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Autor: André Vilela D’Elia

Gênero: Cinema brasileiro

Cavação:

A historiografia do cinema brasileiro indica como “o nascimento”


do cinema nacional no dia 19 de junho de 1898, quando o italiano Afonso
Segreto com uma câmera e material sensível europeus, de cima de um
navio francês, fez tomadas de fortes e navios ancorados na baia. Este
primeiro “filme” brasileiro não tem registros de uma projeção, nem se
quer se sabe se foi revelado ou exposto da maneira correta, mas mesmo
assim é tido como o marco inaugural. Jean-Claude Bernardet em seu
texto “O nascimento” nos mostra que independentemente dos detalhes
historiográficos, o cinema requer a legitimação de um início, mesmo que
de forma mítica “uma instância existencial” e cronológica estabelece uma
relação causal da historia do cinema brasileiro e mundial, por exemplo:
introdução de novas tecnologias, gêneros dramáticos e qualquer outro
fato que possa mudar o rumo cinema, como guerras e revoluções. Tal
relação causal é a base do conhecimento e noção da atividade
cinematográfica. Portanto não se trata de um marco puramente histórico,
mas do inicio de um pensamento cinematográfico.
Na França, a data escolhida para o nascimento o cinema é o dia 28
de dezembro de 1895, quando ocorreram as primeiras projeções públicas
feitas com os equipamentos dos irmãos Lumiere.
No primeiro capitulo do livro Cinema brasileiro: propostas para
uma história de Jean-Claudet Bernardet, o autor faz uma analogia do
cinema com outros produtos como botões, calçados e sal, e como tais
produtos, o cinema também pode ser importado independentemente de
sua importância como obra de arte, e suporte técnico da historia e cultura
de um povo. O autor coloca o cinema como um produto sucessível a
acordos comerciais, tanto na produção como em sua exibição, e coloca
claramente a situação atual do cinema brasileiro dependente desses
acordos, que só favorecem os filmes importados, uma vez que muito mais
vantajoso e lucrativo exibir filmes americanos que já foram previamente
lançados nos EUA, o acesso às copias é mais barato, e como os filmes já
foram lançados estes já passaram por uma “pesquisa de mercado”, já se
sabe quais filmes agrada o público e quais filmes não agrada o público, o
que diminui muito o risco de prejuízo para o exibidor. Quando o filme é
nacional ele tem que “arriscar” pois não se sabe como o publico ira
reagir.
Todas essas desaforáveis situações causadas pela presença de
filmes estrangeiros desfavorece também a produção cinematográfica,
como produto, o cinema nacional não vende e por isso não pode se
consolidar como industria, o ciclo de produção , distribuição e exibição
não se fecha, o cinema nacional esta sufocado pela grande oferta de
filmes estrangeiros e por isso a qualidade e quantidade do das produções
nacionais é baixa (há exceções), e não ao contrario, como pensam muitos
críticos e cronistas de Cinema da época. Esse texto foi publicado em 1979
e a essa altura, de acordo com Bernardet a conquista do mercado pelos
filmes nacionais ainda não se consolidara, é possível dizer que até o
presente momento (2007) o mercado ainda não foi conquistado, as causas
disso, ao meu ver, são as mesmas apontadas por Jean-Claude em 1979;
pouca coisa mudou: a qualidade técnica dos filmes nacionais melhoraram
muito principalmente com relação ao som, mas ainda assim os filmes
nacionais são pouco assistidos: “o mercado não solicita, não precisa do
filme brasileiro”.
O que ocorreu foi uma “americanização” da cultura brasileira: a
TV , as revistas de celebridades e o próprio Cinema alimentam um falso
ideal de sucesso, que na verdade não existe nem nos EUA nem em lugar
algum. Entretanto faz com que o receptor se identifique e deseje esse
“american way of life”.
Nós, cineastas brasileiros também precisamos comer, e é nesse
sentido que o livro de Jean-Claude Bernardet leva o subtítulo: propostas
para uma história; o capitulo seguinte A cavação, mostra como as
dificuldades financeiras e técnicas do Cinema brasileiro deram origem a
novos gêneros; como o telejornal e os filmes institucionais. O cineasta
estava quase sempre subordinado a interesses públicos ou de quem
tivesse dinheiro para financiar um filme. Ao meu ver, atualmente, o
cineasta cavador é aquele que faz um “cinema clandestino”, subversivo,
esse sim tem que cavar: mamar nos seios da publicidade para fazer um
filme quase sem dinheiro, ou até mesmo vender os bens da família como
fez o nobre cavador Glauber Rocha, que chegou a vender a casa de sua
mãe em Botafogo para fazer o filme “Barravento”. O termo cavação não
se refere apenas à um jeito de captar recursos, mas se refere a todos
improvisos e maracutaias, o fazer acontecer daquilo que é considerado
impossível e inviável. Esse conceito não é exclusivo do cinema, em um
pais de contradições como o Brasil a cavação se faz necessária em quase
tudo: os impostos são altos e o governo é corrupto, temos que viver com
essas constantes e cavar o ganha pão, a educação e a justiça.

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