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GUIDO V I A R O PIONEIRO D A PINTURA M O D E R N A NO P A R A N A

Adalice Araújo

0 artista participa da sociedade como especie de radar:


nao so age como sistema de detecção, captando seu meio-ambien-
te, como prevê a nova dimensão humana da sociedade futura.
Talvez, mais do que os outros, tenha condiçoes de reagir con-
tra os elementos condicionadores de seu status social; por
isto mesmo, denuncia-os e simultaneamente age como verdadeiro
elemento desencadeador de liberdade e renovaçao.
Quais as circunstancias que determinariam a passagem da
aculturaçao para a criatividade? Ë difícil analisá-las e mais
ainda defini-las. Como sabemos, o Parana no início do século
vivia ainda a permanência do tropeirismo e a formação de uma
infra-estrutura cultural. Vinte e dois anos seriam poucos para
mudar radicalmente a situaçao. Daí porque, para nós paranaen
ses, a Semana de 22 de São Paulo foi um fenômeno isolado.
Viveríamos a nossa propria semana de Arte Moderna (pelo que
esse termo significa no sentido de atualizaçao com uma realida
de internacional e o consequente despertar de um nacionalismo)
apenas anos mais tarde, após a chegada ao Paraná, em 1933, de
Guido Viaro seria assim o marco inicial do Movimento de
Integração da Arte Paranaense, e,jã em fins da década de 40,
teria a sua contemplação com a criação da revista "0 Joaquim"
por Poty, Dalton Trevisan e outros.
Assim como Minas Gerais tem Guignard, o Paraná tem Via-

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ro símbolo de: O N T E M / H O J E / S E M P R E . Formador de várias gera-
ções de artistas paranaenses é pioneiro, possivelmente em âm-
bito n a c i o n a l , das escolinhas de arte para crianças. Como ar-
tista, Guido Viaro representa uma das mais altas expressões da
p i n t u r a expres s i on i sta latino-americana. Compreendendo o ser
humano com todas as suas qualidades e fraquezas, nao poderia
exilá-lo de sua arte. A sua grande fonte de inspiraçao so po-
deria ser o homem e o que o rodeia. Cora visão subjetiva, res-
peita a integridade dos s e r e s , embora variem técnicas e temas.
Assim poderemos ver b e l e z a mais formal em p a i s a g e n s ou crian-
ças, bem como poderemos sentir as palavras ríspidas e ao mes-
mo tempo h u m a n a m e n t e poéticas com que d e s c r e v e as mulheres do
povo lavando roupa, ou, como boas comadres comentando a vida
do p r o x i m o , ou ainda a mae ignorante que segura o filho esquã
lido nos b r a ç o s , com amor instintivo e quase animal. Sempre
pesquisando chegaria finalmente a libertar os elementos de um
sentido meramente documental, cujo climax é atingido na ultima
fase conhecida como "fase religiosa". Em vez de fazer uma arte
dirigida como é a arte social dos m u r a l i s t a s mexicanos, faz
uma arte m í s t i c a , onde através da e x a l t a ç a o de Cristo prega
amor/igualdade, lutando contra as injustiças sociais. Tendo
por inspiraçao principalmente a Via C r u c i s , seus personagens,
mesmo aí, sao tirados da vida cotidiana: gente simples porém
d r a m á t i c a , heróica m e s m o , por transcender os limites da maté-
ria e gritar bem alto a dor coletiva que é a de todos os ho-
mens. Com uma solenidade ritual e aspera, o introduz
o espectador no climax da tragédia, onde ele também passa a
gemer e sofrer com os protagonistas do drama, na metamorfose

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artística que somente os v e r d a d e i r o s criadores conseguem trans-
mitir. Segundo as p a l a v r a s do p r ó p r i o Viaro, a dor de Cristo
morto é um s í m b o l o : "e a dor de ver a morte de n o s s o p r ó p r i o fi
lho". Daí sentirmos diante de suas crucificações que algo ex-
plode e ao m e s m o tempo se e s t r a n g u l a diante de n ó s . No rosto
convulso de Jesus em agonia está o paradoxo do ser h u m a n o - a
suprema pergunta: a existência e inexistência. Assimilando todo
o ideal humanista de imanência do divino, Cristo passa a ter um
caráter simbólico de q u e m , por a m o r , em p l e n o século XX, conti-
nua carregando o grande peso do s o f r i m e n t o e da m i s e r i a humana.

VIARO FALANDO
- Por que Curitiba, Prof. Viaro?
- Cheguei aqui por acidente. Em Sao P a u l o des en tend i - m e com
uns decoradores, fui ã E s t a ç a o da S o r o c a b a n a e tomei o primeiro
trem que passou. Assim vim p a r a r em C u r i t i b a , como poderia ter
ido a Porto Alegre ou Rio. Fiquei algum t e m p o , mas era difícil
sobreviver naquela época só com a p i n t u r a . Como sempre tive a
mania de e s t a r quite com meus compromissos econômicos, para
ganhar 150 m i l réis, fui p i n t a r casas de m a d e i r a . Neste interim
fiz u m a exposição na Associaçao Comercial vendendo cada quadro
por 40 ou 50 m i l réis. E s c r e v i um artigo no Diário da Tarde de-
clarando que eu nao admitia aquela pintura descritiva; inconti-
nenti os compradores me devolveram os q u a d r i n h o s dizendo que se
eu p r ó p r i o atacava a minha pintura é porque não tinha valor. En
fim, fiz u m a série de b e s t e i r a s e decidi ir ao M é x i c o . Para tan
to, e c o n o m i z e i dois contos de réis,tendo inclusive.declinado do
oferecimento do P r o f . Parodi para lecionar no Colegio Iguaçu.
Acontece que um b o n i t o dia, quando estava esperando que passas-

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se o navio que me levaria ao M é x i c o , vi passar pela rua XV, Y£
landa, m i n h a e s p o s a e mudei por completo de idéia. Corri ao Co
légio Iguaçu para perguntar se o lugar ainda estava vazio -di£
seram-me que sim, e então comecei a lecionar ali. No entanto
estava assediando a praça forte de Y o l a n d a que meio a contra-
gosto começou a falar c o m i g o , até que um dia sua família aca-
bou por me conceder a possibilidade de n a m o r a - l a . Gastei os
dois mil cruzeiros em flores para ela. A c a b a n d o minha reserva,
aqui fiquei e aqui estou. Houve época, logo após o casamento,
que lecionava em quase todos os colégios de C u r i t i b a . Leciona-
va 15 ou 16 horas por dia, e, quando chegava em casa, ainda
d e s e n h a v a ou pintava".

- Como é antes, durante e após a realização do quadro?


- Antes do q u a d r o , ele é em geral d i g e r i d o . Assim que é
concebido adormece quase que em estado de gestaçao dentro do
indivíduo. Quando ele tenta, ou quer fazer alguma coisa, soli-
cita a esta imagem ou m u l t i p l i c i d a d e de criaturas que estão
dentro de si para virem auxiliá-lo, porque se nao estão dentro,
de nada adiantaria faze-la visto que cada obra deverá corres-
ponder ã construção de um mundo novo. Ao começar, nem o pró-
prio artista sabe se poderá terminar o trabalho, que embora
possa ser pré-concebi do deverá estar sempre subordinado a in-
tuição. Mesmo depois de finalizado e encostado à p a r e d e , por
algum tempo, tem de ser submetido a própria crítica. Se resis-
tir e porque existem elementos bons - se nao, é melhor des-
trui-lo. Eu destruo muita coisa, eu destruo...

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- Fale de sua arte, cite inclusive fases que passou.
- A princípio Viaro limita-se a responder:- "A minha arte
é aquilo que é". Depois, aqui e lã, no desenrolar da conversa,
diz o seguinte: - "Antes de chegar ao Brasil fiz diversas exp£
sições na Europa. Veneza naquela época era e x c l u s i v a m e n t e pre-
sa a um realismo objetivo; daí a razao pela qual m i n h a conduta
frente aos movimentos não foi bem sucedida. Tanto que um críti^
co v e n e z i a n o , Sr. Scarpa, escreveu num cotidiano que minhas t¿
las eram feitas com excessiva rudeza, porém possuiam uma manei^
ra p r o p r i a e uma "inconsciencia de limites" só permitida aos
artistas. Embora express ion ista, passei por todos os climas
conhecidos, até chegar a esta fase m í s t i c a , dentro da qual me
parece, ter podido fazer alguma coisa, se nao grande, pelo me-
nos representativa. No lugar de fazer uma arte social eu faço
uma arte r e l i g i o s a , eis a minha temática geral. Por exemplo,
a Via Crucis e espiritual e ao mesmo tempo todos os acompanhan
tes desse Cristo que será sacrificado representam o povo ou se
ja o individuo que sofre, o unico que crê, que tem necessidade
do apoio de Cristo, esse espírito superior. E n t ã o , em vez de
fazer arte dirigida como é a arte s o c i a l , eu traduzo através
da Bíblia todo o sofrimento de C r i s t o , exalto o povo através
da exaltação de Cristo que pregou o amor e igualdade entre os
h o m e n s , sem diferenças raciais e econômicas. Depois de Cristo,
São Francisco de Assis é o único santo h u m a n o , g r a n d e , que apa
receu na casca da terra. 0 único que aprecio porque soube se
desvencilhar do superfluo e até do n e c e s s á r i o . 0 meu problema
hoje é de procura e pesquisa. Estou estudando Moisés. Para mim
Moisés não é aquele descrito por M i c h e l a n g e l o , um deus grego,

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um homem forte, g r a n d e , m a r a v i l h o s o , intocável e distante. 0
Moisés dos judeus é outro aquele que se e l i m i n o u , abjurando
o próprio povo pela porcaria que fez, pela i n j u s t i ç a , e falta
de seriedade; eu quero faze-lo antes de se e l i m i n a r . Antes de
cancelar a matéria e se tornar quase espirito: deixar só os o-
lhos. Ver através do brilho dos o l h o s , a única vitalidade que
deve aparecer no semideus dos judeus. Tenho p r o c u r a d o muito
mas ate agora nao consegui, mas hei de fazê-lo.

- Até que ponto existe a participação do espectador?


- Sua p a r t i c i p a ç a o é um elemento compositivo, isto é, por
assim d i z e r , solicitamos o auxílio do e s p e c t a d o r como forma
compositiva mas nao no sentido que possa ajudar a expressão
criadora. 0 mundo exterior só nos ajuda após ter sido incorpo-
rado e s p i r i t u a l m e n t e , porem a obra deve ser s u g e r i d a , para que
o espectador participe de maneira g l o b a l , complementando-a com
o seu próprio conteúdo subjetivo. E x p l i c o m e l h o r : o excesso de
m a t é r i a diminui a própria essência da obra: Esta deve ter uma
base espiritual que limite o peso da m a t é r i a para que a parti-
cipaçao do espectador, ao contemplá-la, t r a n s f o r m e - o em co-autor
da obra. Se nao tiver um conteúdo este p a s s a r a por ela como se
fosse um cartaz. Se por acaso criássemos um trabalho fantásti-
camente realista en que o mundo p u d e s s e ver o que o indivíduo
queria d i z e r , este tornar-se automaticamente limitado e insí-
pido como um prato de comida que já tivesse saturado pelo ex-
cesso; deve portanto possuir elementos nao d e c i d i d a m e n t e expli_
cados a serem completados pela imaginaçao do espectador - sím-
bolos de uma visão cosmogónica que lhe apresente certa dificul^
dade de p e r c e p ç ã o . Ao desafiar-se a sua capacidade perceptiva,

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a obra torna-se útil e interessante.
- Como definiria seus modelos?
- Como posso definir? Sao elementos sociais que perambulam
por ail Através do espírito m í s t i c o procuro v a l o r i z á - l o s o
quanto posso. V o c ê veja o Cristo morto é um homem símbolo do
amor crucificado . Todos os ascetas que o c i r c u n d a m são
elementos da sociedade que o capitalismo e o totalitarismo de¿
troem ou tentam destruir. Sempre foi e talvez sempre será
assim. Haja v i s t a , por e x e m p l o , o caso da Rússia que está dis_
cutindo o fato da I n g l a t e r r a ter e l i m i n a d o aqueles espiões do
proprio território. Quer dizer que a Rússia está tentando sur-
rupiar a uma outra nação o esforço do próprio povo. Ora, se
ela j u s t a m e n t e ostenta o título de e x a l t a d o r a dos direitos do
povo está cometendo uma g a f e , uma indecência moral perante a
humanidade Toda.Há também o caso dos tupamaros,vietcongs e,por
outro lado a Rússia ajudando á r a b e s , e Estados Unidos os israe
litas,ambos vendendo armas a um e a outro e depois ousam falar
em nome da fraternidade universal'. Obviamente temos de refle-
tir em n o s s a p i n t u r a alguma coisa disso tudo.

-Como foi sua experiência em Esaolinha de Arte?


-Gostei e s o b r e t u d o me senti bem porque estava junto com
a
infancia, o que me dá a sensação de prolongar m i n h a propria
vida. E s c o l i n h a s de Arte não d e v e r i a m ser um rameirao como es-
ta atualmente o c o r r e n d o , mas p r e c i s a r i a m estar espalhadas nos
quatro pontos cardeais da c i d a d e , p a r a que seu acesso fosse fa-
cultado a todos os filhos de gente pobre. P o r q u e , justamente,
os m e l h o r e s elementos de nossas escolas sao gente de bairro.
G e n t e , filho de pobre gente que jamais teve c a r i n h o , ou prlti-

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camente nada- Porque é ai que se encontra a verdadeira sensibi
lidade e a escola permite , através da cor,da expressão nova,
uma fuga ou uma realizaçao.

- Como encara a problemática da arte?


- Arte é uma necessidade e s p i r i t u a l . É manifestar os pró-
prios sentimentos, os próprios anseios de dizer aos outros o
que se pensa do mundo exteri or , e x t r a v a s a n d o as n e c e s s i d a d e s in
teriores. Desde o paleolítico até hoje o homem possui uma ma-
nifestaçao artística que se coaduna com o m a g i c i s m o religioso.
Religião e arte se c o n f u n d e m , nao tem limites. A criatura hu-
mana tem sempre tentado se exprimir de maneira invulgar, porém
nem todos, mesmo aqueles que pensam estar fazendo arte, conse-
guem fazer alguma coisa sensível que transmita algo dos an-
seios h u m a n o s . Falo exprimir no sentido de preencher uma lacu-
na humana. Talvez o problema mais sério que um jovem artista
deva enfrentar seja o fator economico. Hoje os materiais cus-
tam caríssimo. Se quiser fazer um trabalho grande ira gastar
uma fortuna em m a t e r i a i s , de modo que se ve constrangido a afo
gar, a reduzir, a estrangular a própria emotividade. 0 mercado
também é restrito. A própria casa m o d e r n a , o a p a r t a m e n t o , em
gei al de pequenas dimensões>nao comportam um quadro grande; o
indivíduo tem forçosamente que fazer um quadro p e q u e n o , pois
ocorre o fenomeno comum do "quadro complemento decorativo da
parede". Nao se compreende a "arte-mensagem". Efetivamente, o
artista é um indivi dual i sta,com sua própria sensibilidade e
emotividade. Daí também a razao pela qual nao se pode nivelar
nem a arte, nem os seres,como preconizam o comunismo e os par-
tidos totalitários. 0 artista é um ser e s t r a n h o , um maluco e

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ao mesmo tempo um equilibrado, que sente todos os movimentos
telúricos do mundo e tenta através da propria sensibilidade
transmitir sua emotividade, de modo a ser útil àquelas criatu-
ras sensíveis; aos outros nao interessa. Ocorre o mesmo em ou-
tros setores: para um indivíduo que nao gosta de foot-ball é
inútil falar no assunto, assim para quem nao gosta de música
por que falar de Debussy? Quer dizer, o mundo ainda hoje não
é coletivo. Nem o comunismo nem o socialismo conseguiram ar-
rancar o individualismo dos seres. Assim como nao existem duas
folhas exatamente iguais numa árvore, nao existem também duas
criaturas iguais; nem mesmo irmãos que provem de uma mesma ma-
triz, isto é, de um mesmo ser. Cada um tem uma própria razão
de ser, de pensar, de sentir.

- 0 que pensa da arte moderna?


- 0 que é a arte moderna eu não sei? Quer talvez dizer
zrte contemporanea? Porém eu conheço só uma forma de arte:
arte verdadeiracien í..j arte, arte manifestação superior de um
povo, que mostra o grau de civilização a que atingiu. Devemos
admitir que a arte atual, em muitos aspectos, deve ser considera
da em relaçao a arquitetura. Dai, também, compreendemos a neces-
sidade de preencher uma função decorativa dentro das linhas rí-
gidas e simples do funcionalismo arquitetônico. Surgindo for-
çosamente uma arte de cor, de vibração visual, válida para
a criatura humana ja com demasiados problemas para pensar. Se
num ambiente decor ado modernamente nos incluirmos uma mensagem
qualquer que seja, poderia criar insegurança, justamente num
momento em que aquele ser afogado por um excesso de tensões de

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veria esquecer os problemas que o a t o r m e n t a m . Quanto a certos
movimentos como a "anti-arte", considero-os estupides, manei-
ra elegante de fazer alguma coisa d i f e r e n t e , para chamar aten-
çao do público ps eudo-inte 1 ectua1.

- E a arte no futuro?
- A arte do futuro é imprevisível. Por um lado,a técnica
moderna chegou a um ponto tal que se d i v o r c i a completamente da
sensibilidade do povo; por outro lado, todos os caminhos já
foram e x p l o r a d o s , desde a pintura a é r e a , desde a pintura bidi-
mensional ã tridimensional, desde a mecanica a pesquisa de la-
b o r a t ó r i o . Assim é dificil prever o que o futuro irá proporcio
nar. Mas como o homem é sempre homem e vive como h o m e m repe-
tir-se-ã dentro do espaço e do t e m p o . Habituado que é a cho-
rar, b l a s f e m a r e rezar, acostumado a protestar contra tudo e
contra todos,e possível que a arte sofra uma volta ao primiti-
vismo antigo, vestida de uma m a n e i r a diferente, com palavras e
símbolos d i f e r e n t e s ; visto que o m u n d o nao p á r a , ao contrário,
caminha, e portanto voltar atrás seria n e g a r toda a evolução
humana. Devemos também admitir que a arte tende a industriali-
zação, mas em forma ilustrativa e descritiva. Aliás, a própria
m u s i c a e literatura sao d e s c r i t i v a s , d e s c e n d o em profundidade,
descrevendo a tragédia da criatura h u m a n a . So que dentro des-
ta amarraçao t e c n o l ó g i c a , o artista devera descobrir uma nova
forma para atingir a parte sensível da criatura h u m a n a . Veja
- se o ab s t r a c i o n i s m o atual que em sua função tende a eliminar
o problema p s i c o l ó g i c o , passando a agir como uma espécie de
f o o t - b a l l , de "pan is-circens e" dos r o m a n o s , onde, no momento
em que tem fome, esquece a tudo para soltar foguetes.

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- Como encara a tecnologia e a criação artistica?
- A criação h u m a n a pode ser auxiliada pela tecnologia. Não
pode repousar completamente nela por ser ciencia pura. 0 dia
em que transformarmos a arte em e s p e c u l a ç ã o científica, então
ate logo, estaremos perdidos. Porque e l i m i n a n d o o espírito, a
religião e a propria arte, eliminaremos tudo.

- Como ê seu conceito de espaço?


- Não tenho muito conceito de espaço porque respiro mal.

- Qual a função da cor em seu trabalho?


- É um complemento. Voce ve que o veículo de minha obra é
o desenho e não a cor. A g r a v u r a , por e x e m p l o , é um elemento
que leva o indivíduo em p r o f u n d i d a d e ; a cor é s u p e r f i c i a l , ê
quase um elemento de ócio, de p r a z e r . E m b o r a nao possamos vi-
ver num mundo sem cores, uma p i n t u r a totalmente apoiada nas co
res, mesmo que haja t e m á t i c a , sera d e c o r a t i v a , j u s t a m e n t e por
apelar mais aos sentidos do que a razao.

- Quais as influencias em sua evolução artís tica?


- Devo confessar uma coisa, aliás, já confessei muitas ve-
zes. Até 1936 era m e d i o c r e p i n t o r , quando veio da Itália De Bo-
na com uma exposição maravilhosa - com aquele entusiasmo e a-
quela m a n e i r a de fazer tal - que em seis m e s e s , m o d i f i q u e i to-
talmente; h a v i a descoberto a i n v e n ç ã o ! É portanto a ele que de-
vo a transformaçao de minha pintura. Se formos suficientemente
humildes deveríamos reconhecer que inclusive os alunos nos po-
dem ensinar coisas. Quantas vezes em poucos minutos encontram
o dispositivo final v i t a l , a renovação dos problemas sofregamen
te b u s c a d o s ! Finalmente me vali também de A n d e r s e n , bastante

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tecnico, cujo dominio artesanal é veículo indispensável para a
projeção da s e n s i b i l i d a d e . Sempre a n d a n d o , em procura de algo
ma,is do que ser simplesmente profissional, fiz gravuras. Con-
tinuo andando, isto e, continuo procurando.
- Que mensagem enviaria a um jovem artista?
- Trabalhar, trabalhar, trabalhar.

QUEM FOI GUIDO VIARO

Guido Batista Viaro nasce em Badia P o l e s i n e , Itália, em


9 de Setembro de 1897, sendo filho de Santina Soldé Viaro e
João Batista Viaro. Na cidade natal cursa o primeiro e segundo
grau. Inicia sua formaçao artística em Veneza tendo completa-
do estudos em Bolonha. Em 1921 exerce o magistério de desenho
na Escola de Desenho de Badia. Por algum tempo mora em Paris.
Na primeira fase de sua pintura, antes de vir ao Brasil, está
demasiado preso ao realismo objetivo, tanto é que um crítico
veneziano! Sr. Scarpa, comenta que suas telas eram feitas com
excessiva rudeza, porém,pos sui am uma m a n e i r a própria e uma in-
consciencia de limites só p e r m i t i d a aos artistas. Em 1928 de-
sembarca no Rio de Janeiro onde p e r m a n e c e pouco tempo. Passa
a residir em Sao Paulo ondo colabora como caricaturista em j o r^
nais locais e realiza sua primeira individual. Em 1933 radi-
ca-se no P a r a n a onde passa a exercer simultaneamente as fun-
ções de: p r o f e s s o r , p i n t o r , d e s e n h i s t a , gravador e escultor.
Em 1935 casa-se com Yolanda Stroppa tendo em 1938 um filho de
nome C o n s t a n t i n o . Em 1937 inicia uma experiencia inédita no
Brasil formando uma escolinha de arte no Colégio Belmiro Ce-
sar. (Graças ao apoio da pedagoga paranaense Eny Caldeira,

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apenas em 1950 o Centro Juvenil de Artes Plásticas seria regu-
larizado). Algum tempo após a experiência do Colégio Beimiro
Cesar,surge a Escola de Arte Guido V i a r o , numa das dependên-
cias da Sociedade Dante A l i g h i e r i , Praça Z a c a r i a s , Em 1948 le
va seus alunos ã recém-criada Escola de Musica e Belas Artes
da qual é um dos professores fundadores (assim é que seus alu-
nos particulares passam a constituir o núcleo inicial da área
de Belas Artes). Antes de M c L u h a n , o papa da comunicação con-
temporânea, ele já chegara a conclusão de que a arte é essen-
cialmente processo de comunicaçao, transmitindo inclusive aos
seus alunos da Escola de Belas Artes o sentido v e r d a d e i r o de
uma auto-educaçao: nao só criando a clima de professor - a n i m a -
dor como também de a1 u n o - p e s qui s ador. Pode-se dizer que na épo
ca Viaro salva a criatividade da nova geração paranaense. Como
gravador colabora na revista "0 Joaquim". Em 1942, recebe uma
medalha de bronze em pintura no Salao Nacional de Belas Artes.
No Salão Paranaense: 1947, medalha de prata; 1951, M e d a l h a de
Ouro; 1952, prêmio de viagem. Em I960, m e d a l h a de prata, Porto
Alegre; 1952, medalha de ouro, Salao do Clube C o n c ó r d i a ; 1966,
Sala Especial no II Salão de Arte Religiosa de Londrina. Rea-
liza mostras individuais em C u r i t i b a , Porto Alegre e Rio. Em
1966 o Departamento de Cultura publica um opusculo na Documen-
tação Paranaense intitulado: "Guido Viaro A r t i s t a e Mestre".
Entre outras referências b i b l i o g r á f i c a s , é citado no "Dicioná-
rio de Artes Plásticas no Brasil" de Roberto Pontual. Em 1969
é focalizado numa reportagem de "0 Cruzeiro". No mesmo ano os
alunos da Escola de Belas Artes, em reconhecimento ã obra do
m e s t r e , considerado pioneiro da pintura m o d e r n a no Paraná,

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d a o o nome de Guido Viaro ao D i r e t ó r i o A c a d é m i c o . Sua ultima
exposição individual realiza-se no dia 22 de Setembro de 19 71»
pouco antes de seu falecimento,ocorrido no dia 4 de novembro,
do mesmo ano, em Curitiba.
A obra de Guido V i a r o , o artista que amou a humanidade,
continua. A sua filosofia de vida al esta, em qualquer crian-
ça que pinta expontane amente, d e s c o b r i n d o en si a aventura
de criar.

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