Professional Documents
Culture Documents
setembro-dezembro 2010
O teu retrato
Mestrando em Poética. Bolsista Nota 10 FAPERJ. Editor do Dicionário de Poética e Pensamento
(www.dicpoetica.letras.ufrj.br)
Comecemos pelo título: “O teu retrato”. Espalmando as mãos como se fôssemos
apanhar algo no contrassenso de nossos dedos, o que vem de súbito é a imagem figurada
numa superfície. Neste pedaço de coisa, lembranças viajam em intemporalidades. O
adulto ali se vê criança, volta aos tempos de andar descalço. O único compromisso era
obedecer aos pais, comer as verduras sempre intragáveis, fazer o dever escolar para,
finalmente, encontrar os amigos e cambalhotear meninices. As reminiscências têm o
poder de máquina do tempo, sem a necessidade de exacerbada tecnologia, até porque
esta está sempre um passo atrás da poesia. Podemos então brincar de dizer que quando
um cientista se tornar poeta, oposições se fundirão a olhos vistos e a hegemonia da
técnica talvez tenha seu fim.
Mas, enquanto isso não acontece, precisamos nos demorar em certas indagações
a partir do que dissemos acima. Então, perguntamos: as reminiscências são só aquelas
lembranças acolhidas no passado? Uma foto é mecanismo de desentravar as poeiras
mnemônicas? As andanças de ser hoje o que era ontem são somente invencionice
romântica ou peraltice de poetas?
Tendo em vista essas perguntas, podemos aprofundar algumas questões que o
poema nos incitou a pensar, refletindo acerca de algumas palavras já desgastadas pelo
seu uso comum. Dessa maneira, o título aciona todo um complexo de questionamentos
propostos na desenvoltura das estrofes. Pois, o retrato já traz implicitamente a ideia de
lembrança que, por sua vez, instala a questão da memória. Dessa feita, a memória
enquanto questão vai além do sentido reminiscente, pois convoca um percurso
desmedido pelo canto originário do poeta, ou seja, miticamente encena o abraçar-se
deste com o mistério do abismo, quando o mesmo se lança na queda abissal de ser um
com as musas. Irrompendo em linguagem, seu canto é fala musal realizada em língua.
Cada palavra é retrato que se tira, são transfigurações do real na feitura imagética do
inapreensível. O que se registra em cores é assombro de luz.
Retrato, etimologicamente, retoma o verbo latino trahĕre, que reúne verbos
como tirar, mover, atrair, entre outros. Estes citados são os que nos interessam, pois
constelam o emaranhado concernente ao interior semântico da palavra em evidência.
Insistindo nos verbos, é interessante notar que na fixidez do sentido comum de retrato
moram dinamizações de vigor temporal. Assim, tais verbos expõem ruminações de
tempo como suas infindas possibilidades de manifestação, pois: tirar requisita o sentido
de mudança: o tempo que vigora, trazendo na ilusão da deslocação a permanência. O
Ser é permanente enquanto o ente, o sendo, muda ininterruptamente. O verbo mover
enseja o mesmo caminho, contrapondo-se com o atrair: move-se na medida em que atrai
para si a incomensurabilidade de se estabilizar no tempo. Desta forma, trazendo ainda a
denotação comum do retrato (como registro de uma imagem), esta propicia
implicitamente a conjugação de todas essas questões ao convocar a memória e sua
realização como possibilidade de possibilitar: descaminhos convergentes no fluxo das
diferenças.
Quando pensamos no que apontamos acima, junto com o pronome “teu” se
estabelece a dinâmica que vamos acompanhar no desenvolvimento das estrofes, isto é, a
questão do outro, de um fronteiriço trânsito, no qual a transmigração corporal se
apresenta poeticamente. O “teu” já é o que está prestes a acontecer: é eco vibrando na
antecedência de seu frêmito.
O título do poema enseja a complexidade de um sentido subjacente de memória
quando esta se dimensiona conjeturando outras possibilidades de ser pensada em sua
intimidade com a maturação da vida, portanto, o arcabouço da morte indo muito além
de causalidade final. Dito isto, temos que a morte é fonte inesgotável de vida, e isso não
é novidade: “Pois a morte é nascimento, é angústia e medo ante uma renovação
aterradora” (HESSE, 1968, p. 20). E essa renovação é uma das questões que o poema
suscita conforme vamos perceber, trazendo a lume outras que se revelarão em nossa
leitura. Então, sigamos para a primeira estofe, a fim de nos aproximarmos do que ela
oferece:
Vertigem temporal
Somos levados a pensar numa gestação, e isso é claro: algo é gestado. Uma
criança? Talvez, entretanto fazer tal afirmação seria colocar palavras que não existem
no poema. Este é o perigo numa leitura poética: quando excedemos o que diz a obra
para inserirmos nela resquícios de nossa subjetividade, um expressionismo sutil, mas
que não condiz com o desencadear do pensamento questionante, do pensar poético. Por
isso, a suposição de uma gestação vem e nos seduz com seu ar de nascença, fertilizando
nossa imaginação quando planejamos e nos excedemos em nossa excitação. Tal
movimento é próprio da iminência do que nossos ouvidos esperam numa música: o
silêncio fomenta nossa audição, produzindo a agitação que quer prever no compasso o
seu porvir. Desencadeiam-se benfazejos de improvisos nos quais o surpreendimento é
sempre dadivoso, virtuoso.
Toda essa ânsia à qual nos referimos acima é oferecida pelo “és já” que inicia a
estrofe em questão. Tal expressão antecipa distâncias e retoma o que já fora mencionado
na estrofe anterior, configurando-se como um elo que conjuga tempo e espaço. Na sua
antecipação, propõe a potencialidade de ser o que já é e não é e, nesse ínterim, está
sendo em efervescência. Quando retoma a estrofe anterior, o “és já” também pode se
referir à “deslumbrada crista”, então, encontramo-nos em um terreno incerto. Mais
ainda, num território liminar em cuja intermitência se agita a investida abissal no
desconhecido. A consagração do espaço ocorre como fio que delineia o aberto de uma
obra de arte, tangendo, alinhavando, circulando, tecendo lugares nessa clareira. Se
entendemos que espaço é todo o aberto que ao ser ocupado conforma um lugar (Cf.
HEIDEGGER, 2010, p. 111), então a dança que faz girar perspectivas encena o
espiralar de mundos que se penetram. A aliança espaço-temporal se dá no âmbito da
excessividade de fazer ver o não visto, projetando no longe do olhar a imaginação que
gesta confins de limite.
Da mesma maneira que na estrofe anterior, nesta são enumeradas diversas
maneiras de presunção existencial, isto é, insistindo no apregoar tensional do vir a ser.
No entanto, essa estrofe acrescenta uma particularidade, pois se divide sutilmente em
dois mo(vi)mentos. A saber, pela conjunção “e” disposta no sétimo verso, que
empreende uma perpendicularidade avessa à intocabilidade, ou seja, embora andem lado
a lado, tocam-se inevitavelmente, até porque o poema é um operar de contrários em
cujas particularidades vigora o diálogo, unificando-as. Mas vamos com calma,
percorrendo os versos que antecedem esse momento.
A segunda estrofe se inicia com letra minúscula, o que nos faz desconfiar de que
seja uma continuidade da primeira. Daí, segue o metamorfosear da esperança em
realidade concreta, ou seja, inserida no âmago do que se desdobra, do que cresce junto,
enraizando-se com o que aflora. Portanto, vislumbramos o jogo entre permanência e
mudança na ausculta da verdade.
Em “violência e doçura”, temos os opostos que se consagram na mesmidade de
forças ao se antagonizarem e empreenderem o movimento de fluxo e refluxo de uma
realidade em especial. Ora, não é a primeira vez que dissemos ser uma obra poética um
desencadeador de realidades, e uma obra não diz apenas um coletivo – um livro, por
exemplo –, e sim aquilo que concentra numa cena toda a encenação, portanto, um
poema é uma condensação de todo poetar de um poeta, conforme o caso que temos em
vista. Então, essa realidade em especial à qual nos referimos é uma dentre as demais
ainda recolhidas no mistério do real. Devemos ter em mente que o poema “O teu
retrato” conjuga um entremear espaço-temporal e nos conduz para essa instabilidade do
que é e não é, logo, eis uma leitura de derrocada, cuja estagnação de tempo como
premência do visível é posta em derrisão.
A violência é reviravolta de doçura, face oculta do que se mostra aprazível e
sereno, é o repentino ataque que arrebata o singelo de um afago. Este é transposto em
fogo que arde a súplica com que se abrem caminhos mediante os premeditados destinos
a seguir. No entanto, brincar de enxergar contrários nessas palavras apenas raspa de leve
a superfície do que nos absurda, do que nos poetiza. Doçura e violência são a ciranda
que roda e faz circular no seu entorno a excentricidade do que foge ao esperado.
Uma outra imagem-questão da segunda estrofe está em “o espaço da
meditação”. Aqui, temos o lugar que se funda na abertura do escampado. Isto é, se o
lugar é conformado a partir da ocupação do espaço, então irrompe, faz nascer o
diâmetro que liga os pontos de uma circularidade fundada no aberto, no interior de uma
espera. O espaço da meditação é o arranjo que vê na sua possibilidade de acontecer a
contemplação no longe que já se faz perto desde o “és já”.
O “olhar que se desdobra” é revestido de ambiguidade tal qual (embora
diferente) a “deslumbrada crista” da primeira estrofe, pois prepara para um sutil
acréscimo de nuance. Desse modo, e sem incorrermos em tautologismos, esse olhar
tanto desdobra quanto se desdobra, ou seja: imiscui tempo e espaço, misturando
perspectivas na opacidade de um ponto transiente. Mais ainda, intensifica o olhar para
alongar o horizonte de seu alcance. Para esses nossos dizeres, baseamo-nos na
conjunção “e”, que adiciona um outro ponto de vista, ainda que muito tênue. Vejamos:
A captação de mundo propiciado pelo olhar traz ao corpo o largo para onde ele
pode se lançar. Este olhar é derivado em outras margens, pois é também “floresta e
mar”: imagens que ensejam o entendimento do pleno, do uno. Assim, é um olhar que
vislumbra o visível ao mesmo tempo em que abarca o não visível, a saber, toda a
possibilidade recolhida no que ainda não veio à luz. Horizontalmente, essa ambiguidade
duplica numa harmonia antinômica o olhar que é tanto para diante como para trás,
passado e futuro se concentrando no istmo da realidade presente. Verticalmente, do
cimo de toda claridade, o sentido do olhar se enverga ao intenso negrume da noite,
sendo metáfora de vazio, de útero.
A floresta acalenta todas as possíveis trilhas que levam tanto ao perder-se quanto
ao achar-se. Habitar a floresta significa viger em proximidade com o legítimo berço no
qual vida e morte se enredam. É tanto acolhimento do verdor quanto metáfora que nos
conduz à origem da nascividade:
O mar seria uma outra maneira de dizer a floresta? De certa maneira, sim. No
entanto, cada uma resguarda sua singularidade. Se na floresta o verdor acolhe todos os
caminhos, no mar estes são engolidos pelas marés, pela extensão de água e sal onde
vida e morte se entretecem em caos e cosmo. Podemos transpor nosso olhar para uma
dimensão, diríamos, macroscópica ao rever no poema o sentido de mar que vai se
fazendo. Logo, aproximamo-nos agora mais explicitamente da questão que rege nosso
trabalho: a inesgotabilidade do mar em se manifestar sempre inauguralmente,
mostrando toda a variabilidade possível, e resguardando o que ainda não se deu a ver.
Eis nosso empenho, quando nos incutimos do método hermenêutico na leitura de Para
fazer um mar. Desse modo, temos um exemplo claro de como a questão de uma obra
está em cada detalhe da mesma.
O mar é efusão de dor e amor: cada onda é propulsão de unidade. Bate, quebra,
leva consigo toda profundidade do oceano na colisão com a rocha, com a praia. Daí,
cada espuma, pedaço de água ao céu, é o todo do mar concentrado nessa doação ao
aberto do infinito. Lembremos de Mensagem, quando no final do poema “Mar
Português”, podemos ler o seguinte:
Portanto, o valor infinitivo de um fazer, de um mar que ainda não existe porque
está em contínua feitura, espelha a profundeza do céu numa paisagem que confunde os
limites de cada um. E esta fronteira desguarnecida refaz o “olhar que se desdobra”,
desdobrando-se ele mesmo em ecos de permanência.
O olhar que “é floresta e mar”, por sua vez, é um desdobramento do “és já”, que
também se obliqua em “fogo e segredo”. Estes se reúnem no ímpeto do que arde e se
esfumaça secretamente. O ardor impõe marca de constância enquanto o segredo
entorpece os ouvidos de quem por ele é dominado. A copertença entre um e outro é tão
forte que ambos se invadem numa orgia semântica, nomeando de instabilidade o que
deles se esperaria. O que nos leva a tal constatação são os versos seguintes:
Como podemos ver pelo pronome “que”, o “corpo interior” é incendiado pelo
segredo e não pelo fogo. Este corpo é o abrigo que recebe as reviravoltas de
incandescência e enigma numa ciranda de intimidade, e em cuja circularidade se
envolvem o antigo e o novo numa conjuntura de penetração. O antigo é o já posto, o
sabido, o que alimenta as chamas para a geração do novo que, por sua vez, não é apenas
o que desponta, e sim o que sempre se inaugura tal qual a luminosidade solar. Desse
modo, o sol que abre o dia é sempre a comoção que traz consigo as boas-novas do que
irrompe como claridade, como presença. Se apontarmos em direção aos pensadores
originários,2 observaremos tal referência no 106º fragmento heraclítico, no qual lemos o
seguinte: “O vigor de cada dia é um.” (HERÁCLITO, 1980, p. 123).
Outra maneira de entendermos tal incêndio está em irmos além do caráter
combustivo. Pois o fogo também diz a purificação, a transformação de algo que está
sendo gestado. Portanto, uma constante metamorfose que se concretiza na procura pela
luz. Por sua vez, a incandescência do segredo é o sagrado que contém no silêncio a
potência do que virá a ser. Assim, o fogo e o segredo agem dupla e ambiguamente,
desdobrando-se um no outro no sentido de verter na claridade o que ainda não foi
revelado. Também trazem a lume a inerência de uma espera, vislumbrando uma
aprendizagem que é serena e tenaz, ao se imbuir na perseverança do tempo a energia
luminosa do que está resguardado no ventre do não saber.
Todas as imagens acima se excedem na última palavra da estrofe: “vertigem”.
Esta nos diz o súbito de uma perda, em que qualquer dimensão de controle é abalada
por um lampejo de desfalecimento. Digamos ser uma palavra cataclísmica, pois
concentra as profusões de revoluteios empreendidas pelas duas estrofes, a primeira e a
segunda. Então, é um redemoinho que faz rodar as amarras do tempo cronológico,
brindando a imaginação que encena o outrar-se na simultaneidade entre o que é e o que
está prestes a ser: o um e o outro num movimento de rotação: circularidade entrevista
em faces diversas do que se realiza em segredo.
O outrar-se: memória, história e destino
[...]
que se transcende e perscruta e apreende
e subverte na subversão do que sente
Dessa feita, o pronome relativo retoma a palavra “desejo” do verso anterior, com
sentido de espera. E assim, é transfigurado num tipo de prolixidade poética, cuja
loquacidade é um derramamento desenvolto em semânticas. Percebemos este
alongamento na figuração polissindética do “e”, que aprofunda e nos faz mergulhar
juntos na figuração desse carrossel de imagens: quatro verbos – transcender, perscrutar,
apreender e subverter – compondo o horizonte de uma expectativa num movimento de
impor esforço ao transbordamento do desejar, uma vez que tais verbos oferecem
dinâmicas de travessia.
Demorando um pouco nas quatro direções desse desejar, entendemos que, no
poema, transcender é ir além do que vai ao longe; aquilo que é e, enquanto está sendo,
inaugura-se na centelha de seu porvir: uma senda que ultrapassa sua própria passagem
no tempo, por isso, sendo o legítimo tempo acontecendo em vez de uma notação de sua
cronografia.
Perscrutar é se embrenhar no que se examina, invadindo-se numa indagação que
procura essencialmente o que poderá ser no que ainda não é, mas se presentificando
nessa ausência. Por sua vez, apreender é tomar para si, morar no que toca o corpo e
invade a percepção sensorial, logo, o instante que se converte em trajetória de memória.
Isto é, envergadura de cimo à base no largo de uma corporeidade mnemônica, cuja
passagem é encruzilhada de temporalidades, portanto, fluxo de investidas que se
assomam ao mundo que é tanto antecedência como potência de porvir.
Finalmente, subverter é aniquilar, revolver do chão ao céu uma verticalidade de
invasões mútuas: “subverte na subversão do que sente”. Eis um sentir contraditório que
em sua própria percepção se arruína qualquer aparência de estabilidade, ou seja, o sentir
é corrompido, sendo tanto o que toca quanto o que foge ao toque: signo de contradição
afirmada no ato de aprofundar-se, quando se aprofundar é imergir no desconhecido.
Todas as acepções acima estão ligadas pelo sentido de travessia, pois além de
estar presente etimologicamente no interior de cada verbo, assinala neles o isomorfismo
de ser a própria coisa sobre a qual se fala. Em outras palavras, este sentido de travessia
faz convergir para o centro tensional – primeiro de cada verbo e depois da própria
estrofe – a multiplicidade de sentidos pertinentes à cada enunciado, suscitando estes
como harmonia de corrupção sígnica, já que estão poeticamente além dos seus registros
dicionarizados.
A terceira estrofe acentua a questão da memória já proposta desde a primeira.
Afinal, pensar o tempo como inalcançabilidade cronológica, vendo como os quatro
verbos de que tratamos acima se articulam é pensar a memória em sua disponibilidade
de entrever além de tempo, também história e destino. Nesse sentido, pensamos na
experiência histórica consagrada pelo poeta, à qual Octavio Paz faz referência no ensaio
“A consagração do instante”, que compõe O arco e a lira (1982). No texto, ao se pensar
o histórico, pensa-se também o destino, uma vez que as questões do tempo, da história e
do destino estão intimamente ligadas, imbricadas.
Uma questão não se desliga da outra. Ao contrário, insinuam-se, flertam entre si,
até que se consumam como bacantes no apogeu de seu entusiasmo. E no meio disso
tudo, em trânsito e em transe, está o homem: sendo engolido, consumido e consumado
agonicamente. Humaniza-se no estertor dessa fúria de ser tempo e destino em
acontecimento poético-histórico. No cume dessa possessão, entremeado pela luta de ser
outros num só, conflita as diferenças no seu destinar como presença. Portanto, o poeta é
iluminado e tocado pelo canto musal, subverte rastros de cronologia a fim de evidenciar
a condição humana: essência de todo poetar, pois a dança da linguagem na composição
de qualquer manifestação artística tem inevitavelmente como fundo o homem enquanto
questão. Finalmente, observaremos o que nos diz Octavio Paz nessa referência entre
homem, história e destino. Para isso, leiamos o seguinte:
CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas e o ser feliz”. In: Travessia Poética.
Disponível em <http://travessiapoetica.blogspot.com/2008/05/o-mito-de-midas-
e-o-ser-feliz-manuel.html>. Acesso: 12 ago 2010.
HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Tradução de Idalina Azevedo e
Manuel Antônio de Castro. São Paulo: Edições 70, 2010.
______. Sobre o humanismo. Tradução de Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1967.
HERÁCLITO. Fragmentos: Origem do pensamento. Tradução, introdução e notas de
Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1980.
HESSE, Hermann. Demian. 3ª ed. Trad. Ivo Barroso. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1968.
LEÃO, Emmanuel Carneiro. “Heidegger e a modernidade: a correlação de sujeito e
objeto”. In: Aprendendo a Pensar. Vol. II. Petrópolis: Vozes, 1992.
LEMOS, Virgílio de. Para fazer um mar. Maputo: Instituto Camões, 2001.
LISPECTOR, Clarice. “Amor”. In: Laços de família. Rio de Janeiro: José Olympio,
1974.
PAZ, Octavio. “A consagração do instante”. In: O arco e a lira. Tradução de Olga
Savary. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
PESSOA, Fernando. “Mar Português”. In: ______. O Eu profundo e os outros Eus. 8ª
ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.
TORRANO, JAA. “O mundo como função de musas”. In: HESÍODO. Teogonia. 3ª ed.
São Paulo: Iluminuras, 1995.
Notas
1
Des-lumbrar: des- > prefixo com sentido intensivo; -lumbrar = lumen > luz
2
Quando temos o cuidado de considerar os primeiros pensadores gregos (Tales, Anaximandro,
Anaxímenes, Zenão, Xenófanes, Heráclito – no nosso caso – e Parmênides) como “pensadores
originários” e não pré-socráticos, estamos nos dirigindo ao zelo histórico e não simplesmente
historiográfico, que reduz em determinações cronológicas a inaugurabilidade de uma época e de um
pensar singularíssimo. Desse modo, dialogamos com o que nos diz Emmanuel Carneiro Leão na tradução
que faz dos fragmentos de Heráclito e o que, ainda na introdução da obra, esclarece sobre o sentido
originário do pensamento e sobre o prefixo “pré-”, utilizado nas correntes traduções desses pensadores:
“Os problemas, as concepções e os conceitos de Sócrates, Platão e Aristóteles, transformados pelas
ciências modernas, servem de parâmetro para se medir o nível filosófico de todos os gregos de antes e
depois da segunda metade do século V. Em pacientes pesquisas filológicas, historiográficas e linguísticas
busca-se reconstruir a lógica, a ética e a física arcaicas sem se levar em conta que só há uma lógica, uma
ética e uma física na tradição de ensino das escolas clássicas. Não se permite que os primeiros pensadores
gregos sejam pensadores. Têm de ser filósofos, iguais a Sócrates, Platão e Aristóteles, ainda que só o
sejam de forma arcaica, isto é, primitiva. Por isso mesmo só podem ser pré-socráticos ou pré-platônicos
ou pré-aristotélicos. Assim, nestes títulos, o pré- não possui apenas sentido cronológico mas sobretudo
axiomático. É o axioma de implantação da filosofia na decadência do pensamento.” (1980, p. 10).
3
Inserção nossa.
4
Citação do ensaio “O mito de Midas e o ser feliz”, de Manuel Antônio de Castro, disponível em seu
blog Travessia Poética, no endereço: http://travessiapoetica.blogspot.com/2008/05/o-mito-de-midas-e-o-
ser-feliz-manuel.html.