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O Brasil no

concerto das Maio, Marcos Chor: O Brasil no


nações: a luta concerto
das nações: a luta contra o racismo
contra o racismo nos primórdios da Unesco.
nos primórdios da História, Ciências, Saúde —
Manguinhos,
Unesco V(2): 375-413 jul.-out. 1998.

O objetivo deste artigo é abordar o


contexto político-científico que
levou o Brasil à condição de
paradigma da Unesco em matéria
Brazil within the racial. Parto da hipótese de que
logo após o Holocausto a imagem
concert of nations: positiva das relações raciais no
the struggle against Brasil adquiriu maior visibilidade
transformando-se numa espécie de
racism in the early anti-Alemanha nazista. Nesta
days of Unesco ocasião, ocorreram esforços não
antecipados no sentido de uma
associação entre a busca de
inteligibilidade do fenômeno
totalitário alemão, a crítica radical
do estatuto científico do conceito
de raça, a explicitação de
demandas sócio-econômicas de
países subdesenvolvidos e a
escolha do Brasil como laboratório
sócio-antropológico. Esta
conjunção de propósitos só se
viabilizou a partir de uma conexão
político-acadêmica transnacional
de caráter universalista.

PALAVRAS-CHAVE: história da
ciência, raça e racismo, relações
internacionais, Arthur Ramos,
Unesco.

Maio, Marcos Chor: Brazil within


the concert of Nations: The
struggle against racism in the early
days of Unesco. História,
Ciências, Saúde — Manguinhos,
V(2): 375-413 Jul.-Oct. 1998.

This article has the objective of


approaching the political and
scientific context that led Brazil to
the position of Unesco paradigm
Marcos Chor Maio for racial matters. I set out from
Pesquisador da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz the hypothesis that soon after the
e-mail: maio@ax.apc.org holocaust, the positive image of
race relations in Brazil was in
greater evidence, becoming a sort
of anti-Nazi Germany. At this time,
a number of unforeseen efforts
took place in the sense of striving
for an association between the
search for understanding the
German totalitarian phenomenon,
the radical critique of the scientific
standing of the concept of race, the
evidencing of socio-economic
demands of underdeveloped
countries, and the choice of Brazil
as a socio-anthropological
laboratory. This combination of
aims only became viable from the
onset of a transnational political-
academic alliance universalistic in
nature.

KEYWORDS: history of science,


race and racism, international
relations, Arthur Ramos, Unesco.

Em meados de outubro de 1949, dois meses após assumir a


direção do Departamento de Ciências Sociais da Organização das
Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), Arthur
Ramos acabou de delinear um plano de trabalho no qual estava
previsto estudos sociológicos e antropológicos no Brasil.1 Em
sintonia com as crescentes preocupações da agência internacional
com os problemas do racismo e com as dificuldades vividas pelos
países subdesenvolvidos, o antropólogo brasileiro considerava ser
necessária, juntamente com o projeto contra o analfabetismo já
implementado pela Unesco em colaboração com o governo
brasileiro, uma atenção especial ao "estudo dos grupos negro e
indígena para a tarefa de sua integração ao mundo moderno".2
Em consonância com o historiador norte-americano Rudiger
Bilden (1929, pp. 71-4), Arthur Ramos acreditava que o Brasil fosse
um laboratório de civilização, uma vez que teria oferecido "a solução
mais científica e mais humana para o problema, tão agudo entre
outros povos, da mistura de raças e de culturas" (Ramos, 1943, p.
179). Essa convicção, no entanto, não impediu que o antropólogo
reconhecesse as profundas desigualdades sociais entre brancos e
negros, bem como a existência do preconceito de cor no Brasil
(idem, 1938, pp. 124-6). O problema da inserção dos negros na
sociedade brasileira estava presente em sua obra, ora visto como
questão social (idem, 1947, p. 132; 1951, p. 146), ora percebido
como dificuldade afeita à condição de minoria dos negros nos
estados do Sul do país (idem, 1939, pp. 173-4; 1942, pp. 62-3).
Em junho de 1950, a V Conferência Geral da Unesco aprovou a
realização de uma pesquisa sobre as relações raciais no Brasil,3 mas
Arthur Ramos, seu idealizador, havia falecido em outubro de 1949,
sem chegar a definir com maiores detalhes o tipo de estudo que tinha
em mente.
A presença do autor de O negro brasileiro na Unesco e sua
atuação como idealizador de um projeto internacional de estudos
sobre o Brasil constituem um momento especialmente significativo
para as ciências sociais brasileiras. É então que confluem e põem-se
em associação dois conjuntos bastante complexos de esforços
intelectuais que conjugavam atividades de pesquisa sistemática a
desígnios e motivações de ordem menos estritamente científica.
De um lado, e tendo em Arthur Ramos um representante não só
institucional mas quase emblemático, dada a trajetória de seu
pensamento e de sua obra, está a série de reflexões que, no Brasil, se
vinham fazendo há décadas a respeito das questões levantadas pela
convivência de raças diversas na formação e história do país
(Skidmore, 1993). De outro lado, exemplificados na atuação do
Departamento de Ciências Sociais da Unesco, estão os
questionamentos críticos — teóricos, éticos e culturais — de
cientistas sociais europeus e norte-americanos suscitados pelo
trágico desenvolvimento científico e ideológico-político de
concepções sobre raça e cultura que haviam em parte resultado no
nazismo (Métraux, 1950, pp. 384-89).
Essa confluência, em que Arthur Ramos é um agente efetivo de
ligação, teve, por várias razões e de diversas formas, resultados tão
relevantes quanto interessantes. Daí a pertinência deste artigo, que
tem por objetivo examinar o contexto político-científico que levou o
Brasil a transformar-se em objeto de pesquisa da Unesco, tendo em
vista a luta contra o racismo. Embora a imagem positiva das
interações raciais no Brasil gozasse de certo prestígio no cenário
internacional, tal condição por si só não explica a escolha do país
como sede do conjunto de investigações realizadas no início da
década de 1950. Outros aspectos influíram, também, no processo
decisório, tais como a perplexidade e busca de inteligibilidade das
terríveis feridas abertas pelo Holocausto; o consenso momentâneo,
no interior da instituição, a respeito da necessidade de um novo
conceito de raça que substituísse em definitivo as concepções
racialistas vigentes até então; o perfil ideológico da Unesco em seus
primórdios, de corte iluminista, universalista e sensível aos
problemas dos países menos desenvolvidos; a atuação decisiva de
uma comunidade de intelectuais engajada no trabalho daquela
agência internacional. O artigo contempla a fase heróica da Unesco e
as estratégias utilizadas pela instituição na luta contra o racismo
entre 1945 e 1950, período que compreende a criação da agência
internacional e culmina com a 5ª sessão da Conferência Geral da
Unesco, em Florença, em que o Brasil foi elevado à condição de
laboratório racial.

Os primórdios da Unesco

Os resultados catastróficos do nazismo revelaram, entre outros


aspectos, a fragilidade das relações internacionais construídas após a
Primeira Guerra Mundial. Os traumas do conflito que se prolongou
de 1914 a 1918, com a perda de milhares de vidas, o surgimento da
União Soviética, as reações ao Tratado de Versalhes, o novo mapa
europeu, a depressão econômica do sistema capitalista a partir do
final da década de 1920, a onda nacionalista, a descrença crescente
nos mecanismos políticos liberais-democráticos, o advento do
fascismo e do nazismo, o fracasso da atuação das organizações
intergovernamentais existentes naquele período — especialmente a
Liga das Nações — e, por fim, a Segunda Guerra Mundial são
alguns dos aspectos que caracterizaram a crise mundial entre as
décadas de 1920 e 1940 (Hobsbawm, 1996, pp. 38-51).
A Organização das Nações Unidas (ONU) e suas diversas
agências especializadas surgiram em face do desafio de instaurar-se
um sistema político estável após a guerra de 1939-45 e procuraram
conciliar os distintos interesses imediatos dos Estados-membros. No
caso específico da Unesco, criada em novembro de 1945, havia uma
expectativa de que a mesma atuasse como uma espécie de fórum
intelectual que informasse as ações da ONU.
A declaração de princípios contida no preâmbulo da Constituição
da Unesco reflete a busca de inteligibilidade dos motivos que haviam
levado ao conflito mundial. Conforme a visão liberal da instituição,
na medida em que "as guerras começam nas mentes dos homens, é
nas mentes dos homens que os baluartes da paz devem ser erguidos"
(Huxley, 1946, p. 5). A Unesco postulava a superação da ignorância,
do preconceito e do nacionalismo xenófobo por meio da educação,
da cultura e da ciência, e erigia como seu objetivo a criação de um
consenso em torno da idéia de se estabelecer "um único mundo"
(Sathyamurthy, 1964, p. 23).
Assim, um enfoque iluminista e universalista levava a crer que a
instituição internacional pudesse contemplar um pluralismo
ideológico e político alicerçado numa solidariedade moral e
intelectual. Afinal, o racionalismo e o humanismo, que permeavam
tanto os ideais do capitalismo liberal quanto os do socialismo
marxista, encontravam-se em radical oposição ao fascismo
(Hobsbawm, 1996, p. 20).
Nesse sentido, a Unesco, movida por um espírito liberal-
democrático, no qual a ciência era investida de um papel
salvacionista, começou a fomentar pesquisas e inquéritos, a
organizar reuniões de especialistas em determinados temas, a
publicar livros e revistas, a estimular a formação de associações
internacionais nos diversos campos da ciência e a dirigir campanhas,
como as que foram desenvolvidas contra o analfabetismo e o
racismo (Angell, 1950, pp. 282-7). Essas atividades traduziam a
crença de que as ciências sociais pudessem não apenas responder às
indagações a respeito das motivações econômicas, sociais, políticas e
psicológicas que levaram à Segunda Guerra Mundial e a seus
resultados assombrosos, como também oferecer sugestões para
dirimir futuros conflitos.
No entanto, os esforços intelectuais e políticos inspirados pelo
otimismo vigente nos primórdios da Unesco esbarravam num
contexto internacional regido por uma nova configuração geopolítica
moldada pela Guerra Fria, que repercutia no interior da instituição,
revelando concepções distintas acerca de suas funções específicas.
Grosso modo, a primeira corrente, de corte universalista, relutava em
aceitar a divisão Leste-Oeste, considerando que o binômio paz e
segurança só poderia ser alcançado mediante ações comprometidas
com valores humanistas informados pela ciência e pela cultura. Essa
tendência via de modo abrangente o papel da Unesco, e o reflexo
mais nítido de seu pensamento era o amplo programa de atividades
sugerido a cada ano. O primeiro diretor da Unesco, Julian Huxley,
foi o principal representante dessa corrente (Capello, 1970, pp. 21-2;
Sathyamurthy, 1967, pp. 617-8).
Outra vertente, mais pragmática, sem negar, em geral, os
princípios constitutivos da Unesco, concebia as relações entre paz e
segurança por meio de uma análise mais ajustada às contingências da
Guerra Fria. Céticos em relação à alternativa que via o mundo como
um só, os porta-vozes dessa corrente, principalmente os
representantes dos Estados Unidos, enfatizavam as diferenças
existentes entre os Estados-membros e viam o órgão como
representação política dos princípios liberais-democráticos que,
segundo eles, deveriam nortear os destinos da humanidade. Portanto,
os países socialistas, e especialmente a então União Soviética, seriam
uma ameaça a tal projeto. Isso significava dizer que, para atingir a
estabilidade política, a Unesco deveria limitar suas atividades aos
esforços de preservação da civilização ocidental (Sathyamurthy,
1964, pp. 36-44).
A hegemonia da primeira corrente, que tinha um sentido
globalizante e mostrava-se sensível aos desafios do Terceiro Mundo,
particularmente aos problemas da educação e aos obstáculos à
industrialização, não impediu que a Unesco reconhecesse as
crescentes adversidades surgidas a partir do final da década de 1940.
Em abril de 1949, o diretor interino do Departamento de Ciências
Sociais da Unesco, o psicólogo social Otto Klineberg (949, p. 11),
alertava para os perigos das "bombas atômicas, cortinas de ferro,
alianças defensivas, chauvinismo, racismo, acusações e contra-
acusações na Guerra Fria — tudo isso faz com que nos demos conta
da realidade do perigo".
O perfil inicial da organização foi desenhado, em grande parte,
por Julian Huxley (1887-1975), seu primeiro diretor entre 1946 e
1948 (Sowell, 1975, p. 86). Huxley foi ao mesmo tempo um
especialista no campo da biologia, especialmente com sua pesquisa
sobre a síntese evolucionária (Mayr, 1982), e um intelectual
engajado na luta pela educação, pela popularização da ciência e, em
particular, no combate ao nazismo (Sowell, 1975, pp. 87-9). Suas
pesquisas, calcadas na biologia, levaram-no a desenvolver uma
filosofia por ele denominada humanismo evolucionário, que
estabeleceria vínculos entre as raízes biológicas do homem e os
valores que permeavam sua conduta (Huxley, 1946, p. 8). Huxley
postulava que a ciência era o grande instrumento, na esfera pública,
para superar as mazelas enfrentadas pela humanidade (Barkan, 1992,
pp. 178-89).
O biólogo inglês acreditava que a instituição pudesse assumir
uma filosofia única — The Unesco Idea — que estivesse acima das
clivagens ideológicas existentes na época. Em seu livro, Unesco: its
purpose and its philosophy (1946) sugeria à agência internacional
adotar uma concepção que procurasse associar o progresso ao
humanismo informado pela ciência. A plataforma de Huxley
contemplava os esforços dos seres humanos na direção de uma
sociabilidade que primasse pela cooperação.
A proposta contida em seu livro-manifesto não foi aceita pela
Conferência da Unesco realizada no México, em 1947. Prevaleceu a
posição que julgava ser impossível enquadrar numa única
perspectiva a diversidade de concepções e ideologias defendidas
pelos Estados-membros da organização. Para os adeptos dessa
posição, seria mais aconselhável privilegiar determinados pontos de
consenso entre as forças que atuavam na instituição, os quais
deveriam orientar os programas de curto, médio e longo prazos.
Após dois anos de gestão, Huxley foi substituído por Jaime
Torres Bodet na III Conferência Geral da Unesco, em Beirute, 1948.
Torres Bodet nasceu no México, em 1902, numa família de
intelectuais de classe média. Poeta, educador e diplomata, foi
assessor de José Vasconcelos, renomado intelectual mexicano e
autor de La raza cósmica, importante obra sobre a ideologia da
mestiçagem. Vasconcelos foi reitor da Universidade Nacional e
depois ministro da Educação de seu país e liderou campanhas contra
o analfabetismo das quais Torres Bodet também participou. Em
1924, este era professor de literatura francesa na Escola de Altos
Estudos do México e, em seguida, teve breve atuação no Ministério
da Saúde, antes de ingressar na carreira diplomática, tornando-se
embaixador de seu país na Espanha, na França e na Bélgica.
Nomeado ministro da Educação, em 1943, aos 41 anos de idade, sua
atuação no campo educacional teve repercussão internacional. Torres
Bodet representou o México na Conferência de Londres em que se
criou a Unesco. Encarnava a identidade do intelectual e do político e,
nessa qualidade, enfrentara problemas centrais de um país
subdesenvolvido, como educação e saúde (Karsen, 1963, pp. 7-12).
Na gestão de Torres Bodet, a Unesco esteva determinada a
reelaborar sua experiência de trabalho, buscando racionalizar
atividades e custos. Além disso, a agência internacional teve de
enfrentar os primeiros desafios da Guerra Fria, como a crise da
Coréia em 1950. Pela primeira vez, a Unesco tomou posição diante
de um assunto tão delicado, o que a deslocou do campo da
neutralidade (Laves e Thomson, 1968, pp. 296-301).
Torres Bodet considerava que a Unesco deveria estar de fato mais
próxima das diversas agências vinculadas às Nações Unidas. Se a
ONU era o corpo político, a Unesco seria sua consciência política
(Sathyamurthy, 1964, p. 107). Ademais, atribuía especial
importância à intensa divulgação da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, na medida em que a carta, promulgada pela ONU
em 1948, era vista como importante instrumento para a construção
da paz, contemplando temas como o analfabetismo e o combate ao
racismo. Por último, Bodet entendia que o sucesso da Unesco estava
na razão direta da superação das mazelas que atingiam os países
subdesenvolvidos. Nesse sentido, os programas de educação e de
assistência técnica a regiões do Terceiro Mundo, patrocinados pela
instituição, reduziriam as diferenças entre países ricos e pobres,
facilitando um maior entendimento entre os Estados-membros da
Unesco (idem, 1967, p. 618).
Na verdade, Bodet seguia a mesma linha filosófica de Huxley: a
política da Unesco deveria estar calcada numa solidariedade
intelectual, com base no universalismo. Essa solidariedade seria
construída por meio da divulgação do conhecimento científico, do
intercâmbio de informações, e teria como sustentáculo uma política
educacional arrojada. Entretanto, a Unesco, na gestão Bodet, viveu o
dilema de enfrentar um quadro onde conviviam ignorância, pobreza
e fome, por um lado, e escassez de recursos, por outro. A tensão
entre os limites orçamentários e a tentativa de concentrar esforços
em programas voltados para o Terceiro Mundo levou à renúncia de
Bodet em 1952 (Sowell, 1975, pp. 150-4).
Foi na gestão de Torres Bodet, em 1949, que a Unesco iniciou
ampla campanha de luta contra o racismo. No ano seguinte, como
parte do programa a ser desenvolvido pela agência internacional, o
Brasil foi escolhido para ser objeto de estudos sobre as relações
raciais.

A Unesco e a luta contra o racismo

Embora a Unesco não tenha assumido de imediato a luta contra o


racismo, desde os primórdios de sua organização o tema emerge de
forma nítida. No preâmbulo da Constituição da agência internacional
lê-se: "a grande e terrível guerra que terminou agora só foi possível
pela negação dos princípios democráticos de dignidade, igualdade e
respeito mútuo entre os homens, e a propagação, no lugar deles, por
meio da ignorância e do preconceito, da doutrina da desigualdade
dos homens e das raças" (Unesco, 1950, p. 1).
Não obstante o estatuto científico do conceito de raça como
instrumento válido de classificação da espécie humana ou de
aferição da capacidade intelectual dos diversos grupos humanos
fosse colocado em dúvida desde o início do século (Boas, 1911, pp.
99-103) e, com maior vigor, a partir do final da Primeira Guerra
Mundial, nos Estados Unidos, por força da atuação da escola
boasiana de antropologia, a correlação entre características físicas,
de um lado, e comportamentos sociais e atributos morais, de outro,
permanecia em voga na década de 1930. A Segunda Guerra Mundial
revelou os resultados perversos da combinação entre racialismo e
racismo,4 representados por milhões de mortes e incomensurável
destruição.
O fim da Segunda Guerra Mundial inaugurou um período de
grande euforia. Afinal, a derrota das forças do Eixo trouxe a
esperança de que se poderia viver o fim do ciclo de guerras do século
XX. A inteligibilidade do fenômeno totalitário em suas múltiplas
faces era visto como o único meio de se superar definitivamente
aqueles tempos sombrios.
As doutrinas raciais que sustentaram ideológica e politicamente a
dominação hitlerista foram vistas pela Unesco como sistema anti-
racional de pensamento, em franco conflito com as tradições
humanistas inerentes à cultura ocidental. O ódio e os conflitos raciais
estariam embasados em falsos postulados científicos, sendo nutridos
pela ignorância. A Unesco, como agência de caráter internacional,
teria as melhores condições para organizar ampla campanha contra o
preconceito racial e para solapar as bases ideológicas do fenômeno
(Métraux, 1950, p. 384).
De início, temas referentes ao preconceito e à discriminação
racial estavam vinculados de modo indireto ao projeto Tensions
Affecting International Understanding, criado na 2ª sessão da
Conferência Geral da Unesco, na cidade do México, em 1947. O
projeto tinha propósitos bastante abrangentes, procurando investigar
as múltiplas razões que levavam às guerras, às rivalidades nacionais
e à criação de estereótipos.5 Em 1948, em Beirute, na 3ª sessão da
Conferência Geral da Unesco, foram definidas algumas linhas de
pesquisa, entre as quais:

o caráter diferenciado das diversas culturas nacionais, de seus ideais e sistemas


jurídicos; as idéias que os cidadãos de uma nação têm de sua própria nação e das
dos outros; a influência das idéias, que permitem o entendimento internacional ou
que levam a um nacionalismo agressivo; problemas populacionais que afetam o
entendimento entre nações, inclusive a assimilação cultural de imigrantes; a
influência da tecnologia moderna sobre as atitudes e o mútuo relacionamento entre
as pessoas (Klineberg, 1949, p. 11).

Em 1949, surgiu um plano mais específico de luta contra o


racismo. O Conselho Econômico e Social (Ecosoc), agência
vinculada às Nações Unidas, por meio da Subcomissão de Prevenção
à Discriminação e Proteção de Minorias, propôs à Unesco a criação
de um programa de combate à discriminação racial. Eram quatro as
propostas do Ecosoc:

1) disponibilizar material relevante ou análises que possam resultar de estudos


sobre tensões sociais ou de qualquer outro programa patrocinado pela Unesco ...;
2) colaboração entre as Nações Unidas e a Unesco na formulação de tal programa
(educacional eficaz) ...; 3) considerar a conveniência de se iniciar e recomendar a
adoção geral de um programa de disseminação de fatos científicos com o propósito
de eliminar o que é geralmente conhecido como preconceito racial; 4) considerar a
criação de um comitê de líderes mundiais em teoria e prática educacional, o qual
se encarregaria de estudar e selecionar os princípios mais básicos e comuns de
uma educação democrática e universal, de modo a combater qualquer espírito de
intolerância ou hostilidade entre nações ou grupos (Wirth, 1949, p. 137).

Tais sugestões derivavam, em parte, da pressão de países da Ásia,


África e América Latina, associados a organizações não-
governamentais, entre as quais entidades negras e algumas lideranças
anti-racistas brancas norte-americanas. Pressionavam a ONU a criar
órgãos permanentes de luta a favor dos direitos humanos. Em
dezembro de 1948, em Paris, foi elaborada a Declaração Universal
dos Direitos Humanos. Na verdade, a sugestão encaminhada pela
Ecosoc à Unesco, no ano seguinte, reflete, de certo modo, um novo
momento da realidade mundial, em que se conjugaram pelo menos
dois importantes elementos políticos. A luta contra o racismo
traduzia uma atitude de afirmação dos países subdesenvolvidos,
muitos deles recém-criados no processo de descolonização da África
e Ásia. Em segundo lugar, a pressão da União Soviética sobre os
Estados Unidos, no contexto da Guerra Fria, fazia-se também pela
denúncia do racismo norte-americano (Malik, 1996, pp. 15-16),
buscando, assim, o então país socialista solidarizar-se com países do
Terceiro Mundo (Lauren, 1988, pp. 195-6).
Atendendo à solicitação da Ecosoc, a 4ª sessão da Conferência
Geral da Unesco em Paris, em 1949, introduziu em seu programa de
ciências sociais um capítulo especial (Estudo e disseminação de fatos
científicos concernentes a questões de raça) em que três pontos
destacavam-se: 1) estudar e coletar materiais científicos referentes a
questões raciais; 2) divulgar amplamente as informações científicas
coletadas; 3) preparar uma campanha educacional baseada nessas
informações.6
A Unesco realizou três grandes atividades inspiradas nessa
proposta. A primeira foi a convocação de uma reunião de
antropólogos (físicos e culturais) e sociólogos com o intuito de
elaborar um manifesto científico (Schaden, 1953, p. 63) a respeito do
conceito de raça (Statement on race) visando a condenação dos
conteúdos racialistas que haviam sido utilizados como ideologia de
Estado pelo nazismo. A segunda decisão dizia respeito à realização
de uma pesquisa sobre relações raciais no Brasil, relações estas
consideradas positivas na época.7 Por último, a Unesco publicou uma
série de pequenos estudos sobre raça e relações raciais, com o intuito
de dar maior publicidade a certos conhecimentos científicos a
respeito do tema (Dunn et al., 1972; Comas et al., 1970). Para os
objetivos deste artigo, limito-me à análise da Primeira declaração
sobre raça e aos aspectos concernentes à escolha do Brasil como
objeto de estudo.

A Primeira declaração sobre raça

Em julho de 1950, o setor de comunicação social da Unesco


lançou em caráter oficial, e com ampla divulgação, a Primeira
declaração sobre raça. Em destaque, aparecia a seguinte afirmação:
"raça é menos um fato biológico do que um mito social e, como
mito, causou graves perdas de vidas humanas e muito sofrimento em
anos recentes".8
Motivo de intensas controvérsias nas décadas de 1920 e 1930
entre antropólogos, biólogos e geneticistas, a idéia de raça, no final
da década de 1940, era concebida como uma construção ideológica
sem respaldo científico pelos cientistas, predominantemente
vinculados às ciências sociais, convidados pela Unesco para elaborar
o manifesto anti-racista. Como observa Proctor (1988, p. 175), com
base na análise do historiador da ciência William Provine, não havia
ocorrido nenhum fato novo no campo da pesquisa científica ao longo
da Segunda Guerra Mundial que alterasse os conhecimentos acerca
da noção de raça. Desse modo, pode-se inferir da própria propaganda
da Unesco que o consenso momentâneo a respeito do mito da raça,
num fórum internacional, só pôde se afirmar devido ao contexto
político do pós-guerra, quando houve uma condenação radical da
doutrina eugênica nazista. A crítica assumia maior importância ainda
com a persistência do racismo nos Estados Unidos e na África do Sul
e com os novos desafios da descolonização africana e asiática.
Entretanto, não era a primeira vez que um grupo de cientistas
lançava um manifesto contra o racismo. Antes da Segunda Guerra
Mundial e durante o conflito, algumas associações científicas nos
Estados Unidos, Inglaterra e Brasil já haviam declarado
publicamente que a ideologia racialista carecia de fundamentos
científicos (Ramos, 1943, pp. 177-83). No entanto, as tentativas de
atribuir caráter transnacional a pronunciamentos anti-racistas, no
interior da comunidade científica, não foram bem-sucedidas. A
complexa situação advinha das dificuldades para encontrar tanto um
denominador comum a respeito do conceito de raça quanto formas
de combate ao racismo, particularmente na década de 1930. Este
quadro sofria decerto forte influência das imprevisibilidades do
contexto pré-guerra.
Após o término da Primeira Guerra Mundial, tornara-se mais
visível a contestação ao uso do conceito de raça como instrumento
válido para estabelecerem-se sistemas de classificação ou tipologias
dos diversos agrupamentos humanos. No final do primeiro decênio
do século XX, o antropólogo alemão radicado nos Estados Unidos,
Franz Boas, havia constatado, em suas pesquisas sobre imigrantes
europeus, a ocorrência de alterações nas medidas de crânio e de
estatura e nos índices cefálicos da primeira geração de norte-
americanos oriundos de diferentes agrupamentos étnicos e nacionais
(Stocking, 1982, pp. 175-80). Conquanto houvesse indicado
genericamente o meio ambiente como causa das mudanças
observadas, Boas colocou em questão uma idéia fundamental da
antropologia de seu tempo: a crença na invariabilidade das
características físicas das raças.
Era também corrente nas duas primeiras décadas do século XX a
crença em que um único gene fosse responsável por características
físicas ou sociais como cor, estatura, comportamento etc. O
desenvolvimento da genética, como observa Barkan (1992, p. 7),
revelou a complexidade do fenômeno da hereditariedade. A distinção
entre fenótipo e genótipo e a possibilidade de um número de genes
suscitar uma gama variada de conseqüências indicavam que as novas
análises estavam longe de confirmar os conhecimentos até então
consagrados sobre os tipos raciais.
As pesquisas de Boas e seus seguidores operaram um
deslocamento gradual do conceito de raça para o de cultura,
enquanto biólogos e geneticistas desenvolviam lentamente uma
mudança conceitual, substituindo a categoria de raça pela de
população (Santos, 1996, p. 125). Neste último caso, a novidade
ficou ainda mais visível a partir das décadas de 1930 e 1940 com o
surgimento, por obra de uma nova geração de geneticistas, da síntese
evolucionária ou neodarwiniana. Como observa Santos (idem, p.
126), "a síntese possibilitou compatibilizar mendelianismo (que
explicava a transmissão dos caracteres hereditários), biometria (que
abordava o comportamento dos genes e características morfológicas
das populações) e darwinismo (que tratava da origem e evolução das
espécies)". Dessa forma, de uma visão que atribuía à raça uma
natureza invariável passou-se à concepção de população, que
expressava melhor a diversa, dinâmica, adaptável, variável espécie
humana (Mayr, 1982, cap. 12).
Esse processo gerou controvérsias no campo científico, que não
estava infenso ao avanço das ideologias racialistas, especialmente na
Europa e nos Estados Unidos. Durante pelo menos duas décadas, na
luta contra o racismo foram minoritárias as posições que
questionavam a suposta cientificidade das análises dos fenômenos
culturais calcadas em explicações de natureza biológico-racial
(Barkan, 1992, pp. 75-96; Kuznick, 1987, caps. 6, 8).
Bom exemplo desse cenário, no qual ciência e política se
confundiam, foi a tentativa de realização de um congresso
internacional sobre a questão racial. Em 1933, ano da ascensão dos
nazistas ao poder, o médico tcheco Ignaz Zollschan submeteu a idéia
à Academia de Ciências de Praga e ao governo de seu país.
Zollschan conseguiu atrair a Igreja e o governo austríaco; a idéia
contou com a simpatia, também, de outros países, como Holanda,
Suécia, França e Inglaterra. Em Paris, teve o apoio do Instituto
Internacional de Cooperação Intelectual, órgão vinculado à Liga das
Nações. Todavia, com o aumento das tensões na Europa, a frágil
Liga das Nações, que esperava ainda negociar com a Alemanha um
acordo que evitasse a guerra, considerou perigoso qualquer
movimento que pudesse descontentar os nazistas. A proposta de
Zollschan, que tinha por objetivo denunciar os pressupostos
racialistas da ideologia nazista, por meio de pesquisa ou num
congresso, tornou-se assim apenas uma intenção que punha em
evidência as incertezas vividas naquele momento (Métraux, 1950,
pp. 385-6).
Somente 16 anos após essa tentativa frustrada veio a ocorrer a
reunião de especialistas em questão racial, patrocinada por uma
instituição que gozava de certo prestígio no final da década de 1940.
Para que isso acontecesse, foi necessário derrotar o nazismo e se
conhecer os horrores do genocídio perpetrado em nome da raça.
O encontro que resultou na Primeira declaração sobre raça foi
idealizado por Otto Klineberg, coordenador do projeto Tensions
Affecting International Understanding, entre 1948 e 1949, período
no qual ocupou parte de seu tempo como diretor interino do
Departamento de Ciências Sociais da Unesco, tendo desempenhado
o papel de personagem-chave nos passos iniciais desta organização.
Canadense radicado nos EUA,9 Klineberg fez o bacharelado na
Universidade McGill, em Montreal (1919), e o mestrado na
Universidade de Harvard (1920), onde se interessou pela psicologia
social. De 1925 a 1927 estudou na Universidade de Colúmbia,
doutorando-se em psicologia. Esse período foi crucial em sua
carreira profissional, por se haver aproximado de Franz Boas.
Klineberg foi professor do Departamento de Psicologia da
Universidade de Colúmbia de 1929 a 1962. Na virada da década de
1920, o psicólogo social desenvolveu uma série de pesquisas sobre
os negros nos EUA, tornando-se um intelectual de destaque nas
diversas trincheiras contra o racismo, tanto em solo norte-americano
quanto no contexto internacional. Exerceu grande influência na luta
contra a crença, bastante generalizada antes e depois da Segunda
Guerra Mundial, de que as diferenças raciais se traduziriam em
diferentes níveis de capacidade mental. Participou do projeto de
Gunnar Myrdal que integrou várias pesquisas sobre a temática racial
e cujos resultados, publicados em An American dilemma (Myrdal,
1944), tiveram enorme repercussão entre as décadas de 1940 e 1960
nos EUA (Jackson, 1991; Southern, 1987).
Entre 1945 e 1947, a convite de André Dreyfus, então diretor da
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São
Paulo (USP), Otto Klineberg foi professor visitante, assumindo a
tarefa de criar o Departamento de Psicologia da USP. Em sua estada
de dois anos no Brasil, publicou Introdução à psicologia social
(1946), versão atualizada de Social psychology (1940). Na
introdução à edição brasileira, Klineberg (1946, p. 5) afirma que
encontrara "entre muitos cientistas sociais que escrevem no Brasil —
por exemplo, Gilberto Freyre, Arthur Ramos, Roger Bastide, Emilio
Willems, Herbert Baldus, Donald Pierson, entre outros — um ponto
de vista semelhante ao seu próprio, mas com campos diferentes de
aplicação e conteúdo". Embora não trate em particular das relações
raciais no Brasil, o boasiano Klineberg refere-se ao tema e concorda
com os argumentos freyrianos acerca da especificidade cultural
brasileira (idem, pp. 121-2).
A atuação de Klineberg na Unesco, no final da década de 1940,
revelou-se fundamental tanto para a articulação do encontro que
resultou na Primeira declaração sobre raça, quanto para a escolha de
Arthur Ramos para a direção do Departamento de Ciências Sociais
daquela agência. Contribuiu também para que fosse realizada, em
seguida, a pesquisa sobre relações raciais no Brasil.
Identificando-se com as estratégias da Unesco na luta contra o
racismo, Klineberg começou a colher informações para um amplo
debate no campo científico sobre o conceito de raça. A princípio, o
psicólogo social coletou diversos manifestos contra o racismo,
publicados antes e durante a guerra.10 Este material deveria ser
utilizado por um grupo de especialistas "das diversas ciências sociais
e biológicas … . Estes especialistas serão chamados a formular suas
próprias declarações, baseadas quer naquelas já disponíveis ou
especificamente redigidas por eles". (idem, 1949, p. 20).
Ao assumir o cargo de diretor do Departamento de Ciências
Sociais da Unesco, em agosto de 1949, Arthur Ramos
operacionalizou a proposta da reunião de especialistas. Dentro da
programação de combate ao preconceito racial aprovada pela 4ª
sessão da Conferência Geral da Unesco, em setembro de 1949, o
antropólogo informava aos futuros participantes do encontro que seu
objetivo era "reunir um comitê de especialistas em antropologia
física, em sociologia, em psicologia social e em etnologia para
formular uma definição prévia das raças do ponto de vista
interdisciplinar. Este será o ponto de partida indispensável para uma
futura ação da Unesco em 1950."11
O antropólogo brasileiro não apenas organizou o encontro como
revelou extrema sensibilidade ao convidar cientistas notoriamente
anti-racistas. Além disso, o convite tinha marca nítida das ciências
sociais. Este fato assume maior importância quando se observa que
raça era ainda concebida, predominantemente, como categoria
biológica. Parece que a frágil institucionalização da Unesco, nos
primeiros anos de sua existência, facilitou a emergência de um
questionamento radical ao conceito de raça, sob o patrocínio do
Departamento de Ciências Sociais da organização.
A reunião dos especialistas foi realizada em Paris, entre os dias
12 e 14 de dezembro de 1949, com a participação de oito dos dez
intelectuais convidados.12 Do comitê faziam parte os sociólogos
Franklin Frazier (EUA), Morris Ginsberg (Inglaterra), Luiz de
Aguiar Costa Pinto (Brasil); os antropólogos Ernest Beaghole (Nova
Zelândia), Juan Comas (México), Ashley Montagu (EUA), Claude
Lévi-Strauss (França); o filósofo, educador e político Humayan
Kabir (Índia).
A escolha dos participantes da reunião da Unesco observou
critérios políticos e acadêmicos. Foram convidados representantes
dos principais países ocidentais de então, e de países do Terceiro
Mundo que tinham alguma ascendência sobre a formulação de
políticas no interior da Unesco (Índia, Brasil e México). Além disso,
afinidades raciais, étnicas e intelectuais podem ser observadas nas
biografias desses representantes.
Arthur Ramos aproveitou a ocasião para ampliar a presença
brasileira nos fóruns da Unesco. Convidou seu ex-aluno e colega do
Departamento de Ciências Sociais da então Faculdade Nacional de
Filosofia (FNFi), o sociólogo Costa Pinto (1920- ), para participar do
encontro com uma contribuição sobre os aspectos sociais da raça.13
Até então, o sociólogo brasileiro não se havia dedicado, em suas
pesquisas, ao temário a ser discutido em Paris. No entanto, sua visão
de corte marxista concebia raça e relações raciais como conceitos
imersos na estrutura social.
No caso do antropólogo social Ernest Beaghole (1906-65), que
estabelecia importante interface com a psicologia, esta não era a
primeira participação em algum trabalho patrocinado pela Unesco.
Seu estudo sobre as relações étnicas na Nova Zelândia fazia parte do
principal projeto da área de ciências sociais da agência internacional,
Tensions Affecting International Understanding, coordenado por
Otto Klineberg (Ritchie, 1967, pp. 68-70).
Morris Ginsberg (1889-1970), russo naturalizado inglês,
sociólogo e professor da London School of Economics, já tinha obra
reconhecida e influente, que contemplava a sociologia, a filosofia e a
psicologia. Em 1949, tornou-se vice-presidente da Associação
Internacional de Sociologia, órgão criado sob o patrocínio da Unesco
(Bulmer, 1985, pp. 5-14; Fletcher, 1974, pp. 1-26).
Outra presença importante na reunião da Unesco foi a do
antropólogo francês Claude Lévi-Strauss (1908- ), que, entre os anos
de 1935 e 1938, participou da missão francesa que colaborou para a
criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, tendo
realizado investigações etnológicas em seu período de permanência
no Brasil (Massi, 1991, pp. 132-53). Durante a Segunda Guerra
Mundial, tentou voltar ao Brasil. No entanto, o governo Vargas, com
sua política ambígua em relação à imigração judaica, não permitiu
que Lévi-Strauss retornasse (Lévi-Strauss, 1961, p. 24). O
antropólogo acabou por ir lecionar nos Estados Unidos (New School
For Social Research), com apoio de um programa de ajuda a
intelectuais refugiados de guerra. No pós-guerra, foi adido cultural
da França nos Estados Unidos. Por ocasião da reunião da Unesco,
Lévi-Strauss gozava de grande prestígio por conta de sua densa obra,
Les structures élémentaires de la parenté, publicada em 1949. Além
disso, era pesquisador do Conselho Nacional de Pesquisa Social da
França e pertencia aos quadros do Museu do Homem de Paris (Lévi-
Strauss, 1990).
O sociólogo Franklin Frazier (1894-1962), professor da Howard
University, doutorou-se pela Universidade de Chicago na fase áurea
de seu Departamento de Sociologia. No início da década de 1940,
esteve no Brasil para estudar as relações raciais, especialmente na
Bahia. Escreveu diversos artigos sobre o tema. Comungava na visão
positiva de Donald Pierson a respeito do Brasil em matéria racial
(Helwigg, 1991, pp. 87-94). Nesta ocasião envolveu-se numa
controvérsia com o antropólogo Melville Herskovits sobre o tipo de
inserção cultural e social dos negros na sociedade brasileira.14 Frazier
escreveu diversos trabalhos sobre os negros norte-americanos e
participou da importante pesquisa coordenada pelo economista e
sociólogo sueco Gunnar Myrdal que resultou no livro An American
dilemma. Em 1948, Franklin Frazier foi o primeiro sociólogo negro a
presidir a American Sociological Association (Edwards, 1975, p.
85). Sua abordagem sociológica, especialmente no que tange à
perspectiva assimilacionista como solução para o problema do negro
nos Estados Unidos, exerceu grande influência sobre o enfoque de
Myrdal acerca dos dilemas da questão racial na realidade norte-
americana (Jackson, 1991).
Humayun Kabir (1906- ) tinha longa experiência política, com
diversos serviços prestados ao governo da Índia e alguma atividade
junto à Unesco. Com formação em filosofia na Universidade de
Oxford, o intelectual indiano, nascido em Bengala, estava
plenamente identificado com o pensamento ocidental. Kabir foi
representante da Índia na 3ª sessão da Conferência Geral da Unesco,
em Beirute, em 1948, e participou do fórum patrocinado pela
agência internacional sobre o tema da democracia no mundo pós-
guerra (Kabir, 1951; Datta, 1969).
O antropólogo Juan Comas (1900-79) esteve ligado à área de
educação na Espanha até a derrubada da Frente Popular durante a
guerra civil espanhola. Exilado no México, tornou-se professor e
pesquisador no campo da antropologia física e cultural. Sua
participação no encontro da Unesco se deve à influência do então
diretor-geral da entidade, o mexicano Jaime Torres Bodet. Nesta
ocasião, Comas era secretário-geral do Instituto Indigenista
Interamericano e redator-chefe da revista America Indigena e do
Boletin Indigenista (Genovés et al., 1965).
Por último, cabe destacar a presença do antropólogo físico inglês,
radicado nos Estados Unidos, Ashley Montagu (1905- ). Ex-aluno de
Franz Boas, desde a década de 1920, interessava-se pelo problema
racial. Seu envolvimento na luta contra o racismo ficou mais
evidente com a publicação do livro Mans most dangerous myth: the
fallacy of race (1942). Além disso, participara do importante projeto
de Gunnar Myrdal. Sua contribuição centrou-se na análise das
características físicas do negro norte-americano (Moritz, 1967, pp.
294-7; Harnard, 1979, pp. 535-7; Myrdal, 1944, p. xiii; Barkan,
1996, pp. 96-105).
Dos oito participantes da reunião de Paris, três já haviam tido
algum tipo de experiência de ensino e/ou pesquisa no Brasil (Claude
Lévi-Strauss, Franklin Frazier e Luiz de Aguiar Costa Pinto). Os
dois representantes da Europa, palco do genocídio nazista, eram
judeus (Morris Ginsberg, Lévi-Strauss). Dos Estados Unidos, que
ainda vivia sob as leis racistas do Jim Crow, foram convidados um
negro (Franklin Frazier) e um judeu que se havia destacado na luta
contra o racismo durante a Segunda Guerra Mundial (Ashley
Montagu). Barkan (1996, p. 100; 1992, p. 9) observa que um dos
componentes importantes na luta contra o racismo no interior da
comunidade científica, desde a década de 1920, foi a presença de
uma minoria formada por judeus, socialistas ou mulheres,
especialmente no campo da antropologia. No caso da Primeira
declaração sobre raça, fica nítida a participação expressiva de
cientistas de origem judaica que contribuíram decisivamente para a
redefinição do conceito de raça devido, em grande parte, ao
significado do anti-semitismo no período.
A reunião foi presidida por Franklin Frazier, e a função de relator
dos trabalhos coube a Ashley Montagu, por sugestão de Lévi-Strauss
(Barkan, 1996, p. 99). O antropólogo francês considerava que o tema
central da reunião era de natureza antropológica e não sociológica.
Houve divergências. Costa Pinto (1950, p. 5) acreditava que a
discriminação racial estava subsumida à estrutura das relações
sociais; portanto, as características biológico-raciais, afeitas aos
estudos da antropologia física, exerciam papel secundário. Frazier
também apresentou documento que enfatizava os aspectos
sociológicos da questão em debate. Todavia, os dois sociólogos
ficaram em posição minoritária e acabou por prevalecer a proposta
do antropólogo francês.
O deslocamento da sociologia e a escolha de Ashley Montagu
para relator do Encontro de Paris refletiam certa contradição no
interior da Unesco, na medida em que a reunião era patrocinada pelo
Departamento de Ciências Sociais, e o comitê era composto
predominantemente por cientistas sociais. Embora a discussão a
respeito do conceito de raça devesse oferecer subsídios teóricos à
luta contra o racismo, como fenômeno político-ideológico, a agência
internacional enveredou por um debate científico, embasado em
questões concernentes à antropologia física, à biologia e à genética.
Neste caso, Ashley Montagu era o cientista mais autorizado para
analisar de forma científica o conceito de raça. A opção Montagu
parecia dar maior legitimidade ao próprio debate. Em outras
palavras, a sugestão de Lévi-Strauss era uma forma de intermediar as
relações entre biologia e ciências sociais, entre ciência e política.
O trabalho do comitê foi dividido em três partes: 1) apresentar
uma definição de raça; 2) avaliar criticamente os conhecimentos
existentes acerca do tema; 3) oferecer sugestões de futuras pesquisas
que pudessem dar maior substância ao assunto em questão (idem,
1950, p. 4). Prevaleceu ao longo do primeiro dia do encontro o
debate em torno de alguns conceitos vinculados aos campos da
genética, biologia e antropologia física. Com base nessas discussões,
Montagu apresentou um primeiro esboço de declaração. Como era
permitido a cada um dos presentes trazer uma proposta de
declaração, Costa Pinto expôs uma Declaração sobre os aspectos
sociológicos das relações de raças. Como o título revela, o trabalho
do sociólogo brasileiro destoava dos propósitos apresentados no
primeiro dia da reunião. Ao término da leitura, o antropólogo
neozelandês Ernest Beaghole ponderou que o conjunto de reflexões
sociológicas sobre o assunto impedia uma avaliação mais
pormenorizada em tempo hábil. Segundo Costa Pinto, prevaleceu o
principal objetivo da reunião, ou seja, "que as diferenças biológicas
existentes entre as raças não justificam que entre elas se pretenda
estabelecer categorias de superioridade e inferioridade de umas sobre
as outras" (idem, p. 6). A parte relativa a futuras investigações e
debates esteve sob a responsabilidade de Morris Ginsberg, que
sugeriu diversas modalidades de pesquisa sobre tipos de colonização,
distintos padrões de relações entre brancos e não-brancos,
nacionalismo e minorias etc. Entre as propostas então formuladas,
encontrava-se uma que veio a ter especial importância para o Brasil,
a saber, "exame das atitudes dos vários grupos étnicos na América
do Sul; por exemplo, (I) Brasil, (II) América Espanhola" (idem, p.
20).
A redação final da declaração foi elaborada por Ashley Montagu
e aprovada pelo comitê de especialistas no dia 14 de dezembro de
1949. O documento procurava refutar a validade científico-social do
conceito de raça ao afirmar que: 1) a capacidade mental é semelhante
em todas as raças; 2) a miscigenação não resulta em degeneração
biológica; 3) não existe qualquer possibilidade de estabelecer uma
correlação entre determinados agrupamentos religiosos e/ou
nacionais e tipologias raciais; 4) raça é menos um fato biológico do
que um mito social; 5) as indagações sobre a pertinência da
utilização de conceito de raça como fundamento para a análise dos
fenômenos econômicos, sociais, culturais e psicológicos vêm
acompanhadas de visão baseada no pressuposto supostamente
darwiniano de que o homem naturalmente teria vocação para a
sociabilidade positiva.15
O texto de dezembro de 1949 expressou o compromisso de
articular uma perspectiva igualitária à negação da existência de
hierarquias raciais. Esta perspectiva gerou controvérsias. Além da
afirmação mais polêmica, atribuindo ao conceito de raça uma
qualidade meramente ideológica, houve reações à proposta de
cancelamento da associação entre raças e determinadas capacidades
mentais. Acrescente-se a contenda em torno da suposta cooperação
natural entre os homens.
O texto de 1949 foi submetido à crítica de 12 cientistas, em sua
maioria ligados às ciências naturais.16 Os comentários foram
encaminhados ao diretor interino do Departamento de Ciências
Sociais, Robert Angell, que, com a ajuda de seus auxiliares, entre
eles o futuro chefe do setor de estudos raciais do departamento, o
antropólogo suíço-americano Alfred Métraux, fizeram a mediação
entre as críticas dos cientistas e a versão final do documento que
estava sendo escrita por Ashley Montagu.
Para que se possa ter uma visão das reações à declaração
elaborada em Paris, antes de sua publicação em julho de 1950,
exponho algumas das críticas apresentadas pelos geneticistas Leslie
Dunn e Theodosius Dobzhansky, pelo biólogo Julian Huxley e pelo
psicólogo Otto Klineberg. Embora concordassem de modo geral com
o conteúdo do documento, esses cientistas identificaram nele certas
afirmações precipitadas, pois sem comprovação científica até aquele
momento, especialmente no que tange à negação da influência dos
variados caracteres biológicos conformadores das diversas raças
sobre os seus respectivos patrimônios culturais. Na verdade, segundo
tais críticas, atenção especial deveria ser atribuída a determinados
enunciados, ou mesmo dever-se-ia suprimir alguns deles, de modo a
preservar os conteúdos científicos do manifesto.
Julian Huxley, que, como vimos, fora o primeiro diretor-geral da
Unesco, sugeriu que a declaração começasse por uma exposição
mais detalhada dos diferentes grupos raciais para em seguida deter-
se nas "diferenças pseudo-raciais, mostrando-se então que são de
origem social e cultural". Huxley alertava que, sem essa
apresentação inicial, uma série de considerações contidas na
declaração ficariam fragilizadas; era o caso da assertiva de que não
havia ligações entre a formação genética dos diversos grupos
humanos e determinados comportamentos. O biólogo inglês ilustrava
sua afirmação com o seguinte exemplo: "seria provável que
houvesse alguns graus de base genética nas diferenças fenotípicas de
temperamento entre vários grupos, por exemplo, o temperamento
expansivo e afeiçoado aos ritmos dos negros, e o temperamento
fechado de muitos grupos ameríndios".17
Leslie Dunn considerava imprecisa a afirmação contida no
documento de que não havia qualquer "evidência de que existissem
quaisquer diferenças genéticas entre grupos humanos". O geneticista
da Universidade de Colúmbia também acreditava que o postulado,
segundo o qual "não há conexões entre características morfológicas e
mentais" carecia de base de conhecimentos mais consistente. Seria
necessário fazer uma diferença entre raça como fenômeno biológico
e raça como mito. Segundo Dunn, "o mito consiste em se atribuir à
raça poderes para os quais não há fundamentos biológicos".18
Dobzhansky, bem próximo às considerações de Dunn,
aconselhava a exclusão da frase: "os fatos biológicos podem ser
totalmente desconsiderados do ponto de vista do comportamento
social e da ação social".19 Klineberg alegava que a declaração
deveria ser "menos dogmática do que é atualmente". 20 Afirmações
definitivas quanto à ausência de correlações entre dados biológicos e
características psicológicas pareciam-lhe prematuras. Da mesma
forma havia, segundo ele, certa precipitação em se eliminar de vez os
vínculos entre diferentes heranças genéticas e realizações culturais.
As preocupações de Klineberg eram compartilhadas pelo geneticista
Dobzhansky, que sugeriu alterações em algumas formulações que
considerou verdadeiros "exageros e, por conseguinte, poderiam
expor toda a declaração ao ataque dos racialistas".21
A princípio, Montagu procurou incorporar algumas das críticas ao
texto de dezembro com a expectativa de vê-lo publicado. Todavia,
por motivos aparentemente distintos, tanto alguns dirigentes da
Unesco (Torres Bodet, Robert Angell e Alfred Métraux), quanto
proeminentes cientistas, como o biólogo Julian Huxley, discordaram
de algumas afirmações ainda presentes na nova versão de Ashley
Montagu. Por parte do staff da Unesco, havia a preocupação de o
Statement on race representar apenas as idéias de um grupo de
cientistas em prejuízo de um documento de caráter mais geral
chancelado pela agência internacional. As citações de pensadores ou
cientistas no corpo do texto, como Confúcio, Darwin e Castle,
poderiam gerar constrangimentos. Segundo Robert Angell, diretor
interino do Departamento de Ciências Sociais, em contexto de
crescentes disputas no pós-guerra, o diretor-geral da Unesco, Torres
Bodet, considerava que a Primeira declaração sobre raça, na ocasião
de ser votada, "por um grupo que representa tantos países,
dificilmente poderá conter citações de pensadores e escritores
específicos. Ele teme que isso acarrete um sem-fim de
desentendimentos, porque alguns delegados podem desejar incluir
também citações de seus próprios líderes nacionais ou religiosos."22
Julian Huxley chegou a afirmar: "lamento, mas não vou querer
meu nome associado ao documento se estas correções não forem
efetuadas". 23 A ameaça não se concretizou. Parecia haver um
consenso quanto à autoridade científica e política de Ashley
Montagu (Barkan, 1996, p. 100). O conteúdo substantivo da
declaração dos especialistas reunidos em Paris em 1949 não foi
alterado. Nesse sentido, como observa Barkan, a Primeira declaração
sobre raça "mostrou o determinismo ambiental em seu auge. A
inversão do credo científico sobre raça, iniciada no começo da
década de 1920, havia sido completada" (Barkan, 1992, p. 341).
O evolucionismo humanista veio, assim, a prevalecer, na forma
de uma concepção de humanidade universal e biologicamente
credenciada a usufruir, em igualdade de condições, os direitos de
cidadania (Harraway, 1989, p. 189). Nessa perspectiva otimista, a
Unesco publicou a Primeira declaração sobre raça em 18 de julho de
1950, por ocasião da 5ª sessão da Conferência Geral da Unesco, em
Florença, tendo em vista uma ampla repercussão. Entretanto, as
críticas contundentes ao documento por parte de antropólogos
físicos, biólogos e geneticistas e a limitada ressonância junto ao
grande público frustraram as expectativas iniciais da instituição. No
entanto, a postura anti-racista radical do Statement on race vinha de
encontro ao imaginário sobre o Brasil miscigenado. Foi neste
momento que o Brasil, por assim dizer, tornou-se objeto de ciência e
de política naquela organização.

A Unesco redescobre o Brasil

Em correspondência mantida com professores da Faculdade


Nacional de Filosofia no curto período em que esteve à frente do
Departamento de Ciências Sociais da Unesco, Arthur Ramos
avaliava que a grande chance do Brasil viria com o programa a ser
aprovado pela 5ª sessão da Conferência da organização, em
Florença, em maio de 1950. Devido a seu falecimento prematuro, o
antropólogo não pôde ver concretizado seu projeto de uma pesquisa
sobre as relações raciais no Brasil. No entanto, em sua gestão, deu
alguns passos nesse sentido.
O Brasil atraiu a atenção da Unesco, que o via como país onde
prevaleciam relações raciais com reduzida presença de tensões.
Cabe, no entanto, investigar as mediações estabelecidas entre
determinadas imagens do Brasil e a sua transformação em objeto de
estudo da Unesco. Neste caso, um bom ponto de partida é a análise
dos motivos que levaram Arthur Ramos à instituição e sua atuação
nela.
O Departamento de Ciências Sociais foi criado em 1948 e, até
1949, teve dois diretores interinos: Arvid Brodersen e Otto
Klineberg. Em agosto de 1948, foi aventada a hipótese de Gilberto
Freyre (1900-87) assumir o cargo em caráter permanente, mas ele
não aceitou o convite.24 Freyre era o cientista social brasileiro mais
conhecido no exterior. Além de ter sido aluno de Franz Boas na
Universidade de Colúmbia, na década de 1920, e professor visitante
de prestigiosas universidades norte-americanas, como Colúmbia e
Stanford, na década de 1930, era uma importante referência para o
mundo acadêmico norte-americano interessado no estudo do Brasil
por conta de sua inovadora e positiva visão acerca da sociedade
brasileira publicada em livros e revistas científicas norte-americanas
(Freyre, 1948, 1946, 1945, 1940, 1939, 1922). Em 1944, em plena
guerra, uma série de conferências suas foram publicadas pela
Universidade de Indiana (Freyre, 1945). No ano seguinte chegava ao
público norte-americano seu mais importante livro, Casa-grande e
senzala, que, na edição norte-americana, recebeu o título de The
masters and the slaves.
Na década de 1930, Freyre foi o mais radical crítico do racismo,
ainda presente em parte significativa de nossa elite erudita. Diferente
da visão pessimista da produção intelectual brasileira, que concebia a
maciça presença dos negros e a intensa miscigenação, características
visíveis do compósito racial brasileiro, como obstáculos à inserção
do país na modernidade, Freyre enfatizava, em escalas semelhantes,
a importância da cultura africana, da contribuição portuguesa e, em
menor grau, da presença do índio na conformação da identidade
nacional brasileira. Se antes a sociedade brasileira era condenada
pela raça, com Gilberto Freyre ela, na verdade, estaria salva pela
miscigenação, fruto de uma antiga tradição legada pela herança
ibérica. Embora Freyre, com sua perspectiva dialética dos
antagonismos em equilíbrio, em diversos momentos lembre a
extrema violência das relações entre brancos e negros no universo
escravocrata, a idéia prevalecente em Casa-grande e senzala é a da
relativa confraternização entre as raças, o que constituiria a marca de
distinção da sociedade brasileira (Araújo, 1994). A visão freyriana,
sem dúvida a mais refinada interpretação do mito da democracia
racial à brasileira, tornou-se assim um dos principais alicerces
ideológicos da construção de uma identidade positiva, e foi
suficientemente substantiva para atrair a atenção internacional,
contrastando com a negativa experiência norte-americana em matéria
racial.
Em julho de 1945, ao terminar o prefácio à futura edição de The
masters and the slaves (1946, p. xiv), Gilberto Freyre criou a
imagem do Brasil como uma espécie de anti-Alemanha nazista, ao
afirmar que: "ao aceitarmos esta interpretação da história brasileira
como uma marcha em direção à democracia social, … somos
incapazes de imaginar uma sociedade com tendências mais opostas
àquelas da Weltanschauung germânica".
O livro de Gilberto Freyre, Brazil: an interpretation (1945),
exerceu enorme influência sobre o estudo comparativo desenvolvido
por Frank Tannenbaum, Slave and citizen: the negro in the Americas
(1992). Para o historiador norte-americano, a herança ibérica
constituía uma variante do sistema escravocrata e ostentava alguns
traços positivos, quando comparada com a experiência norte-
americana.
Em 1948, Freyre participou de um fórum patrocinado pelo
projeto Tensions Affecting International Understanding, vinculado
ao Departamento de Ciências Sociais da Unesco. Coordenado pelo
psicólogo social da Universidade de Princeton, Hadley Cantril
(1949), versava sobre as Tensões que ocasionam a guerra.
Participaram do debate Max Horkheimer, George Gurvitch, Gordon
Allport e outros. Freyre (1948, p. 149) destacou no evento a
importância da América Latina como uma região que poderia prover
"abundante material para os cientistas sociais". O convite feito a ele,
por Hadley Cantril, para assumir a direção do Departamento de
Ciências Sociais veio logo após o simpósio da Unesco. Gilberto
Freyre não aceitou, provavelmente porque na época era deputado
federal (UDN-PE) e estava totalmente envolvido com o projeto de
criação do Instituto Joaquim Nabuco em Recife (Freston, 1989).
Em abril e maio de 1949 foram realizadas negociações tendo em
vista a indicação de outro brasileiro para a direção do Departamento
de Ciências Sociais da Unesco, o médico e antropólogo Arthur
Ramos. Nesta ocasião, Paulo Estevão Berredo Carneiro,
representante do Brasil na agência internacional, propôs o nome de
Ramos ao então diretor-geral, Jaime Torres Bodet, que aceitou a
sugestão.25 A indicação contou com o respaldo de Otto Klineberg,
então diretor interino do Departamento de Ciências Sociais.26
O alagoano Arthur Ramos (1903-49) formou-se pela Faculdade
de Medicina da Bahia em 1926, enveredando pelas pesquisas em
psiquiatria e medicina legal e dedicando-se particularmente a estudos
do fenômeno da possessão entre os negros baianos. Em 1928, por
concurso, entrou para o quadro docente da Faculdade de Medicina da
Bahia e dinamizou o Instituto Nina Rodrigues, instituição dedicada a
investigações em medicina legal. Seguindo o caminho de diversos
médicos e intelectuais, Arthur Ramos migrou para o Rio de Janeiro
em 1933. A convite de Anísio Teixeira, assumiu no ano seguinte a
chefia da Seção Técnica de Ortofrenia e Higiene Mental do
Departamento de Educação da Secretaria Geral de Educação e
Cultura do Distrito Federal. No ano de 1936, Ramos tornou-se
professor de psicologia social na então Universidade do Distrito
Federal (UDF). Com o fechamento desta pelo governo autoritário do
Estado Novo, o médico-antropólogo foi incorporado à Faculdade
Nacional de Filosofia (1939), na condição de professor catedrático
em antropologia e etnologia (Ramos, 1945). Foi graças aos estudos
sobre o negro, desenvolvidos nas décadas de 1930 e 1940, que
Arthur Ramos começou a se destacar no campo da antropologia.
Junto com o também médico Afrânio Peixoto, foi um dos
responsáveis pelo resgate da obra de Nina Rodrigues e um dos
criadores da denominada Escola Nina Rodrigues (Peixoto e Ribeiro,
1931; Ramos, 1934; Corrêa, 1982).
Na virada da década de 1930, Arthur Ramos reviu a sua
identificação com os postulados de Lévy-Bruhl sobre a mentalidade
pré-lógica dos negros, a concepção acerca de supostas atitudes
patológicas envoltas por reflexões freudianas dos rituais afro-
brasileiros, incorporando à sua análise o modelo de aculturação
proposto por Melville Herskovits (Ramos, 1942, pp. 5-46; 1940, pp.
411-28).
Paralelamente a suas investigações etnográficas, Arthur Ramos
engajou-se na luta contra o racismo, tanto no Brasil quanto no
exterior.27 Entre 1935 e 1943, publicou quatro manifestos e uma série
de artigos contra o nazismo, em favor das Forças Aliadas e sobre as
possíveis contribuições das ciências sociais no pós-guerra (idem,
1944; 1943). Esta militância intelectual foi reconhecida mais tarde
pela Unesco.28
Não menos importante foi o estreito contato de Arthur Ramos
com o cenário acadêmico norte-americano nas décadas de 1930 e
1940, que se fez graças a cursos, palestras, correspondência com
scholars norte-americanos (Melville Herskovits, Lewis Hanke,
Donald Pierson, Ruth Landes, T. L. Smith e outros), edição de
livros, artigos em revistas e coletâneas e resenhas de suas obras em
publicações científicas norte-americanas (Ramos, 1945, 1942, 1939).
É importante lembrar que as ciências sociais na Unesco
encontravam-se então sob a hegemonia dos Estados Unidos
(Lengyel, 1986, p. 11).
Em 1949, Otto Klineberg encaminhou à Comissão de Direitos
Humanos do Ecosoc, órgão vinculado à ONU, um documento
elaborado pela Unesco no qual constavam propostas de combate ao
racismo. Encontram-se nele referências ao manifesto contra o
nazismo, elaborado pela Sociedade Brasileira de Antropologia e
Etnologia, presidida por Arthur Ramos. Além disso, Klineberg
sugeria que a campanha contra o racismo devia ampliar a divulgação
de obras de diversos cientistas sociais, entre os quais Gunnar
Myrdal, Franz Boas, Ruth Benedict, Fernando Ortiz e Arthur
Ramos.29
O empenho na luta contra o racismo durante a guerra e sua
inserção no circuito norte-americano deram maior visibilidade à
atuação e à produção intelectual de Arthur Ramos no contexto
internacional. No entanto, sem a intervenção de Berredo Carneiro,
representante do Brasil na Unesco, teria sido difícil alçá-lo à direção
do Departamento de Ciências Sociais da Unesco.
Paulo Estevão Berredo Carneiro (1901-81)30 nasceu no Rio de
Janeiro, e sua família tinha raízes nas elites políticas imperiais do
Maranhão, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Pelo lado paterno, era
profundamente ligado ao positivismo. O pai, Mario Barboza
Carneiro, lutara pela abolição da escravidão e participara ativamente
da fundação da República. Foi funcionário do Ministério da
Agricultura e criou junto com o marechal Cândido Rondon, outro
positivista, o Serviço de Proteção ao Índio. No primeiro governo
Vargas, chegou a assumir o cargo de ministro da Agricultura.
Paulo Carneiro formou-se em química industrial na Escola
Politécnica do Rio de Janeiro. Durante as décadas de 1920 e 1930,
combinou as atividades de magistério e de pesquisa. Doutorou-se na
França e trabalhou no Instituto Pasteur de Paris. Retornando ao
Brasil no início da década de 1930, Paulo Carneiro foi chefe do
laboratório de investigações de química vegetal e animal do Instituto
Nacional de Tecnologia, vinculado ao Ministério da Agricultura.
Convidado para o cargo de secretário de Agricultura de
Pernambuco durante o governo progressista de Carlos Lima
Cavalcanti no ano de 1935, em sua gestão criou o Instituto de
Pesquisas Agronômicas e estabeleceu uma série de políticas para a
redução dos custos da alimentação do trabalhador, além de propor
uma reforma agrária no Estado. Nove meses depois, foi obrigado a
deixar o posto devido ao clima de repressão resultante da frustrada
Revolta Comunista de 1935. Retornou então à França para dar
continuidade a suas investigações científicas no Instituto Pasteur. Em
1940, sua pesquisa sobre o princípio ativo do curare valeu-lhe o
prêmio Nativelle, do Instituto Pasteur. No mesmo período, o
positivista Paulo Carneiro, profundamente identificado com a cultura
francesa, viu aquele país ser invadido pelas tropas nazistas e viveu os
tempos difíceis da ocupação. Manteve estreito contato com o
embaixador Souza Dantas, o representante da diplomacia brasileira,
antes e durante a Segunda Guerra Mundial, que mais resistiu às
circulares secretas do Itamarati proibindo a concessão de vistos para
a entrada de judeus no Brasil (Milgram, 1995, pp. 110-3; Lesser,
1995, p. 81). Paulo Carneiro chegou a abrigar em sua residência
membros da resistência francesa.
Em 1942, com a declaração de guerra do Brasil contra as forças
do Eixo, ficou preso junto com a missão diplomática brasileira na
França, sendo levado para o campo de prisioneiros de Baden-Baden
e, a seguir, para o de Godesberg. Neste último permaneceu por 14
meses, junto com Souza Dantas. Com a libertação da França, em
1944, voltou ao Brasil, mas no início de 1946 foi escolhido delegado
do Brasil à primeira Assembléia das Nações Unidas, em Londres. No
mesmo ano, Paulo Carneiro tornou-se representante do Brasil na
Comissão Preparatória da Unesco. A Segunda Guerra Mundial
mudou sua vida. O positivista brasileiro deixou de ser cientista para
se tornar um político da ciência com amplo raio de ação no interior
da Unesco.
Ele foi delegado permanente do Brasil na instituição, primeiro
como ministro (1946-58), depois como embaixador (1958-65). Além
disso, foi membro do comitê executivo na maior parte do tempo em
que esteve envolvido com o trabalho da agência internacional. Entre
1951 e 1952, presidiu o comitê executivo da Unesco.31
Desde o começo, a atuação e a influência de Paulo Carneiro
transcenderam em muito suas atividades de representante do Brasil.
Manteve estreitos contatos com Julian Huxley e Torres Bodet.
Comungava com eles numa visão universalista da organização.
Partilhava com Julian Huxley a idéia de que a ciência poderia
emancipar a humanidade dos flagelos resultantes da Segunda Guerra
Mundial. Acreditava, como Torres Bodet, que a Unesco deveria ser o
centro intelectual que nortearia a atuação política da ONU. Neste
contexto, Arthur Ramos foi escolhido para a direção do
Departamento de Ciências Sociais da instituição.
Antes de chegar a Paris, Arthur Ramos reuniu-se com os
professores do Departamento de Ciências Sociais da Faculdade
Nacional de Filosofia com o objetivo de colher sugestões para a sua
gestão na Unesco. Nessa reunião, segundo o sociólogo Costa Pinto,
considerou-se a possibilidade de a Unesco vir a transformar a
América Latina, e particularmente o Brasil, num "laboratório de
pesquisas sobre as relações humanas", devido à singularidade de
suas estruturas sociais, "repletas de situações e de problemas de
interesse científico universal" (Costa Pinto, 1953, p. 20).
Ao assumir seu posto, Arthur Ramos tinha dois objetivos: ampliar
as investigações no campo das ciências sociais para auxiliar "a obra
de compreensão internacional em que a Unesco se acha empenhada e
(concomitantemente) ajudar o desenvolvimento destes estudos nos
países da América Latina, e especialmente o Brasil, onde a ação da
Unesco ainda não se faz sentir de uma maneira eficaz...".32 Ramos
constatou que à antropologia cultural estava reservado papel
secundário naquele órgão, se comparado ao da sociologia, da ciência
política e da psicologia social. A disciplina de eleição de Arthur
Ramos era incorporada apenas lateralmente no projeto Tensions,
com a inclusão de temas relativos às raças e às minorias.33
Esse diagnóstico inicial foi acompanhado pelo reconhecimento
dos limites ditados pelo peso da máquina burocrática e pela
necessidade de cumprir metas e utilizar recursos já definidos
anteriormente.34 Não obstante os constrangimentos institucionais,
duas propostas apresentadas pelo antigo diretor interino do
Departamento de Ciências Sociais, Otto Klineberg, vinham ao
encontro dos interesses de Arthur Ramos: uma reunião de
especialistas para debater o estatuto científico do conceito de raça e a
criação de um setor, dentro do departamento, que lidasse
especificamente com o tema das relações raciais. Ademais, o
antropólogo brasileiro mostrava-se otimista com a possibilidade de
viabilizar uma série de projetos no novo programa a ser discutido e
aprovado na Conferência de Florença, a ser realizada em maio de
1950.
Para atingir tais metas, Arthur Ramos julgava que a antropologia
deveria assumir papel central, particularmente no que tange ao
debate sobre raça e relações raciais. A importância da disciplina se
revelaria a partir de dois aspectos do pensamento de Ramos. O
primeiro refere-se à centralidade das concepções antropológicas na
organização do mundo do pós-guerra, na medida em que "nenhuma
outra ciência foi tão desviada de seus verdadeiros propósitos. Em seu
nome, nações inteiras apelaram para o conflito, para defender o falso
ideal de supremacia racial ou étnica. É, portanto, perfeitamente
natural que a antropologia, uma vez recolocada em seu lugar de
direito, e despojada dos mitos com que a cobriram, dê agora sua
mensagem científica para o mundo" (Ramos, 1949, p. 9).
O segundo aspecto se refere às possibilidades e tarefas de uma
antropologia aplicada e socialmente engajada, conforme concebida
por Arthur Ramos. Ele creditava à disciplina um outro compromisso
no interior da Unesco, a saber, a elaboração de uma ampla pesquisa
sobre a vida e a cultura de povos não-europeus, com base na qual
fosse possível, em seguida, compará-las com os principais aspectos
constitutivos da civilização européia. Essa proposta tinha por
objetivo introduzir a questão da assimilação dos índios e negros do
Novo Mundo e sua inserção na cultura ocidental.35
Ao citar explicitamente o caso dos negros e dos índios, Arthur
Ramos tinha em mente não apenas a América Latina, mas,
especificamente, o quadro brasileiro, onde os problemas econômicos
e sociais se faziam presentes. Nesse sentido, a visão do Brasil como
laboratório de civilização não impedia o reconhecimento de que
existiam problemas étnicos ou raciais no país. Ramos acreditava que
a antropologia cultural, com estudos sobre os segmentos negro e
indígena, poderia contribuir para a incorporação deles à
modernidade.
Diante de tantos desafios e num curto espaço de tempo, o
antropólogo conseguiu imprimir sua marca, fazendo avançar a
ampliação das pesquisas no campo das ciências sociais em âmbito
internacional, tendo em vista a maior aproximação e compreensão
entre os povos e Estados nacionais, sem prejuízo de suas
preocupações específicas com o Brasil e a América Latina. Na
primeira semana de setembro de 1949, participou da instalação, em
Oslo, da Associação Internacional de Sociologia e, na semana
seguinte, da criação da Associação Internacional de Ciência Política.
O surgimento das duas instituições teve o incentivo da Unesco e
contou com apoio financeiro do Departamento de Ciências Sociais.36
No tocante ao Brasil, podemos listar pelo menos três iniciativas
de Arthur Ramos. A primeira foi a colaboração de Djacir Menezes
(1950, pp. 228-32) na coletânea sobre ciência política publicada pela
Unesco, onde o autor traça, em linhas gerais, uma análise sobre a
literatura existente sobre o tema no Brasil. A segunda está associada
à proposta delineada por Otto Klineberg, seu antecessor na direção
do Departamento de Ciências Sociais, relativa à convocação de uma
reunião de especialistas para discutir o conceito de raça numa
perspectiva interdisciplinar. Na verdade, Arthur Ramos concebia a
reunião como impulso inicial para a criação de um setor de estudos
sobre problemas raciais no departamento (Angell, 1950, p. 286). A
terceira atividade viabilizada pelo antropólogo brasileiro foi a
elaboração de um artigo "sobre as minorias étnicas no Brasil e suas
influências nas relações internacionais". A tarefa ficou a cargo da
Comissão Nacional da Unesco, o Instituto Brasileiro de Educação,
Ciência e Cultura (IBECC), que não chegou a realizá-la.37 De
qualquer modo, a proposta revela a intenção de Arthur Ramos de
alçar o Brasil à condição de laboratório sócio-antropológico da
Unesco (Maio, 1998, pp. 22-8).

A decisão de Florença

O "exame das atitudes dos vários grupos étnicos na América do


Sul" (Costa Pinto, 1950, p. 20), sugerido na reunião dos especialistas
em dezembro de 1949, passou a fazer parte do plano de trabalho do
Comitê Executivo da Unesco em janeiro de 1950. O texto da
proposta inserida no programa da entidade para 1951 sugeria a
realização de uma pesquisa na América Latina com o intuito de
examinar "os fatores que levam a relações harmoniosas entre as
raças. A idéia é criar um projeto piloto que aponte o caminho para
estudos comparativos sobre variações nas atitudes raciais no tempo e
no espaço e, particularmente, sobre as condições em que os
preconceitos raciais diminuem de intensidade."38
No início de fevereiro, o diretor interino do Departamento de
Ciências Sociais, o sociólogo Robert Angell, solicitava informações
a respeito da Escola Livre de Sociologia e Política, por meio de
Donald Pierson. Desde 1935, o sociólogo norte-americano mantinha
laços estreitos com o Brasil e foi um dos principais responsáveis pela
institucionalização das ciências sociais no país. Pierson (1987)
apresentou um breve relatório dos cursos, das pesquisas e do corpo
docente da instituição brasileira, colocando-se à disposição da
Unesco para uma futura parceria. No final da carta, revelava seu
interesse em participar de uma pesquisa sobre relações raciais no
Brasil.39 Por sua vez, em carta a Alfred Métraux, Robert Angell
comunica-lhe que:

Em nosso programa para 1951 constam vários estudos a serem executados na


América do Sul, África e Oriente Médio. Um estudo importante situa-se no campo
das relações raciais, e dois outros versam sobre a adaptação às transformações
tecnológicas. Estes três estudos serão realizados por meio de acordos firmados
com instituições de pesquisa. Uma de suas principais tarefas será cuidar da
correspondência preliminar à seleção dessas instituições e colaborar com as que
forem escolhidas. Tenho em meu poder uma carta relevante de Donald Pierson, de
São Paulo.40

Até aquele momento, a presença do Brasil numa pesquisa sobre


relações raciais dar-se-ia em uma perspectiva comparada. No
entanto, a reunião do Comitê Executivo realizada em março de 1950
restringiu o escopo da investigação a "uma pesquisa-piloto sobre
contatos raciais num país da América Latina com o objetivo de
determinar os fatores que contribuiriam para a existência de relações
raciais harmoniosas".41 Em junho aprovou-se a pesquisa no Brasil.
Como ocorreu tal escolha?
Em sua intervenção na reunião dos especialistas sobre a questão
racial convocada pela Unesco, o sociólogo Costa Pinto (1950, p. 18)
sugeriu que fossem realizadas análises com base em pesquisas sobre
relações étnicas, de perfil interdisciplinar e reunindo equipes de
pesquisadores de diversos países. Na sua opinião,

seria fácil encontrar por exemplo, para tais investigações, excelentes pontos de
observação no Brasil, nos Estados Unidos, na África do Sul, na União Soviética,
na Índia, no México, na Palestina e em diversas outras regiões que se enquadram
naquilo que Park denominou fronteiras raciais — o que nos permitiria observar,
sempre em ligação com as diferentes estruturas sociais, os tratamentos e as
diversas soluções encontradas para os problemas das minorias nacionais e étnicas.

Ao citar o Brasil como possível campo de investigação, Costa


Pinto dava continuidade ao projeto de Arthur Ramos. No intervalo
entre a reunião dos especialistas sobre a temática racial e a
Conferência de Florença, o Departamento de Ciências Sociais da
Unesco criou um setor especialmente dedicado à questão das
relações raciais. Para chefiá-lo foi escolhido o antropólogo Alfred
Métraux (1902-63), que já havia realizado pesquisas sobre grupos
indígenas e cultos africanos e estava bem informado sobre os estudos
etnológicos em curso no Brasil. Em 1946, Métraux (1978, pp. 155-
213) esteve vinculado à ONU e, no ano seguinte, participou, como
consultor, do frustrado projeto de criação do Instituto Internacional
da Hiléia Amazônica, patrocinado pela Unesco. Seu principal
assistente entre 1950 e 1953 foi o antropólogo brasileiro Ruy Coelho
(1920-90), ex-aluno de Roger Bastide na Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da USP, e de Melville Herskovits na Universidade
de Northwestern.42 Coelho (1964) fez sua tese de mestrado sobre a
aculturação dos Caraíbs negros em Honduras.
Logo que foi nomeado, Alfred Métraux envolveu-se na fase final
de elaboração da Primeira declaração sobre a raça. Após a aprovação
do projeto sobre as relações raciais no Brasil, teve sob sua
responsabilidade a definição do escopo da pesquisa e sua
subseqüente operacionalização. A presença de Métraux e Coelho na
Unesco representa, de certo modo, a constituição de um grupo de
pressão latino-americano no interior da organização.
Em maio de 1950, o plano de trabalho do Comitê Executivo da
Unesco foi submetido à Conferência Geral. Entre as propostas,
constava a pesquisa sobre contatos raciais num país da América
Latina, com o objetivo de determinar os fatores que contribuiriam
para a existência de relações raciais harmoniosas.43
No início de junho, os representantes de Iugoslávia, Brasil, El
Salvador, França e Colômbia e o diretor interino da Unesco, Robert
Angell, debateram a proposta. O representante da Iugoslávia
considerou necessário explicitá-la melhor, inserindo tanto grupos
raciais como étnicos, e especificando os fatores econômicos, sociais
e políticos que influenciariam as relações entre esses
agrupamentos.44 Os representantes de El Salvador45 e da França46
ponderaram que a pesquisa sobre contatos raciais num só país
limitaria a possível generalização de seus resultados. O salvadorenho
propôs a inclusão de outros países da América Latina que tivessem
perfis étnicos semelhantes para que se pudesse, comparativamente,
avaliar em que medida haveria padrões distintos de relações raciais
nesta parte do continente. O representante da Colômbia não se
importou com o fato de a pesquisa ser realizada num só país, mas
julgou necessário escolhê-lo com base num perfil que contemplasse,
de fato, "os fatores favoráveis ou desfavoráveis à presença de
relações raciais harmoniosas".47
Paulo Carneiro, o representante brasileiro, considerou importante
que a escolha recaísse sobre algum país do Novo Mundo onde
fossem encontrados "lado a lado populações amarelas nativas,
negros de descendência africana e, por fim, imigrantes brancos. Ele
sugeriu que a pesquisa em questão fosse feita no Brasil, onde a
mistura da população prosseguia com notável ausência de tensões, e
onde a Unesco encontraria um rico campo de estudos, podendo
contar com a eficiente ajuda das autoridades brasileiras."48
Robert Angell garantiu que seria realizada somente uma
investigação-piloto, que poderia vir a contemplar diversos países nos
anos seguintes. Sugeriu também que fosse desenvolvida em um país
no qual as relações raciais fossem boas, na medida em que já se tinha
vasto conhecimento das experiências negativas neste terreno.49
Por fim, prevaleceu a proposta de se fazer a pesquisa no Brasil,
incluindo-se as emendas dos representantes da Iugoslávia e
Colômbia que explicitavam os fatores que poderiam facilitar ou
dificultar a existência de relações raciais harmoniosas. É interessante
ressaltar a aliança entre Robert Angell e o representante brasileiro.50
O argumento de Paulo Carneiro, associando a importância da
pesquisa de um povo mestiço ao apoio político do Estado brasileiro
reiterava, de certo modo, ideologia respaldada oficialmente desde os
tempos do Estado Novo (Carvalho, 1995, p. 31).51

O Brasil no concerto das nações

Em 1945, Arthur Ramos escreveu o prefácio de As raças da


humanidade, pequeno livro de divulgação da luta contra o racismo
elaborado pelas antropólogas Ruth Benedict e Gene Weltfish da
Universidade de Columbia. Os boasianos, na linha de frente dessa
luta desde a década de 1920, estavam particularmente engajados
contra o nazismo.
Arthur Ramos (1945a, pp. 5, 6) reconhecia que a antropologia
vivia a tensão entre a ciência e a política, tendo servido a causas
nada edificantes em nome "da falsa idéia da civilização-igual-a-
domínio-europeu-do-mundo". O racismo, em sua vertente nazista,
parecia-lhe a última fronteira ideológico-política da racionalização
do determinismo biológico. Entretanto, face à ideologia racialista
que grassava no espírito do homem da rua, tomado por sistemas
supostamente objetivos e fidedignos de classificação das raças, fazia-
se necessário ampliar a divulgação dos segredos dos laboratórios
antropológicos, que, sem dúvida, poderiam contribuir para a
superação das mazelas do racismo. Entre esses segredos encontrava-
se a fundamental distinção entre raças, grupos étnicos e culturas.
Caberia aos antropólogos denunciar a crença na existência de raças
puras e enfatizar, com evidências, "a universalidade das misturas,
(apontando para) a conclusão lógica (de) que a civilização nada tem
a ver com a cor da epiderme, a forma dos cabelos ou a cor dos
olhos".
A Unesco foi fundada na Europa, sobre as cinzas de uma grande
crise da civilização ocidental. Nos seus primeiros anos de existência,
procurou encontrar respostas para um fenômeno até então inédito na
história, a saber, o genocídio nazista. Para isso, assumiu a luta contra
o racismo, buscando não apenas tornar inteligível o fenômeno, mas
também investigando experimentos civilizacionais que pudessem
oferecer lições à humanidade.
Assumida a condição de aliar ciência e política, a Unesco criou
um fórum que viesse a cancelar a importância científica do conceito
de raça. O antropólogo físico Ashley Montagu assumiu a liderança
deste difícil projeto. A Primeira declaração sobre raça foi repudiada
por parte significativa dos antropólogos físicos, biólogos e
geneticistas que observaram a presença de imprecisões. Julgaram
que o problema decorria da presença excessiva de cientistas sociais
(Unesco, 1952, pp. 6-7).
Desse modo, as críticas à Declaração Ashley Montagu,52 como foi
denominada pelos opositores, obrigou a instituição a convocar nova
reunião de especilaistas em 1951, que foi monopolizada pela
comunidade dos cientistas naturais. Embora sem mudanças
substantivas nas conclusões, o novo Statement on race procurou
ater-se fundamentalmente aos aspectos genéticos da reflexão sobre
raça, eliminando assim conteúdos filosóficos ou culturalistas
presentes no documento anterior. Enfim, o conceito de raça foi
resgatado, mas despido de quaisquer definições de natureza
racialista.
Se a proposta de uma definição científica do conceito de raça
apropriada ao pós-guerra gerou uma série de controvérsias, a crença
universalista na miscigenação, segundo a visão de Arthur Ramos,
parece ter obtido êxito. Afinal, as imagens do Brasil encarnavam
esse ideal. Uma tal sociedade seria um indicador preciso da ausência
de sentido de qualquer recurso à noção de raça. É interessante
observar que, no mesmo momento em que era amplamente
divulgada a Primeira declaração sobre raça com a manchete "raça é
menos um fato biológico que um mito social",53 o Brasil era
escolhido como sede de uma pesquisa experimental sobre relações
raciais.
Quase uma década antes, o escritor austríaco Stefan Zweig (1956,
p. 115), em livro considerado exageradamente otimista, comentara
que:

há quatrocentos anos na enorme caldeira deste país a massa humana,


constantemente mexida e recebendo sempre novas substâncias, está cozinhando.
Está esse processo definitivamente terminado, essa massa de milhões de seres já
tomou forma própria, já se tornou uma substância nova? Existe hoje já alguma
coisa que possamos denominar a raça brasileira, o brasileiro, a alma brasileira?

As indagações de Stefan Zweig, que via sua civilização ser


pervertida pelo nazismo, já traziam embutida a crença de que o
Brasil representava o novo, a ausência de raças, ou melhor, uma
população moldada pelas matrizes européia, africana e indígena,
formando uma "mistura nova que ainda fermenta eficazmente"
(idem, ibidem, p. 213).
No prefácio à edição brasileira do livro de Donald Pierson,
Brancos e negros na Bahia, Arthur Ramos elogia os métodos
sociológicos modernos da Escola de Chicago que o autor havia
utilizado para o estudo das relações raciais, embora afirme que o
sociólogo norte-americano "chega às mesmas conclusões que
estavam admitidas, vamos dizer, tradicionalmente" (Ramos, 1945b,
p. 23).
Antes de a Unesco escolher o Brasil como espaço privilegiado de
pesquisa, Louis Wirth (1949, p. 138), então presidente da Associação
Internacional de Sociologia, já havia sugerido uma análise das
relações raciais no Brasil, nos Estados Unidos e na África do Sul em
perspectiva comparada. E Otto Klineberg (1949, p. 6) aconselhava a
Unesco a pesquisar "exemplos históricos e contemporâneos dos
modos em que vários grupos raciais podem viver e têm vivido juntos
com sucesso dentro da mesma comunidade".
Durante sua breve estada na Unesco, Arthur Ramos expressou sua
convicção de que a instituição intergovernamental poderia contribuir
para a inserção plena do Brasil na civilização ocidental. Essa
incorporação seria um processo negociado, contribuindo o país com
uma experiência civilizacional singular em troca de seu ingresso na
modernidade. Por sua vez a Unesco, dotada de uma visão
universalista, localizava em um caso periférico a idealizada
convivência racial harmoniosa e, dessa forma, encontrava a
oportunidade de integrar e revitalizar uma civilização em crise.

Notas
1
Carta de Arthur Ramos a Alceu Maynard de Araújo (27.10.1949), apud Azeredo
(1986, p. 215).

2
Carta de Arthur Ramos a Clemente Mariani (14.10.1949). Correspondência
Familiar, Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional.
3
As pesquisas foram realizadas no Norte, Nordeste e Sudeste e contaram com a
participação de cientistas sociais brasileiros, franceses e norte-americanos. Os
resultados foram publicados em Wagley et alii (1952); Azevedo (1953); Costa
Pinto (1953); Bastide e Fernandes (1955); Nogueira (1955); Ribeiro (1956). Sobre
a história do projeto Unesco, ver Maio (1997).

4
Para uma análise das aproximações e distinções dos conceitos de racialismo e
racismo, ver Todorov (1993, p. 107; 1986, pp. 370-3; Appiah, 1991, pp. 4-5).

5
Resolutions adopted by the general conference during its second session. México,
nov.-dez. 1947. Paris, Unesco, abr. 1948, p. 25, Arquivos da Unesco.

6
Records of the General Conference of the United Nations Educational, Scientific
and Cultural Organization, Fourth Session, Resolutions. Paris, Unesco, 1949, p.
22. Em Statement on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I, Caixa 146, Arquivos da
Unesco.

7
The Programme of Unesco Proposed By The Executive Board, Part II - Draft
Resolutions For 1951. Paris, 1950, p. 40, Arquivos da Unesco.

8
Unesco Launches Major World Campaign Against Racial Discrimination. Paris,
Unesco, 19.7.1950, p.1. Em Statement on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I,
Caixa 146, Arquivos da Unesco.

9
As informações provêm de entrevista concedida por Otto Klineberg ao projeto
Columbia Oral History, Universidade de Colúmbia, em 1984. Ver, também,
Klineberg (1974, pp. 163-82).

10
Entre os manifestos encontravam-se os da Real Sociedade de Antropologia da
Grã-Bretanha e Irlanda, da Associação Antropológica norte-americana e da
Sociedade Brasileira de Antropologia e Etnologia. Klineberg chegou a escrever
uma carta a Arthur Ramos pedindo cópia de um manifesto que os antropólogos
brasileiros teriam publicado e que se encontraria em um dos livros de Ramos
(Carta de Otto Klineberg a Arthur Ramos, 31.5.1949. Coleção Arthur Ramos,
Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional). Na verdade, a Sociedade Brasileira
de Antropologia e Etnologia, sob a direção de Ramos, publicou dois manifestos
(Manifesto da Sociedade Brasileira de Antropologia e Etnologia e Mensagem da
S.B.A.E. aos antropólogos da Grã-Bretanha), incluídos no livro de Arthur Ramos,
Guerra e relações de raça, de 1943.

11
Carta-convite de Arthur Ramos a Costa Pinto, 14.10.1949, p. 1. Em Statement
on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I, Caixa 146, Arquivos da Unesco.

12
Embora a União Soviética só tenha ingressado na Unesco em 1954, a
organização preocupou-se em convidar um representante dos países socialistas: o
antropólogo polonês Jan Czeckanowski, da Universidade de Lwow, que não pôde
comparecer à reunião por motivo de doença. Pelo mesmo motivo, não participou
do encontro o representante da Suécia, Joseph Sköld, da Universidade de
Estocolmo (Montagu, 1951, pp. 3-10).

13
Carta de Arthur Ramos a Jorge Kingston, 14.9.1949 (Coleção Arthur Ramos,
Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional).

14
Sobre esta controvérsia entre Franklin Frazier e Melville Herskovits, ver Maio,
(1997, cap. 5).
15
Declaration Sur La Race, Reunion DExperts Sur les Questions De La Race, p. 7,
Unesco/SS/Conf. 1/6. Statement on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I,
Caixa146, Arquivos da Unesco.

16
Hadley Cantril (psicólogo social), E. G. Conklin (biólogo), Gunnar Dahlberg
(geneticista), Theodosius Dobzhansky (geneticista), L. C. Dunn (geneticista),
Donald Hager (antropólogo), Julien S. Huxley (biólogo), Otto Klineberg
(psicólogo), Wilbert Moore (sociólogo), H. J. Muller (geneticista), Gunnar Myrdal
(economista e sociólogo), Joseph Needham (bioquímico). Ver Montagu (1951, pp.
7-10).

17
Carta de Julian Huxley a Robert Angell, 26.1.1950, p. 4. Em Statement on race,
Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da Unesco.

18
Carta de Leslie Dunn a Robert Angell, 11.1.1950, pp. 1-2. Em Statement on
race, Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da Unesco.

19
Carta de Theodosius Dobzhansky a Robert Angell, 17.1.1950, p. 2. Em
Statement on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da
Unesco.

20
Carta de Otto Klineberg a Robert Angell, 25.1.1950, p. 1. Em Statement on race,
Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da Unesco.

21
Carta de Theodosius Dobzhansky a Robert Angell, 17.1.1950, p. 1. Em
Statement on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da
Unesco.

22
Carta de Robert Angell a Ashley Montagu, 26.4.1950, p. 1. Em Statement on
race, Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da Unesco.

23
Carta de Julian Huxley a Ashley Montagu, 24. 5. 1950, p. 1. Em Statement on
race, Arquivo 323.12 A 102, parte I (Caixa 146), Arquivos da Unesco.

24
Hadley Cantril, professor de psicologia social da Universidade de Princeton e
coordenador do projeto Tensions Affecting International Understanding, da
Unesco, logo após o fórum organizado em Paris sobre Tensions that cause wars
(verão de 1948), sondou informalmente Gilberto Freyre sobre a viabilidade de vir
a dirigir o Departamento de Ciências Sociais. Em sua carta a Freyre, Hadley
Cantril escreve: "Estive conversando nos últimos dias com os principais
responsáveis pela direção da Unesco. Tiveram a bondade de pedir meu conselho
sobre um candidato para o cargo de chefe do Departamento de Ciências Sociais da
Unesco. Brodersen está como interino. Como o nosso programa está se
expandindo e ganhando fôlego, torna-se cada vez mais fundamental que tenhamos
um chefe que possua renome no campo, um pouco de suavidade e sabedoria e
todas as demais qualificações que você conhece melhor do que eu. Mencionei seu
nome, e pediram-me que lhe escrevesse informalmente para sondá-lo sobre o seu
interesse pelo cargo. Teria de ser por um ano, ao menos, com a esperança, é claro,
de que você quisesse ficar por mais tempo. Creio que o salário está em torno de
US$ 6.700, mas na verdade chega a quase US$ 10.000" (Carta de Hadley Cantril a
Gilberto Freyre. Arquivo do Instituto Gilberto Freyre, 13.8.1948, 1 p.). Em outra
carta, Cantril agradece a resposta do sociólogo pernambucano mas não entra em
detalhes sobre os motivos da recusa do convite informal (Carta de Hadley Cantril a
Gilberto Freyre, 21.9.1948, 1 p., Arquivo do Instituto Gilberto Freyre.)

25
Na carta de Arthur Ramos a Paulo Carneiro, o antropólogo agradece a indicação
do seu nome ao diretor-geral da Unesco e aguarda a decisão do Conselho
Executivo da Unesco em junho de 1949 (Carta de Arthur Ramos a Paulo Carneiro,
14.5.1949, p. 1, Arquivo da família de Paulo Carneiro).

26
Carta de Otto Klineberg a Arthur Ramos, 31.5.1949 (Coleção Arthur Ramos,
Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional). Em entrevista ao autor (27.7.1995),
Costa Pinto apresentou sua versão sobre o motivo que teria levado Arthur Ramos à
direção do Departamento de Ciências Sociais da Unesco: "O Paulo Carneiro me
contou que quando recebeu o livro dele, os dois grossos volumes da Introdução à
antropologia brasileira, o Departamento de Ciências Sociais (da Unesco) estava
vacante, não havia chefe. Havia alguém respondendo interinamente. Ele foi ao
mexicano Torres Bodet, diretor geral da Unesco, e disse aqui está o homem para o
departamento de ciências sociais. Bodet concordou imediatamente."

27
Arthur Ramos esteve envolvido na luta contra a perseguição policial às religiões
afro-brasileiras, denunciou em diversos momentos as condições sociais em que
viviam os negros e colaborou na luta contra o anti-semitismo, como se verifica por
seu trabalho na coletânea organizada por Uri Zwerling em 1936, onde figuravam
também Gilberto Freyre, Roquette-Pinto e outros (Ramos, 1936, pp. 115-22).

28
A partir da idéia de se reunir cientistas sociais, biólogos e antropólogos físicos
para debater o conceito de raça, Otto Klineberg, coordenador de Tensions
Affecting International Understanding, na época o mais importante projeto do
Departamento de Ciências Sociais da Unesco, escreveu carta a Arthur Ramos no
intuito de colher subsídios para o encontro. "Atualmente, estou coletando todos os
depoimentos feitos por grupos ou organizações científicas sobre a questão de raça.
Estou ciente de que um grupo de antropólogos brasileiros fez tal depoimento, e
que você o reproduzuiu num de seus livros… Dentre os outros que tenho na minha
coleção, há um que foi feito pela American Anthroplogical Association e um por
antropólogos britânicos… Sei que a maiorias destes depoimentos, se não todos,
foram feitos durante a guerra, ou antes da guerra, em conexão com a ascensão do
hitlerismo, mas ainda assim eles são relevantes para a atualidade, e a Unesco pensa
utilizá-los". Carta de Otto Klineberg a Arthur Ramos, 31.5.1949 (Coleção Arthur
Ramos, Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional).

29
Otto Klineberg, United Nations, Economic and Social Council, Commission on
Human Rights, Fifth session. The prevention of discrimination and the protection
of minorities, 9.5.1949, 6 pp. Em Race questions & protection of minorities,
Arquivo 323.1, parte I, Caixa 145, Arquivos da Unesco.

30
As informações sobre Paulo Berredo Carneiro foram extraídas das seguintes
fontes: currículos nos Arquivos da Unesco; discurso do acadêmico Ivan Lins ao
receber Paulo Carneiro, na Academia Brasileira de Letras, 4.10.1971; entrevista
concedida por Mário Carneiro, filho de Paulo Estevão Berredo Carneiro, ao autor,
20.9.1995.

31
Como representante do Brasil na Unesco, Paulo Carneiro esteve à frente de
grandes projetos como o da criação do Instituto Internacional da Hiléia
Amazônica, um centro de pesquisas que envolvia Brasil, Venezuela, Equador,
Bolívia, Peru, Guianas Francesa e Holandesa. Colaborou também para a criação do
projeto de uma História do desenvolvimento científico e cultural da humanidade,
que mobilizou mais de quinhentos intelectuais, e com o projeto de preservação de
monumentos históricos. Em 1956, teve papel decisivo na criação do Centro
Latino-Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (Clapcs), com sede no Rio de
Janeiro.

32
Carta de Arthur Ramos a Clemente Mariani, 14.10.1949 (Coleção Arthur
Ramos, Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional).

33
Courrier, vol. II, set. 1949, p. 28.

34
Carta de Arthur Ramos a Luiz de Aguiar Costa Pinto, 29.9.1949 (Coleção
Arthur Ramos, Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional).

35
Courier, vol. II, set. 1949, p. 28.

36
Carta de Arthur Ramos a Jorge Kingston, 14.9.1949 (Coleção Arthur Ramos,
Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional).

37
Carta de Arthur Ramos a Pedro Calmon, 13.10.1949 (Coleção Arthur Ramos,
Seção de Manuscritos, Biblioteca Nacional).

38
Work Plan For 1951. Executive Board, 23.1.1950, p. 8, Arquivos da Unesco.

39
Carta de Donald Pierson a Robert Angell, 15.2.1950. Em Race questions &
protection of minorities, Arquivo 323.1, parte I, Caixa 145, Arquivos da Unesco.

40
Carta de Robert Angell a Alfred Métraux, 24.3.1950. Em Race questions &
protection of minorities, Arquivo 323.1, parte I, Caixa 145, Arquivos da Unesco.

41
The Programme of Unesco Proposed by the Executive Board. Part II — Draft
Resolutions For 1951. Paris, Arquivos da Unesco, 1950, p. 40.

42
Estas informações constam do currículo de Ruy Coelho enviado pelo
antropólogo a Unesco em abril de 1950. Paris, Arquivos da Unesco. Ver, também,
Coelho (1964).

43
The Programme of Unesco Proposed by the Executive Board. Paris, Unesco,
1950, p. 40, Arquivos da Unesco.

44
General Conference - 5th Session, Florence 1950, Records, Proceedings.
Arquivos da Unesco, nov. 1950, vol. 45, p. 381.

45
General Conference - 5th Session, Florence 1950, Records, Proceedings.
Arquivos da Unesco, nov. 1950, vol. 45, p. 381.

46
General Conference - 5th Session, Florence 1950, Records, Proceedings.
Arquivos da Unesco, nov. 1950, vol. 45, p. 382

47
General Conference - 5th Session, Florence 1950, Records, Proceedings.
Arquivos da Unesco, nov. 1950, vol. 45, p. 382.

48
General Conference - 5th Session, Florence 1950, Records, Proceedings.
Arquivos da Unesco, nov. 1950, vol. 45, p. 381.

49
General Conference - 5th Session, Florence 1950, Records, Proceedings.
Arquivos da Unesco, nov. 1950, vol. 45, p. 382.

50
No dia 31.5.1950, Costa Pinto endereçou carta a Paulo Carneiro, em Paris, na
qual procurava convencê-lo de que deveria estar atento à decisão sobre a escolha
do Brasil para sede da pesquisa sobre relações raciais, pois a pesquisa teria sido
gestada no interior do Departamento de Ciências Sociais da Faculdade Nacional de
Filosofia (Arquivo da família de Paulo Estevão Berredo Carneiro).

51
Paulo Carneiro era positivista. O tema da incorporação de índios e negros à
civilização ocidental estava presente no ideário positivista (Bastide, 1947, pp. 367-
88). Cabe lembrar que o marechal Cândido Rondon tinha relações muito próximas
com a família de Paulo Carneiro.

52
Expressão utilizada pelo etnólogo William Fagg (Man, nos 30-32, 1951, p. 17).

53
Unesco Launches Major World Campaign Against Racial Discrimination. Paris,
Unesco, 19.7.1950, p. 1. Em Statement on race, Arquivo 323.12 A 102, parte I,
Caixa 146, Arquivos da Unesco.

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