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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA

DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS VERNÁCULAS


MESTRADO EM LETRAS
CULTURAS E AMAZÔNIA

Uma introdução aos Estudos da Crítica Pós-colonial

Anderson Silva da Silva

Resumo: O artigo visa apresentar uma introdução aos Estudos da Crítica


Pós-colonial, expondo conceitos, contextualizando o seu surgimento e os caminhos
atuais desses estudos. Apresenta também um resumo da obra “Orientalismo” do autor
Edward Said, reconhecida como marco fundador das teorias pós-coloniais.

Palavras Chave: 1. Pós-colonialismo; 2. Edward Said; 3. Orientalismo.

Mestrando em Letras pela UNIR/RO e graduando em Música pela UFRGS.


1. Pós-Colonialismo

Nas décadas de 1980-90, o pós-colonialismo ganhou amplitude e


institucionalização em diversas partes do mundo. O surgimento desses estudos se deu
pela relevância de certos intelectuais do terceiro mundo nas academias européias e
estadunidenses nas décadas de 1970-1980. Tendo como principal expoente o historiador
e crítico literário palestino Edward Said, cujo livro O Orientalismo (1978) obteve
considerável repercussão de crítica na Europa e EUA. Tratava-se de um livro que
pretendia desconstruir o discurso colonial a partir da metodologia foucaultiana.

Muryatan Santana em seu artigo “o pós-colonialismo como projeto” expõem que

a partir da influência direta e indireta de Said, outros autores “pós-


coloniais” ganharam legitimidade e reconhecimento na crítica
européia e estadunidense. Tal qual Said, outros herdeiros do “pós-
estruturalismo” francês - em particular, Michel Foucault e Jacques
Derrida -, como os indianos Hommi Bhabha e Gayatri C. Spivak
desenvolveram trabalhos reconhecidos acerca do discurso colonial.
Em verdade, sua crítica ficou famosa tanto por seu objeto de pesquisa,
quanto a quem ela se opunha: os discursos anti-coloniais e “negros”
dominantes da primeira metade do século XX. Foram, tidos, por estes
analistas contemporâneos, como discursos baseados na mesma óptica
“essencialista” da identidade e do sujeito que o discurso colonial
(Hall, 2003:111).

Segundo Sérgio costa os estudos pós-coloniais não constituem propriamente


uma matriz teórica única. Explica que trata-se de uma variedade de contribuições com
orientações distintas, mas que apresentam com característica comum o esforço de
esboçar, pelo método da desconstrução dos essencialismos, uma referencia
epistemológica crítica às concepções dominantes de modernidade. Iniciada por aqueles
autores qualificados como intelectuais da diáspora negra ou migratória, a perspectiva
pós – colonial teve, na crítica literária, sobretudo na Inglaterra e nos Estados Unidos, a
partir dos anos 1980, suas áreas pioneiras de difusão. Depois disso, expande-se
geograficamente e para outras disciplinas, fazendo dos trabalhos de autores como Homi
Bhabha, Edward Said, Gayatri Chakravorty Spivak ou Stuart Hall e Paul Gilroy
referências recorrentes em outros países dentro e fora da Europa. (Costa, 2006:83)

Mestrando em Letras pela UNIR/RO e graduando em Música pela UFRGS.


Segue expondo que a abordagem pós-colonial constrói sobre a evidência – diga-
se, trivializada pelos debates entre estruturalistas e pós-estruturalistas – de que toda
enunciação vem de algum lugar, sua crítica ao processo de produção do conhecimento
cientifico que, ao privilegiar modelos e conteúdos próprios àquilo que se definiu a
cultura nacional nos países europeus, reproduziria, em outros termos, a lógica da relação
colonial. Tanto as experiências de minorias socais quanto aos processos de
transformação ocorridos nas sociedades “não ocidentais” continuariam sendo tratados a
partir de suas relações de funcionalidades, semelhanças ou divergências com aquilo que
se definiu como centro. Nesse sentido, o “pós-colonial não representa simplesmente um
“ “depois” no sentido cronológico linear; trata-se de uma operação de reconfiguração
do campo discursivo, no qual as relações hierárquicas são significativas a partir de
fronteiras de gênero, étnicas ou raciais. (Costa, 2006:84)
Conclui dizendo que os estudos Coloniais buscam explorar precisamente as
fronteiras, produzir, conforme Bhabha (1994), uma reflexão para além da teoria.

2. Edward Said – “Orientalismo”

Pensador, professor de literatura na Universidade de Columbia, em Nova


York.e escritor palestino, nascido em Jerusalém, Edward Said marcou o rumo do
pensamento contemporâneo com o Livro Orientalismo, publicado em 1978, deixando
em evidência os mecanismos de dominação e de montagem de imagem que são e foram
aplicados nos processos de colonização. Sua obra é considerada um marco para o
surgimento de novas disciplinas teóricas como os Estudos Pós-Coloniais e a Teoria
Crítica das Raças.
A obra tem por objeto o estudo do orientalismo, entendido como um
conjunto de diversas realidades interdependentes, nas quais se destaca a construção
acadêmica e doutrinária desenvolvida, precipuamente pelos povos ocidentais, em
relação ao Oriente.
No primeiro capítulo, denominado “O âmbito do Orientalismo”, o autor
disserta sobre o alcance do Orientalismo, trazendo a visão ocidental acerca do Oriente.
Inicia seu relato voltando-se ao pensamento europeu durante o século XIX (e também

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nos primórdios do século XX). Primeiramente, através da exposição do discurso
proferido por Arthur James Balfour à Câmara dos Comuns, no ano de 1910, denota a
condição de superioridade auto-proclamada pela comunidade européia (essencialmente
os ingleses) em detrimento às civilizações orientais – no caso descrito, os egípcios.
Defende o autor, assim, que a acepção pela qual se divide o mundo em
“oriente” e “ocidente”, embora resguardada sob inocente desígnio de mera distinção,
serve, na realidade, para intensificar as diferenças e obstar quaisquer tentativas de
aproximação entre as culturas. A tradição orientalista, ao apontar a existência de tantas
diferenças, constitui-se num convite à subjugação oriental.
Explica que um conceito mais restritivo de “orientalismo” conceituaria o
termo como um campo de estudos eruditos, fundados na unidade geográfica, cultural,
lingüística e étnica do Oriente. Geograficamente, é como se houvesse uma linha
imaginária a dividir o continente europeu do asiático com linhas muito mais profundas.
Culturalmente, a própria literatura e arte produzida no Ocidente tende a corroborar este
pensamento.
Desta forma, o estudioso explicita que não pode ser adotado de forma plena,
filosoficamente, o pensamento e visão orientalista, sob risco de tomar por realidade o
que constitui, tão somente, uma visão distorcida. Para ele, do ponto de vista psicológico,
o orientalismo é uma “paranóia”, resultado de conceitos e idéias traçados desde o século
XIX. A grande verdade é que o desenvolvimento das idéias sobre o mundo oriental
sempre foi processo eivado de preconceitos.
Identifica, no orientalismo ao longo do século XIX, dois traços principais: a
autoconsciência científica, baseada na importância lingüística do Oriente para a Europa,
e a inclinação a interferir no tema sem, no entanto, mudar de opinião sobre o Oriente
como algo imutável, uniforme, embora peculiar (p. 107). O Oriente era apenas
“olhado”, observado, como salientara Flaubert. O orientalista moderno, assim,
disfarçava sua antipatia de conhecimento profissional, e rigorosismo científico.
Para o estudioso, “Investigar o orientalismo é também propor modos
intelectuais de tratar os problemas metodológicos a que a história deu origem, por assim
dizer, em seu tema de estudos, o Oriente” (p. 119).
Deste modo, no segundo capítulo, intitulado “Estruturas e estruturas
orientalistas” o autor busca destrinchar, cronologicamente, as principais obras e
produções sobre o Oriente, indicando os mecanismos utilizados em sua produção e, ao
mesmo tempo, trazendo uma farta explanação sobre como se deu o desenvolvimento, e

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também as transformações, das visões acerca do Oriente. Inicia evocando a necessidade
de se retraçar as fronteiras e redefinir as questões de estudo. Indica que, no orientalismo
moderno, permanecem ainda os elementos de correntes de pensamento inerentes ao
século XVIII – a expansão, o confronto histórico, a solidariedade e a classificação. Sem
a presença de tais elementos, aponta que, muito provavelmente, a concepção moderna
do orientalismo não teria existido, mas se constituiria de ideais libertadores, amplos e
realmente “modernos”.
O terceiro capítulo “O orientalismo hoje”, inicia-se com um retorno às
explanações iniciais, tendo por objeto reiterar o desígnio indicado pelos capítulos
anteriores. O autor explica que, pela utilização de obras dos grandes escritores, filósofos
e poetas que usaram o Oriente como referencial, construiu uma caricata figura, que
representa o Orientalismo em suas vertentes, conquanto direcionamento científico. E,
sobre a forma com que foi concebido, diz:
O Oriente que aparece no orientalismo, portanto, é um sistema de
representações enquadrado por todo um conjunto de forças que
introduziram o Oriente na cultura ocidental, na consciência
ocidental e, mais tarde, no império ocidenta1. Se esta definição do
orientalismo parece mais política que outra coisa, isso acontece
apenas porque acredito que o próprio orientalismo foi um produto
de certas forcas e atividades políticas. O orientalismo é urna escola
de interpretação cujo material, por acaso, o Oriente, suas
civilizações, seus povos e suas localidades. (p. 209)

Portanto, o autor traz que o orientalismo não é apenas doutrina positiva, mas
uma realidade de caráter multifacetário, servindo-se conquanto orientação acadêmica e
área de interesse para curiosos e interessados dos mais diversos campos de atuação.
Conclui que, no século XIX, o europeu tinha visão puramente racista do Oriente, por
enxergar o mundo de forma etnocêntrica. Foram precisos esforços e pressões de cultura
geral para que, diferenciando-se corretamente Leste e Oeste, se pudesse construir uma
ciência despida dos preconceitos anteriormente vigentes.

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3. A releitura

Nas últimas duas décadas, o reconhecimento mútuo e de crítica aos trabalhos de


Said, Bhabha e Spivak transformou-os, gradativamente, em um grupo homogêneo de
crítica “pós-colonial”.
De acordo com Santana, numa perspectiva ampla do pós-colonialismo definida
por Ashcroft, que vêm sendo defendida por diversos autores, a releitura tem sido
utilizada como uma propriedade importante para recuperar e/ou reavaliar o pensamento
de autores e ativistas do “Terceiro Mundo” como pertencentes a tal tradição crítica. Esse
é o ensejo que guia estudos como os de Homi Bhabha (1994 [1998]) sobre Fanon;
Aníbal Quijano (2000) e Neil Larsen (1996) sobre J. C. Mariátegui; Josaphat
Kubayanda sobre Aimé Césaire (1989); Ashis Nandy (1988) sobre M. Gandhi; Chidi
Amuta (1989 [1995]) sobre Amílcar Cabral, etc. Cita os ensaios de Bhabha sobre Fanon
no livro “O lugar da cultura” expondo que a questão chave nesta releitura é a
temporalidade. Segundo Bhabha é a partir dessa percepção crítica das temporalidades
que Fanon subverte a lógica “essencialista” da identidade, constituída pelo discurso
colonial e seu poder de significação. Ao estabelecer tal interpretação do pensamento
fanoniano, Bhabha (1998: 341) defende que a luta estratégica atual não seria mais a de
retomar ou reivindicar novos símbolos de identidade “positiva”, mas transformar as
condições de enunciação ao nível do signo, em particular, em relação à subalternidade.
Tido, por Bhabha, como espaço da “temporalidade disjuntiva” da modernidade.
Neste contexto percebemos que as releituras, sem dúvida, revelam um exemplo
particular da importância e da atualidade das intervenções pós-coloniais .
Ainda segundo Santana, trata-se de um movimento amplo e transdisciplinar nas
ciências humanas, que visa desconstruir a tradição clássica e auto-legitimadora da
“modernidade ocidental”. É um intento que vêm sendo conquistado a partir de, pelo
menos, cinco eixos críticos: a) na sua historiografia; b) no provincialismo de seu
universalismo; c) nas suas ressuposições sobre a civilização (ocidental); d) no seu
orientalismo; e) na sua tentativa de impor a teoria do progresso (Wallerstein (2002
[1996]: 206).
Neste sentido, sem dúvida, o pós-colonialismo têm um papel central a cumprir,
trabalhando com alternativas locais, na cultura formal e no pensamento popular, para a

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superação dos paradigmas eurocêntricos dominantes. É, de fato, uma tarefa difícil, mas
que vêm sendo positivamente concretizada em certos grupos de intelectuais, em
especial, na Índia, com o Grupo de Estudos Subalternos e o Centro de Estudos para o
Desenvolvimento Social.

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4. Referência Bibliografia

SAID. Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Trad. Tomás


Rosa Bueno. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

COSTA, Sérgio. Dois Atlânticos: teoria social, anti-racismo, cosmopolitismo. Belo


Horizonte: Ed. UFMG, 2006.

MEMMI, Albert. Retrato do Colonizado Precedido do Retrato do Colonizador.


Brasil: Civilização Brasileira, 1973

Muryatan Santana Barbosa/O pós-colonialismo como Projeto/2011/artigo disponível


na Internet.

Frank Nilton Marcon/Estudos pós-coloniais em reflexão/2011/ artigo disponível na


Internet.

Olívia Maria Gomes da Cunha/Reflexões sobre Biopder e Pós-colonislismo: Relendo


Fanon e Foucault /artigo disponível na Internet.

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