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CSO 534 – Met. e Téc.

em História Cultural

Aluno: Elizeu Antonio Ewald Rezende


Matrícula: 2008228115-7

Tema

Cinema e Poder – A Ideologia nos filmes produzidos pela Agência Nacional, no


final dos anos 50.

Introdução

O governo de Juscelino Kubitscheck (1956-1960), enfrentou uma série de dificuldades


políticas, hostilizado por adversários capitaneados pela UDN. Visando desmobilizá-los,
Juscelino Kubitschek lançou um ousado programa de governo: O Plano de Metas – 50
anos de progresso em 5 anos. Mas JK precisava, ainda, obter o apoio da opinião pública,
para garantir sua manutenção no cargo. Vários veículos de comunicação, que lhe eram
favoráveis, foram utilizados (jornais, revistas, rádios e televisões), mas o cinema
conferiu um status privilegiado para sua proposição, visto que atingia profundamente o
imaginário da população, ainda desconhecedora do hábito televisivo.

Numa época onde careciam sistemas eficazes de comunicação - principalmente com


imagens - os “filmetes do governo”, entitulados “CineJornal Informativo”, eram
exibidos obrigatoriamente antes do filmes de longa-metragem em mais de 4.000 salas
de cinema distribuídas pelas principais cidades brasileiras, cobrindo todo território
nacional, freqüentadas, quase diariamente, por uma população com poucas opções
culturais ou de laser. Esses filmes cumpriram um papel importante na difusão da
ideologia de uma corrente político-econômica – o Nacional-Desenvolvimentismo – e
contribuíram para estabelecer novas demarcações na disputa entre os grupos políticos
pelo espaço de atuação.

Referencial Teórico, Metodologia e Conceito

Os seguidores da escola dos Annales propunham a história-problema, com a abertura da


disciplina às demais ciências humanas, onde interdisciplinaridade serviria como base
para a formulação de novos problemas, métodos e abordagens. Mas a crise dos
estruturalismos (as realidades sociais não se confinavam à modelos) reforçou a ênfase
na problemática da construção das identidades sociais, privilegiando as abordagens
socio-culturais.

Logo após, sob a rubrica do pós-estruturalismo (Michel Foucault), houve, no entanto,


um rompimento radical com a presunção da existência de estruturas sociais e na ênfase
do vivido e da experiência. Deixava de existir os “atores sociais” enquanto sujeitos
históricos, sendo compreendidos como produções (criações) de práticas discursivas (ou
simbólicas) concorrentes, e não como produtos sociais da experiência histórica.

Numa contribuição decisiva para esse entendimento, Roger Chartier elaborou as noções
de “práticas” e “representações”. Assim, neste horizonte teórico,
"tanto os objetos culturais seriam produzidos 'entre práticas e
representações', como os sujeitos produtores e receptores de cultura
circulariam entre estes dois pólos, que de certo modo corresponderiam
respectivamente aos ‘modos de fazer’ e aos ‘modos de ver’”1

Segundo Chartier, as estruturas do mundo social são historicamente produzidas pelas


práticas articuladas (políticas, sociais, discursivas) que constroem as suas figuras. Sua
interpretação, no entanto, não é necessariamente estável e unívoca.

“Temos, portanto, de um lado, a caracterização das práticas discursivas


como produtoras de ordenamento, de afirmação de distâncias, de
divisões, e de outro (...) o reconhecimento das práticas de apropriação
cultural, como formas diferenciadas de interpretação. Umas e outras
têm as suas determinações sociais”.2

Utilizando-se do Método Comparativo, tentaremos detectar como os objetivos do grupo


político associado ao governo JK foram alcançados. Pretendemos verificar como o uso
de práticas discursivas, através no cinema, foram usadas na apropriação e representação
de idéias de nacionalidade e emancipação político-econômica, que o modelo Nacional-
Desenvolvimentista pretendia proporcionar.

Contextualização

Ao longo da década de 1920, diante da agressividade das empresas estrangeiras, os


produtores cinematográficos brasileiros insistiam no apoio do Estado à atividade. Essa
demanda levou Getúlio Vargas a assinar, em 1932, um decreto que previa a projeção
compulsória de um filme de curta metragem com cada longa metragem, em salas de
cinema. O decreto 21.240/32, no entanto, já demonstrava todas as intenções da política
oficial, e constituiu a base de um padrão ideológico e político da relação
Estado/sociedade.

“A idéia de moderno associada à de universalização, o que implicava esforço


na construção de uma identidade, imprescindível ao desenvolvimento industrial
e à constituição de um mercado, valorizou os instrumentos de difusão cultural,
abrindo um novo relacionamento do cinema com o poder”3

Em 1939, o Estado Novo (1937-1945) institucionalizou a produção oficial de filmes


pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) para exibição obrigatória antes
dos filmes nos cinemas - os Cinejornais - e do programa radiofônico nacional "Hora do
Brasil", retransmitido em horário nobre, antes das radionovelas.

Em 1945, o DIP foi substituído pelo Departamento Nacional de Informações (DNI) e


foi criada a Agência Nacional. O DNI foi extinto em 6 de setembro de 1946, mas
a Agência Nacional teve uma redefinição de suas funções e posição na hierarquia
da administração pública, a começar por seu diretor-geral, que passou a ser de
escolha do presidente da República.
1
BARROS, J.D., A História Cultural e a Contribuição de Roger Chartier. Diálogos, UEM, v. 9. n°1, 2005
2
CHARTIER, R . A História Cultural entre práticas e representações. Lisboa: Difel,. 1990.
3
VIANNA, Luiz Wernek. “O Papel do Moderno na Política Brasileira”, Presença, no. 5, São Paulo,
Caetés, jan./1985
Em janeiro de 1956, Juscelino Kubistcheck lançou um conjunto de objetivos que
visavam eliminar os "pontos de estrangulamento" da economia brasileira, buscando a
superação de seus “obstáculos estruturais”. O Plano de Metas mencionava cinco setores
básicos para os quais os investimentos públicos e privados deveriam ser canalizados.
Energia, indústrias de base e transportes, receberam 93% dos recursos alocados.

Ao longo de seu governo, dezenas de “Cinejornais Informativos” foram produzidos pela


Agência Nacional, descrevendo as etapas de implementação do Programa, além das
atividades administrativas dos órgãos governamentais.
No início dos anos 60, apesar dos avanços, muitas foram as críticas à opção do governo
de Juscelino Kubistcheck pelo crescimento econômico com recurso ao capital
estrangeiro, em detrimento de uma política de estabilidade monetária. Mas o sentimento
de que o subdesenvolvimento não deveria ser uma condição imutável foi lançado.

Fonte Primária

O acervo de filmes existente da Agência Nacional, encontra-se atualmente distribuído


entre a Cinemateca Brasileira (São Paulo) e o Arquivo Nacional (Rio de Janeiro). Este
último disponibiliza parte de seu acervo pela internet (http://www.zappiens.br),
composto de 944 Cinejornais, realizados entre as décadas de 1930 à 1970, num total de
119 horas de material. Utilizaremos um desses filmes, com o título “Cinejornal
Informativo n. 6/60 – Caminho da Libertação ”, produzido em 1960, e disponibilizado
na internet através do link: http://tinyurl.com/2wsw8fw (Ctrl+Click do mouse). Na
análise da fonte, composta de trilhas de Audio e Vídeo sincronizadas numa escala
progressiva de tempo, faremos menção a alguns tópicos relevantes, indicando suas
ocorrências (Imagem - Som) e destacando, em itálico, trechos da Narração.

TEMPO IMAGEM - SOM

00:24=>00:23 Letreiros (”Agência Nacional Apresenta” e “Caminho de


Libertação”) + Música Épica
00:44=>01:15 Imagens aéreas Brasília (Ministérios e Palácio Alvorada)
(“Brasília é ponto pioneiro de integração com várias áreas
rarefeitas e sub-desenvolvidas do Brasil... Vai ser ligada ao
extremo Oeste e estremo Norte através da rodovia Acre-
Brasília”)
01:17=>02:43 Terraplanagem em Rio Verde, GO. Presença de Governadores
(“abrindo via de acesso à regiões ocidentais e setentrionais do
Brasil”...novas esperanças nos espíritos de populações
esquecidas e abandonadas... nos vastos territórios de Rondônia e
do Acre, nos confins do Mato Grosso, e até das áreas opulentas e
desconhecidas do Alto Amazonas... outra via efetiva de ocupação
do território brasileiro, desbravando o oeste, rasgando noutro
rumo a selva amazônica, despertando riquezas adormecidas e
libertando populações da miséria...a rodovia Brasília-Acre terá
3.305 kms...a maior estrada da América do Sul”) + Música épica
02:44=>03:40 Imagens Aéreas, sobrevoando a rodovia (“em futuro próximo, ela
poderá ligar o Pacífico ao Atlântico... numa extensão de 6.000
kms... o projeto revela o alto nível da engenharia nacional... o
empreendimento significa audácia, energia e confiança no futuro
da pátria”)+ Música.
03:41=>04:43 Imagens avião+Pouso num acampamento de construtora em
Vilhena, Rondônia, antiga agência telegráfica (”o espírito
desbravador do Gal. Rondon ... índios catequizados... entretanto,
pelas cercanias, rondam ainda hoje índios ferozes, onças,
cobras... penetrar regiões quase virgens do extremo oeste, as
quais se ligam à Amazonia realmente desconhecida”)+ Música
04:43=>05:21 Imagens floresta virgem (“o homem abriu a primeira picada na
selva... gigantesca operação rodoviária... em breve chegarão
máquinas modernas para desmatar, aplainar e compactar o leito
da estrada que integra áreas imensas do Brasil ao sistema
econômico e administrativo da nação”)+Música épica
05:24=>06:38 Desfile de operários (“esses são os primeiros heróis da grande
jornada, os vencedores da floresta... trabalhadores sem medo,
pioneiros intrépidos e audazes... uma empreitada cívica e
libertadora de sua própria terra... a picada vai continuar para
frente, sempre para frente!...com seus rudes instrumentos de
trabalho, que são as suas armas, armas de redenção de
conquistas do primeiro domínio sobre natureza rude, armas que
traçam o rumo do futuro, da riqueza e da civilização”)+Música
épica+(“a construção da estrada implicará num desmatamento
de 50 milhões de m2”) + Imagens de Porto velho, Rondônia.
05:56=>07:47 Balsa sobre o rio Janari, “no grande plano de expansão
rodoviária que constitui um dos pontos altos do Programa de
Metas do Presidente Juscelino Kubischek, a Amazônia está sendo
realmente dominada e ocupada”... e as imensas possibilidades
econônicas da vastísssima região da Iléia acenam com novas
perspectivas para o futuro do país”)
07:48=>08:45 (“a dura batalha contra a selva será travada aqui...não há
desalento ou descrença no espírito dos pioneiros... pontes
modernas serão construídas sobre os rio de Estados e Territórios
que a estrada atravessa... já se efetuou o desmatamento, a
floresta foi vencida e cortada pelo meio...a iniciativa do Governo
Federal foi recebida com verdadeiro entusiasmo nos meios
administrativos e entre as populações”)
08:46=>09:19 Imagens aéreas (“O Porto de Rio Branco não será o ponto final
dessa grande via de acesso ao extremo Oeste. No futuro ela
estará na fronteira com o Perú...estará feita a ligação terrestre
entre os dois oceanos que banham as terras da América do Sul”)
Música épica.
09:22=>09:39 (“em meio à selva há um novo avanço da técnica e poder de
realização do Brasil. Ao término da inspeção a ordem era essa:
Mãos à Obra, Brasileiros!!!”)
09:40=>09:42 Letreiros (Cartela “Fim”)+ Música

Conclusão

Podemos concluir que os objetivos foram, em parte, alcançados, visto ter ocorrido a
transmissão do cargo da Presidência da República pelo próprio presidente Juscelino
Kubitschek, ao seu sucessor Jânio Quadros, em Brasília, a nova Capital Federal. O
grupo governamental tentou permanecer no governo, através da re-eleição do vice-
presidente João Goulart, e preparava seu retorno cunhando o slogan “JK 65”.

Mas o Nacional-Desenvolvimentismo, enquanto projeto político-econômico, não


satisfazia a um segmento significativo de elite brasileira. Assim que o movimento
popular ficou incômodo (inflação, greves, etc.), a burguesia “nacionalista” o abandonou,
unindo-se aos latifundiários e ao capital estrangeiro para articular o golpe de estado de
1964, expondo as deficiências de um projeto que tentava reunir o destino da burguesia
brasileira com o das camadas populares.

Bibliografia

BARROS, J. D`A. A História Cultural e a Contribuição de Roger Chartier. Diálogos,


UEM, v. 9. n°1, 2005
________________ O campo da história: especialidades e abordagens /2.ed. –
Petrópolis : Vozes, 2004.
________________ (ORG) Cinema-História: Teoria e Representações no Cinema, Rio
de Janeiro : Apicuri, 2008
BURKE, P. História e Teoria Cultural. São Paulo: Unesp, 1991
CASTRO, H. História Social, in CARDOSO, C.F.; VAINFAS R. (ORG), Domínios da
História, Rio de Janeiro : Ed. Campus, 1997
CHARTIER, R. A História Cultural entre práticas e representações. Lisboa: Difel,
1990.
FERRO, M. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992
MARROU, H. I. Do conhecimento Histórico. Lisboa: Presença, s/d
VEYNE, P. Como se escreve a História, Brasília: UNB, 1998
VIANNA, L. W., “O papel do Moderno na Política Brasileira”, Presença, no.5, São
Paulo: Caetés, jan./1985)

Sitiografia

http://pt.wikipedia.org/wiki/Departamento_de_Imprensa_e_Propaganda,
acessado dia15/11/2010 às 11:42
http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/Economia/PlanodeMetas, acessado dia
15/11/2010 às 14:21
http://www.eaesp.fgvsp.br/Interna.aspx?PagId=DLMJMMTJ&ID=187 acessado
dia 15/11/2010 às 21:51

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