada pelo
CONPAM ao Governador do Estado do Ceará;
6) A definição dos terrenos de marinha é imprescindível para delimitar os bens
compreendidos no domínio da União na área, já que o Rio Cocó sofre influências das marés
na região proposta como adequada para receber o Parque no futuro;
7) Definidos os terrenos de marinha se poderá estabelecer, com absoluta segurança,
quem são os titulares da inscrição desses bens, quais deles ainda mantém sua utilização
originária definida no ato de inscrição e quais estão localizados em áreas de preservação
permanente;
8) Para os bens da União, inscritos em nome de particulares, que estiverem em área de
preservação permanente ou, mesmo fora destas áreas, não estiverem regular com a União,
seja porque não mantém sua utilização originária, seja porque estão em débito, devem ser
reincorporados ao domínio público sem qualquer ônus;
9) A definição de todas as áreas de preservação permanente também é outra
providência essencial, na medida em que, uma vez definidos esses espaços ambientalmente
protegidos, qualquer titularidade pública (apenas direta) ou privada que sobre eles incidam
não deverá ser indenizada para fins de criação do Parque;
10) O Governo do Estado continua a fazer promessas vazias sobre a criação efetiva do
Parque. Recentemente o presidente do CONPAM afirmou na imprensa que o Parque será
criado até o final de 2014. Tomando esta afirmação como verdadeira, demonstra-se que há
um consenso no governo estadual de que o Parque deve mesmo ser efetivamente criado,
mas também demonstra a necessidade de proteção dos ecossistemas contidos na nova
delimitação do CONPAM, até que isto realmente ocorra, de fato e de direito;
11) A criação de uma unidade de conservação, no Brasil, é um ato de natureza política,
que demanda um decreto por parte do chefe do poder executivo (Governador ou Prefeito de
Fortaleza) ou uma Lei, estadual ou municipal. Não cabe ao Judiciário obrigar a criação do
Parque, mas diante de elementos que demonstram, razoavelmente, que se caminha neste
sentido, cumpre ao Judiciário obrigar a realização das providências administrativas para a
identificação dos terrenos de marinha e de áreas de preservação permanente, mantendo a

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integridade dos ecossistemas presentes na região, impedidndo novas intervenções na área já


delimitada pelo GT do CONPAM, até que o Parque venha a ser definitivamente criado, o
que acontecerá, segundo o próprio Governo Estadual, até o final de 2014;
12) Diante destes fatos duas posturas podem ser adotadas: 1) ficar esperando que um dia
algum legitimado resolva enfim criar o Parque do Cocó. Quando isto acontecer talvez não
exista mais nada a proteger, mais nenhum mangue, nenhum olha d'água ou nascente,
nenhuma duna, pois tudo terá sido objeto de apropriação pelo poder econômico; ou, 2)
determinar a implementação imediata das providências administrativas necessárias para a
definição dos terrenos de marinha e das áreas de preservação permanente existentes na área
delimitada pelos estudos técnicos do GT do CONPAM e, enquanto isso, determinar que
esta mesma área fique protegida da atuação predatória da iniciativa privada e dos descasos
do poder público. Somente adotando esta última postura é que o Judicário contribuirá,
dentro do desempenho regular de suas atribuições constitucionais, com a preservação
ambiental e a viabilização da criação do Parque do Cocó.

DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR PARA A EFETIVA


PROTEÇÃO AMBIENTAL DOS ECOSSISTEMAS DO FUTURO PARQUE DO
COCÓ

88. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, sediada
no Rio de Janeiro em 1992, definiu claramente, os contornos do princípio da precaução.
Senão vejamos:

“Princípio 15: De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da


precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com
suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis,
a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão
para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a
degradação ambiental.”

89. Segundo Paulo Affonso Leme Machado, a precaução “age no presente para não se ter
que chorar e lastimar no futuro. A precaução não só deve estar presente para impedir o
prejuízo ambiental, mesmo incerto, que possa resultar das ações ou omissões humanas,
como deve atuar para a prevenção oportuna desse prejuízo. Evita-se o dano ambiental,

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através da prevenção no tempo certo.2”

90. No mesmo sentido, acentua Álvaro Luiz Valery Mirra o seguinte:

“ Se existem fundamentos de ordem científica para concluir-se que uma


determinada atividade causa degradação ambiental ou é suscetível de
causá-la, por força do princípio da precaução torna-se indispensável
adotarem-se medidas eficazes para impedir essa atividade, ainda que
seu caráter lesivo seja passível de contestação científica. A probabilidade
– nela incluída a idéia de risco sério e fundado – da ocorrência de uma
degradação, ainda que não haja certeza científica absoluta, impõe a
adoção de medidas para impedi-la ou obstá-la, inclusive pela via
judicial.3”

91. Por sua vez a Constituição Federal Brasileira, em seu art. 225, obriga ao poder público
proteger de forma especial, mediante a criação de Unidades de Conservação, espaços
determinados que, por sua relevância ambiental e paisagística, devem ser retirados da
possibilidade de intervenção mais contundente das atividades humanas, informadas pela
satisfação de interesses privados e até públicos. Eis o mandamento constitucional:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente


equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo
e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§1° Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder


público:

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e


seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e
a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer

2
Direito Ambiental Brasileiro, ed. Saraiva, p. 57.
3
Direito Ambiental: Princípio da Precaução e sua Aplicação Judicial, in Revista de Direito Ambiental, editora
RT, ano 6, no. 21, pág. 99.

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utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem


sua proteção.

92. A par de estatuir o direito fundamental à proteção ambiental como destinado ao


estabelecimento de um equilíbrio ambiental, qualificá-lo como bem de uso comum do povo
e ressaltar sua essencialidade para uma sadia qualidade de vida, a disposição contida no art.
225, caput, também conhecida como Norma-Princípio de Proteção Ambiental, ainda
cuidou de impor estes deveres ao Poder Público e aos particulares, mas não somente sob
uma perspectiva imediatista, na medida em que tal dever se direciona à proteção da
qualidade do meio ambiente, também, para as futuras gerações.

93. Quando a Constituição se refere ao Poder Público, logicamente que está impondo a
adoção de políticas públicas positivas, essencialmente preventivas e, ainda, de atuações
negativas no sentido de não violação dos parâmetros de proteção estabelecidos.

94. Com efeito, a imposição constitucional alcança todas as possíveis atuações estatais, seja
ela legislativa – obrigando a formulação de regras de conduta em consonância com a
efetivação deste direito fundamental de proteção ao meio ambiente -, executiva –
principalmente mediante o exercício efetivo do poder de polícia ambiental, essencialmente
voltado à prevenção do dano – ou jurisdicional –, como instância corretiva das omissões
indevidas do legislativo e Executivo, bem como repressora da atuação danosa dos
particulares, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

95. Com relação à coletividade, este dever de proteção ambiental se traduz, antes de tudo,
em direito de participação – que pressupõe, logicamente, efetivo direito de informação -,
consistente na elaboração e na execução de políticas públicas ambientais – mormente no
processo legislativo, por meio do exercício da iniciativa popular – e no controle efetivo das
condutas lesivas ao meio ambiente, mediante uma atuação judicial consistente no manejo
dos instrumentos processuais adequados, onde se destaca a ação popular. Torna-se a
sociedade, assim, có-responsável pela preservação e defesa do meio ambiente.

96. Ao proclamar o direito à proteção ambiental como direcionado para as presentes e


futuras gerações, a Constituição estabeleceu um “dever não apenas moral, como também
jurídico e de natureza constitucional, para as gerações atuais de transmitir esse

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´patrimônio´ ambiental às gerações que nos sucederem e nas melhores condições do ponto
de vista do equilíbrio ecológico”4.

97. A Constituição objetiva a preservação da qualidade de vida das gerações vindouras,


através de comportamentos atuais de preservação e proteção, acentuando o dever de
solidariedade que deve existir entre as gerações, impondo sempre uma equidade no acesso
aos recursos naturais, como ensina Paulo Affonso Leme Machado5:

A reserva dos bens ambientais, com a sua não utilização atual, passaria
a ser equitativa se fosse demonstrado que ela estaria sendo feita para
evitar o esgotamento dos recursos, com a guarda desses bens para as
gerações futuras. A equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser
enfocada não só com relação à localização espacial dos usuários atuais,
como em relação aos usuários potenciais das gerações vindouras.

98. Concluindo: existe um direito fundamental à proteção ambiental enunciado na Norma-


Princípio estatuída no art. 225 da Constituição Federal, cuja finalidade é o estabelecimento
de um “meio ambiente ecologicamente equilibrado”, considerado, sob a perspectiva
objetiva “bem de uso comum do povo”, o que ressalta o caráter difuso da proteção, sendo a
consecução deste equilíbrio ambiental “essencial à sadia qualidade de vida”, portanto
relacionado com a efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana e com a
concretização dos direitos fundamentais à vida e à saúde e cujo dever de implementação é
imposto, solidariamente, ao “Poder Público e à coletividade”, estendendo-se este dever de
proteção “às presentes e futuras gerações”.

99. Esta Norma-Princípio de proteção ambiental, composta pelos elementos analisados,


ocasiona sérios desdobramentos no próprio âmbito constitucional. Assim, um dos mais
importantes desdobramento são as denominada diretrizes normativas decorrentes de sua
aplicabilidade, que impõem, nos parágrafos e diversos incisos do art. 225, deveres
específicos ao Poder Público objetivando a concretização deste direito fundamental.

100. Após enunciar a Norma-Princípio de proteção ambiental no caput do seu art. 225, a
Constituição Federal estabelece, em seu parágrafo primeiro, que para assegurar a
4
Milaré, Édis. Ob.cit. p.214.
5
Machado, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002, 10ª edição, p.49.

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efetividade desse direito – ao meio ambiente ecologicamente equilibrado - incumbe ao


Poder Público adotar um série de providências específicas que passam a ser determinadas
nos respectivos incisos.

101. A Constituição, embora tenha imposto também à coletividade o dever de preservar o


meio ambiente para as presentes e futuras gerações, resolveu estabelecer, no que diz
respeito ao cumprimento desta mesma função pelo poder público, deveres específicos que
uma vez realizados, caminham no sentido de conferir concretude à enunciação normativa
referente ao direito fundamental de proteção ambiental.

102. Infere-se pois, cumprir ao Poder Público realizar suas tarefas constitucionais,
explicitadas nos incisos deste parágrafo, tanto no âmbito do Executivo, do Legislativo e do
Judiciário. Toda a atividade estatal é direcionada, pela Constituição, à concretização destes
deveres específicos, o que não significa dizer, por sua vez, que não existam outros deveres,
inclusive de natureza negativa, que decorram explícita ou implicitamente da própria
enunciação genérica do caput do art. 225 da CF/88.

103. Ao poder público se impõe o dever de atuar, positivamente, na concreção destes


deveres específicos e, ainda, a abster-se de desenvolver atividades contrárias ao
estabelecimento de um equilíbrio ambiental satisfatório, que proteja o meio ambiente para
as presente e futuras gerações.

104. Existe, portanto, estabelecido na Constituição Federal, um dever imposto ao poder


público de concretizar metas, desenvolver trabalhos, de atuar positivamente, no sentido de
não deixar que a enunciação do direito fundamental de proteção ambiental exista,
unicamente, no plano normativo. Esta preocupação constitucional com o atingimento de
uma concreção, de efetivação de suas próprias formulações normativas é louvável, ao passo
em que o Constituinte reconhece a importância do tema tratado e impõe, criando um
verdadeiro dever jurídico – portanto, exigível subjetivamente – de concreção para o
atingimento de uma finalidade.

105. Assinala Flávia Piovesan6, sobre estes deveres especificos do Poder Público:

6
Piovesan, Flávia. O Direito ao Meio Ambiente e a Constituição de 1988; Diagnósticos e Perspectivas. In,
Revista dos Tribunais – Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. (?)

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Isto significa que o direito ao meio ambiente ecologicamente


equilibrado é um direito que exige do Poder Público prestações
positivas, visando a preservação e restauração dos processos ecológicos
essenciais, a fiscalização das entidades dedicadas à pesquisa e
manipulação de material genético, a definição de espaços territoriais e
seus componentes a serem protegidos, a existência de estudo de impacto
ambiental para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação ambiental, o controle da
produção e comercialização de substâncias que importem em risco para
vida, a qualidade de vida e o meio ambiente, a promoção nda educação
ambiental e conscientização pública para a preservação do meio
ambiente e, por fim, a proteção da fauna e da flora.

106. Conforme já restou afirmado, além destes deveres específicos, tem o Poder Público
que adotar todas as providências cabíveis, mesmo não enumeradas especificamente pela
Constituição, para evitar a consumação de danos ambientais, o que equivale a afirmar que
estas imposições particularizadas , muito embora bastante abrangentes, têm natureza
meramente exemplificativas, não encerrando, por sua vez, todas as possibilidades de
atuação estatal concretizadora, por ação ou omissão, do direito fundamental à proteção
ambiental.

107. Conclui-se, facilmente, que, o dever estatal geral de proteção do meio ambiente é
fragmentado pela própria ordem constitucional em deveres específicos, cumprindo ao Poder
Público – Executivo, Legislativo e Judiciário - deles se desincumbir satisfatoriamente, sob
pena de sua atuação ou omissão indevidas serem caracterizadas como inconstitucionais.
Correto, assim, se falar na existência de um princípio jurídico ambiental, decorrente da
Norma-Princípio de proteção impositivo de uma atuação estatal concretizadora.

108. Considerando que este princípio deve nortear toda a atuação estatal, facilmente chega-
se a triste constatação de que, no Brasil, a atuação normativa – constitucional e
infraconstitucional – tem se desincumbido satisfatoriamente desta obrigação, elaborando,
na maioria das vezes, normas que impõem parâmetros de proteção adequados à
concretização da tutela do meio ambiente. Porém, em que pese possuir nosso país, nesta
seara, textos legislativos modernos e ousados, padece nosso ordenamento de um problema

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sério atinente à concretização desta normatividade através de uma atuação mais


contundente do Executivo e do Judiciário7.

109. Este enorme fosso existente entre o plano normativo e o mundo dos fatos, o plano real,
acompanha, é verdade, todos os direitos fundamentais enunciados na Constituição.
Contudo, especificamente no que se refere à proteção ambiental, esta ineficiência
concretizadora acarreta sérias consequências para a própria qualidade de vida de todos, na
medida em que expedientes de degradação, cada dia mais gravosos, se multiplicam ante a
conivência e a quase absoluta incapacidade da administração, sob o beneplácito do
Judiciário, ainda não inteiramente comprometido com a concretude destes direitos.
Conforme acentua Luiz Fernando Coelho8:

se examinarmos a parafernália legislativa do direito ambiental, antes e


depois da Constituição de 1988, a primeira reação é de perplexidade
perante um fato evidente: a ineficácia destas normas, eis que elas
simplesmente não são aplicadas...existem milhares de procedimentos
administrativos de imposição de penalidades pecuniárias por infração
aos regulamentos, simplesmente aguardando passar o prazo
prescricional.

110. No caso em comento, a Constituição Federal obriga o poder público a criar, por Lei ou
por Decreto, em todas as unidades da federação, espaços especialmente protegidos cuja
supressão será permitida somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.

111. De conformidade com o que afirmado anteriormente, o ato de criação de uma unidade
de conservação decorre do exercício de uma prerrogativa política do Executivo ou do
Legislativo, não cabendo ao Judiciário, a pretexto de efetivar direitos fundamentais, criar o
7
Vera Lúcia R. S. Jucovski, em artigo intitulado “O Papel do Juiz na Defesa do Meio Ambiente” ( Revista
de Direito Ambiental nº 19, julho/setembro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.43), enfatiza a
submissão do Judiciário a este dever de concretização constitucional da proteção ambiental, nos seguintes
termos: “Uma vez que o texto constitucional preceitua que todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, tendo sido ordenado ao Poder Público e à coletividade o dever de sua
defesa e preservação para a taual e futuras gerações (art.225, CF), essa norma fundamental é também
dirigida ao Juiz, a fim de que cumpra as obrigações impostas no art. 225,§1º e incisos, da Carta,
mormente o de promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública
da preservação ambiental (art. 225, § 1º, VI da CF).”
8
Coelho, Luiz Fernando. In Dúbio pro Natura – Interpretação da Lei Ambiental. Boletim Informativo do
Instituto de Pesquisas Jurídicas Bonijuris, n. 207, ano 6: Curitiba, 1994. p. 2.330.

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Parque do Cocó. Todavia, cabe ao Judiciário ordenar a execução de atividades


administrativas de demarcação de terrenos de marinha e análise de sua regularidade, bem
como de áreas de preservação permanente, tudo com o objetivo de manter íntegros os
ecossistemas relevantes localizados na área definida pelo estudo do GT do CONPAM.

112. Assim, como persiste a omissão do poder público, estadual e municipal, que não
criam, por Lei ou decreto, o Parque do Cocó, deve o Judicário intervir para impedir que esta
omissão resulte em danos ambientais significativos para os ecossistemas ainda íntegros que
podem ser preservados pela criação da unidade de conservação em referência, em um futuro
que esperamos seja próximo, como vem prometendo o Governo do Estado do Ceará desde
que o atual governador assumiu o primeiro mandato.

113. Portanto, com fundamento no princípio da precaução, tendo em vista que o poder
público não se desincumbe de seu dever constitucional de criar a unidade de conservação
em comento, a despeito da existência de robustos estudos técnicos-científicos já elaborados,
cumpre ao Judiciário evitar o perecimento destes bens ambientais existentes na região
admitida pelo próprio governo estadual como ideal para a implantação do Parque. Destarte,
a forma mais eficaz de atuação judicial seria deteminar a imediata demarcação dos terrenos
de marinha e das áreas de preservação permanente em toda a área definida pelo CONPAM
como adeuada para receber definitivamente o Parque do Cocó. Ao assim proceder, o
Judiciário estaria atuando no sentido de concretizar a proteção ambiental, uma vez que
estaria preservando, para a presente e futuras gerações de cidadãos de Fortaleza, a área
indicada para implantação definitiva do Parque.

114. Ademais, para evidenciar a urgência do deferimento de medidas cautelares capazes de


proteger os bens ambientais relevantes presentes na área delimitada pelo CONPAM, basta
citar o fato amplamente noticiado na imprensa local acerca da enorme pressão ambiental
que esta área vem sofrendo com o avenço da iniciativa privada sobre todo o seu entorno.
Tal situacão gera uma série de problemas ambientais que, embora originados fora da área
proposta para receber o Parque, causa diversos e graves danos aos ecossistemas
compreendidos dentro desta mesma área delimitada pelo CONPAM, conforme já
especificadoi no item 41 desta petição inicial.

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115. Por sua vez, não havendo paralisação deste crescente processo de degradação
verificado nesta região, em um futuro próximo o Parque a ser implantado não mais contará
com a inegridade de ecossistemas relevantes e, assim, de nada mais adiantará criar esta
unidade de conservação, se a situação de todo o seu entorno estiver completamente
comprometida pelas construções que continuam sendo realizadas, gerando graves pressões
ambientais na região com danos significativos às áreas de preservação permanente
circunvizinhas, bem como degradando a paisagem notável localizada em toda a região que
contorna o Parque do Cocó.

116. Em que pese a gravidade da violenta pressão ambiental acarretada pelas construções
no entorno da área definida pelo CONPAM e que, no futuro, ao ser criada a Unidade de
Conservação será utilizada como sua área de amortecimento, o que mais vem preocupando
o Ministério Público Federal e a sociedade de Fortaleza são intervenções agora realizadas
não mais no entorno, mas, dentro da própria área proposta pelo CONPAM para a criação do
Parque. Dois casos concretos de intervenção privada demonstram bem essa realidade.

117. O primeiro diz respeito a uma intervenção realizada dentro da área proposta pelo
CONPAM a ser protegida com a criação do parque, consistente na licença concedida pela
SEMACE para a instalação, por um particular, de uma cerca cortando a área compreendida
no limite da Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) das dunas do Cocó e daquela
que será destinada, segundo o CONPAM, para instalação definitiva do Parque. A partir da
colocação indevida desta cerca, a Câmara Municipal de Fortaleza aprovou uma Lei
Municipal determinando a instalação de uma via paisagística cortando estes ecossistemas,
lei esta que resultou vetada pelo Prefeito de Fortaleza, mas, cuja apreciação do veto ainda
pende de decisão final do legislativo municipal.

118. Outra intervenção bastante conhecida e objeto também de investigação pelo MPF, diz
respeito a uma tentativa de construção de um instituto denominado Ultradata, em área
sugerida para ser preservada mediante a criação do Parque, tanto nas antigas (decreto de
1989 3 1993) como na nova poligonal (GT CONPAM). Nesta hipótese, a intervenção em
comento já resultou, conforme demonstram os documentos ora anexados, em
desmatamentos e aterramentos em áreas de preservação permante, com perda significativa
da qualidade ambiental dos ecossistemas ali existentes.

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119. Os dois casos referidos apenas demonstram que a iniciativa privada, contando algumas
vezes com a colaboração decisiva, por ação ou omissão, do poder público, não mais se
contenta em ocupar o entorno da área proposta para receber o Parque do Cocó. Agora, de
forma mais ousada, avança ferozmente sobre os ecossistemas que devem ser utilizados no
futuro para a implantação do Parque, degradando-os de forma definitiva, impedindo sua
recomposição natural e legando às futuras gerações uma área totalmente degradada.

120. Resta evidente que, somente com a adoção urgente de medidas de ordem preventiva,
fundadas na efetivação do Princípio da Precaução será possível ainda conseguir manter a
integridade de bens ambientais relevantes localizados na área definida pelo GT do
CONPAM como adequada para a instalação futura da Unidade de Conservação de proteção
integral do Parque do Cocó.

121. Com efeito, no caso em apreço, estão presentes os requisitos que ensejam o
deferimento de medidas cautelares, quais sejam, a plausibilidade do direito e o perigo da
demora, mormente este último, na medida em que, como restou demonstrado
exaustivamente, novas intervenções estão surgindo todos os dias, com a rapidez
característica da especulação imobiliária, na tentativa de, através da consolidação de
situações fáticas, inviabilizar por completo o desfazimento destas construções, com sérios
prejuízos à preservação da área proposta pelo CONPAM para a criação definitiva do Parque
do Cocó. Atente-se para o que restou apurado pelo MPF em seus procedimentos
administrativos – cópias em anexo -, onde restaram evidenciadas diversas obras já em
construção ou já autorizadas pelo Poder Público municipal e estadual, que demonstram,
cabalmente, a intensidade da apropriação de todo o entorno e da própria área destinada à
futura implantação do Parque do Cocó.

122. A plausibilidade da argumentação deduzida decorre da demonstração inequívoca da


existência de estudos técncos suficientes para fundamentar a decisão política de criação do
Parque do Cocó, com a definição da tipologia a ser adotada (unidade de conservação de
proteção integral) e de seus limites territoriais, bem como da demonstração da necessidade
de definição urgente dos terrenos de marinha e das áreas de preservação permanente
existentes na área definida pelo CONPAM. O perigo da demora é evidente. Enquanto não
criada definitivamente a unidade de conservação, os expedientes de degradação de seu
entorno e da área delimitada para a sua implantação definitiva só aumentam diariamente,

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bem como a definição dos terrenos de marinha e das APPs se torna cada vez mais dificil, se
não paralisadas quaisquer intervenções dentro daquela área. Demais disso, em nome do
princípio da precaução e da solidariedade intergeracional, esta área definida pelo GT do
CONPAM deve ficar livre de qualquer intervenção até a criação definitiva do Parque, pois,
somente assim, as novas gerações terão garantido o direito constitucionalmente assegurado
de, um dia, virem a usufruir de uma unidade de conservação que preserve estes relevantes
ecossistemas.

123. Presentes os requisitos para o deferimento liminar de medidas cautelares, incumbe ao


Judiciário, enquanto poder público comprometido constitucionalmente com a preservação
do meio ambiente, efetivar o princípio da precaução, deferindo os pedidos formulados.
Neste sentido, assinala Álvaro Mirra:

No âmbito do processo judicial tal aspecto é de particular importância no tocante


á tutela jurisdicional preventiva de urgência das agressões ao meio ambiente –
por intermédio das ações cautelares ou da denominada antecipação de tutela nas
ações de conhecimento. De fato, se a orientação que deve prevalecer é a da
prudência e da vigilância no tocante às atividades degradadoras – e não a da
tolerância – parece evidente que cada vez mais a postura de juízes e tribunais
deva ser no sentido de conceder – inclusive liminarmente – a tutela preventiva de
urgência para impedir o início de um fato danoso ou para fazer cessá-lo, se já se
tiver iniciado.
De outra parte, ao estabelecer que diante do perigo de danos graves ou
irreversíveis a ausência de certeza científica absoluta não deve ser utilizada como
razão para postergar a adoção de medidas eficazes para impedir a degradação do
meio ambiente, o que o princípio 15 da Declaração do Rio de 92 na realidade fez
foi substituir, de uma vez por todas, para identificação e correção de uma ativida-
de degradadora do meio ambiente, e de uma degradação ambiental considerada
em sentido amplo, o critério da certeza pelo critério da probabilidade.
Ou seja: se existem fundamentos de ordem científica para concluir-se que uma
determinada atividade causa degradação ambiental ou é suscetível de causá-la,
por força do princípio da precaução torna-se indispensável adotarem-se medidas
eficazes para impedir essa atividade, ainda que o seu caráter lesivo seja a passível
de contestação científica. A probabilidade - nela incluída a idéia de risco sério e

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fundado - da ocorrência de uma degradação, ainda que não haja certeza cientí-
fica absoluta, impõe a adoção de medidas para impedi-Ia ou obstá-la, inclusive
pela via judicial.
Esse outro aspecto é igualmente importante, porque, como se sabe, em uma ação
judicial a constatação de uma degradação ambiental exige análises científicas e
provas técnicas variadas, abrangendo, muitas vezes, diversos campos do
conhecimento. E a prática tem evidenciado que são muitas ainda as incertezas
científicas nas questões relacionadas à proteção do meio ambiente, sobretudo no
tocante ao funcionamento dos sistemas naturais, motivo pelo qual nem sempre os
técnicos e os peritos têm condições de trazer aos processos, de maneira plena-
mente satisfatória, em termos de certeza absoluta, as informações e conclusões
solicitadas pelos operadores do direito, abrindo amplo espaço para dúvidas e
controvérsias nas demandas.
A partir daí, o que se verifica é que os profissionais envolvidos com a utilização
da legislação ambiental passam a ter de lidar com probabilidades na aplicação do
direito ambiental e os juízes, principalmente, passam a ter de tomar decisões nos
processos com base nessas mesmas probabilidades, o que contraria a formação
tradicional dos juristas de uma forma geral e dos juízes em especial, como sabido
bastante apegada à idéia de segurança e certeza jurídicas.
Nesse sentido, o princípio da precaução define, de uma vez por todas, a validade
do critério da probabilidade para a tomada de decisões em favor da preservação
da qualidade ambiental, inclusive no âmbito da aplicação judicial do direito
ambiental.
Como decorrência da substituição do critério da certeza pelo critério da pro-
babilidade, consagrado com o advento do princípio da precaução, pode-se dizer
que, nas ações ambientais, para o autor da demanda basta a demonstração de
elementos concretos e com base científica que levem à conclusão quanto à proba-
bilidade da caracterização da degradação, cabendo, então, ao réu a comprovação
de que a sua conduta ou atividade, com absoluta segurança, não provoca ou não
provocará a alegada ou temida lesão ao meio ambiente.
Assim, o princípio da precaução tem também essa outra relevantíssíma
consequência na esfera judicial: acarretar a inversão do ônus da prova, impondo
ao degradador o encargo de provar, sem sombra de dúvida, que a sua atividade
questionada não é efetiva ou potencialmente degradadora da qualidade

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ambiental. Do contrário, a conclusão será no sentido de considerar caracterizada


a degradação ambiental.
Observe-se que não há nada de extraordinário ou que possa escandalizar nessa
afirmativa, pois não é de hoje que se discute a relação entre certeza,
probabilidade e risco no direito processual, no tocante às decisões judiciais. Como
analisa Cândido Rangel Dinamarco:
"No processo de conhecimento, o exagero em que a doutrina costuma incidir
consiste na crença de que verdadeiramente os julgados se apoiem sempre na
certeza. Essa é uma ilusão que permanece, meio por inércia dos que passam pelo
assunto sem deter-se e apesar de expressivos alertas já levantados por vozes muito
autorizadas.
A rigor, o problema da certeza não se põe somente para o juiz, nem apenas com
relação às atividades jurisdicionais (...)
Em todos os campos do exercício do poder, a exigência de certeza é somente uma
ilusão, talvez uma generosa quimera. Aquilo que muitas vezes os juristas se
acostumaram a interpretar como exigência de certeza para as decisões nunca
passa de mera probabilidade, variando somente o grau da probabilidade exigida
e, inversamente, os limites toleráveis dos riscos (A instrumentalidade do processo.
São Paulo : RT, 1987. p. 337 a 339).
Como enfatiza Édis Milaré, a incerteza científica milita em favor do ambiente,
carregando-se ao interessado o ônus de provar que as intervenções pretendidas
não trarão conseqüências indesejadas ao meio considerado" ("Princípios
fundamentais do direito do ambiente", cit., p. 61-62). No mesmo sentido
posiciona-se Paulo Affonso Leme Machado, com ampla referência à doutrina
estrangeira que igualmente extrai da consagração do princípio da precaução a
mesma conseqüência (Direito ambiental brasileiro, cit., p. 58-59),
Nessa matéria, portanto, em termos processuais, pode-se afirmar que elementos
indiciários de probabilidade de degradação ambiental amparados cientificamente,
devidamente demonstrados e que não sejam contrariados de forma cabal pelo
degradador, correspondem a fatos existentes e provados.
E aí surge um outro ponto importante.
O princípio da precaução, além de acarretar a inversão do ônus da prova nas
ações coletivas ambientais, estabelece também uma verdadeira regra de
julgamento a ser seguida pelos juízes.

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Comprovada, em termos de probabilidade, com elementos sérios e confiáveis, a


realidade da degradação ambiental (efetiva ou potencial), ainda que sem certeza
científica absoluta, o resultado da demanda deverá ser forçosamente o julgamen-
to de procedência do pedido para o fim de impedir, fazer cessar ou reparar o dano
e todas as conseqüências prejudiciais do fato danoso.
De fato, se existem elementos idôneos a amparar a pretensão, pela probabilidade
da degradação ambiental, a existência de controvérsias científicas na matéria não
pode por si só inviabilizar o acolhimento da demanda, pois, como visto, a idéia de
precaução não se coaduna com a aceitação de riscos quanto à ocorrência de
danos graves ou irreversíveis, direcionando-se, ao contrário, a "prevenir já uma
suspeição de perigo ou garantir uma suficiente margem de segurança da linha de
perigo.
Assim sendo, se, em uma hipótese concreta, a ação coletiva ambiental for julgada
improcedente, por entender o juiz ou o tribunal que, diante das controvérsias
científicas na matéria, não ficou cumpridamente provada a degradação am-
biental, nessa hipótese, diante do que vem de ser exposto, estará sendo negada
aplicação a um dos princípios gerais do direito ambiental: o princípio da
precaução.9

124. No mesmo sentido, com muita propriedade, afirma Vera Lúcia R.S. Jocovsky:

Esclarecedora é a cristalina lição que realça que no Direito Ambiental,


diferentemente do que se dá com outras matérias, vigoram dois princípios que
modificam, profundamente as bases e a manifestação do poder de cautela do juiz:
a) o princípio da prevalência do meio ambiente (da vida); b) o princípio da
precaução (algo mais que o princípio da prevenção, já tradicional no nosso
direito). Tutela ambiental que chega quando o dano ambiental já foi causado
perde, no plano da garantia dos valores constitucionalmente assegurados, muito,
quando não a totalidade, de sua relevância ou função social.10

125. No caso concreto, em face de todas as circunstâncias fáticas e jurídicas levantadas pelo
MPF, em nome da efetividade do princípio da precaução, mostra-se recomendável a

9
Artigo anteriormente citado, págs.99/101.
10
Meios de Defesa do Meio Ambiente. Ação Popular e Participação Pública, in Revista de Direito Ambiental,
editora RT, ano 5, nº 17, pág.71.

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imediata paralisação do início de novas obras, dentro da área definida pela proposta do GT
do CONPAM para receber o futuro Parque do Cocó, até que todas estas questões estejam
efetivamente resolvidas, o que somente acontecerá quando o Parque for realmente criado e
for definida sua respectiva zona de amortecimento e os usos permitidos, conforme definição
de seu respectivo Plano de Manejo a ser elaborado sob a coordenação da SEMACE.

126. Presentes os pressupostos para o deferimento da medida liminar e evidenciados fatos


que demandam a efetivação do princípio da precaução, conforme restou demonstrado acima
através dos ensinamentos doutrinários transcritos, somente resta ao MPF buscar junto ao
Poder Judiciário a concretização do referido princípio ambiental, cabendo a esse Juízo atuar
na forma determinada pela Constituição, ou seja, enquanto poder público comprometido
com a preservação ambiental.

127. Ademais disso, cumpre salientar que as providências cautelares buscadas não têm
efeito satisfativo, tendo em vista que, criado o Parque do Cocó e estabelecida a sua Zona de
Amortecimento, pelo órgão ambiental competente, caberá a este a realização de seu Plano
de Manejo, onde serão estabelecidos os critérios necessários para as formas de utilização
futura destas áreas. Trata-se, pois, de preservar hoje para ordenar no futuro, e não para
inviabilizar, definitiva e totalmente, o direito de propriedade de qualquer pessoa que possua
titularidade imobiliária na área que se visa, neste momento, preservar. É neste sentido que
se posiciona a jurisprudência, quando entende ser legítima a atuação administrativa
destinada a impedir a realização de obras em áreas destinadas a futura criação de Unidade
de Conservação, bem como a delimitar esta área e as áreas de preservação permanente
existentes no entorno:

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PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. CRIAÇÃO DE UNIDADE


DE CONSERVAÇÃO. REVOGAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA PESQUISA DE
CALCÁRIO BIOGÊNCIO. RISCO AO MEIO AMBIENTE. POSSIBILIDADE DE
DANO IRREVERSÍVEL NA ÁREA DE IMPLANTAÇÃO DO PARQUE. PRINCÍPIO
DA PRECAUÇÃO. DESPROVIMENTO DO AGRAVO.
1. Na disciplina da Constituição de 1988, a interpretação dos direitos individuais deve
harmonizar-se à preservação dos direitos difusos e coletivos.
2. A preservação dos recursos hídricos e vegetais, assim como do meio ambiente
equilibrado, deve ser preocupação de todos, constituindo para o administrador público
obrigação da qual não pode declinar.
3. Se há a intenção de criação de unidade de conservação ambiental em área onde
anteriormente havia sido deferida licença de pesquisa para explotação de calcário
biogênico, é possível a revogação da licença concedida, pois o princípio da precaução
recomenda que em defesa da sociedade não seja admitida a exploração da área em
questão.
4. A irreversibilidade do dano potencial aos meios biótico, planctônico e bêntico, indicam
que o prosseguimento de pesquisas de extração na área irão alterar o meio, situação que
não autoriza a concessão de tutela antecipada para revigorar a licença revogada.
5. Agravo de instrumento improvido.
TRF da 1a.Região. AI 200301000290187, 5a. Turma. Rel. Des.Fed. Selene Maria de
Almeida, Julgado em 15/12/2003.

DOS PEDIDOS:

128. Diante de todo o exposto, requer o MPF de Vossa Excelência:

1) o deferimento de medida liminar que determine:


a) À União, através da Superintendência Regional do Patrimônio da União no
Ceará, que proceda, no prazo de 180 ( cento e oitenta) dias, a identificação e
delimitação física da faixa de domínio da União (terrenos de marinha e seus
acrescidos) na área destinada à futura implantação do Parque do Cocó, conforme a
poligonal definida pelo estudo do GT do CONPAM, abstendo-se de conceder
qualquer inscrição de ocupação e/ou aforamento e transferência de domínio útil
entre particulares nestas áreas, bem como a concordância com a
construção/edificação de qualquer novo empreendimento privado, até que seja
criado efetivamente o Parque do Cocó e sua respectiva Zona de Amortecimento,
com o seus disciplinamento estabelecido pelo seu respectivo Plano de Manejo;
b) À União, através da Superintendência Regional do Patrimônio da União no
Ceará, que proceda, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, com uma análise em
todas as inscrições atualmente vigentes para utilização de terrenos de marinha e

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seus acrescidos, na área destinada à futura implantação do Parque do Cocó,


conforme a poligonal definida pelo estudo do GT do CONPAM, eleborando um
relatório completo onde restem consignadas as seguintes informações: 1) o número
da inscrição; b) a delimitação precisa da área inscrita; c) a data de deferimento da
inscrição; d) a utilização prevista do imóvel no ato da inscrição; e) a verificação se
esta utilização foi mantida desde a inscrição até os dias atuais; f) se a utilização foi
paralisada e hoje nada mais é utilizado; g) se existem benfeitorias na área inscrita e,
havendo, especificá-las e informar se são compatíveis com a utilização definida no
ato de inscrição; h) se o titular da inscrição está rigorosamente em dias com o
pagamento dos encargos decorrentes da utilização de terrenos de marinha; e, I) se a
área inscrita está localizada em área de preservação permanente ou se houve
qualquer tipo de utilização que importasse em dano ambiental, suspendendo a
eficácia destas inscrições até que a referida análise seja apresentada a este Juízo;
c) À União, que se abstenha de conceder qualquer forma de repasse de recursos
finaceiros para qualquer tipo de intervenção a ser realizada dentro área destinada à
futura implantação do Parque do Cocó, conforme a poligonal definida pelo estudo
do GT do CONPAM, até que seja criado efetivamente o Parque do Cocó e sua
respectiva Zona de Amortecimento, com o seu disciplinamento estabelecido pelo
seu respectivo Plano de Manejo, bem como, para bloquear, reter ou fazer retornar
aos cofres da União qualquer recurso federal que já tenha sido repassado para
intervenções nesta área;
d) À SEMACE, ao IBAMA e ao Município de Fortaleza, através da SEUMA,
que procedam, em conjunto e no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, com o envio
deste estudo a este juízo, onde restaram apuradas a identificação e a delimitação
física de todas as Áreas de Preservação Permanente na área destinada à futura
implantação do Parque do Cocó, conforme a poligonal definida pelo estudo do GT
do CONPAM, até que seja criado efetivamente o Parque do Cocó e sua respectiva
Zona de Amortecimento, abstendo-se de conceder quaisquer novas licenças
ambientais nesta área definida pelo GT CONPAM, para qualquer empreendimento
público ou privado, até que seja criado efetivamente o Parque do Cocó e sua
respectiva Zona de Amortecimento, com o seus disciplinamento estabelecido pelo
seu respectivo Plano de Manejo;
e) À SEMACE, ao IBAMA e ao Município de Fortaleza, através da SEUMA,
que no exercício regular do poder de polícia, paralisem, de imediato, a partir do

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deferimento desta liminar, qualquer intervenção que esteja sendo realizada nos
limites territoriais traçados pela nova poligonal definida pelo estudo do GT do
CONPAM, até que seja criado efetivamente o Parque do Cocó e sua respectiva
Zona de Amortecimento, com o seus disciplinamento estabelecido pelo seu
respectivo Plano de Manejo.

2) No mérito:

a) Que sejam tornados definitivos todos os pedidos cautelares formulados,


obrigando a União, a SEMACE, o Município de Fortaleza e o IBAMA a
adotarem as condutas especificadas em cada um destes pedidos, até que seja
efetivamente implementado o Parque do Cocó e definida sua Zona de
Amortecimento e o respectivo regramento de sua utilização, conforme se dispuser
no seu Plano de Manejo a ser elaborado sob a coordenação do órgão ambiental
competente.
b) Que a União anule todos as inscrições para utilização de terrenos de marinha que,
dentro da área definida pela nova poligonal elaborada pelo estudo do GT do
CONPAM para a criação do Parque do Cocó : 1) não estejam mantendo a utilização
definida no ato de inscrição; 2) estejam localizadas em áreas de preservação
permanente; e/ou 3) estejam em débito com a União;
c) Que o IBAMA, a SEMACE e o Município de Fortaleza, através da SEUMA,
não mais concedam qualquer licença ambiental para qualquer tipo de intervenção
dentro da área definida pela nova poligonal elaborada pelo estudo do GT do
CONPAM para a criação do Parque do Cocó, até que seja efetivamente
implementado o Parque do Cocó e definida sua Zona de Amortecimento e o
respectivo regramento de sua utilização, conforme se dispuser no seu Plano de
Manejo a ser elaborado sob a coordenação do órgão ambiental competente;
d) Que a União se abstenha de realizar qualquer forma de repasse de recursos
federais para intervenções na área definida pela nova poligonal elaborada pelo
estudo do GT do CONPAM para a criação do Parque do Cocó, até que seja
efetivamente implementado o Parque do Cocó e definida sua Zona de
Amortecimento e o respectivo regramento de sua utilização, conforme se dispuser
no seu Plano de Manejo a ser elaborado sob a coordenação do órgão ambiental
competente;

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3) Demais pedidos:
a) a citação de todos os demandados para que, querendo, possam contestar a
presente demanda;
b) o deferimento da produção de provas por todos os meios em direito admitidos,
notadamente a realização de perícias e a juntada posterior de documentos;

Dá-se a causa o valor de R$ 10.000,00 (Dez mil reais)

Termos em que,
Pede e espera deferimento.

Fortaleza, 17 de maio 2013.

Nilce Cunha Rodrigues Alessander W C Sales


Procuradora da República Procurador da República

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