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DO FOTOJORNALISMO OCIDENTAL
PORTO
1998
INTRODUÇÃO
O presente livro resulta da ampliação e restruturação de um capítulo da nossa tese de
doutoramento (1997) e pretende contribuir para eliminar uma lacuna no panorama editorial
fotojornalismo, apesar de este assunto ser crucial para a compreensão do actual momento
fotojornalístico.
génese pessoal, social, cultural, ideológica e tecnológica. É um ponto de vista que parcialmente
alarga o modelo com que Michael Schudson (1988) procurava explicar por que é que as notícias são
como são e parcialmente se opõe à visão schudsodiana, uma vez que esse autor afirmou
taxativamente que as notícias são cultura, não ideologia (Schudson, 1995, 31).
melhor, o nome de "revoluções" e é com base neles que subdividimos o presente trabalho em
capítulo para cuja elaboração muito contribuiu o livro Uma história de Fotografia, de António Sena,
e referimos alguns dos trabalhos mais recentes no que respeita à investigação científica sobre
fotojornalismo.
ambiente positivista, a fotografia já foi encarada quase unicamente como o registo visual da
verdade, tendo nessa condição sido adoptada pela imprensa. Com o passar do tempo, foram-se
do credível — como muito bem se pode ler na obra Give Us a Little Smile, Baby, de Harry Coleman,
já no final do século passado se manipulavam as imagens em função de objectivos que em nada
tinham a ver com a verdade, mas, de facto, unicamente com o credível. Ainda assim, na linha da
sobrepor a beleza da arte. Chega-se então à ideia de fotógrafo autor e artista, criador, original.
ideia da construção social da realidade, processo que em parte se nutre na acção dos media. Mas
esta foi também a linha de partida para a interpretação fotojornalística do real, até porque as
percepções que dele se têm são dissonantes da realidade em si e, neste sentido, são sempre uma
espécie de ficção. Legitimam-se, assim, os criadores-fotógrafos, que olham para si mesmos como
participantes num jogo que há muito deixou de ser um mero jogo de espelhos, para desembocar no
jogo bem mais elaborado e complexo dos mundos de signos e de códigos, de linguagem e de cultura,
aprofundado na obra Seeing the Newspaper, de Kevin G. Barnhurst. No campo oposto, fizemos
uma incursão pelos fotógrafos-autores, aqueles que procuram traçar percursos fotográficos pessoais
presente livro corresponde apenas a uma visão pessoal dessa evolução, pois não há uma história da
fotografia, mas várias, apesar de os diversos compêndios sobre história da fotografia tenderem a
reproduzir as mesmas imagens e a realçar os mesmos fotógrafos. Neste campo, a própria selecção
de fotógrafos que fizemos, embora tanto quanto possível abrangente, não impede que muitos
e personalidades, a este nível, será sempre problemática. De qualquer modo, não foi nossa intenção,
com este livro, fazer história, mas tão só corresponder aos propósitos já definidos, tentando
sobretudo provar a influência das pessoas, dos meios sociais, das ideologias, das culturas, das
histórias e das tecnologias na evolução do fotojornalismo, de onde o relevo dado a vários fotógrafos
de diferentes épocas, embora sem preocupações de exaustividade. Foi também nosso objectivo
contribuir para a reunião de exemplos de temas, actuações e abordagens fotográficas que permitam
ao fotojornalismo português enveredar por um fotojornalismo que, no nosso entender, será mais —e
de conhecimento.
Realce-se que a própria passagem do tempo relativiza a percepção que se tem das
fotografias e da evolução do medium. Aliás, nem sequer as fotografias que entusiasmaram os nossos
pais ou avós são sempre aquelas que nos entusiasmam: a aventura do olhar é uma aventura
evolutiva. Por exemplo, num estudo de 1980 sobre as mensagens fotográficas eventualmente
patentes nas fotos de Russell Lee da era da depressão ("A study of the messages in depression-era
photos"), Paul Hightower descobriu que pessoas que viveram a depressão não viam uma pobreza tão
intensa nas fotos como aquela que perspectivavam os mais novos. No estudo, o autor coloca até a
hipótese de a credibilidade das imagens diminuir com a passagem do tempo, já que uma das
respostas que obteve sobre uma foto de uma cozinha foi que esta "não podia parecer assim!".
cada momento e alargando o campo de visão dos seres humanos. Será esse caminho o motivo que
procuraremos descrever neste livro, de forma cronologicamente ordenada, pois essa sistematização
multiplicidade de fotógrafos que se reclamam do sector, mas que nem sempre apresentam unidade
fotojornalismo tem-se mesclado com a própria publicidade, como aconteceu nas campanhas da
Benetton. E mesmo quando se fala do fotojornalismo como a actividade orientada para a produção
de fotografias para a imprensa, repara-se que vários fotógrafos que se reclamam igualmente
conceito de fotojornalismo é fazê-lo em sentido lato e em sentido restrito, sendo que, em qualquer
caso, para se abordar o fotojornalismo se tem de pensar numa combinação de palavras e imagens: as
finalidade, pela intenção, e não tanto pelo produto; este pode estender-se das spot
num sentido lato podemos usar a designação fotojornalismo para denominar também
Este interesse pode variar de um para outro órgão de comunicação social e não tem
fotojornalismo viveria das feature photos e das spot news, mas também, e talvez algo
assunto e das condições em que pode desenvolver o plano de abordagem do tema que
quer o significado que qualquer acontecimento possa ter para a vida humana ou ainda
Homem. Enquanto o fotojornalista tem por ambição mais tradicional "mostrar o que
preciso, porém, não esquecer que, como disse Szarcowski (1973) a propósito do
a ser uma actividade larga e ambígua, já que inclui fotografias de notícia, foto-reportagens e até
fotografias documentais. Apesar de tudo, parece-nos que, mesmo na actualidade, a sua ambição
máxima corresponde à mais antiga vocação da fotografia: testemunhar, com um elevado número de
realismo e outras formas de expressão, entre o matizado e o contraste, entre o valor noticioso e a
estética, entre o cultivo da pose e o privilégio concedido ao espontâneo e à acção, entre a foto única
e as várias fotos, entre a estética do horror e outras formas de abordar temas potencialmente
chocantes, entre variadíssimos outros factores. E é também uma história que assiste, gradualmente,
ao aumento dos temas fotografáveis, o mesmo é dizer, a uma história que assiste à expansão do que
menos verdade que existem interpretações diferenciadas desse percurso. Por alguma razão demos o
título "Uma visão…" ao presente capítulo deste livro e não o denominámos por "A história…". De
qualquer modo, parece-nos que por detrás das diversas histórias do fotojornalismo se esconde a
noção de que, pelo menos algumas fotografias jornalísticas, são poderosas — como a do suspeito
vietcong morto à queima roupa pelo chefe da polícia de Saigão. Essas fotos, se bem que não sejam
convencionalmente tidas por desejáveis nas fotografias de notícias, mostrando também que a cultura
impor-lhe um sentido. Por esta razão, mas também pelo facto de o significado dos produtos
fotojornalísticos derivar, em larga medida, dos propósitos e significados que às fotos foram
encomendadas pelo devir da civilização, encontramos versões da história da fotografia e do
de Hoy (1986) propõem, de algum modo, a ideia de que a evolução tecnológica (desde as primitivas
de uma forma cada vez mais perfeita, alimentando, por consequência, a ideia de que a fotografia
seria o espelho da realidade. Eles olham para a história do fotojornalismo como se fosse composta
por fragmentos que levaram a actividade ao sítio onde hoje está, onde seria capaz de cumprir o ideal
da reflexão dos acontecimentos actuais que ocorrem na realidade para um elevado número de
pessoas. Os mais abordados desses fragmentos são os seguintes: as obras dos "grandes" fotógrafos,
elevados, com frequência, a um estatuto quase mitológico (culto dos fotojornalistas); as gravuras
aparecimento das agências; o serviço de telefoto; as conquistas técnicas, que levaram à diminuição
do peso e do tamanho das câmaras, à melhoria das lentes e dos filmes, à conquista do movimento
em interiores sem iluminação artificial; o aparecimento do flash de magnésio, a que sucedeu o flash
electrónico; o nascimento do fotojornalismo moderno na Alemanha; os fotógrafos do pós-guerra; a
Life, etc. Os livros mais recentes (e.g., Kobre, 1991) falam também da fotografia digital e do
tratamento electrónico das imagens fotográficas, salientando os perigos da sua manipulação. Outros
focalizam-se na tecnologia, chamando a atenção para a "era do grande formato" ou para a "era do 35
(1980) ou Crary (1990), rejeitam a ideia de que a evolução da fotografia permitiu ao medium a
reprodução da realidade. Pelo contrário, eles sugerem que a história da fotografia é uma história de
substituição e imposição de convenções, uma história ideológica, uma história do domínio e
abandono de determinadas ideias. E mostram também que a noção de que o que cada um de nós vê
com os seus olhos é a realidade não passa de uma falácia, aliás como muitos teóricos —entre os
social em que a fotografia se desenvolve. Newhall, mais esteta, descreve condições como as que
suportaram a demanda social de fotografias; Freund, por seu turno, dá um grande destaque à
Noutro prisma, Sontag (1986), Sekula (1984), Hall (1981) ou Benjamin (1986)
situaram a fotografia no contexto da cultura, das ideologias, dos mitos e dos valores, questionaram o
seu valor informativo, lançaram um olhar crítico para o papel político, ideológico e económico de
fotógrafos, actantes nas fotografias e organizações fotográficas e abordaram temas como os direitos
de autor, a estética, as técnicas e os usos sociais da fotografia. Na linha desses teóricos, Bolton
(1989) e Guimond (1991), provavelmente influenciados pelos trabalhos de Barthes (1961, 1964,
1984, 1989) e pela ideia de Foucault (1973) segundo a qual a visão pode impor um controle social,
seu turno, até que ponto a fotografia estaria relacionada com a verdade, enquanto historiadores
fotojornalismo, embora este último tenha salientado que os fotojornalistas, mais especificamente os
dominante como tema do seu trabalho. Os editores podem até, por vezes, segundo Phelan (1991),
livros de apoio destinados a socializar e aculturar neófitos no ofício e a permitir aos amadores uma
aproximação às convenções profissionais (por exemplo, Kinkaid, 1936; Ezickson, 1938). Ainda
hoje são publicados livros que cumprem a mesma função (Hoy, 1986; Kobre, 1980 e 1991; Keene,
1993). Outros livros, como os do World Press Photo, os da National Press Photographer's
convencionais que, em cada momento histórico-cultural, uma fotografia jornalística deve ter para ser
imagens de nomes grandes do fotojornalismo, como Capa ou Smith, trabalham no mesmo sentido,
bem como livros como o de Lacayo e Russell (1990) e as edições de agências, jornais e revistas.
Não são apenas as publicações impressas, porém, a marcar as qualidades tidas por
catálogos, já nos longínquos anos cinquenta, ajudaram e ainda ajudam (como as exposições da
World Press Photo) a definir rumos para a fotografia, sejam eles no mesmo sentido das fotos
Em alguns casos, todavia, é dada atenção a fotógrafos com uma produção alternativa,
como Karen Korr ou Salgado. Estes, por vezes, trazem para o fotojornalismo (entendido numa
forma vasta) a recuperação de antigas ideias ou novas concepções que superam as convenções
Os primeiros fotógrafos foram pintores, pelo que não é de admirar que, conforme
Hicks sustenta, as grandes referências que os primeiros fotógrafos de imprensa tinham fossem as da
pintura(2); por outro lado, diz o mesmo autor, imbuídos de uma mente literária, os editores resistiram
durante bastante tempo a usar fotografias com texto, não só porque desvalorizavam a seriedade da
informação fotográfica(3) mas também, julgamos nós, porque as fotografias não se enquadrariam nas
convenções e na cultura jornalística dominante na época. Provavelmente, a associação da fotografia
à pintura e, portanto, à arte, terá sido também uma das razões que levou ao enquadramento das
imagens fotográficas publicadas na imprensa por filetes floreados e outros motivos, como se da
uma mudança conceptual: as fotografias teriam deixado de ser secundarizadas como ilustrações do
texto para serem definidas como uma outra categoria de conteúdo tão importante como a
componente escrita.(4) Hicks vai mais longe e considera que essas mudanças, ao promoverem a
competição na imprensa e o aumento das tiragens e da circulação, com os consequentes acréscimos
que, por sua vez, originaram a cobertura baseada numa única foto —a doutrina do scoop— e o
máquinas menores e mais facilmente manuseáveis, lentes mais luminosas e filmes mais sensíveis e
actuais. Segundo Hicks, o fumo do flash não só tendia também a impedir que se realizasse mais do
que uma fotografia por assunto como também afastava as pessoas do fotógrafo, pois o cheiro do
magnésio queimado era nauseabundo.(7) De qualquer modo, as diversas constrições terão levado,
pela imitação e pela necessidade (competição), ao aparecimento de uma das convenções mais
perenes no fotojornalismo: o cultivo da foto única(8). Esta convenção, segundo pensamos, levou os
identificáveis e lidos (planos frontais, etc.). Para isso também terá contribuído o facto de no início
do século as imagens serem valorizadas mais pela nitidez e pela reprodutibilidade do que pelo seu
fotografar pessoas, estas paravam, arranjavam-se e olhavam para a câmara ou, em alternativa,
levantavam objecções a serem fotografadas.(10) De algum modo, o fotógrafo dominava a cena, até
devido à sua reputação de "mal-cheiroso". Hoje, recorrendo à nossa própria experiência
profissional, parece-nos que as pessoas procuram mostrar que estão à vontade e naturais, o que
demonstrará algum domínio por parte do público das actuais convenções profissionais
século XIX para o XX as pessoas dominavam minimamente as convenções então vigentes, pelo que
O moderno fotojornalismo terá visto a luz do dia pelos anos vinte, devido a vários
factores, entre os quais a modificação de atitudes e ideias sobre a imprensa. Barnhurst salienta que,
após a I Guerra Mundial, se valorizou a eficiência e a comodidade.(11) Essa terá sido, em conjunto
como a Leica, uma das razões que levaram à obtenção de imagens sem a cooperação dos sujeitos
moderno mudaram quer o modus operandi dos fotojornalistas quer o formato das imagens. Estas
puderam tornar-se menos formais e mais vivas. O valor do espontâneo e o valor noticioso
embora não as substituindo totalmente (a história do fotojornalismo não é apenas uma história de
rupturas, também é uma história de reformulações). Barnhurst releva ainda que se valorizavam
a atenção para as políticas editoriais da Life e da Time, revistas em que as fotografias eram tratadas
como tendo a mesma importância que o texto e onde os editores recusavam o retoque modificador
das imagens e a sua emolduração(14), o que trouxe respeitabilidade e reconhecimento aos
fotojornalistas(15).
que em parte a forma de cobertura dos acontecimentos dita o formato das fotografias: por exemplo,
na alvorada do século a maior parte das fotografias dizia respeito a cerimónias que ocorriam em
dão pistas para analisarmos a evolução e as rupturas das convenções profissionais e das rotinas. Os
primeiros desses manuais, como o de Price (1932), o de Pouncey (1946) e o de Kinkaid (1936),
advertem os fotojornalistas contra a composição formal das imagens que, segundo eles, era da esfera
da arte e dos académicos. Apesar disso, Kinkaid aconselha uma série de regras que, ao fim e ao
cabo, são regras de composição: motivo centrado, selecção do "importante" em cenários amplos,
manutenção de uma impressão de ordem no primeiro plano, correcção do efeito de inclinação dos
edifícios mais altos (o autor era norte-americano, não o esqueçamos) e manutenção da composição
simples.(18) Se exceptuarmos a ideia de que o motivo deve surgir sempre centrado, grande parte
(Kobre, 1980 e 1991; Hoy, 1986; Associated Press Style Book, etc.) preconizam o aproveitamento
fotojornalismo a partir dos anos sessenta.(19) Spencer, por exemplo, apela para a combinação de
elementos da arte e do design, de maneira a que as fotografias fossem mais apelativas, contribuindo,
assim, para a circulação e prestígio dos jornais e para bater a concorrência; esses elementos seriam a
prazer e semelhantes.(20)
entende que é significativo numa cena vasta, na manutenção de uma composição simples, na escolha
de um único centro de interesse em cada enquadramento, na não inclusão de espaços mortos entre os
interesse, na inclusão de algum espaço antes do motivo (inclusão de um primeiro plano, que deve
dar uma impressão de ordem), na correcção do efeito de inclinação dos edifícios altos, na captação
do motivo sem que o plano de fundo nele interfira (aconselhando, para tal, usar pequenas
profundidades de campo, andar à volta do sujeito para que não haja elementos que pareçam sair-lhe
do corpo nem fontes de luz indesejadas, etc.), no preenchimento do enquadramento (para o que
imprensa, etc. Desses manuais fazem parte, por exemplo, o de Hoy (1986), os de Kobre (1980;
1991), e o de Kerns (1980), embora todos eles, em consonância com Schwartz e Griffin, possam ter
recebido influências da indústria fotográfica, que terá distribuído manuais e livros ensinando as
não é só esta sugestão que, para nós, promove a consolidação de rotinas de abordagem
atrás citados, tal como no Le Photojournalisme (1992), no Associated Press Photojournalism Style
de imprensa, temas sociais e a uma vasta gama de outras ocorrências, que fomentam igualmente a
manutenção de rotinas e convenções, mas que, por outro lado, asseguram também aos
(foto)notícia e a manutenção de um fluxo regular e credível (em parte pela aplicação constante do
apresentar um plano geral para localizar a acção, vários planos médios para mostrar a acção, um ou
como a criança que beija outra) ou photo illustrations (fotografias que combinam desenho e imagem
fotográfica ou que são eminentemente ilustrativas, como a fotografia de um prato culinário). A
de diferentes fotos para gerar sentido (por exemplo, a integração de uma imagem fotográfica da
mesa de uma conferência numa foto da plateia da mesma conferência). Porém, se excluíssemos os
1) em primeiro lugar, o público deve sempre perceber claramente que se trata de uma imagem
manipulada ou, em alternativa, o público deve ser advertido do facto; 2) em segundo lugar, a
manipulação só deve ser feita quando, em conformidade com a avaliação do fotógrafo ou com a
interpretação que este faz da realidade, o acto resultar em benefício do público (lembremo-nos das
fotomontagens de Heartfield).
podem, sem intenção, reiterar uma série de crenças sobre as pessoas, dando o exemplo dos heróis,
que actuam, e das vítimas, que se emocionam — "The narrative teaches that the world is not safe,
that when things go wrong, what is needed is a hero to intervene and set them right. And the need
for a hero presumes a victim, someone who waits passively for rescue."(23) Na verdade, isto significa
que, num determinado contexto histórico-cultural, as narrativas convencionais no (foto)jornalismo
contribuem para que seja dado significado social a determinados acontecimentos em detrimento de
noticías, concorrendo para dar uma aparência de ordem ao caos que é a irrupção aleatória de
categorias. Isto vem, aliás, ao encontro da função remitificadora que Adriano Duarte Rodrigues
ao mito para explicar as experiências do mundo e dar sentido à vida, hoje teriam transferido para os
media a tarefa de organizar e integrar as experiências aleatórias de vida num todo racionalizado.(24)
O fotojornalista não apenas reporta as notícias, como também as cria: as (foto)notícias são um
artefacto construído por força de mecanismos pessoais, sociais (incluindo económicos), ideológicos,
demonstrações técnicas, mas, pouco a pouco, por influência dos primeiros fotógrafos, em muitos
casos também pintores, foram surgindo determinados cânones estético-expressivos para o medium.
pictoralismo via, assim, a luz do dia como a primeira grande tendência a desenhar-se em torno da
fotografia, constituindo-se como um movimento que visava a integração da fotografia nas artes
tinha de se fazer pintura, pelo que exploravam fotograficamente os efeitos da atmosfera, do clima
A fotografia de retrato, pelo seu lado, também vai copiar as poses forçadas e os
cenários que a pintura usava. Mesmo ao nível técnico, o retoque e a pintura das fotos vão fazer
escola. Tal constitui um indício da ideia então vigente de que a fotografia era como uma extensão
da pintura que, eventualmente, substituiria esta última. Porém, não só a pintura não desapareceu
como também a fotografia a poderá ter ajudado a libertar-se das amarras do realismo.
As primeiras manifestações do que viria a ser o fotojornalismo notam-se quando os
primeiros entusiastas da fotografia apontaram a câmara para um acontecimento, tendo em vista fazer
chegar essa imagem a um público, com intenção testemunhal. Também seria uma questão de tornar
a espécie humana mais visível a ela própria(26) e essa preocupação "(…) has led them to confront
hostile surroundins, censorship, fallible equipment, the conventional tastes of photo editors and
readers, the distorting scrims of their own prejudices, the inherent limitations on what photograph
can convey".(27)
se desenvolvem a partir do final do século XIX — até meados do século passado, desenhadores,
que surgiriam ao virar do século. Até essa altura, a tecnologia usada envolvia papel, lápis, caneta,
pincel e tinta para desenhar; depois, tornava-se necessário recorrer a madeira, cinzéis e serras para
criar as gravuras.
Hamburgo, em 1842, realizado por Carl Fiedrich Stelzner.(28) (Fig. 2) A The Illustrated London
News, revista semanal que durante muito tempo esteve à frente das publicações ilustradas, grandes
artífices da comunicação/informação visual, usou uma imagem, desenhada a partir desse original,
para ilustrar o sucedido(29), pois a reprodução de fotografias constituía um problema com que se
defrontavam os primeiros jornais e revistas desse tipo. De qualquer modo, também é de relevar que
uma multidão reunida em Filadélfia por ocasião da eclosão de uma série de motins anti-
imigração.(31)
para onde jornais enviaram correspondentes, tendo mesmo um daguerreotipista anónimo realizado
Em Abril de 1848, foi publicada no The Sunday Times uma reprodução sob a forma
de gravura de madeira daquele que talvez se possa considerar como o primeiro daguerreótipo
envolvidos no cerco de Roma, mais um prenúncio da atenção que o fotojornalismo iria devotar à
guerra.
Ilustrated London News, a primeira revista ilustrada, nasceu em Maio de 1842. O seu fundador,
Herbert Ingram, afirmou, no número um, que a revista daria aos seus leitores informação em
contínuo dos acontecimentos mundiais e nacionais mais relevantes, da sociedade à política, com a
ajuda de imagens caras, variadas e realistas.(33) Entre 1855 e 1860, a tiragem cresceu de 200 mil para
300 mil exemplares(34), o que indicia uma crescente apetência social pela imagem.
ilustrada a ver a luz do dia. É também durante esse ano que um funcionário fixa, em daguerreótipo,
a cerimónia de assinatura de um tratado de paz entre a França e a China. Com ele, completa-se a
protocolar ficam, assim, para a história, como indícios daquilo que, mais tarde, se conformaria como
curiosidade pelo diferente, por exemplo, vão promover a produção e difusão de fotografias de
intenção documental de locais distantes e de paisagens. Na Europa, a atenção vai para a África e o
Oriente, sobretudo no Egipto, teve como fim principal a comercialização de postais ilustrados.
para o Oeste, povoado por tribos índias, e para onde os colonos se deslocavam, indo provocar um
viam, encobertos pela capa do realismo fotográfico, começavam a ambicionar substituir-se ao leitor,
sob mandato, na leitura visual do mundo. É já uma retórica da "objectividade" a despontar, mas que
correspondia, de facto, a um discurso fotográfico cujo fim residia na obtenção de imagens sem
censura nem truncagens. De todo o modo, embora esses fotógrafos não carregassem ainda o peso de
uma tradição histórico-cultural manipuladora e censória, não eram raras as ocasiões em que os
gravuristas de madeira acrescentavam pormenores da sua lavra às imagens no momento em que
tendências compositivas patentes na fotografia pictoralista ainda hoje se repercutem, por vezes, no
como as que "aprisionam o instante", gradualmente, foram surgindo. Mas as tecnologias não são
neutras: emergem num determinado estado de coisas e configuram um novo estado de coisas. É
pois notória a inter-relação entre as possibilidades técnicas e os conteúdos: nas guerras daquele
tempo seria impossível obter spot news das batalhas. As imagens de Fenton, da Guerra da Crimeia,
e de Brady, Gardner, O'Sullivan, Barnard e outros, da Guerra da Secessão Americana, por exemplo,
concentram-se, por isso, mais na paisagem bélica do que nos processos de guerra em si. Assim,
"Depictions of battle were sanitized by distance and time, leaving the viewing public outside the
consequentemente, a avanços tecnológicos, que permitirão ganhos para o conteúdo das fotografias.
É desta forma que a evolução da temática fotográfica no século XIX é acompanhada por conquistas
técnicas. Entre elas, avulta a diminuição dos tempos de exposição, ligada à melhoria da qualidade
das lentes e à adopção de novos processos, como o do colódio húmido (cerca de 1851).
do reinado deste e com a disseminação dos processos negativo-positivo, vão produzir-se mudanças
na cultura, nas rotinas e convenções profissionais. Na fotografia, vai abandonar-se a ideia da obra
uma vez que permitiu "congelar" a acção, impressioná-la numa imagem quase em tempo real,
capturar o imprevisto, chegar ao instantâneo e, com ele, acenar com a ideia de verdade: o que é
assim capturado seria verdadeiro; a imagem não mentiria (note-se, todavia, que apesar de o
deixam de ser representações). O mesmo se passa com a melhoria das lentes — uma maior
humano através da máquina fotográfica(40), monta o seu estúdio em 1853. Será a ele que se deverá a
primeira fotografia aérea, em 1858, as primeiras fotografias com iluminação artificial (esgotos de
Paris) e as primeiras fotografias de uma entrevista (as fotos do filho de Nadar à entrevista que o seu
pai fez ao químico Chevreul, por ocasião do centenário deste, em 1886, das quais 12 foram
publicadas no Journal Illustré). (Fig. 5) Segundo Gisèle Freund:"A foto inaugura os mass media
visuais cando o retrato individual fica substituido polo retrato colectivo. De vez, convertese nun
volta de 1854, opera-se uma mudança radical na evolução da fotografia — surge a fotografia "cartão
de visita" e dá-se democratização do acesso à fotografia de retrato por via da diminuição dos
preços. É dado o primeiro passo para a fotografia se tornar um mass medium. Julgamos mesmo,
aliás, que foi através da popularização massiva da imagem fotográfica que se começou a delinear
Notre-Dame de Paris, em 1856.(42) Pelo meio, em 1855, Roger Fenton (1819-1869) parte para a
Guerra da Crimeia, com quatro assistentes e uma enorme parafernália de equipamento, entre o qual
uma carroça-laboratório, indispensável para a necessária revelação imediata das fotografias (usava-
se a técnica do colódio húmido sobre vidro). Ele irá realizar a primeira reportagem extensa de
guerra.
A década de cinquenta do século passado tornou-se uma época de oportunidades para
particularmente activos. Algumas das fotos surgiam na imprensa sob a forma de gravuras, como as
Também surgiam nos jornais e revistas da época algumas gravuras de fotos que
Times escreve-se sobre o potencial "fotojornalístico" da câmara: "It secures precise and charming
representaions of the most distant and the most evanescent scenes. It fixes, by almost instantaneous
processes, the details and character of events and places, which otherwise the grear mass of
uma secção especial sobre fotografia. Por essa altura, nos meios intelectuais, animados pelo
positivismo, e nos meios artísticos, onde pontifica paralelamente o realismo, alimenta-se uma
creadora que pulaba polos seus protagonistas e que estimula o camiño da foto como testemuña, o
grande perigo aparecerá vencellado coas correntes pictoralistas, de condición recuada, que
É na exposição parisiense de 1855 que, pela primeira vez, são exibidas provas
inventou o retoque do negativo, também abriu as portas à manipulação da imagem fotográfica pela
truncagem. Gisèle Freund afirma mesmo que: "O retoque constituiu um facto decisivo para o
desenvolvimento ulterior da fotografia. É o começo da sua degradação pois, uma vez que o seu
emprego inconsiderado e abusivo elimina todas as qualidades características de uma reprodução
Nessa mesma época, a fotografia estereoscópica (em três dimensões) vai popularizar-
se, chegando quase ao estatuto que têm hoje os videos domésticos. Paisagens, fotos de guerra, fotos
de viagem, todas contribuiam para os lucros das companhias que se dedicavam a esse produto, como
a London Stereoscopic Company, que, no final da década de cinquenta do século passado, havia
vendido 500 mil aparelhos em que podiam ser usadas quase 100 mil fotografias. A
fotoestereoscopicomania durará até à I Guerra Mundial. A este fenómeno, provavelmente, não será
estranho o facto de só a partir dos finais do século XIX os jornais e revistas começarem a editar
Guerre de Crimée, 1855) ou Gustave Le Gray (1820-1884), começaram também por essa época a
realizar várias fotografias em sequência espacial, algumas das quais com interesse documental, para
tentar compor panorâmicas. A ideia da panorâmica, hoje em dia, é representada pelas técnicas que
dos avanços técnicos, químicos e ópticos que lhe permitiram abandonar os estúdios e avançar para a
documentação imagética do mundo com o "realismo" que a pintura não conseguia. A foto
beneficiava também das noções de "prova", "testemunho" e "verdade", que à época lhe estavam
fotojornalistas" e dos seus editores. Por um lado, a herança cultural consagrava-lhe atenção artística,
pois a guerra sempre foi um tema sedutor e de sucesso junto das pessoas(48); por outro lado, na
segunda metade do século passado ocorreram numerosos conflitos em que se viram envolvidas as
"reportagem ilustrada".
consequente interesse popular, leva o editor Thomas Agnew a convidar o fotógrafo oficial do Museu
acontecimento.
publicadas no The llustrated London News e no Il fotografo, de Milão, em 1855, foram inseridas na
imprensa sob a forma de gravuras, apesar dessas fotos constituirem o primeiro indício do privilégio
que o fotojornalismo vai conceder à cobertura de conflitos bélicos. De qualquer modo, e de acordo
(Fig. 6) Os cerca de 300 negativos que restam são antes imagens de soldados e oficiais, por vezes
sorridentes, posando para o fotógrafo, ou imagens dos campos de batalha, limpos de cadáveres,
condicionalismo que ultrapassa o dos limites definidos pelas tecnologias. Sendo uma expedição
guerra nasce a censura prévia ao fotojornalismo.(50) Daí serem imagens que nada revelam da dureza
dos combates. Em vez disso, mostram a "falsa guerra", os soldados bem instalados, longe da frente.
É ainda a guerra vestida com a sua auréola de heroísmo e de epopeia, como tradicionalmente era
representada pela pintura. Por outro lado, porém, há evidentemente que atentar nas limitações
técnicas: a "reportagem" de guerra estava limitada ao "teatro das operações" e às consequências das
desenrolaram nos Balcãs, podem ter sido registadas por Karl Baptist de Szathmari, um amador de
Bucareste, mas as fotos não sobreviveram, pelo que se desconhece o seu conteúdo.
britânico: James Robertson. Ele, provavelmente, foi o primeiro fotógrafo a fotografar mortos em
Felice Beato (c. 1830-1906). Juntos após 1850, depois do conflito da Crimeia foram para a Índia,
fotograficamente, como o conflito que opôs a Áustria à Sardenha (Luigi Sacchi, Berardy e Ferriers,
pai e filho, 1859), a colonização da Argélia (Jacques Moulin, 1856/57), as rebeliões na Índia
(Robertson e Beato, 1857-1858), a intervenção britânica na China, durante as Guerras do Ópio
(Beato, 1860), o ataque da Prússia e da Áustria à Dinamarca (Friedrich Brandt, Adolph Halwas e
Heinrich Grat, 1864), a Guerra da Secessão nos EUA (1861/65) e a Guerra Franco-Prussiana, onde
Disdéri chegou a fotografar as ruínas de St. Claud (1870). De qualquer modo, acontecimentos mais
pacíficos ou até mesmo agradáveis também mereceram reportagens: concursos agrícolas, festas,
A exemplo do que aconteceu com as fotos da Crimeia, nos Estados Unidos levantam-
Weekly, a New York Illustrated News ou a Frank Leslie's Illustrated Newspaper) fotografias como as
história do fotojornalismo, como Mathew Brady (1823-1896), um freelance que havia sido o
Gardner (1821-1882), Timothy O'Sullivan (activo de 1840 a 1882) e George N. Barnard (1819-
1902).
Americana: Gardner chega a rearranjar um corpo de um sulista na célebre foto de um soldado morto
intitulada "Home of a Rebel Sharpshooter".(54) (Fig. 7) Aliás, esse mesmo corpo pode ter sido usado
não só para essa mas também para outra foto de um morto, desta feita de um soldado da União: "A
ruiu quando estes começaram a reclamar do facto de Brady assinar todas as fotos, incluindo as
desses últimos, o que deixa adivinhar o despontar da ideia do direito de autoria e assinatura no
fotojornalismo. Devido ao mau estar desencadeado pela actuação de Brady, Gardner, por exemplo,
Gardner's Photographic Sketch Book of The War. Contudo, independentemente dos seus méritos e
desméritos, Pollack assegura que foi Brady a ter a ideia inovadora de montar a primeira agência
começa a revelar-se uma certa estética do horror, que, mais actualmente, dominou obras como a de
Don McCullin ou as de uma parte dos fotojornalistas de guerra, mas que já se adivinhava, por
exemplo, nas fotos de Felice Beato durante as Guerras do Ópio, na China, em 1860. As imagens de
Beato da captura de Tientsin pelas tropas franco-britânicas não teriam sido sujeitas aos
Pelo estudo de William Thomson, The Image of War, chega-se, todavia, à conclusão
que a cobertura fotográfica da Guerra Civil Americana abrangeu também, especialmente no seu
início, imagens idealizadas de oficiais garbosos a conduzir ordeira e heroicamente os seus soldados
na frente.(57) O retrato duro e cruel das realidades (mortais) do conflito só aparece numa fase
posterior, quando os editores perceberam que os leitores pretendiam notícias "factuais" sobre o que
Brady e outros fotógrafos, por exemplo, devem ter influenciado a opinião dos
públicos, ao dar a conhecer fotos do campo de prisioneiros de Andersonville, onde se dizia que
morria um prisioneiro a cada onze minutos. As gravuras dos "esqueletos humanos" publicadas, em
Junho de 1864, na Leslie's e na Harper's, a partir das fotos, escandalizaram o Norte: não traziam a
emoção visceral, intensa e instantânea das fotos-choque, mas saber que eram desenhos executados a
a) A descoberta definitiva, por parte dos editores das publicações ilustradas, que os
leitores também queriam ser observadores visuais(59); a fotografia passa a ser vista
verosimilitude;
fotografias das batalhas eram publicadas menos de uma semana após a sua
realização;(62)
c) A aquisição da ideia de que era preciso estar perto do acontecimento quando este
tivesse lugar(63), a mesma intenção que alguns anos depois incitará Robert Capa e
revistas; as fotos das batalhas obtêm-se ainda com o fumo e o odor a sangue a pairar
pelo campo(64);
da pintura e que era nisto que residia o poder do novo medium; essa carga dramática
no visor; assim, o observador tende a intuir que se estivesse lá veria a cena da mesma
maneira;
"estória" dos exércitos da União, já que a Confederação não possuía jornais ilustrados
pela enorme quantidade de equipamento que necessitavam de transportar consigo, incluindo uma
carroça-laboratório (tal como na Crimeia, usava-se a técnica do colódio húmido, que exigia que as
fotografias fossem reveladas mal fossem obtidas) e câmaras enormes com tripé.
Secessão, o primeiro exemplo de edições fotográficas organizadas pelos fotógrafos para serem
tomadas em conta na hora de se fazer história: o já referenciado Photographic Sketch Book of the
War (de Gardner, embora reunisse contribuições de outros fotógrafos) e Photographic Views of
Sherman's Campaign (de Barnard). Este último talvez seja mais curioso, devido ao seu pendor
ensaístico: trata-se de uma colecção quase obsessiva de fotografias "de paisagens" em que silhuetas
de edifícios esventrados se alinham contra um céu claro. Era, afinal, o que restava da tal marcha do
general Sherman.
Por outro lado, são realizadas várias exposições, nomeadamente por Brady. Livros e
culturais.
em casa, na cidade de Richmond. Pela última vez, o general vestiu o uniforme Confederado. O
lógica que configura algumas das rotinas produtivas do fotojornalismo moderno.(66) Porém, mais
introdução das fotos traumáticas dos acontecimentos violentos nas tranquilas casas burguesas.
Depois da fotografia, a guerra nunca mais seria a mesma. Com o medium emergente, o observador
era projectado num mundo mais próximo, mais real, mas por vezes mais cruel. No mundo da
profissional autónomo. Foi apenas por volta da última década do século passado, graças à
emergência da imprensa popular, de que resultou a contratação de fotojornalistas a tempo inteiro por
profissionalização viria a conformar a actividade, tornando a sua produção algo "popular", uma
tendência que adquiriu maior projecção nos dias que correm com o triunfo da foto-ilustração, do
glamour e do show biz bem como com os fotógrafos paparazzi, que se movem ao faro do
século XX vai configurando-se no ambiente tenso que resulta das pulsões de sinais contrários que
aliás, justificação o interesse que, em 1889, o British Journal of Photography mostra pela criação de
um arquivo de fotos de actualidade(68), prenúncio do que, mais tarde, jornais, revistas e agências se
veriam forçados a fazer. Hoje em dia, as novas tecnologias facilitam a arquivística fotográfica,
texto anexo. Porém, as novas tecnologias facilitam também a manipulação imagética, constituindo
uma fonte de preocupação, embora também um desafio a que fotojornalistas, arquivistas e outros
velocidade na fotografia europeia. É também nesse conflito que são realizadas as primeiras fotos de
pois, após o desenlace da revolta, as fotos foram, pela primeira vez, usadas com intuitos repressivos,
para identificar pessoas com vista à instauração de processos criminais que levaram frequentemente
a execuções. De facto, quando, nas barricadas, os revoltosos radicais posavam ingenuamente para
os fotógrafos, certamente estavam longe de pensar nessa nova utilização da fotografia. Hoje, quem
não quer ser reconhecido, tapa a cara — um gesto simples, embora denunciante de fotoliteracia, que
poderia ter salvo vidas entre os revoltosos. Anos mais tarde, curiosamente, um álbum que reunia a
Vai ser também depois da Comuna que surge a informação gráfica truncada, com as
sueco Nordisk Boktryckeri-Tidning publicou uma fotografia impressa conjuntamente com o texto,
graças a uma impressão em halftone com uma trama de linhas. Carl Carleman, o inventor do
processo (que será usado, depois, na imprensa de outros países, como na revista francesa Le Monde
Illustré, a partir de 10 de Março de 1877), sublinhou que seria somente dessa forma que a fotografia
poderia penetrar massivamente no público e tornar-se o meio mais poderoso para elevar
culturalmente a humanidade.
Edward Muybridge (1830-1904), já bastante conhecido pelas suas fotos de Yosemite Valley,
Califórnia, Lelan Stanford. Muybridge obteve uma sequência das fases sucessivas do movimento
usando doze máquinas fotográficas dispostas sequentemente, em bateria, accionadas por obturadores
eléctricos cujo disparo era, por sua vez, accionado pelo cavalo ao tocar em fios que atravessavam a
(Espanha).
proclamava: "(…) o objectivo especial será desenvolver as possibilidades até aqui quase
periodicidade, de especialización temática ou de público será neste sector da prensa escrita —na
revista— onde irá manifestarse o avance no uso da imaxe, mesmo as súas aplicacións vangardistas,
Na mesma altura, porém, alguns títulos tradicionais, como a The Illustrated London
News, chegam até a manifestar-se contra a substituição da gravura artesenal pelos novos
um lado, é provável que um público mais conservador continuasse a considerar o desenho como
uma forma de arte, estatuto que não outorgaria à fotografia. Desta forma, o seu gosto privilegiaria o
detractores do novo medium alimentavam quase desde o seu nascimento. Por outro lado, esta
postura é algo anacrónica, pois, ao fim e ao cabo, renegava os novos processos técnicos e invenções
que concorriam para consolidar a fotografia como news medium (lentes anastigmáticas, emulsões
isto, as aparições esporádicas da fotografia nas páginas dos jornais e revistas mais não fizeram do
que abrir caminho para a informação fotojornalística sistemática e, assim, para uma informação mais
directa.
com o instantâneo e a conquista da acção, com a competição entre as cada vez mais numerosas
renovador ao publicar dois instantâneos (fotografias que valem mais por existirem do que pela
vemos duas fotografias instantâneas impressas conjuntamente com letra de imprensa (…). A
fotografia abriu novos caminhos. A sua palavra de ordem é agora 'rapidez' em todos os aspectos,
quer ao tirar a fotografia quer ao reproduzi-la. As velhas técnicas estão já ultrapassadas pelas de
hoje (…)."(72) Estas ideias ainda hoje moldam algum fotojornalismo, como o fotojornalismo de
The New York Daily Graphic publica a sua primeira foto reproduzida através desse processo
O halftone veio emprestar ao fotojornalismo a base tecnológica que lhe faltava para
conquistar um lugar ao sol na imprensa. Ulteriormente, tornou-se mais fácil fazer acompanhar os
textos de imagens fotográficas. Na Europa, por exemplo, são publicados dois halftones na Leipziger
performances "intuitivas" que o seu trabalho implica; (b) nem todas as notícias são fotografáveis ou,
pelo menos, "fotogénicas"(73); e (c) a adaptação tecnológica ao halftone era cara e poderia contrariar
Assim, os desenhos continuaram a ser a principal fonte de imagens dos jornais, com
excepção dos domingos, em que os suplementos passaram a incluir fotos em grande número.
sendo vulgar que as fotografias fossem apenas usadas como modelo para os gravuristas de madeira,
que chegavam a assinar as imagens nos jornais em detrimento de quem as obtinha. Conforme
explica Karen Becker: "Despite these successes newspapers resisted the costly reorganization of
production and hiring of outside printers to screen photographs. Their investment in engravers also
satisfied standards of visual art and supplied more lively images than the slow photographic
As fotografias surgiam nos jornais do século XIX como um pouco menos do que
intrusas. O design de imprensa era centrado na letra. Além disso, nos jornais do final do século
passado, como o Boston Evening Trancript, por exemplo, as fotografias surgiam sobretudo para
ilustrar features. Nas páginas de features, era inclusivamente comum a inclusão de fotos de
casamentos, embora separadas do texto por enfeites sóbrios. Frequentemente suprimia-se o fundo
para se destacarem as figuras.(75) O Daily News, o Herald and Examiner e o Post usavam a
surge também em 1884, como se referiu, o ano de publicação pela Illustrirte Zeitung dos
instantâneos de Ottomar Anschutz das manobras do exército alemão em Hamburgo (hoje em dia as
manobras militares continuam a ser pretexto de foto-reportagens, devido não só ao seu carácter
espectacular mas provavelmente também aos inteligentes serviços de relações públicas das Forças
Armadas). Essa invenção, para além de ter contribuido para o uso da fotografia como self-medium,
virá a facilitar a vida aos fotojornalistas, pois trata-se de um material extraordinariamente mais
Quatro anos mais tarde, em 1888, Eastman inventa e fabrica a primeira câmara
Kodak. Com ela, a fotografia promove-se definitivamente a medium de uso massivo e democratiza-
se — "You press the bottom. We do the rest!" ("Você Carrega no Botão. Nós Fazemos o Resto!"),
sustentava a campanha publicitária da Kodak. A partir deste momento, deixam de ser necessários
também disseminar as ideias compositivas estereotipadas da foto bonita, lisa e aplanada no sentido,
bem centrada — para o senso comum, estas seriam, em exclusivo, as boas fotografias, inclusive no
domínio do fotojornalismo. Mas, por outro lado, também permitirá ao amador tornar-se num criador
e até mesmo num caçador de imagens, garantindo que os acontecimentos marcantes das histórias
individuais e familiares ganhem uma memória. Baptismos, casamentos, férias, ganham uma
dignidade fotográfica que, para a fotografia tradicional, actua não só como um agulhão espicaçador
asserção. De facto, Lartigue veio a ser um dos amadores que usou abundantemente as máquinas
portáteis. Ainda na sua juventude, realizou, a partir de 1904, diversos instantâneos de pessoas,
cheios de graça e ternura, que contrastavam vivamente com a anémica estética pictoralista
dominante, chegando mesmo, por vezes, a roçar a abstracção. Depois, continuou a fotografar a
família, as crianças e as mulheres de estratos privilegiados da população francesa, até 1935,
(uma guerra em que os jornalistas não se limitaram a reportar as notícias: fizeram notícias(78)), a
partir de 1898, vai incentivar as empresas jornalísticas dos EUA a uma política de investimentos que
York Journal, de Randolph Hearst, à cabeça, faziam um "(…) lavish use of pictures, including faked
and inaccurately labeled photographs, contributed to the war fever and increased circulation."(80)
elite (quality papers) mais conservadores a adiar a sua adesão ao jornalismo fotográfico.
destacar-se James Henry Hare (Collier's e New York Journal), James Burton e F. Pagliuchi
(Harper's), John C. Hemment (Leslie's) e William Randolph (World). Hare, provavelmente, foi o
Freelance no Reino Unido, James Hare emigrou para os EUA onde trabalhou no
mesmo regime para a Illustrated American e para a Collier's Weekly. Rapidamente se tornou uma
estrela do fotojornalismo emergente. Contratado por William Hearst, serviu os propósitos deste
barão da imprensa, que teve O Mundo a Seus Pés na Guerra Hispano-Americana, que ajudou a fazer
irromper. Nas suas imagens, Hare visava obter efeitos dramáticos — fossem as lutas de rua ou o
avanço do exército americano nas batalhas de San Juan ou Kettle Hills. Noutras circunstâncias, a
mesma pretensão é visível, nem que fosse a "prova" de que o avião dos irmãos Wright podia voar.
México a cobrir a revolução de Pancho Villa, na Coreia a fotografar o desembarque japonês durante
a Guerra Russo-Japonesa de 1904-1905, em São Francisco após o terramoto. Em 1914, rompeu
com a Collier's para poder cobrir a I Guerra Mundial na Europa para a Leslie's Weekly, tendo
escolhido a frente dos Balcãs para fazer o seu trabalho. Antes de se retirar, fotografou os confrontos
polaco-soviéticos pós-armistício. As suas fotos do conflito entre a Rússia e o Japão, tal como as de
americana, foram também vendidas aos jornais ilustrados europeus, estabelecendo as bases para a
Apesar do uso que a imprensa mucracker e amarela faziam das fotos (no New York
Journal, de Hearst, os fotógrafos chegavam a alterar fotos de pessoas conhecidas para que estas
passassem por desconhecidas; as fotos serviam, depois, para ilustrar narrativas diversas, como
crimes(81)), nos anos 90 do século passado a introdução da rotativa e a alteração do conteúdo dos
jornais e revistas, que começam a publicar artigos mais sérios e profundos, levam a uma integração
crescente da fotografia jornalística, mesmo nos órgãos de comunicação social mais clássicos.
Muitas vezes, contudo, as imagens são publicadas até três ou quatro semanas após o acontecimento.
De qualquer modo, nesta mesma época, revistas como a Collier's ajudaram a estabelecer as
primeiros repórteres fotográficos profissionais. Estes cedo começam a ser detestados pelas suas
"vítimas" devido ao cheiro nauseabundo e à luz ofuscante dos flashes de magnésio, ao carácter
grotesco com que as pessoas eram fotograficamente representadas e ao facto de os fotógrafos serem
frequentemente pessoas rudes, escolhidas mais pela força física, devido ao peso das câmaras, do que
às suas qualidades, o que até dificultava o seu acesso ao local dos acontecimentos. "O objectivo
destes fotógrafos era (…) o de conseguir uma foto, o que na época queria dizer que a imagem devia
primeira agência fotográfica "de facto", em 1894, inaugura uma era de expansão do fotojornalismo.
À Illustrated Journals, outras agências se seguem, como a Underwood & Underwood (EUA), em
1896, e a Montauk Photo Concern (EUA), estabelecida em 1898, que empregou a primeira fotógrafa
americana a fazer nome — Frances Benjamin Johnson. Em 1899, surge em Londres a Illustrated
Press Bureau, que concorre com a Illustrated Journals. Estas agências fornecem fotografias aos
partir desse mesmo ano, a National Geographic torna-se poneira do uso da cor na foto-reportagem.
fotográfica sobre a vida numa prisão (Fig. 9) —um tema que ainda hoje continua a ser abordado e
S.W. Westmore. Em 1896, o The New York Times começa a publicar um suplemento semanal
New York Tribune converte-se, em 1897, num utilizador regular da fotografia de actualidades.
Aquela que terá sido a primeira revista a usar a fotomontagem nasceu em França em
1898 — chamava-se La Vie au Grand Air (Fig. 10) e abordava essencialmente temas desportivos.
Esta revista inovou profundamente no campo gráfico, não apenas através do recurso à
fotomontagem como também recorrendo, por exemplo, a planos detalhados sobrepostos a planos
gerais e ao rompimento da mancha gráfica habitual. Nesse ano, publicavam-se já regularmente doze
revistas ilustradas nos EUA, dez no Reino Unido, nove em França, sete na Alemanha e Áustria e
uma ou mais noutros países europeus, como Portugal. Tornavam-se conhecidos os rostos das
imprensa.
Com a disseminação do fotojornalismo, e beneficiando das suas abordagens do
quotidiano, no sentido inverso ao dos amadores, que persistiam, no início do século, numa via
da "aldeia global".(85)
Vai ser em França que, a partir de 1910, a fotografia jornalística faz a sua verdadeira
aparição nos jornais europeus, no Excelsior, de Pierre Lafitte. Neste jornal, quatro a doze páginas
eram reservadas à reprodução de fotografias de actualidade usadas como meio de informação, e não
de ilustração. No Velho Continente, isto era novidade. Com o britânico Daily Mirror, L'Excelsior
directamente com o L'Éxcelsior, já que publicava menos fotografias, embora talvez de melhor
Face aos dados expostos, pode concluir-se que, pelos finais do século XIX, a
fotografia começou a impor-se na imprensa, pelo menos como meio de ilustração directa, graças (a)
emergentes. Todavia, como se verá, só nos anos vinte é que o medium se adaptará realmente à
imprensa.
Até lá, devagar, o fotojornalismo vai encontrando os meios para cobrir com eficácia e
em competição o mais difícil desafio, mas também talvez o mais aliciante: a guerra. É assim que a
Guerra dos Boers, que ensanguentou a África do Sul entre 1899 e 1902, propiciou ao fotógrafo
alemão Reinhold Thiele, entre outros, a obtenção de imagens que mostram a tensão de alguns
momentos do conflito, como o bombardeamento da artilharia naval britânica a uma fortaleza boer,
em Dezembro de 1899. As fotos de Thiele e de outro fotógrafo, Horace Nicholls, foram publicadas
no The Daily Graphic de Londres, em Março de 1900, o jornal que encomendara o trabalho. Com
um senão: nenhuma menção foi feita ao facto de o ataque britânico ter sido um desastre.
ponto alto em 1910, foram também um tema de trabalho de Augustin-Victor Casasola, que fundou a
Noutra área, Arthur Genthe fotografou China Town, em São Francisco (1897), bem
como a devastação causada pelo terramoto de 1900 na cidade. Dois anos antes, o Graphic tinha
Paul Martin, por seu turno, pode considerar-se um dos precursores da candid
photography dos anos vinte, com os seus instantâneos das ruas de Londres —onde também faz
fotografia nocturna— nos anos noventa do século passado. Além das figuras típicas e das cenas do
quotidiano londrino, Martin tem também fotografias de pessoas em férias, com o seu quê de erótico,
hoje, para o fotojornalismo, não vai merecer o destaque consagrado pela imprensa da época à
fotografia de guerra e de "pequenos eventos", pelo menos numa fase inicial. Fotógrafos como
Thomson (1837-1921) publicaram as suas fotos em álbuns e Riis (1849-1914) teve dificuldades em
recorriam à gravação em linha sobre madeira não eram os mais apropriados para a imprensa.
Jornais e revistas teriam ainda de esperar alguns anos pela adaptação para a tipografia da gravação
fotomecânica, pelos clichés de cobre e zinco e, especialmente, pelo halftone, procedimento capaz de
decompor a fotografia numa trama de pontos que, depois de impressos, restituem à foto a sua
identidade: os cinzentos são traduzidos em pontos negros e brancos que o olho humano mistura,
fotodocumentalismo:
passado;
de povos;
final do século passado e princípios do século XX, por Edward Curtis (1868-1952) e
daguerreótipos de Richard Beard das ruas de Londres; foi uma das primeiras obras
em que as imagens foram usadas tanto para persuadir como para informar;
f) Nos trabalhos de Carlo Ponti, que realizou uma série de fotografias dos vendedores
das ruas de Veneza, vendidas como recordações aos turistas, e nas obras de outros
humanística, como Thomson (em parceria com o jornalista Adolphe Smith) (Fig. 11),
Riis (Fig. 12), Atget (1856-1927) (Fig. 13), Zille, Sander (1876-1964) (Fig. 14), Hine
Orleans, etc.; é no trabalho destes autores que, julgamos, se pode situar mais
Salgado) que, nos anos trinta (a década que faz a fotografia realmente descobrir o
Conforme, nos nossos dias, Salgado viria a dizer, mais do que momentos decisivos,
"(…) há vidas decisivas, com toda a sua cultura e toda a sua ideologia".(89)
mostrar a quem não está lá como é ou o que sucedeu e como sucedeu. Por vezes, exploram um
sentidos, como é notório nos fotógrafos do "compromisso social", que tinham uma intenção
denunciante e reformadora, que as fotos deviam consubstanciar, atingindo mesmo os que não
queriam ou não sabiam ver. Se em Thomson esta tendência não é totalmente visível, com Riis, Hine
e o Farm Security Administration já se evidencia essa preocupação denunciante, embora talvez um
século XX: o desejo de conhecer o outro, de saber como o outro vive, o que pensa, como vê o
(americana) nasce nos tablóides e não nos jornais mais sérios nem nas revistas ilustradas. Mas, se é
interessante, não é, de todo, surpreendente: afinal, as "cruzadas morais" sempre se enquadraram nas
relativa em que se encontrava o operariado um pouco por toda a parte, especialmente quando se
compara a sua situação com a de uma burguesia comercial e industrial em ascenção, favorece a
Nos EUA, as fotografias do assassinato do Presidente McKinley são destacadas na imprensa. Mas o
aumento da produção, e consequente destaque das fotografias, leva injustamente muitos repórteres
fotográficos ao anonimato, menos ao estrelato. Nos primeiros, pode incluir-se o autor da foto da
sufragista Mrs. Pankhurst, quando se manifestava diante do Palácio de Buckingham pelo voto
oportunidade, obtida no "momento decisivo", como no instantâneo de outra sufragista que, em 1913,
protestava contra a inexistência do direito ao voto das mulheres, colocando-se à frente do cavalo do
Rei George.
fotograficamente registados por repórteres e fizeram crescer as expectativas do público face ao novo
medium, ajudando a consolidar o mercado. Além dos referidos, são os casos das fotos do incêndio
Nova Iorque, em 1910, esta última captada quase por acaso por William Warneke, do World. O seu
scoop atingiu um sensacionalismo nunca conhecido até aí, mas bem ao gosto da imprensa
sensacionalista e amarela: o World publicou a foto a quatro colunas. Nesse mesmo ano, usa-se pela
tiragem de heliogravuras numa rotativa, como sistema de reprodução. Este sistema subsistirá até à
implementação do offset, nos anos sessenta, que por sua vez dá lugar à infografia nos anos oitenta.
suas fotografias do Titanic, as últimas realizadas a bordo, alguns dias antes do naufrágio, terem sido
publicadas na Europa e nos Estados Unidos. O Padre Browne, aliás, provavelmente só escapou à
morte porque o seu superior o impediu de continuar a viagem. Depois disso, o seu nome
mergulharia no esquecimento até 1986, mais de 25 anos após a morte do sacerdote, ano em que num
colégio dos jesuítas se descobre uma mala com mais de 42 mil negativos seus sobre a vida social na
Irlanda de 1897 aos anos Cinquenta. Este espólio dará origem a livros e exposições, entre as quais
Por outro lado, "A foto afástase do efecto verité único e unívoco. E entra no século
XX coma eido de experiencias técnicas (…) ou compositivas"(92). De facto, se por volta de 1880
Todos estes movimentos artísticos tiveram influência sobre a fotografia e, consequentemente, sobre
o fotojornalismo, tal como a teria, noutro plano, a fotomontagem (Fig. 16), que, rompendo com a
Secession, que procurava abrir caminhos mais "realistas" e precisos para o medium, emancipando-o
do pictoralismo, tornando-o numa arte autónoma. Esse movimento, fundado por Edward Steichen
(1879-1973) e Alfred Stieglitz (1864-1946) (Fig. 17), a que se associará Paul Strand (1890-1976)
(Fig. 18), promove, nomeadamente através da revista Camera Work, lançada em 1903, uma estética
e dos costumes não pitorescos (o que, por exemplo, fez Benice Abbot, em Nova Iorque), que
desagua na straight photography, a fotografia "pura" que recorria unicamente aos meios fotográficos
podia-se, contudo, tentar neutralizá-la. De uma certa forma, a straight photography retomou as
intenções "realistas" dos primeiros tempos da fotografia, quando o medium se alimentava sobretudo
do século XIX. A straight photography é, em resumo, uma fotografia pura, mas criativa, apostada
em que o processo de significação da imagem fotográfica se apoie nela mesma, isto é, na autonomia
fazer com que as imagens fotográficas fossem um instrumento válido para manifestar os sentimentos
humanos.
enquadrar (tirando partido, por exemplo, das formas geométricas existentes que permitissem realçar
os elementos, como um edifício que se recorta num espaço entre a folhagem das árvores). Nos
retratista (retratou personalidades tão díspares como o financeiro J. P. Morgan e os actores Charlin
Chaplin e Greta Garbo) e que colaborou com revistas como a Vanity Fair e a Vogue. Durante a
americano. Os fotógrafos sob o seu comando reuniram mais de um milhão de negativos, que se
preocupação de mostrar quanto a guerra era estúpida. Desse livro venderam-se mais de seis milhões
principalmente pelas revistas fotográficas, nas páginas das quais se inseriam sobretudo "estórias" de
interesse humano.
Paul Strand, que fotografou dos anos dez aos sessenta, foi provavelmente um dos
fotógrafos que mais impulsionou a entrada da fotografia na modernidade, tendo igualmente sido um
Cartier-Bresson ou Brassaï.
A foto de Wall Street onde Strand fotografa peões, reduzidos face à imensidade da
fachada de um banco —mas sem que os primeiros percam a sua individualidade—, condensa as
tendências da sua fotografia, revelando também que o fotógrafo não se revia —estamos em crer—
termos de objectivos, com os apologistas da straight photography. Este novo movimento nasce da
realismo na pintura, num mundo marcado pelo racionalismo, pela ciência e pelo positivismo.
todas as estéticas fotográficas, como a do grupo f/64, fundado em 1932, em torno das ideias de
Edward Weston (1886-1958), de controle total da imagem óptica obtida com uma máquina
físico com recurso à maior profundidade de campo possível e, portanto, à menor abertura possível
do diafragma. Porém, é de salientar que a reprodução rigorosa dos objectos e sujeitos, recortados do
plano de fundo, que essas tendências sustentavam, não evita a subjectividade da percepção e leitura
photography e pela Neue Sachlichkeit vai servir os objectivos do Estado e do Partido Comunista.
glorificarem os "feitos" do Estado Soviético (sobretudo nos campos agrícola e industrial, mas
grande expoente da fotografia soviética desse período foi Alexander Rodchenko (1891-1956).
sociedade, que não representa o outro lado da "pátria do socialismo": o gulag, as deportações de
mas "vazia" em termos de conteúdos. O mesmo sucedeu, aliás, na Itália fascista, na Alemanha Nazi
e Salazar.
propaganda dos anos da Primeira Guerra Mundial (em que predominavam as fotos dos heróis) até ao
auge da colectivização da agricultura, nos anos trinta. Sob a influência da ideologia e de Estaline,
indesejáveis suprimem-se das fotografias oficiais, enquanto outras são acrescentadas. A revista
Sovietskoe Foto inscreve-se, após 1927, nesse espírito manipulador, propagandístico e censório.
CAPÍTULO VII
A PRIMEIRA REVOLUÇÃO NO FOTOJORNALISMO:
SURGE E DESENVOLVE-SE O FOTOJORNALISMO
MODERNO
Pelos finais do século XIX, os diários encontravam-se atrasados na utilização da
fotografia como news medium. De facto, ao contrário dos semanários e das revistas ilustradas, que
XIX, é, por exemplo, apenas em 1904 que surge o Daily Mirror, em Inglaterra, um jornal que
ilustrava as suas páginas quase unicamente com fotografias, beneficiando dos autochromes,
inventados e fabricados pelos irmãos Lumiére; nos EUA, só em 1919 é que surge o Illustrated Daily
News, de Nova Iorque, que seguia as políticas do Mirror. Gisèle Freund explica:
"Esta utilização tardia da fotografia na imprensa é devida ao facto de
que as imagens devem ainda ser feitas fora do jornal. A imprensa, cujo sucesso se
funda na actualidade imediata, não pode esperar e os proprietários dos jornais
hesitam em investir grandes somas de dinheiro nestas novas máquinas." (101)
mudança cultural operada na imprensa: nas rotinas produtivas da alvorada do século insere-se o
pede. As empresas adaptam-se. A procura cresce. E, como "a necessidade aguça o engenho", a
tecnológicas que lhe possibilitarão "(…) tentar converterse nun elemento informativo independente
Com o aumento da procura da fotografia pela imprensa aumenta o número dos que
optam pelo fotojornalismo enquanto profissão. Em 1913, a Collier's proclamava mesmo que "It is
the photographer that writes history these days. The journalist only labels the characters."(103)
Contudo, o alvor do século é uma época de anonimato para os repórteres fotográficos, que só nos
anos vinte, com a geração de Solomon (1896-1944), vão ver a sua actividade profissional mais
reconhecida. Isto não significou, porém, um reconhecimento total e definitivo da profissão: ainda
hoje, em Portugal, subsiste, por vezes, a ideia de que o fotojornalismo serve essencialmente para
"encher o olho" e ilustrar(104), o que indicia a falta de cultura fotográfica e revela desconhecimento
o progresso, bem como a ciência e a técnica que o permitiam. Daí o positivismo, que "substituiu"
Deus.
De facto, o progresso era real, visível e globalmente benéfico, apesar das catástrofes,
amador Nahum Luboshez. Mas dá-se a Primeira Guerra Mundial, e a humanidade sentiu que, por
vezes, o progresso a deixava ficar mal. E vai voltar-se, após o conflito, para a ideologia, surgindo as
fotografias, que tendem a editar-se em suplementos ilustrados dos jornais. À época, alguns meios
impressos dos EUA, Reino Unido, França e Alemanha possuiam já um staff de fotojornalistas, que
cobrem os eventos de rotina e, por vezes, produzem um scoop, a "cácha" fotojornalística, a
fotografia exclusiva, em primeira mão. No final da Grande Guerra, a maior parte dos grandes
jornais já tinha ou estava em vias de ter a sua própria equipa de fotojornalistas. O The New York
A The Illustrated London News foi uma das revistas que dedicou várias primeiras
páginas e páginas interiores à informação gráfica sobre o conflito. Por exemplo, a 11 de Dezembro
de 1915 publicou, na primeira página, a fotografia de um soldado britânico usando uma máscara de
gás e fazendo guarda na primeira linha. No dia do armistício, publicou duas páginas cheias de
fotografias da multidão que efusivamente celebrava o acontecimento. Mas não é ainda aqui que se
pode falar de reportagem fotográfica no sentido actual do termo: as fotografias eram publicadas sem
ter em conta o resultado global, tinham todas o mesmo tamanho (provocando a ausência de ritmo de
leitura e não dando pistas para uma leitura mais hierarquizada da informação visual) e eram quase
com o fito evidente de ajudar a controlar as populações e direccionar e estimular, os seus ódios e
afectos. Os ministérios franceses da Guerra e das Belas Artes, por exemplo, criaram o Serviço
Fotográfico do Exército, com os objectivos de registar os tempos de luta que se viviam e, sobretudo,
que retratavam a face odiosa da guerra (o organismo será ressuscitado na Segunda Guerra
Mundial). Os fotógrafos de guerra tiveram ainda de lidar com a mão-pesada de censores e editores,
Em 1937, numa exposição do Register and Tribune, de Des Moines, sobre o uso
Aliados em que alemães pareciam brutalizar crianças belgas e francesas, enquanto crianças e
soldados aliados prisioneiros eram fotografados pelos alemães como se estivessem a receber bons
tratos.
movimentações militares. Algumas fotografias sob fogo foram realizadas por fotógrafos integrados
nos exércitos dos antagonistas, mas a sua maioria foi conservada em arquivo até ao início dos anos
vinte.
fotografia como um método auxiliar de reconhecimento aéreo, um factor que poderá ter contribuído
do seu clima liberal, floresceram na Alemanha as artes, as letras e as ciências.(106) Este ambiente
repercute-se na imprensa e, assim, entre os anos vinte e os anos trinta, a Alemanha torna-se o país
com mais revistas ilustradas e onde irão nascer verdadeiramente os fotojornalistas modernos. Estas
tinham tiragens de mais de cinco milhões de exemplares para uma audiência estimada em 20
milhões de pessoas.(107) Posteriormente, influenciadas pelas ideias basilares das revistas ilustradas
alemãs, fundar-se-iam a Vu, e a Regards, a Picture Post e a própria Life, entre várias outras
publicações.
Deuphot) para sustentar as exigências das revistas. Entre estas relevam-se a Berliner Illustrirte
Zeitung (fundada em 1890), a Munchner Illustriert Presse e a Arbeiter Illustrierte Zeitung (uma
"correligionária" da USSR im Bild alemã e que, como esta última revista, começou a usar uma série
de imagens para cobrir um tema). Com base nas ideias basilares das revistas ilustradas alemãs,
notáveis os nomes de Erich Solomon e Felix H. Man (1893-1985), bem como os de uma série de
imigrantes húngaros na Europa que contribuiram para trazer aportações originais ao medium
Munkacsi (1896-1963) chegava a Berlim, em 1927; André Kertész (1894-1985) e Brassaï (1899-
1984) atingiram Paris, entre 1924 e 1925. Um pouco antes destes acontecimentos, em 1917, tinha-
A forma como se articulava o texto e a(s) imagem(ns) nas revistas ilustradas alemãs
da "nova vaga" permite que se fale com propriedade em fotojornalismo. Já não é apenas a imagem
isolada que interessa, mas sim o texto e todo o "mosaico" fotográfico com que se tenta contar a
Além disso, vários são os avanços técnicos que ocorrem no domínio da fotografia.
Em 1925, é inventado por Paul Vierköter o flash de lâmpada. Em 1929, esse flash é aperfeiçoado
por Ostermeier, que introduz um metal reflector na lâmpada. Os fotojornalistas em pouco tempo
adoptaram o modelo, substituindo o flash de magnésio. O novo flash fez a sua estreia nos Estados
Unidos, com a foto do Presidente Hoover assinando a Lei de Apoio aos Desempregados.
Pese embora a resistência à mudança de algumas publicações, como a própria Life, que, em 1936,
ainda insistia para que os fotojornalistas usassem câmaras de grande formato e não a Leica, esta
marca afirma-se no mercado. O fotojornalista, com ela, ganha mobilidade, pode posicionar-se
melhor face ao evento, explorando pontos de vista variados, passa mais facilmente despercebido,
não necessita de usar constantemente flash para fotografar em interiores e tem à sua disposição uma
gama de objectivas permutáveis que pode mudar consoante os objectivos do seu trabalho e a
câmaras de pequeno formato [estas, por vezes, ficaram conhecidas por "câmaras detective" (spy
cameras)], só em meados do presente século é que a qualidade das câmaras menores melhorou ao
ponto de se tornar possível a sua utilização profissional. A facilidade de manuseamento das câmaras
Leica e da Ermanox, equipadas com lentes mais luminosas e filme mais sensível, o
que permitiu "(…) transportar o observador para a própria cena"(108); mas, por outro
lado, também se vai, de algum modo, devassando a privacidade; segundo Hicks, a
nalguns casos, com nível social elevado, o que lhes franqueava muitas portas;
públicas, mas também os temas que representam a sua própria vida; as revistas
identificava uma larga fatia do público, que também estava ansioso por imagens;
5) Ambiente cultural e suporte económico.
autor tornou-se referência obrigatória. Pela primeira vez, privilegia-se a imagem em detrimento do
texto, que surge como um complemento, por vezes reduzido a pequenas legendas. Outras vezes, a
imagem na imprensa vai mais longe. Chega a aliar-se a arte à autoria, a expressão à interpretação e
à assunção da subjectividade de pontos de vista pessoais. É o que acontece, por exemplo, com as
Nos primeiros tempos do novo fotojornalismo, para se obter sucesso nas fotografias
em interiores por vezes era necessário recorrer a placas de vidro, mais sensíveis, e proceder à
revelação das placas em banhos especiais. A profundidade de campo também era muito limitada,
pelo que o cálculo das distâncias tinha de ser feito com grande precisão, o que dificultava a vida ao
fotógrafo. Também era preciso usar tripé, incómodo e difícil de esconder. Raramente se
conseguiam obter várias fotos de um mesmo tema, pelo que a que se obtinha devia "falar por si".
Assim, começa a insinuar-se, com força, no "fotojornalismo do instante", a noção do que, mais
R. E. Kuenzli diz, porém, que, tirando casos como o de Heartfield, que usava as foto-
Weimar serviu sobretudo os interesses das classes média e superior, pois as foto-reportagens não
lançou as suas próprias publicações de grande tiragem, como a Arbeiter Illustrierte Zeitung, de
de Hundt. O autor sustenta que a "comercialização da vida" que teve lugar nesse contexto histórico
criou condições para que as fotografias jornalísticas, mais do que os textos, funcionassem como
destas ideias conservadoras fariam parte a celebração do conhecimento técnico como símbolo de
revistas ilustradas alemãs teriam principalmente desenvolvido, na óptica do autor, uma visualidade
excitante, mas num estilo ostensivamente apolítico e incontroverso que teria falhado na preparação
dos leitores para as consequências catastróficas das condições políticas prevalecentes então.(114)
Do nosso ponto de vista, esse facto pode ter ocorrido, mas é menos nítido que as
ambiente social era agitado, tendo a esquerda comunista e social-democrata bastante força (logo não
nos parece que se possa falar totalmente de uma hegemonia ideológica conservadora), mas também
porque na esfera pública alemã pontificavam várias revistas de esquerda, como a Arbeiter
Illustrierte Zeitung, e porque fotojornalistas como Felix Man não deixaram de expressar o seu ponto
de vista negativo sobre o fascismo. Será, todavia, menos questionável afirmar que a articulação
entre fotografias e textos nas foto-reportagens e foto-ensaios publicados nas revistas ilustradas
alemãs contribuiu para apresentar e construir ficções e referências sobre as pessoas, a sociedade e o
mundo.
política por parte da esquerda é a revista Der Arbeiter-Fotograf. Herbert Hofreither mostra bem que
a fotografia, nessa revista, possuía funções políticas militantes na luta de classes e na luta contra o
fotojornalismo "artístico" e "civil" da grande imprensa ilustrada que o autor denomina de "imprensa
civil", isto apesar de a Der Arbeiter-Fotograf descrever as suas fotos como "sociais".(115) Os temas
principais das representações fotográficas da revista eram o trabalho, a habitação operária, a vida
nas ruas, a vida rural, higiene e saúde, miséria e fome, desemprego, mulheres e crianças, vida
Dos vários fotojornalistas que seguem o caminho aberto pelo "pai" do fotojornalismo
moderno, Erich Solomon, podem destacar-se, de imediato, Tim Gidal (um fotojornalista alemão que
colaborou com a Münchner e a Berliner, mas que é mais importante como autor do primeiro livro de
relevo sobre a história do fotojornalismo, pese embora as reportagens que realizou em todo o
mundo), Felix H. Man (Hans Baumann) e Alfred Eisenstaedt (1898-1995), chefe da secção de
Münchner Illustrierte Presse, entre Fevereiro e Maio de 1929. Na maioria, porém, os fotógrafos são
jovens que trabalham como freelances e redigem eles mesmos os textos e legendas que
acompanham as suas fotografias, sempre assinadas. Outros trabalham para agências como a Dephot
(Deutsche Photodienst), que tem as revistas como principais clientes. Entre estes últimos, figurava
um húngaro de nascença, um tal de Andreas Friedmann, que tinha começado como fotógrafo nessa
agência aos 17 anos. Alguns anos mais tarde, adoptará outro nome — Robert Capa (1913-1954).
Todavia, o primeiro fotojornalista alemão da nova vaga a fazer nome foi Willi Ruge, com as suas
porque é principalmente com ele que nasce a candid photography (candid camera foi a expressão
usada pelo director da revista londrina The Graphic para se referir ao novo estilo), a fotografia não
posada, não protocolar, em que o fotografado não se consegue preparar para o ser. Uma fotografia
viva, por vezes bem humorada (Solomon não desdenhava o público), que tenta surpreender as
figuras (públicas) em instantes durante os quais abrandam a vigilância, deixando cair as máscaras e
abandonando os rituais sociais, assumindo posições "naturais". Uma fotografia que procura retratar
o quotidiano. São famosas as fotos informais de encontros diplomáticos realizadas por Solomon.
A par de Erich Solomon, que fazia questão em ser chamado "Herr Doktor", uma vez
que era licenciado em Direito, toda uma nova raça de fotojornalistas rompe com a ideia de que o
repórter fotográfico pouco mais era do que o simples servidor ao qual cabia obter uma fotografia
muito nítida e agradavelmente composta para ilustrar (isto é, pouco mais que decorar) os textos. Os
novos fotojornalistas eram pessoas educadas, muitas vezes aristocratas ou burgueses que, embora
arruinados, mantinham um elevado estatuto social, forte presença e postura. Nalguns casos, isto
facultava-lhes a entrada nos locais "interditos" onde se cozinhavam os negócios de estado, se fazia
política ou até justiça, como aconteceu com Solomon, nas célebre fotografias que, apesar da
proibição vigente de fotografar, realizou no tribunal onde se julgava um estudante acusado de matar
dois companheiros (trabalho com que se estreia como fotógrafo), repetindo a ideia de Arthur Barret,
que, em 1910, tinha também fotografado um tribunal, e aguçando, de certa forma, o voyeurismo do
público.
exemplo, usava um obturador especial que lhe permitia disparar sem ruído; além disso, não se coibia
em usar subterfúgios, como esconder a máquina e o tripé na roupa (chegou a esconder a máquina
numa bíblia para fotografar um cardeal falecido) ou, nas ocasiões de Estado, ocupar lugares de
dignatários que não tinham aparecido. Aliás, no célebre prefácio ao seu livro Beruhmte
Inesperados), publicado em 1931, ele enuncia as qualidades que, na sua óptica, um fotojornalista
deveria ter:
"A actividade de um fotógrafo de imprensa que quer ser mais do que
um artesão é uma luta contínua pela sua imagem. Tal como o caçador está
obsecado pela sua paixão de caçar, também o fotógrafo está obsecado pela
fotografia única que quer obter. (…) É preciso lutar contra (…) a administração, os
empregados, a polícia, os guardas (…). É preciso apanhá-las [as pessoas] no
momento preciso em que elas estão imóveis [por causa dos tempos de exposição].
Depois é preciso lutar contra o tempo, pois cada jornal tem uma deadline ao qual é
preciso antecipar-se. Antes de tudo o mais, um repórter fotográfico tem de ter uma
paciência infinita, e não se enervar nunca; deve estar ao corrente dos
acontecimentos e saber a tempo e horas onde é que irão desenrolar-se. Se
necessário, devemos servir-nos de toda a espécie de astúcias, mesmo se elas nem
sempre são bem sucedidas."
certamente, ultrapassadas, devido aos avanços técnicos. Mas as restantes são ainda hoje válidas e,
entre elas, releva-se o factor tempo, uma das grandes condicionantes do jornalismo, mormente do
reconhecimento pelo seu trabalho e, por vezes, atingindo o estatuto de estrela. Nalguns casos,
porém, a luta pelas fotografias "secretas" originada pela competição entre as revistas leva a
encenações, como nas fotos de Erich Solomon das salas de jogo do Casino de Monte-Carlo,
publicadas em Abril de 1929. Nestas fotografias, encenadas, os empregados do casino posaram para
as fotos como se fossem eles os habituais jogadores, as figuras públicas, antes mesmo de abrirem as
durante o período de abertura. O público desconhecia-o. E as fotos passaram por aquilo que não
eram.
respeito dos políticos pelos fotógrafos. Consta mesmo que o ministro britânico dos Negócios
Estrangeiros, no início de uma reunião intergovernamental, terá perguntado, com um certo humor:
"Onde está o Doutor Salomon? Não podemos começar sem ele, pois o público pensará que este
encontro não teve importância." E o primeiro-ministro prussiano, Otto Braun, terá dito também que
"Hoje pode ter-se uma conferência sem ministros, mas não sem o Doutor Solomon".
Pela mesma época em que vingava o "estilo" Solomon, Munkacsi fazia nome na
Berliner Illustrierte, tal como Kertész, que também verá publicada, em 1929, no BIZ, aquela que se
considera ser a primeira verdadeira photo story, um ensaio subjectivista sobre a vida monástica no
mosteiro de Notre Dame de la Grande Trappe. Kertész, um dos fundadores da fotografia moderna,
Doisneau e Brassaï.
Lorant, na Münchner Illustrierte Presse, foram também importantes para que o novo estilo
vingasse. De alguma maneira, eles quebraram a antiga visão da fotografia como mera ilustração
explicação dos assuntos. Além disso, pela primeira vez as fotografias foram paginadas combinando-
para o efeito. Abalava-se, deste modo, a tradicional publicação de uma única fotografia meramente
ilustrativa por assunto ou de sequências simples, com efeitos quer ao nível das rotinas produtivas,
quer ao nível da obtenção das fotos (inclusão da foto-reportagem aprofundada e do foto-ensaio nos
pedra angular de uma mudança qualitativa nos conteúdos informativos e nas relações conteúdo-
forma, neste caso através das inovações gráficas que se vão implementando. Cada vez mais, com
corresponder ao conceito de fotografia "única" e "ultra-secreta" que ele próprio tinha inventado(119) e
que os leitores esperavam, Stefan Lorant recusava a encenação fotográfica. Ele vai, ao invés,
uma foto central. Esta tinha por missão sintetizar os elementos da "estória" que Lorant pedia aos
fotojornalistas que contassem em imagens. Para Lorant, "A 'foto-reportagem' devia ter [ainda] um
deixam de privilegiar unicamente as figuras públicas e os acontecimentos que giravam na sua órbita,
para estenderem esse privilégio aos vários assuntos que pudessem afectar o público ou com os quais
este se identificava, como os que diziam respeito à sua vida quotidiana, algo que pode ser ilustrado
restaurantes e parques de diversões ou até a primeira foto-reportagem nocturna. Esta ideia será,
fotojornalista;
alemão. Muitos dos fotojornalistas e editores conotados com a esquerda tiveram de fugir para não
serem presos e mortos, exportando as concepções do fotojornalismo alemão, que espalham por
vários países, entre os quais a França (Vu, etc.), o Reino Unido (Picture Post, etc.) e os Estados
refugiados. Ele estava na Dephot e fugiu para o Reino Unido, onde trabalhou para a Weekly
fotógrafo judeu alemão socialista que fugiu de Berlim para Paris, em 1933, e daí para os Estados
Unidos, em 1942, tendo, neste último país, trabalhado para a Fortune. Em muitas das suas fotos,
nomeadamente nas da série Dr. Riegler —onde este surge de fato ao lado de uma rapariga nua num
ambiente doméstico—, não só se revê uma intenção surrealista exaltadora da incongruência como
Alemanha exportaram também as concepções do fotojornalismo alemão, que espalham por vários
Korff fugiu para a Áustria e depois para a América, onde viria a ser conselheiro de
Henry Luce na fundação da Life. Stefan Lorant regressou à Hungria e refugia-se, depois, em
Londres, onde, em 1934, fundou a revista Lilliput. Foi depois editor da Weekly Illustrated e, em
1938, funda a Picture Post, que veio a tornar-se a revista britânica mais significativa das que
privilegiavam o fotojornalismo, tendo-se editado até 1958. Nas palavras de Margarita Ledo Andión
(1988), a revista representa mesmo "a evolución da fórmula pioneira do Münchner Illustrierte Press
e a continuidade de Vu e de Regards."
Na Post, Lorant continuou a publicar, entre outros, ensaios de Felix Man e de vários
fotojornalistas fugidos ao avanço de Hitler, como Capa, que nessa revista e na Life veio a consagrar-
se como repórter de guerra, com a cobertura que fez da Guerra Civil de Espanha até à queda de
Barcelona, em 1939. Não obstante, em 1940, Lorant emigrou, também ele, para os EUA.
Bert Hardy, cujas fotografias conseguem captar a atmosfera dos temas e eventos fotografados e a
expressão das personalidades envolvidas, como ocorre numa foto dos vitivinicultores franceses
numa cave de vinho ou nas fotos sobre os problemas racistas em Liverpool, em 1949. Sob esse
prisma, Hardy apresenta algumas semelhanças com Erwitt e, principalmente, com Cartier-Bresson,
cuja foto Piquenique de Domingo nas Margens do Marne, de 1938, integrada no seu livro Images à
a partir de Junho de 1924, uma série de photo-stories, como a visita do Rei Humberto de Itália ao rei
em 1929 aparece o sistema reflex de duas objectivas, com a Rolleiflex; em 1933, surge o o sistema
reflex de uma única objectiva, que é aquele que hoje é mais usado no campo fotojornalístico. O
sistema de reflex directo permitirá enquadramentos mais exactos, facilitará a focagem e facultará ao
fotógrafo uma maior concentração no tema. Em 1936, a Agfa consegue obter um filme de
si. Doravante, não será só o fabrico rotineiro de um produto de rápido consumo a interessar. O
"olha e deita fora", o "boneco" ilustrativo, praticado em grande número de jornais, revistas e
agências, coexistirá, até aos nossos dias, com o fotojornalismo de autor da Life e de outros jornais,
revistas e agências.(121) A picture story ou photo story, introduzida pelo fotojornalismo alemão dos
anos vinte/trinta, não só concretiza as velhas ideias de narratividade que Paul Nadar e o seu pai, o
"grande" Nadar, ensaiaram aquando da entrevista que este último efectuou a Chevreul, como
também fez avançar o fotojornalismo para a liça pela interpretação da notícia e do acontecimento,
subjectivo, que se nota, por exemplo, na fotografia de Man, não impede, porém, que o
fotojornalismo dos anos vinte e trinta se baseie dominantemente na foto-descrição, na ilusão da
verdade, na facticidade e na univocidade de sentido. Só a partir dos anos sessenta é que a fotografia
evoluirá, com maior pujança, por um lado, para a polissemia e, por outro, embora não
decidida de posição entre o "justo" e o "injusto", o "certo" e o "errado", o "mal" e o "bem", como é
particularmente visível em McCullin. A honestidade começará, nos anos sessenta, a contrapor-se à
Os anos trinta viram também surgir um novo fenómeno: surgem várias publicações
Por volta dos anos trinta, a fotografia destinada à imprensa havia já conquistado um
não podem, na nossa opinião, desassociar-se da cultura da imagem que dava os primeiros passos
para se tornar numa cultura dominante: em meados dos anos trinta já existiam sistemas de televisão
conquistado pela fotografia na imprensa diária dever-se-á tanto ou mais a essa hipótese do que à
respeitabilidade mediática, conquistada pela própria força da fotografia como intermedium, como
medium convergente noutro medium: a imprensa. Jornais e revistas aproveitavam as fotos para
Alguns fotógrafos esforçavam-se mesmo por mostrar o quotidiano mais prosaico, como fez Kertész
desenhando desde os anos vinte. Este fenómeno adquire maior relevância com as coberturas da
Guerra Civil de Espanha e da Segunda Guerra Mundial. Mais tarde, o mesmo acontecerá durante os
medium: antes de qualquer opção mediática e da percepção e recepção da foto por parte do
Na Europa dos anos trinta, "(…) proclamábanse opinións en defensa dunha lectura
comunicativa da foto en conexión coa reserva de signos e coa forma, tirándolle o seu xogo de
imitación do que se vé."(123) Obras sobre fotografia social, como a tese de Giséle Freund, Fotografia
europeus se agarram à foto, que deixará de ser um quase monopólio das revistas ilustradas. Tal
como já faziam o Daily Mirror, o Daily Mail, o Sunday Graphic e o Sunday Pictorial, também
jornais como o Paris-Soir (posteriormente denominado France-Soir) começaram a dar mais atenção
uma certa rotinização e massificação da produção fotográfica. Assim, uma corrente paralela, mas de
sentido oposto, à fotografia de autor (concentrada nas revistas), instala-se com relativo à vontade no
verosimilitude. É dentro desta linha que Prouvost, editor do Paris-Soir, anuncia que os leitores do
periódico vão encontrar fotos recentes (põe em evidência a velocidade) e raras (põe em evidência o
scoop).(124)
histórica fazem parte Carl Mydans, Capa e Cartier-Bresson (1908-), Margaret Bourke-White (1904-
1971) e Kartész, Brassaï, o fotógrafo de Paris, Munkacsi (1896-1963), Doisneau (1912-1995), David
Douglas Duncan (1916-), George Rodger (1908-1995) e David "Chim" Seymour (1911-1956), entre
outros.
fotógrafos que fugiam da Alemanha face ao avanço dos nazis: Man fica no Reino Unido, a trabalhar
com Lorant. Eisenstaedt e Fritz Goro fixam-se nos EUA, tendo vindo a integrar os quadros da Life,
a partir de 1936 (Eisenstaedt colaborará com esta revista durante cerca de quarenta anos, tendo
publicado mais de mil feature stories). Capa, em 1933, dirige-se para Paris, depois de passar algum
tempo em Viena e em Budapeste. Solomon não teve essa sorte: judeu, apesar de se refugiar na
1939, a Guerra Civil de Espanha foi a primeira guerra moderna a ser amplamente fotografada e
também um laboratório de ensaio, mesmo sob o ponto de vista fotojornalístico, para o conflito maior
da II Guerra Mundial que se avizinhava. A maior parte dos grandes fotógrafos que se deslocaram
para Espanha escolheu, sem hesitar, o lado dos Republicanos-lealistas, pois a sua causa atraía-os, no
a "autocensura" motivada pelo empenho na causa e consequente postura perante o mundo vai levar a
que na produção fotojornalística dessa guerra pouco se veja das atrocidades cometidas pelo campo
em que os fotógrafos actuavam. Por exemplo, as chacinas perpetradas pelos Republicanos e mesmo
as confrontações internas entre comunistas e anarquistas foram ignoradas pelos fotógrafos que
cobriram o conflito desse lado, como Capa. "Pra 'significar' o mundo cúmpre sentirse implicado no
ensanguentou o seu país. Augustí Centelles, que colaborou com La Vanguardia, de Barcelona e fez
uma cobertura exaustiva da frente de Aragão, e José Suárez —que mais tarde viria a colaborar com
a Life e que realizou o documental Mariñeiros para o Governo republicano— são apenas dois dos
mais conhecidos.
Espanha, C. Brothers chegou à conclusão de que as fotografias da vida dos civis espanhóis
publicadas na imprensa francesa e britânica exibiam uma considerável correlação entre os temas
seleccionados para representação. A autora sugere que as razões para estas correspondências foram
subordinadas. C. Brothers mantém ainda que a fotografia sobre a Guerra Civil de Espanha tinha
notoriamente fins persuasivos, especialmente porque o conflito provocou intensa polarização
política na Europa; para ela, todas as imagens desta natureza dependem de uma forma fundamental
das crenças colectivas e das suposições da sociedade que as consome. Finalmente, a autora propõe
que o historiador deverá recolocar as fotos nos seus contextos originais de publicação para
histórico determinado e para chegar às noções tão óbvias para essa sociedade que só escassamente
As aportações que, antes e depois do conflito espanhol, a "geração mítica" traz para o
fotojornalismo são várias. Por exemplo, o pioneirismo de fotojornalistas como Capa na cobertura de
guerra obriga a debater a questão: para informar deve "mostrar-se" ou "sugerir-se"? A resposta
originou duas vias de actuação: Capa, por exemplo, sugere ameaças, como nas fotos dos civis
alarmados pelos ruídos dos bombardeiros que sobrevoavam Bilbao durante o conflito espanhol.
Anos depois, Don McCullin enquadrará a sua produção na estética do horror, que, aliás, o esgotará e
o fará abandonar a fotografia de guerra (em 1988, fotografará as paisagens inglesas, talvez para
exorcisar os fantasmas dos horrores que fotografou). Desse debate outro nascerá: é o conflito entre
é boa, é porque tu não estavas suficicientemente perto!" Esta máxima orienta ainda hoje a produção
dos fotojornalistas de guerra e havia de valer a vida Capa, quando, em 1954, após ter coberto
acontecimentos tão relevantes como a fundação de Israel (1948) e as lutas travadas pela nova nação,
bem como cinco guerras em dezoito anos, morre vitimado por uma mina na Indochina francesa,
actual Vietname. Mas dele permanecem as suas fotos, onde, sem abdicar da escolha de um campo,
o que se nota particularmente na Guerra Civil de Espanha, mostra a inumanidade do homem, os seus
tal como Capa, procurava também fotografar perto da acção, com humanismo e sentimento.
concerned photographers (Figs. 21, 22, 23 e 24), cuja produção não apenas era destinada à imprensa
mas também a livros e exposições. Kertész, David Douglas Duncan, Bill Brandt, Capa, George
Rodger, Cartier-Bresson, Munkacsi, Brassaï, Doisneau, Margaret Bourke-White são apenas alguns
dos nomes, vários dos quais já referenciados, que animaram essa geração mítica dos anos trinta, cuja
produção continuará a marcar o produto fotojornalístico ao ponto de ainda hoje se sentir a sua
influência.
1938, reporta a saga das crianças bascas refugiadas de guerra para o Christian Science Monitor. Um
ano antes, a fotógrafa companheira de Capa, Gerda Taro, tinha morrido num acidente enquanto
distingue na guerra espanhola, embora tenha tido outros palcos de actuação: Hollywood, URSS e
Cartier-Bresson, que se tornou notado ainda nos alvores dos anos trinta, com as suas fotos sobre o
México, incluindo as suas prostitutas (1934). O seu primeiro trabalho foi publicado pela Vu e, a
partir daí, o fotógrafo francês colaborou assiduamente na Life, na Paris Match, na Harpeer's Bazar,
na Picture Post, na Epoca, na Realités e muitas outras revistas. Publicou livros como Images a la
sauvette (1952, talvez o mais importante, traduzido em inglês como The Decisive Moment), Les
europeens (1955), Moscou (1955) e D'une Chine à l'autre (1955). Foi também um dos fundadores
da agência Magnum.
entre a arte e o elemento informativo imagético baseado na autoria, iniciando também o que
podemos considerar como uma tradição francesa da fotografia única. Conforme escreve Jose
fotógrafo consciente em relação à influência que as suas imagens podem adquirir. Na sua essência
encontra-se uma brilhante selecção dos locais onde o fotógrafo se posiciona, uma atenção extrema
Nem sempre é fácil extrair sentidos inteligíveis das fotografias de Bresson. Ao jogar
Por seu turno, Munkacsi exprimiu na sua fotografia de reportagem alguns dos
congoleses brincando na praia (tirada por volta de 1930). A partir de 1934, Munkacsi converte-se,
porém, à fotografia de moda, trabalhando para a Harper's Bazar, o que fez dele um dos grandes
fotógrafos de moda do seu tempo. As suas fotos de moda mostram a vitalidade dos sujeitos e são
com frequência extremamente plásticas, como acontecia nas suas fotografias jornalísticas. Foi um
se notam atitudes que roçam o surrealismo…), e Brassaï, com as suas imagens intrigantes e
permissivas da noite parisiense (editadas no livro Paris de nuit, de 1932). Nestas últimas fotos, por
vezes notava-se a acentuação dos reflexos de uma calçada com o flash; noutras ocasiões, o fotógrafo
usava a névoa e a chuva como filtros que imprimem determinadas atmosferas às fotografias, tal
como o tinham feito os pictoralistas. Em alguns casos, a cidade é fotografada em si mesma, sem os
seus habitantes, como anteriormente o tinha feito Atget. Noutros casos, o motivo é a "fauna
os namorados que se beijam "clandestinamente". Para o fazer, teve de lhes ganhar a confiança.
Como outros fotógrafos, Brassaï realiza fotografias de prostitutas que nos tornam
autênticos voyeurs. Mas, provavelmente para evitar precisamente esse mesmo voyeurismo
indiscreto, só em 1977 é que edita Le Paris secret des anées 30. De qualquer modo, ao contrário,
por exemplo, do que fará Weegee, o que Brassaï fotografa é um mundo agradável, um mundo de
prazer, em que as vítimas do pequeno e grande crime são mais ou menos ignoradas.
Também sobre Paris, a partir de meados dos anos trinta, debruça-se Willy Ronis, um
fotógrafo esquerdista que colaborou na Regards, na Vu e na Vie Ouvrière. A sua obra, que em
Objectividade, ele vai recorrer com frequência a uma prática fotográfica conceptual, na qual joga
com as formas, as linhas, os contrastes de sombra e de volume. As suas fotos parecem transmitir-
precisão dessas linhas e desses contornos, desses contrastes e das distorções. O visível transforma-
se em lisível através da imagem fotográfica, o mundo sofre uma metamorfose que o torna um
sobretudo na Agência Rapho. Esse tipo de fotojornalismo dava uma atenção bem humorada às
Doisneau. Resultando de uma encenação, não deixa, por isso, de sintetizar o essencial da sua obra,
mormente o humor e a graça com que ele abordava os motivos do dia a dia.
conhecido e influente no pós-guerra, mas o seu projecto fotográfico The English at Home —na
contemporâneo.
campo fotográfico, mas que já entram, sobretudo, no domínio da arte: jogos de sombra e luz
acentuados por revelações e impressões contrastadas, fotos de praias e falésias em que se visualizam
fragmentos do corpo humano. Estas últimas, principalmente, são fotografias que apelam ao fora de
campo, obrigando o observador a completar activamente a imagem durante a sua leitura (função de
estendeu-a à fotografia da sociedade industrial, que capta de forma dramática, por vezes
esmagadora, como a foto de uma barragem em Fort Peck Dam que fez a capa do primeiro número
conceituadíssima e uma das introdutoras, se não a introdutora, do foto-ensaio nos Estados Unidos,
precisamente com o trabalho sobre a vida em Fort Peck Dam, também publicado no número um da
revista.
Tendo ganho uma forte consciência social a partir de meados da sua carreira,
Margaret viajava frequentemente à URSS, testemunhando o primeiro raide alemão sobre Moscovo,
na Segunda Guerra Mundial. Na América, tinha publicado, em 1937, com o seu futuro marido, o
escritor Erskine Caldwell, You Have Seen Their Faces, um poderoso documento social sobre os
pobres dos estados do Sul e as suas deploráveis condições de vida. Como correspondente da Life na
Europa durante a Segunda Guerra Mundial, Margaret será também a primeira fotógrafa a participar
num raide aéreo da Força Aérea Americana, em 1943, e estava com os fotógrafos que descobriram
resistência pacífica de Gandhi e, em 1948, o próprio Gandhi, seis horas antes de o líder indiano ser
David Douglas Duncan foi sobretudo um fotógrafo de guerra. A sua carreira iniciou-
se quando, como amador, fotografou acidentalmente o gangster John Dillinger, em 1934. Mas foi
sobretudo a partir do momento em que se juntou aos Marines, em 1943, que a sua produção
fotográfica começou a notar-se. Fotografou as missões aéreas e os avanços das tropas, evidenciando
tanta coragem e sangue-frio que acabou por ser condecorado com a Purple Heart. Após a Segunda
Guerra, fotografou a Guerra da Coreia, em 1950, com as tropas norte-americanas em retirada, tendo
editado o livro This Is War, que condensa a frustração do conflito. Foi talvez na Coreia que ele
Perfeccionista, desgostoso com a forma como a fotografia era tratada pelos editores,
Duncan demite-se da Life, onde trabalhava, em 1955, tornando-se um freelance e orientando grande
parte do seu trabalho para a produção de livros, onde podia fazer o que almejava: controlar o seu
trabalho. Com isto, ajudou a definir as direcções que a fotografia do pós-guerra iria tomar.
A produção de guerra de David Douglas Duncan, a seu modo um outro Capa,
independência da sua colónia. Publica, nessa altura, na Life, The Year of the Snake, um foto-ensaio
sobre esse tema. Alguns anos passados e fotografará o polémico e desastroso envolvimento
A Vu
Alguns anos antes da Guerra de Espanha, em 1928, o francês Lucien Vogel tinha
criado a revista Vu, seguindo uma fórmula similar àquela que estava a ser praticada com êxito na
privilégio outorgado à imagem, em novas receitas gráficas. Todavia, desde o início da Vu que
Vogel associava fotografias de qualidade a textos de qualidade, tendo chamado para a revista não só
imigrados na Alemanha fugidos às perseguições nazis: Man e Capa estavam entre eles. Vieram
juntar-se a Kertész e Germaine Krull (1897-1985), entre outros. Com a guerra, alguns deles, como o
próprio Kertész, mudar-se-iam para os Estados Unidos. Krull prosseguiu a sua carreira como
L'Illustration. De facto, com a Vu inicia-se um processo de utilização massiva e até espectacular das
fotografias (como a dupla página que ocupou uma fotografia de Margaret Bourke-White de uma
metalurgia de Ohio, em 1931), de tal modo que, no final do primeiro ano de vida da revista, Lucien
Vogel mostra-se orgulhoso de um feito, à época, ímpar: a Vu tinha publicado 3 324 fotos.(129) Sem a
Vu, como mais tarde reconhecerá o fundador da Life, Henry Luce, esta última revista não teria
existido (pelo menos, não teria sido o que foi). "Notre culture est devenue visuel", chega a declarar
em 1934, um outro sobre a China. Em 1936, porém, Vogel é obrigado a demitir-se da direcção da
gota de água é a publicação, nesse ano, de um número especial sobre a Guerra Civil de Espanha
vista pelo lado dos republicanos… e da mais célebre fotografia de Capa, a polémica foto da "morte
de um soldado republicano", que é ainda hoje a "foto de marca" do fotojornalismo de guerra, bem
reveladora da máxima do seu autor — uma boa fotografia é uma fotografia de proximidade; quando
a foto sai mal, é porque não se está suficientemente perto. Mas a foto da morte do soldado
republicano não é só a imagem da morte, é sobretudo "(…) a morte como verosímel", como disse
Sem Vogel e com o interesse diminuído, a revista só durará mais dois anos.
será editada, até à eclosão da Segunda Guerra Mundial, por Maxim Gorki, Michael Kolzow e
outros. Esta revista dota-se de um grafismo avant-garde, quase transportando para o doravante
importantíssimo mise-en-page as tensões dialéticas das teses marxistas, como Sergei Eisenstein
editados por El Lissitzky e Alexander Rodchenko (1891-1956), entre 1933 e 1936. Lissitzky e
Rodchenko usaram fotos a cores, fotomontagens, e, em termos gráficos, páginas cut-out e fold-out,
surtir um grande efeito no público. Depois há o caso ímpar de Rodtchenko. Podemos citar também
Petrusov, Dimitri Baltermans e Anatol Garanin, entre outros. Mais tarde, durante a Segunda Guerra,
economia crescer, até à crise de 1929. Porém, a década de trinta voltará a ser uma era de
crescimento económico, só interrompido, pelo menos na Europa, pela Segunda Guerra Mundial. É
nessas duas décadas —a dos anos vinte e a dos anos trinta— que o fotojornalismo se afirmará como
1942) e da sensibilidade.
fotografia de autor e pelo foto-ensaio nas revistas ilustradas (nos jornais isso não se passa tanto), nos
Estados Unidos é principalmente nos jornais diários que se dão mudanças importantes para o futuro
Acrescente-se, todavia, que na América surgem também fotojornalistas que cultivam abordagens
próprias do real, como Weegee (1899-1968). E que é também na América que se desenvolve um
fotodocumentalismo inicia o seu afastamento da ideia de que serve apenas para testemunhar,
comprovava-o). Não é pois de estranhar que a intenção dominante dos fotógrafos da foto-press nos
jornais americanos e europeus é fazê-la posicionar-se, antes de mais, como documento. Era assim
que eles a consideravam. Mas também desejavam que o público assim a considerasse, "(…) na idea
jornais diários norte-americanos, de tal modo que, no fim da década, e em comparação com o seu
início, o número de fotografias nos diários tinha aumentado dois terços, atingindo a média de quase
38% da superfície em cada número.(132) Alguns jornais, como o New York Evening Graphic, usavam,
pessoais, sociais e culturais do fotojornalismo e a mutação que o jornalismo diário dos EUA teve e
exportou:
photography had begun to emerge as a more direct mode of accounting than verbal
narratives, and the introduction of filmes had set up a growing interest in visual
culture."(133);
provaram que o documentalismo tinha força e que as fotos podem ser usadas para
acção única(136);
Mundial;
organizacional, tendem a gerar tensão, devido à resistência à mudança. A tensão pode ser tão forte
que tem repercussões. Repare-se, por isso, no que escreve Barbie Zelizer a respeito da introdução
dos sistemas de telefoto de agência e, ao mesmo tempo, naquilo que se pode aprender com a história
1340 associados, tornou possível a utilização de fotografias como um eficaz meio de informação. O
serviço de telefoto desta agência foi inaugurado com a distribuição de uma imagem da queda de um
avião nas montanhas de Adirondack, no estado de Nova Iorque. Um ano passado, e a AP tinha de
competir com a Soundphoto, do grupo Hearst, que fornecia o The New York Times, e com a Scripps-
Howard's NEA — Acme Telephoto. Mas, os serviços de telefotos levaram a uma maior repetição de
imagens nos diversos jornais e revistas. Na década de quarenta, as agências noticiosas eram já uma
das principais fontes de fotografias para a imprensa. Karen Becker explica que os clientes dos
serviços fotográficos das agências noticiosas exigiam sobretudo apenas uma fotografia nítida e clara
por assunto. Os temas mais solicitados eram essencialmente crimes, conflitos, desastres, acidentes,
actos das figuras públicas, cerimónias e desporto.(143) Ainda hoje, as rotinas produtivas de agências
noticiosas como a Lusa orientam a sua produção fotográfica neste mesmo sentido.
Apesar da crescente utilização das telefotos, não foi feita sobre elas uma avaliação
suficiente: "In the case of wirephoto, journalists' interpretive strategies accomplished little in the
practitioners."(144)
Práticas de construção imagética foram mais uma vez utilizadas devido às
imperfeições das telefotos. Estas, quando chegavam às redacções, passavam para as mãos de um
disponibilizadas on line.
A mudança que ocorreu entre os anos vinte/trinta não foi simples nem linear, mas
"(…) extremely complicated, with considerable meandering and much doubling back on a course
full of conflict and contraditions."(146) De um jornalismo que no século XIX e nos alvores do
presente século se centrava no texto impresso, assumindo as fotografias um papel de intrusas, passa-
se, nos anos trinta, ao aproveitamento do seu conteúdo: as fotos eram mais aproveitadas enquanto
informação e adquiriam maiores dimensões nas páginas, "(…) portraying action and detail."(147). As
bombardeamento aéreo a um navio (editada pelo New York Daily News, em 1937), beneficiando-se
das câmaras de pequeno formato. Não obstante, a inserção de sequências imagéticas dramáticas não
era desconhecida: em 1922, por exemplo, o Daily Post aproveitou uma série de imagens de um
filme para reproduzir uma sequência. Verifica-se, desta maneira, que não foram, em exclusivo, as
representação do nunca visto, é a da execução de Ruth Brown Snyder, na cadeira eléctrica, em Sing
Sing, pelo assassinato do marido. Foi também publicada pelo sensacionalista New York Daily News,
inicialmente denominado Illustrated Daily News. Essa foto mostra bem, aliás, como a foto-choque
Kevin Barnhurst e John Nerone dão alguns exemplos das mutações que o
fotojornalismo norte-americano dos anos trinta atravessou, em relação com as mudanças gráficas
dos jornais:
"In general, the scale of pictures increased over the period. Althought
larger photos appeared in the 1920s, the contrast between small and large shots
increased over the period. The shots were mostly long and medium range at first.
Closer shots (or cropping) got more frequent in the late 1920s, and longer shots
declined after 1936. These shifts were consonant with the emergence of modern
photojournalism, which valued events and emotive detail."(149)
Porém, em meados dos anos trinta, emerge uma tendência que nos dias de hoje é
publicação de fotos de acção isoladas, não posadas, mesmo nas páginas de informação noticiosa ou
até na primeira página, algo que até aí apenas se encontrava nas páginas de features, e que em parte
se pode explicar pela insuficiente velocidade de transmissão de telefotos, o que tornava complicado
o envio de mais de uma foto por assunto. Além disso, com a publicação de fotografias de maior
distância focal), com a diminuição do número de fotografias posadas e com o destaque dado à
fotografia em detrimento dos enrolados enfeites que constituíam os seus caixilhos (e a sua prisão), a
Pelos finais dos anos trinta, a proliferação de fotos, maiores e mostrando mais acção,
emoção e detalhe (que substituem as sequências de imagens), não evitou, contudo, que, já na altura,
e mais ainda com o tempo, parte dessas imagens fossem o que designamos por pseudo-fotografias-
promoters), ou fotografias-mediáticas, fotos do mesmo tipo das anteriores mas que retratam
situações que ocorreriam mesmo sem a presença de (foto)jornalistas.(151) São exemplos típicos as
photo opportunities nas ocasiões de Estado (como os apertos de mão encenados e frequentemente
repetidos para os repórteres de imagem) ou algumas das fotos que alimentam o mito do herói nas
sociedades modernas.
Nos anos trinta, recorria-se também, por vezes, à montagem de cartoons e outras
imagens com fotografias. Nos jornais norte-americanos, tal como nos europeus (especialmente nas
revistas ilustradas), começam ainda a aparecer, com relativa frequência, fotos humorísticas, como as
que apanham gaffes dos políticos.(152) A obtenção deste tipo de imagens é ainda hoje uma ambição
de muitos fotojornalistas, inclusive em agências como a Lusa, pois jornais e revistas costumam
publicá-las. (Fig. 26) Na imprensa mais sensacionalista, o poder subjectivo destas fotografias
Em 1933, a Vogue publicou a sua primeira foto a cores, e virá a ser uma das pioneiras
no caminho que conduzirá, nos dias de hoje, ao domínio da cor nas revistas. Nos anos trinta, as
revistas começaram também a contratar retratistas, num indício dos processos de estrelização das
configurações que o produto jornalístico adquire nos anos trinta nos EUA moldam ainda hoje o
jornal moderno (basta pensar no privilégio outorgado às fotos de acção únicas, às spot news).
Similarmente ao que aconteceu há 55/75 anos, a imprensa actual confronta-se por sua vez com
transformações. Mas estas transformações são já de carácter pós-moderno, num certo sentido, "pós-
televisivo".(154) Elas geram tensão, suscitam resistência, modificam e estimulam discursividades.
Agências
Noutro campo, de meados dos anos trinta aos anos quarenta, como se referiu, as
agências fotográficas e os serviços de fotonotícia das agências noticiosas sofrem grandes impulsos.
A agência fotográfica Black Star foi fundada em Nova Iorque, em 1935. No mesmo
ano, iniciou-se o serviço fotográfico da Associated Press (AP's Wirephoto Service), servindo cerca
de 40 dos 1340 associados. O serviço de telefoto desta agência foi inaugurado com a distribuição de
uma imagem da queda de um avião nas montanhas de Adirondack, no estado de Nova Iorque. Na
década de Quarenta, as agências noticiosas (news agencies) eram já uma das principais fontes de
apenas uma fotografia nítida e clara por assunto. Os temas mais solicitados eram essencialmente
crimes, conflitos, desastres, acidentes, actos das figuras públicas, cerimónias e desporto.
Em 1937, ano em que os principais jornais de Nova Iorque trazem, pela primeira vez,
surge a revista Look, que dura até 1972, e que, com a Life, fundada um ano antes por Henry Luce,
A fundação da Life, em 1936, por Henry Luce, seguida pela fundação da Look, deu
início à difusão massiva de revistas fotojornalísticas nos Estados Unidos. Depois de Berlim e de
Bourke-White, Eisenstaedt, Peter Stackpole (cujas fotografias da Golden Gate Bridge, em São
interiores sem iluminação artificial). Outros se lhes juntariam, como Carl Mydans (cujas fotos mais
Silk ou até Pierre Boulat, que colaborava com a revista a partir de Paris.
A Life pode ter sido uma grande escola de fotojornalismo. Apesar disto, nem sempre
a Life "acertava": Fritz Henle, um freelance que trabalhou para a revista, com a percepção correcta
dos tempos que se viviam empreendeu um projecto sobre a vida em Paris, em 1938, nas vésperas da
Segunda Guerra Mundial. A Life recusou a publicação do trabalho, que só veria a luz do dia no The
A Life, tal como a Look, preferia usar fotografias de grande nitidez e grande
profundidade de campo. Assim, os fotógrafos costumavam usar câmaras de grande formato e, para
flash que podia ser sincronizado com o disparador. Numa fase seguinte, recorriam ao multiple flash,
mais sofisticado e que permitia efeitos de luz menos duros. Mas esta forma de fotografar
brevemente veria o seu fim, por força das políticas de fotografia em interiores sem flash que Lorant
tinha implementado na Weekly Illustrated (que fundou em 1934) e na bem mais famosa Picture
Post. A naturalidade que emanava destas fotos levou a Life a adoptar o estilo, tendo mesmo, em
O primeiro número da Life, que saiu a 23 de Novembro de 1936, teve uma tiragem de
466 mil exemplares. Um ano mais tarde, a tiragem da revista ascendia já a um milhão e, em 72,
chegou a mais de oito milhões. Com a audiência que conquistou, foi possível à Life assegurar
confortáveis receitas publicitárias. Até à altura em que a inflação cresceu e as receitas se tornaram
foto-ensaio como o género mais prestigiante de fotojornalismo. Além disso, consagrou o projecto
ao nível das rotinas produtivas fotojornalísticas nas revistas ilustradas — os foto-ensaios, as grandes
foto-reportagens, podiam dar atenção aos detalhes porque antes de os reporteres partirem para o
podiam ser imediatamente realizadas, ficar a aguardar nova oportunidade ou nunca ser executados.
Surgida no ambiente do New Deal, com a América em crise de crescimento, para ser
esperança num futuro melhor. O lucro era vital. Uma das facetas do sucesso da Life, que chegou a
ter cerca de 40 milhões de leitores, foi, assim, a atenção que deu aos assuntos que afectavam
diariamente as pessoas comuns, que suscitavam a sua curiosidade, espicaçavam os sonhos e faziam
aspirar a uma vida melhor, tudo embrulhado num invólucro capitalista e patriótico. Todavia, a Life
também promoveu a divulgação da ciência e da arte. Era, sobretudo, uma revista familiar, que não
editava temas chocantes. Luis Gutiérrez Espada identifica-a com os seguintes factores ideológicos:
ética cristã, democracia paternalista, esperança num futuro melhor com o esforço de todos, trabalho
também não dava aos repórteres controlo sobre a edição do seu trabalho, algo que ainda hoje
preocupa muitos repórteres fotográficos e que, na Life, suscitou críticas de fotógrafos como o
"poeta" da imagem e perfeccionista Eugene Smith (1918-1978), cuja obra se desenrola sobretudo
dos anos quarenta aos anos setenta. A Life recorreu também substancialmente a agências como a
Magnum e a freelances.
funcionar, a ilusão de que a fotografia não pode fazer outra coisa senão reproduzir fielmente o real,
sem que se atente no ponto de vista ou noutros suportes de conotação, como Barthes referenciou,
como o texto que com a foto pode jogar, a truncagem ou a sintaxe. Mas é também uma outra escrita
—a fotojornalística— a realizar-se e a advogar-se. Repare-se nas palavras com que Henry Luce
apresentou a revista:
"[A Life surge] Para ver a vida; para ver o mundo, ser testemunha
ocular dos grandes acontecimentos, observar os rostos dos pobres e os gestos dos
orgulhosos; ver estranhas coisas — máquinas, exércitos, multidões, sombras na
selva e na lua; para ver o trabalho do homem — as suas pinturas, torres [edifícios] e
descobertas; para ver coisas a milhares de quilómetros, coisas escondidas atrás de
muros e no interior de quartos, coisas de que é perigoso aproximar-se; as mulheres
que os homens amam e muitas crianças; para ver e ter prazer em ver; para ver e
espantar-se; para ver e ser instruído".
Durante a Segunda Guerra Mundial, trabalhavam para a Life 670 pessoas em 320
partir dos anos sessenta não só o mercado publicitário americano foi sendo dominado pela televisão
como também subiram os preços do correio (recorde-se que a Life era muito vendida por
assinaturas), o que levou à suspensão da publicação semanal, em 1972. Ainda assim, em 1965, dois
anos antes da morte de Luce (um acontecimento que também poderá estar associado à queda da
revista), a Life venceu claramente a TV na cobertura das exéquias de Churchill e, nos anos finais,
para captar leitores, enveredou mesmo, em certos momentos, por alguns rasgos de yellow
journalism, ou, pelo menos, de jornalismo sensacionalista, fazendo reportagens sobre a Mafia e a
corrupção. Estas, porém, foram do desagrado dos leitores, que protestaram, pois afastavam-se dos
revista.
Quando, em 1978, a Life iniciou a publicação mensal, fê-lo já sem possuir um staff de
especializadas cresceu, o free-lancing surgiu como uma opção atraente de carreira para os
fotojornalistas. De qualquer modo, com o encerramento da Life, em 1972, morreu uma época de
ouro do fotojornalismo.
tirava, em 1957, cerca de 1,8 milhões de exemplares; dez anos mais tarde, situava-se em quase 1,4
a crise dos finais dos anos sessenta/princípios dos setenta, um certo número de foto-repórteres
então, o programa do New Deal, no âmbito do qual se desenvolve um plano de ajuda aos
agricultores em crise, desencadeado pela Resettlement Adminsitration (uma espécie de secretaria de
Estado que lidava com as reformas rurais), dirigida por Rexford Tugwell. Em 1935, este organismo
vai tomar outro nome, pelo qual também ficaria conhecido um vasto projecto fotodocumental que se
desenvolve no seu âmbito: Farm Security Administration. Este projecto fotográfico, realizado pelo
Farm Security Administration Photographic Corps, tornou-se uma arma importante para despertar
as consciências sociais, devido a algum sentido crítico e denunciante que, independentemente dos
obras que faziam abundante uso da fotografia como ilustração e como suporte de argumentos e de
análises económicas, como a American Economic Life, escrita em 1925 (nesta obra, um terço das
fotos eram de Hine). Por isso, nomeou o seu antigo aluno e colega Roy Stryker para o cargo de
director da Secção Histórica do organismo, com a missão de dirigir um vasto projecto fotográfico,
documentando, com visão histórica, as actividades do plano de apoio aos agricultores e a vida rural
americana.
conhecido por Farm Security Administration (FSA). Este projecto procurou, especificamente,
retratar os resultados das políticas do New Deal do Presidente Roosevelt: empréstimos a baixo juro
para compra de terra, desenvolvimento de estudos sobre preservação dos solos e criação de quintas
experimentais e de explorações comunitárias, que visavam dar emprego aos trabalhadores errantes.
outros fotógrafos mais ou menos conhecidos, como James Van Der Zee, que fotografou a subcultura
dos negos ricos na Nova Iorque dos anos vinte, projecto que Aaron Siskind (1903-) irá continuar,
alargando a documentação a todos os estratos sociais, de 1932 a 1950. O projecto FSA teve uma
exposições.
Na altura, a Administração dos Estados Unidos necessitava de distribuir ajudas
financeiras aos milhares de trabalhadores rurais afastados dos seus campos de cultivo, quer pela
esterelidade da "bacia do pó" dos estados centrais, quer devido à competição desencadeada pela
introdução em larga escala de práticas agrículas mecânicas. Além disso, muitos agricultores
trabalhavam uma terra que não lhes pertencia, descurando a conservação dos solos, o que implicou
pequenos exploradores, tinham sido reduzidos à mais extrema pobreza. Quando se dá o colapso do
stock exchange dos EUA, em 1929, a que se sucede uma crise económica mundial, cerca de oito
disseminaram-se como uma nuvem, especialmente pelos estados do Sul e do Sudoeste, evidenciando
vida na América profunda e rural, apesar da delicadeza da missão, que dependia de critérios
políticos. De qualquer modo, os fotógrafos do projecto souberam, de uma maneira geral, usar
expressivamente a fotografia, por vezes acentuando pontos de vista, abordagemn que se mostrou
importante para que a fotografia se tornasse de tal forma mobilizadora que conquistasse o receptor.
Em conformidade com Keim, são fotos possuidoras de um conteúdo social que ultrapassa a
descrição individual.(156)
Evans (1903-1975) (Fig. 27), Dorothea Lange (1895-1965) (Fig. 28), Russell Lee (1903-1986), Ben
Shahn (1898-1969), Carl Mydans (1907-) (que rapidamente sairia para a Life) e Arthur Rothsthein
(1915-1985). Depois ingressaram Marion Post Wolcott, Jack Delano, John Vachon, John Collier Jr.
e Gordon Parks (1949-), um afro-americano que esteve no FSA como estagiário e que fotografará a
vida dos negros na sociedade americana. Há ainda a considerar os casos de Theo Jung e Paul
Carter, que estiveram pouquíssimo tempo no FSA, no seu início. Em parte, a imagem que
possuímos dos "anos negros" da América é a imagem transmitida por essa mão cheia de fotógrafos.
especialmente as obras de Riis e de Hine (o mesmo que ele acabou por não contratar). Para tratar
Seguidamente, contratou outro fotógrafo, Carl Mydans, que pertencia, na altura, a um diferente
departamento governamental. Só depois se lhes juntou Walker Evans.
"missão". Dava também a conhecer aos fotógrafos o enquadramento socio-económico das mesmas.
autoria (estilo) deveriam conciliar-se com uma profunda ambição documental. Era assim traduzida
a qualidade. E eram assim construídos sentidos, pela pose, pela disposição e simbologia dos
objectos e do vestuário, pelo contraste figura-fundo, pelas texturas, pelos contrastes claro-escuro,
pela utilização expressiva da luz, pelo texto que acompanhava as fotos e pelos suporte de difusão.
Era com base num projecto que os fotógrafos partiam para o seu trabalho, por vezes
rádio à noite, ir à Igreja, ir a clubes e salas de jogo, fotografar encontros em determinados espaços
das ruas, etc.; curiosamente, apenas uma rúbrica do documento fazia referência ao principal
problema da época: "Ver os efeitos da depressão nas pequenas cidades dos Estados Unidos"). Por
vezes, pedia-se-lhes também, com fins publicitários, que fotografassem os projectos de recuperação
e reforma agrícolas financiados pelo Estado. Outras vezes, era-lhes solicitada a cobertura de uma
região devastada por uma calamidade natural ou os efeitos do clima sobre a agricultura. Também
não era raro Stryker enviar aos fotógrafos cartas redifinidoras de objectivos ou que avaliavam o
interesse de documentos e fotografias já enviados para Washington. Para Dorothea Lange, que
raramente ia à capital e desenvolvia o seu trabalho no Leste dos EUA, essas cartas eram vitais. Só
enveredando por uma fotografia com um ponto de vista algo denunciante que lhes acarretou alguns
problemas com Striker, Russell Lee (1903-1986) foi talvez o principal "documentador" do FSA e o
que teve menos problemas com o coordenador. Profissional face a um objectivo preciso —
documentar sem estados de ânimo—, ele assume, desta maneira, uma perspectiva do
fotodocumentalismo que ainda hoje é, no campo fotojornalístico, a dominante. Por vezes, porém,
parece-nos detectar uma certa exploração das situações pelo lado positivo.
aspectos da vida social na empobrecida América profunda. A sua atenção não se concentra
exclusivamente nos sujeitos e menos ainda na dramaticidade de uma expressão particular, mas na
decoração, nas habitações (exterior e interior), na arquitectura, nos móveis e nos acessórios (como o
assuntos estáticos.
internos e pressões políticas. Por exemplo, em 1936 houve enorme controvérsia sobre a veracidade
dos documentos fotográficos do FSA, uma vez que tinha havido lugar a práticas de reconstrução
ficcional da cena captada — Arthur Rothstein fotografou, nesse ano, um crâneo de boi
embranquecido pelo sol no local estéril e seco onde o tinha encontrado; depois, colocou o mesmo
crâneo três metros ao lado, sobre terra coberta de relva, e fotografou-o novamente. Os problemas
surgiram quando um jornal de província apresentou, lado a lado, as duas fotografias, tendo o debate
alargado-se rapidamente à imprensa nacional. O problema —se é que existe— é que Rothstein
fotografava com elevado sentido simbólico: algumas das suas fotografias de famílias, por exemplo,
Segundo William Scott (1973), a atitude documental da década de trinta, bem patente
no FSA, influenciou numerosos aspectos da vida cultural norte-americana. Para ele, essa atitude
traduzia-se em apresentar ou representar factos verídicos de forma atraente e credível. Ora, o que
acontece é que se por um lado um número enorme de obras da década fazia apelo à apresentação
directa de factos aparentemente irrefutáveis, ansiedade satisfeita pela fotografia, por outro lado a
fotografia servia para reivindicar reformas sociais, acentuando pontos de vista e subjectivdades,
como já o tinha feito Riis e ainda o fazia Hine, o que não deixa de ser um pouco paradoxal.
foto-registo animada pela verosimilitude que alguns fotógrafos, como Evans e Lange, por vezes
Apesar de tudo, o que se revela nas fotografias do FSA é, julgamos, um retrato algo
estereotipado e simplificador da América profunda e dos seus habitantes. Nas fotos, estes
aparentam quase sempre tranquilidade, esperança, calma, resolução, nobreza e heroicidade. Mas
sabe-se que houve muitos momentos de cólera e desespero na América dos anos trinta. Onde estão,
pois, os suicídios? Os conflitos? No FSA não aparecem, porque, afinal, o Farm Security
que, por isso, pretendeu divulgar uma versão estereotipada e positiva do homem rural: herói patriota
e puro, que luta nobre e resolutamente contra as adversidades, solidário com os seus compatriotas e
temente a Deus. É um pouco o retrato do "herói rural" enquanto um estereótipo que perdura na
sociedade americana.(158) Por isso, o FSA não satizfaz totalmente a nossa ideia de "testemunho",
É interessante notar que, embora por outras razões, Dorothea Lange também pôs o
assento tónico nos problemas da visão estereotipada da América que o Farm Security
Administration poderia promover. Ela chegou a queixar-se que a sua foto "Mãe Migrante",
provavelmente a mais difundida do FSA e a que, de algum modo, é a imagem do projecto, se havia
transformado num estereótipo, num elemento de elevado valor simbólico, capaz de ofuscar o resto
do seu trabalho. Ela própria acentuava que procurava representar o que fotografava como parte do
seu ambiente.(159)
De qualquer modo, muitas das fotos do projecto surgiram em revistas como a Life e a
Look, tal como em publicações socio-reformistas, como a Survey Graphic. Outras foram reunidas
em livros colectivos ou consagrados a um determinado fotógrafo. Mas a maioria acabou por ser
publicada nos jornais, já que se tratava de uma fotografia humanista mas feita para grandes
audiências, para a difusão mediática, acompanhada de textos cuja elaboração se inscrevia também
no projecto. Tal dá uma ideia mais exacta da importância que o FSA teve para o desenvolvimento
da fotografia e, mais precisamente, do fotodocumentalismo. Pode dizer-se que, por exemplo, na Life
o trabalho de projecto foi influenciado pelas rotinas praticadas no Farm Security Administration e
que importantes projectos fotodocumentais da actualidade, como os de Salgado, ainda vão beber ao
Congresso, são constituídos por cerca de 70 mil tiragens e 170 mil negativos, notáveis pela sua
unidade. Cem mil outras fotografias foram censuradas por Striker, que perfurou os negativos, no
que acabou por ser, quanto a nós, o factor mais negativo do projecto. Elas eram, provavelmente, as
fotos do desespero, mas, mesmo na sua falta, as que sobraram revelaram suficientemente à América
"verdadeiro" aspecto dos Estados Unidos. Entre os seus fotógrafos salientou-se Sid Grossman.
Aaron Siskind, por seu turno, foi, como já se referiu, um fotógrafo documental, pelo
menos na primeira fase da sua carreira. Tal como os fotógrafos do FSA, embora numa dimensão
diferente, representa o que poderíamos considerar como a corrente documental que se opunha à veia
seduzir pelo trabalho não censurado da Liga Fotográfica, tematicamente semelhante ao do FSA. O
seu objectivo principal foi, assim, contribuir para consciencializar os americanos para as condições
de vida de alguns dos seus concidadãos. Quando organizou o Feature Group, uma espécie de escola
fotodocumental, acedeu à ideia de um repórter negro e empreendeu, a partir de 1932, um vasto
projecto fotodocumental sobre as diferentes facetas das relações sociais em Harlem, de que resultou
e conquista da confiança dos sujeitos a fotografar, de maneira a permitir tanto quanto possível a
Europa para os Estados Unidos, a partir dos anos quarenta as culturas fotojornalísticas europeia e
americana convergem mais. Este fenómeno deve-se a factores como (a) o advento da telefoto, em
1935, (b) a emigração de fotojornalistas e editores europeus, fugidos a Hitler, para os EUA, (c) a
cobertura "conjunta" da Segunda Guerra Mundial e dos conflitos posteriores por fotojornalistas de
todo o mundo, (d) a crescente transnacionalização das culturas e da economia e (e) o poderio das
abastecê-lo, pelo menos até meados dos anos setenta, em que se dá a reacção dos Países Não
Alinhados.(160)
elaborando um documento que viria a ter uma mais-valia histórica acumulada devido ao genocídio
já adquirido, não deixou de ser problemática. De facto, tal como aconteceu com as imagens da
Guerra da Crimeia obtidas por Fenton ou com as fotografias da Grande Guerra, a fotografia
"jornalística" da Segunda Guerra Mundial foi usada com intuitos manipulatórios, desinformativos,
verdadeira face do conflito (os mortos e os mutilados) e encorajou a publicação as fotografias que
apoiavam o esforço de guerra, como os "heróicos" raides aéreos diurnos aliados ou o ambiente
sua boneca, "(…) pra que os receptores se sintan culpables —a transferencia de culpa é un dos
beligerantes pretenderam fazer sobre a fotografia de combate. Nos Estados Unidos, por exemplo,
várias agências noticiosas, como a International News Photos, a Acme News Pictures e a Associated
Press, tinham planos para cobrir a previsível guerra na Europa.(163) Mas quando a guerra começou,
na Polónia, o Governo alemão impediu que correspondentes estrangeiros visitassem a frente. O
Propaganda Kompagnie do Exército alemão ou então censurado pelos alemães. Do lado aliado, os
franceses e britânicos implementaram também um serviço de censura nesta fase da guerra, mas a
norte-americana foi principalmente a de uma formidável força militar alemã que varria literalmente
a resistência polaca, sendo capaz de acções rápidas e decisivas. Os leitores podiam observar
fotografias de tropas alemãs marchando ao longo das estradas, atravessando rios, construindo
O segundo tema mais tratado foi o de Hitler e o seu estado-maior e só em terceiro lugar surgia a
cobertura de guerra vista do lado polaco, em que se mostram, por exemplo, as caras de
contentamento dos polacos após a notícia da declaração de guerra da França e do Reino Unido à
Alemanha, crianças no meio das ruínas com um olhar confuso e angustiado, mulheres e crianças
polacas transportando equipamento militar para a frente e soldados polacos avançando para a
batalha. (Ver, por exemplo: Sherer, 1984) Aliás, num artigo publicado pouco tempo após o início
das hostilidades, a Life assegurava que o objectivo principal das fotografias censuradas pelos
alemães era não conquistar simpatias mas sim criar a ideia de poderio militar alemão. Num estudo
por nós elaborado pode constatar-se, porém, que em Portugal a cobertura da imprensa, pelo menos
literal. "O endoutrinamento dos próprios fotógrafos era tão forte que eles próprios estavam
persuadidos de estarem a lutar por uma causa justa ao censurarem-se a si mesmos, fotografando
apenas cenas que não pareciam desfavoráveis aos países que representavam."(164) É de novo, em
muitos casos (como nas revistas da "guerra ilustrada"), o retrato de um combate heróico, limpo,
aventureiro, épico, como já Fenton havia feito na Crimeia. A fotografia era, pois, um factor
importante para animar a "moral". Em alguns casos, chegou-se mesmo a programar a altura de
divulgação das fotos de forma a concorrer para um envolvimento pré-definido dos receptores.(165) As
fotos que testemunhavam o preço caro e as atrocidades da guerra, regra geral, apenas foram vistas
no fim do conflito, mesmo que os fotógrafos —como os do Government Issue— as tivessem obtido
em acção. Depois das hostilidades, finalmente, as fotos difundidas dos prisioneiros que regressavam
apresentaram uma imagem selectiva da guerra que glorificava a luta do bem contra o mal(166),
identificando-se o fotógrafo com uma causa justa colectiva ("a união faz a força") que o levava a
problemas logísticos para os fotojornalistas, uma vez que não se tratava de uma guerra concentrada,
completamente do poder das fotografias, em certas ocasiões maior do que o do texto. Os "(…)
journalists at first avoided the technological adaptation (…) until the events of Second World War
reporters'— had become 'photojournalists".(168) Foi também devido à guerra que os fotojornalistas se
tornaram num "(…) experienced, highly organized body of recognized status"(169), tendo mesmo
formado, nos EUA, a sua própria organização profissional, em 1945. Por esta altura, os
A telefoto, por seu turno, deu ainda à cobertura fotojornalística da II Guerra novas
possibilidades. Com ela, "Ábrese prá foto-xornalismo o período do seu batismo de lume, do seu
paso a cabaleiro da espada, na procura da sua patente de imprescindible. Ábrese, prá foto, a
guerra ó vivo."(171)
que para todas as frentes fossem enviados fotojornalistas. A telefoto permitia a rapidez de
transmissão, embora também levasse à repetição de imagens entre os jornais e revistas clientes.(172)
exemplo, foi dito que a premiada fotografia de Rosenthal dos marines içando a bandeira americana
em Iwo Jima teria sido encenada.(173) Para Goldberg, este tipo de questões só mostra que os padrões
de fidelidade são diferentes e que "(…) truthfulness was as much a question of showing people how
war could look as of reproducing what chance puts in the lens's way".(174)
Como já se referiu, muitos foram os fotógrafos que cobriram a guerra. Entre eles
pode destacar-se Capa, principalmente pelo seu trabalho durante a invasão da Normandia, em 1944
(que viria a ser estragado em laboratório, mas não, ao contrário do que se diz, por Larry Burrows,
outro grande fotógrafo de guerra, que se revelará no Vietname), e pela cobertura do avanço das
tropas aliadas rumo à Alemanha; mas também Margaret Bourke-White (frente de Moscovo, raides
aéreos, libertação dos campos de concentração); George Rodger (home front); Cecil Beaton
(repórter oficial da RAF, que fotografa o soldado só, alimentando o mito do herói, mas também
evidenciando, pela solidão, a desgraça da guerra, capaz de apagar existências); Edward Steichen
(que cobre funcionalmente a guerra nas frentes Ocidental e do Pacífico, de forma "limpa" e
distanciada); Eugene Smith (cujas fotografias bélicas da frente do Pacífico são eivadas de um
lirismo que sensibiliza e engrandece o esforço pessoal mas também a solidariedade humana na
desgraça, como na foto em que um marine pega num bebé ferido e abandonado, depois de um
ataque); Ernest Haas (que se concentra nos resultados da guerra, como nas fotos das mulheres
Leste europeu em ruínas); Yevgeny Chaldey (o Capa soviético, que acompanha a "Grande Guerra
Patriótica" desde o seu início, coroando o seu trabalho com uma das mais memoráveis fotos da
guerra: soldados russos no Reichstag, com a bandeira vermelha em primeiro plano); e Erich Lessing
(que abandonará o Plano Marshall e a fotografia documental para se dedicar à reportagem). Estes
são, de facto, alguns dos nomes —alguns já referenciados, outros dos quais ainda se irá falar— que
se podem citar enquanto referências na cobertura de um conflito tão alargado quanto a Segunda
Guerra. Cartier-Bresson, internado num campo de concentração alemão durante três anos, terá
direito a uma "exposição póstuma" no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, mas foi libertado a
dizê-lo— para o triunfo ideológico dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, conotado com a
liberdade e a democracia política e também com a instauração de uma nova ordem internacional.
CAPÍTULO X
O PÓS-GUERRA
Após a Segunda Guerra Mundial, cedo se começaram a adivinhar os contornos da
Guerra Fria. A Cortina-de-Ferro, como lhe chamou Churchill, erguia-se na Europa, e as duas
superpotências começavam a disputar o domínio do mundo, como se viria a verificar nas guerras da
Vietname. Pelo meio, dava-se a descolonização, mais ou menos violenta, como nos casos das
colónias portuguesas. Finalmente, os anos setenta assistiram à queda das ditaduras ibéricas e ao
As tendências que actualmente são visíveis na fotografia têm origem, como veremos,
em três grandes movimentos que se estabeleceram durante os anos cinquenta: (1) a fotografia
humanista; (2) a fotografia de "livre expressão"; e (3) a fotografia como "verdade interior" do
fotógrafo. Em torno deste último movimento vai debater-se, a partir dos finais dos anos sessenta,
assumida.
o seu expoente na exposição The Family of Man (1955), da qual adiante falaremos mais
pormenorizadamente.
ou em Man Ray, será coroada nos trabalhos experimentais de, entre outros, Aaron Siskind ou Bill
Brandt, na sua fase abstracta. O dinamismo libertador deste movimento conduzirá a uma hierarquia
de valores entre a foto como espelho do real, a foto como interpretação pessoal da realidade e a foto
como pura criação, sendo esta última a que animava os fotógrafos da "livre expressão". Mas esta
fotógrafo, pode-se inscrever Minor White (1908-1976), que, em 1952, fundou, com Walter Chappell
contribuição deste último movimento para o entendimento que temos hoje da fotografia é, talvez, o
de que ela é sempre, num certo sentido, uma testemunha da vida interior do fotógrafo (dos seus
gostos, das suas inclinações, etc.). Walker Evans traduziu bem esta perspectiva no livro que deu à
estampa em 1966, que se chamava precisamente Messages From the Interior. Se bem que não se
possam estabelecer fronteiras rígidas entre esses movimentos ou até entre as ideias da "foto-
testemunha" e da "foto-subjectiva", todos eles, pelo debate que trouxeram, foram proveitosos para o
fotográficas, a par dos serviços fotográficos das agências de notícias, foram crescendo em
documental vai encontar novas e mais profundas formas de expressão, devido aos debates em curso
também originou uma certa banalização do produto fotojornalístico e a produção "em série" de fotos
de fait-divers, que pouco mais permitem ao observador do que ver e surpreender-se.(177) Estas duas
linhas de evolução contraditórias virão a coexistir até aos nossos dias, mas após a junção de uma
institucional, mas também a foto-tipo passe, que ganha relevo na imprensa, sobretudo após os anos
oitenta e noventa, época que marca o triunfo do design global, por vezes sobre o conteúdo,
durante a Guerra Fria. Susan Sontag, em On Photography, chega a dizer que as fotografias da
Guerra da Coreia que mostravam o rosto humano do inimigo não foram publicadas pelos jornais
americanos. Podemos mesmo afirmar que as fotos foram usadas frequentemente de forma
O final da década de quarenta e a década de cinquenta foi uma época de ruptura das
se procura fazer um discurso mais ou menos desenvolvido e compreensivo do assunto. Mas dar-se
significa que um valor estético não lhe possa conferir uma mais valia: a partir de meados dos anos
cinquenta, aliás, nota-se uma importante evolução estética em alguns fotógrafos "da imprensa" —
documentalistas ou fotojornalistas tout court— que cada vez mais fazem confundir a sua obra com a
arte e a expressão. A nível técnico, é de salientar a disseminação do uso das máquinas de reflex
directo.
entendido, mesmo sem reflexão, como o correcto e o primeiro passo do profissionalismo, o pós-
como o da opção Magnum, protagoniza uma existência algo marginal. A exemplificá-lo, Eugene
Smith, em 1955, abandonará a Life, descontente pela utilização descontextualizada que, segundo ele,
a revista fazia das suas fotografias, mais precisamente, desagradado com as alegadas alterações de
sentido impostas às suas fotografias durante a edição (embora, claro, se possa dizer que a
obra, carimba no verso das fotos que estas não poderiam ser reproduzidas se não respeitassem o
espírito da legenda por ele escrita. E são os fotógrafos-autores que se tornam conhecidos: na lista
ideológica e culturalmente bem americana dos "dez melhores do mundo" de 1958, quatro fotógrafos
adquirem estatuto de vedetas: Cartier-Bresson, Ernst Haas (1921-1986), Eugene Smith e Alfred
Eisenstaedt.
satisfação das necessidades dos diários, acentua o fotojornalismo de velocidade. Eco histórico desta
velocidade/actualidade, nas agências e nos jornais, vai tornando-se, cada vez mais, um critério de
valor-notícia.
e a dinâmica da produção fotojornalística leva, por outro lado, a que a Convenção de Berna-
Bruxelas, no seu artigo 6, bis, alínea 1, reconhecesse formalmente os direitos de autor dos
fotógrafos, ao estabelecer que a fotografia não deveria ser deformada, mutilada ou objecto de outra
qualquer modificação que atentasse contra a honra e reputação do fotógrafo. Era, ao fim e ao cabo,
o reconhecimento de uma velha reivindicação que fotógrafos como os que fundaram a Magnum
Pelo final dos anos cinquenta, começaram a notar-se os primeiros sinais de crise nas
investimentos feitos no mercado publicitário televisivo em prejuízo das revistas como também à
acção e emoção superiores do espectáculo televisivo. A Collier's encerra em 1957; a Picture Post
no ano seguinte. Quinze anos passarão e será a vez das gigantes Look e Life.
A emigração para os Estados Unidos dos fotógrafos que haviam feito nome na
concorrência no fotojornalismo, cujas práticas e culturas se vão miscigenando. No final dos anos
agências a adaptar-se a esta nova exigência do mercado. O movimento prosseguirá nos anos
cinquenta e sessenta, com o surgimento e/ou evolução de revistas como a Picture Post, a Paris-
Match, a Fortune, a Look, a Réalités e a Der Spiegel. A concorrência aumenta, mas, de qualquer
modo, e como sempre, a favor da obtenção do scoop fotojornalístico joga a sorte e a arte do
procedimento: estar no momento certo, o tempo certo no sítio certo: é assim que a erupção vulcânica
na Ilha Terceira, nos Açores, é fotografada apenas por um fotógrafo da Paris-Match, Guerard Gèry,
fotojornalismo português.
Por outro lado, a partir do meio do século alguns fotógrafos começaram a abrir, com
os seus trabalhos, novos espaços para a liberdade criativa em fotografia. Basta salientar Les
Américains, de Robert Frank (1958). O estatuto económico e social dos fotojornalistas começa
começam a revivindicar a propriedade dos negativos e um maior controle sobre a edição do seu
trabalho.
como a Magnum e o estatuto de freelances que alguns vão preferir possibilitarão também uma maior
liberdade de criação e actuação. Tal permitirá, por seu turno, alguma projecção do projecto
fotográfico independente a médio e longo prazo. O caso de Eugene Smith, que, com grande
prejuízo económico, abandonou a Life, em 1954, e viria a abandonar a própria Magnum, é
sintomático e inscreve-se nessa "cruzada" pela busca de formas de expressão fotográfica mais
profundas que alguns fotógrafos iniciaram (Smith veio a passar quase vinte anos na obscuridade,
trabalhando sobre a cidade de Pittsburgh, até à realização de Minamata). David Douglas Duncan
também romperá com a Life, em 1955, para se tornar freelance, publicar livros e desenvolver um
projecto intimista sobre a vida de Picasso, na casa do pintor, em Vauvenargus. A isto acresce o
impacto do livro de Cartier-Bresson The Decisive Moment (1952). Ele é tal que contribui para
elevar um certo fotojornalismo à categoria de arte. A actividade irá, assim, expor-se mais e ser
estudada com maior rigor e sistematicidade, tendo chamado a atenção dos críticos e dos académicos.
acontecimento de interesse fotojornalístico e desviando o foco de atenção das pessoas (Fig. 29),
empresas e os subúrbios das grandes cidades. A Fortune e o trabalho paradigmático que Dan
Weiner realizou para essa revista até ao ano da sua morte, em 1959, são exemplares: Weiner, dentro
do espírito da candid photography, consegue representar no espaço fotográfico o que ele parece
prateleiras de um supermercado.
Entre as agências noticiosas com serviço de fotonotícia inicia-se, nos anos cinquenta,
uma era de intensa competição: a United Press International (UPI), por exemplo, surgiu como um
Hearst's International News Service e da ACME Photo Agency. Começa então uma era de intensa
Durante a Guerra Fria, os news media foram também palco das lutas político-
ideológicas, mas igualmente surgiram como o "quarto do poder"(179), isto é, como o local onde se
joga grande parte das guerras políticas, mesmo ao nível interno. No Leste, as fotografias dos líderes
são reproduzidas muito ampliadas enquanto os dirigentes caídos em desgraça são apagados das
fotografias oficiais. Noutros casos, colocam-se pessoas nas fotos, como Estaline a falar com Lenine,
pouco antes da morte deste. No Ocidente, entre vários casos conhecidos, em 1951 o senador Millard
Tydings perde o lugar provavelmente devido à difusão de uma fotografia truncada em que se via
Tydings a conversar com o líder comunista americano, Earl Brownder (é a ideia da objectividade,
veracidade e realismo da imagem fotográfica a funcionar para o senso comum); e um jornal tão
"insuspeito" como o The New York Times não se coibiu, a 5 de Outubro de 1969, de seleccionar de
um álbum de David Douglas Duncan as fotografias em que Nixon surgia com as piores expressões
para minar a campanha republicana à presidência dos EUA. Do mesmo modo, o Paris Match
publicou, em Junho de 1966, uma foto-reportagem com fotografias encenadas sobre o alegado
regresso do nazismo à antiga República Federal da Alemanha.(180) Pelo que se vê, a fotografia
influencia e propicia crenças, por vezes substituindo mesmo o consumo das crenças tradicionais.(181)
que faz sonhar, (b) das revistas eróticas "de qualidade", que exploram simultaneamente o desejo
sexual e a promoção social, como a Playboy (1953), de Hugh Hefner, (c) das revistas ilustradas
especializadas em moda, decoração, electrónica e fotografia, entre outros temas (que, em muitos
casos, sobreviverão, apesar da concorrência da televisão, como a Photo, apesar de se notar uma
uma certa vendetta social. A imprensa de escândalos e a imprensa cor-de-rosa vão fazer surgir, nos
célebres após a morte da Princesa Diana, que se servem dos mais variados expedientes para obter
Por outro lado, estamos convencidos que a aparição de todos esses tipos de imprensa
institiucional), que veio a contaminar os jornais e revistas "de qualidade", bem como para (b) o
descontextualizante?— da acção) e para (c) o recurso a técnicas de estúdio, mesmo no campo do que
fotojornalistas e, de uma forma geral, o meio jornalístico, votavam à profissão de foto-repórter, mas
também que havia a necessidade de espaços que propiciassem a reflexão em torno da foto-press. As
categorias premiadas, além da foto do ano (repare-se no valor do instantâneo, da fotografia única),
Features.
Apesar do renome desse grande concurso, por uma observação breve deduz-se que
grande parte das fotografias premiadas com o título de "foto do ano" se relacionam com a violência
bélica, mas que outros tipos de representações da violência estão ausentes: os crimes comuns, os
suicídios, a pobreza ou a violência nos subúrbios. Parece verificar-se que há uma violência que
colhe frutos editoriais e outra que não. Assim, podemos concluir que as políticas editoriais e de
o WPP, em parte, podem reflectir uma certa interiorização cultural-profissional desses padrões
editoriais e dessas políticas de empresa, privilegiando-os. Além disso, a similiaridade das "fotos do
ano", pelo menos temática, mas também nos conteúdos (veja-se, por exemplo, a valorização das
da sua transculturalização, até porque as fotos são realizadas por fotógrafos de vários países.
World Press Photo— alguma similitude nos enquadramentos, nos pontos de vista e nas abordagens,
coisas já não são assim). O sexo, tabú que alguma imprensa tem começado a explorar de há alguns
anos para cá como factor susceptível de elevar as audiências —sobretudo por escrito, mas, por
vezes, com imagens—, também está estranhamente ausente do World Press Photo. É, aliás, um
pouco estranho que o sexo seja tratado nas sociedades ocidentais com maior pudor do que a
vida sexual de algumas figuras públicas, mas as perversões são ainda um tema proibido.
Neste contexto, dos anos vinte aos anos setenta pode estabelecer-se uma relação entre Sander, que
publicou Antlitz der Zeit, em 1929, Germaine Krull (Cent fois Paris, 1929), Erich Solomon
(Beruhmte zeitgenossen im unbewachten augenbliken, 1931), Brassaï, (Paris de nuit, 1933), Weegee
(Naked City, 1936), Evans e Agee (Let Us Now Praise Famous Men, 1941), Henri Cartier-Bresson
(Images à la sauvette — The Decisive Moment, na versão anglo-americana, 1952), William Klein
(New York, 1956), Robert Frank (Les Américans, 1958) e Lee Friedlander (Self-Portait, 1970).
linha da The Family of Man. Esse termo apareceu, em 1966, sob impulso do irmão de Robert Capa,
Cornell Capa (1918-), também ele da Magnum. Cornell Capa fundará, um ano depois, o
International Center of Photography, que organizou o referido certame. Pela primeira vez, Bishof,
Kertész, Capa, Leonard Freed, Dan Weiner e David "Chim" Seymour foram reagrupados numa
Parks, Eugene Smith, Hiroshi Hamaya, Marc Riboud, Ernst Haas, Bruce Davidson e Roman
Vishniac. Estes nomes reuniram-se aos primeiros enquanto nomes relevantes da tradição fotográfica
humanística.
A emergência de várias agências fotográficas, que, em alguns casos, também se
estilística e para a aquisição de um estatuto de natureza informativa que se nota em grande parte da
fotografia de imprensa contemporânea (e que, devido à credibilidade de que esta goza, facilita a
manipulação através, por exemplo, de fotos truncadas). Todavia, a esta linha evolutiva há que
contrapor a reacção das agências e outros órgãos de comunicação social que cultivam o
Os fotógrafos
Mundial, uma mão-cheia de fotógrafos de grande valor revelou-se nos tempos conturbados da
guerra e do pós-guerra, até que, por alturas da eclosão do conflito no Vietname, se pode falar de uma
nova revolução no fotojornalismo. Entre estes fotógrafos avultam, por exemplo, os nomes de
Eugene Smith (Fig. 30), Werner Bichof (1916-1954) (Fig. 31), Bruce Davidson (1933-), Tony Ray-
Jones (1941-1972), William Klein (1928-), Elliott Erwitt (1928-) (Fig. 32), Marc Riboud (1923-)
(Fig. 33) ou Garry Winogrand (1928-1984). E, num campo que se situa entre o fotodocumentalismo
Eugene Smith começou a fotografar em 1938, ano em que ingressa na agência Black
Star, onde permaneceu até 1943. Nos anos da Segunda Guerra Mundial, fotografou as operações no
Pacífio para as revistas Flying e Life, sendo ferido com gravidade. Optando pelo que podemos
considerar uma fotografia moral, ele tornou-se depois num dos grandes expoentes do foto-ensaio,
que usou como um género capaz de dar expressão significativa à experiência humana.
Realmente, a vida e a obra de Eugene Smith são tão indissociáveis como modelares
para o fotojornalismo moderno. A sua educação católica fê-lo fazer da fotografia uma arma para a
remissão dos pecados do mundo, enquanto despertadora das "boas consciências", mesmo na sua
produção de guerra. Chegou a ingressar na Magnum, em 1955, uma agência conhecida pela
exigência que põe no controle dos fotógrafos sobre a edição dos seus trabalhos, mas demitiu-se da
mesma três anos mais tarde para se tornar fotógrafo colaborador da cooperativa. Preferiu trabalhar
como freelance.
carácter em fotografias cheias de força expressiva e rigorosismo formal, que roçam o lirismo, a
poesia, o drama, e que evidenciam o perfeccionismo técnico do seu autor. Cada um dos seus
dentro dos seus contextos. A grande força da sua fotografia talvez tenha mesmo a ver com a
presença forte e com a dignidade com que conseguia representar os seres humanos, mesmo em
Foi na Life —onde se manteve até 1954— que Smith se tornou notado. A vida do dr.
parteira" (Nurse Midwife), de 1951, manifestou-se contra os preconceitos racistas na Carolina do Sul
Callen. Para realizar "Aldeia Espanhola" (Spanish Village), em 1950, viveu durante um ano na
povoação de Deleitosa. Neste trabalho, apesar de privilegiar a beleza clássica, consegue erigir uma
crítica demolidora do franquismo. Spanish Village, porém, é interessante por outro motivo:
recentemente, alguns dos habitantes da aldeia revelaram que Smith teria pago a alguns deles para
posarem, encenando situações habituais da vida da localidade. Um dos eventos que Smith
fotografou foi o velório de um homem que, apesar de extremamente doente, ainda estaria vivo
quando foi "velado". A foto seleccionada do velório para o foto-ensaio, não obstante a sua beleza,
devida aos fortes, mas equilibrados, contrastes tonais, desencadeou um processo que demonstra a
força da imagem fotográfica: uma das raparigas presentes, de elevada beleza, veio a receber pedidos
de casamento de todo o mundo, tendo de tal modo a sua vida simples sido afectada que há dois ou
esgotou e lhe trouxe graves problemas financeiros. Em 1957, instala-se num atelier próximo do
Mercado das Flores, em Manhattan, fotografando o que observa da janela. Finalmente, depois de
vários outros trabalhos, entre 1971 e 1975 Eugene Smith desenvolveu o seu último grande projecto,
Minamata. As suas fotografias da vida de uma aldeia piscatória japonesa vítima da poluição
criminosa por mercúrio, entre as quais a impressionante Tomoko [uma menina deficiente devido às
alterações genéticas motivadas pela acumulação de mercúrio] Banhada Pela Sua Mãe (1972),
transformaram-se num dos manifestos ecológios e humanistas que mais difundido foi no planeta,
Smith vivia frequentemente com as pessoas e como as pessoas que fotografava, para
delas melhor se poder aproximar, para haver menos reacções à sua presença e para conseguir
perceber a sua cultura e a sua história, e, assim, também as suas mundivivências e mundividências.
Este método de "anulação" do fotógrafo é, aliás, frequente nos documentalistas. Salgado, por
exemplo, tenta praticá-lo, tendo já sido visto, em Portugal, a fazer uma peregrinação a pé a Fátima
para melhor fotografar os peregrinos. As expressivas fotografias de Eugene Smith, tal como as de
Salgado, anos mais tarde, mostram as pequenas epopeias do quotidiano dos desconhecidos de uma
O suíço Werner Bischof, que envereda pelo fotojornalismo em 1945, altura em que
faz um grande trabalho de reportagem pelos países destruídos pela guerra, foi um explorador do
contexto e da beleza: através do belo e do culto da luz fez compreender o sofrimento do outro de
forma pouco brutal. Humanista, a sua fotografia tem o condão de colocar o observador ao lado dos
deserdados do mundo. O seu trabalho foi interrompido muito cedo, com uma morte "em serviço",
nos Andes peruanos, em 1954, quando se dedicava a fotografar a América do Sul, após ter
Entre 1951 e 1952 Bischof realizou aquela que é provavelmente a sua reportagem
mais célebre: Fome na Índia. Como Smith e, mais tarde, como Salgado fará, Bischof conseguia
de Werner Bischof reside, em grande medida, na clareza e na sensibilidade que enformam o seu
fotojornalismo social, ou, talvez mais precisamente, para o documentalismo social, em projectos de
longa duração, nos quais a efemeridade dos instantes se atenua face à perenidade da vida
representada nas várias imagens de uma foto-reportagem. Os instantes "apreendidos" nas suas foto,
porém, traduzem uma atenção selectiva, uma grande capacidade de análise do real social, que
desemboca no detalhe significativo: as mãos, o palhaço que dá uma passa no seu cigarro, os
namorados num banco. Sem chocar, Davidson colocava-se ao lado dos desprotegidos ou
marginalizados, como os negros americanos (Black Americans, 1962-63), tratando os seus sujeitos
inglesa. Na sua breve obra, desenvolvida nos anos sessenta, e por vezes carregada de ironia e de
humor britânico, ele representa o espírito e a mentalidade dos ingleses pela atenção que dá aos seus
comportamentos individuais e colectivos, bem como aos gestos dos sujeitos fotografados, que
parecem teatrais ou excêntricos. Num estilo onde se mesclam influências de Frank e Brandt, Ray
Jones fotografa com humor, por vezes recorrendo à encenação, as pessoas empenhadas nas tarefas
diárias, tarefas estas que, por força da acção do fotógrafo, surgem como estranhas, sem sentido ou
até absurdas ao olhar do observador. O conteúdo torna-se, assim, mais importante do que a forma,
foi William Klein. Grandes-angulares, flashs brutais, filmes hipersensíveis, grandes planos à
queima-roupa fazendo o enquadramento cortar os sujeitos, de tudo usou Klein ao propor, nos anos
cinquenta, um estilo dominantemente figurativo que rompia com todos os modelos do seu tempo,
incluindo a reportagem. Frequentemente, nota-se na fotografia dos anos cinquenta de Klein uma
tentativa de fixar o traço das formas geométricas em movimento. As suas fotos desta época são, na
maioria, fotos dinâmicas de certos momentos, mesmo parados. Outras vezes, evidencia-se nelas
uma certa rugusidade. As aportações brutais dos instantâneos fotográficos de Klein traduzem, ao
1955, passou a trabalhar para a Vogue, dedicando-se à fotografia de moda e publicitária. É, porém,
importante considerar que muitos dos fotógrafos de moda podem ter influenciado o fotojornalismo,
e vice-versa, até porque muitos fotojornalistas fizeram ou fazem também fotografia de moda e
publicitária: Richard Avedon (com as suas fotos de moda em ambientes da vida mundana ou
quotidiana), Helmut Newton (que apresenta a mulher em situações que frequentemente roçam a
pornografia) e Irving Penn (a naturalidade do gesto) foram alguns deles. Avedon mostrou-se
também um hábil retratista que busca a identidade dos fotografados colocando-os em atitudes de
oposição ao fotógrafo sob fundos neutros. Estes obrigam o observador a concentrar-se no sujeito
que nos presenteou com fotos de expressões inesquecíveis de Churchill, Einstein, John F. Kennedy
ou Marilyn Monroe. A sua especialidade, porém, foram retratos dos sujeitos a saltar — o
desequilíbrio do salto despojaria-os das suas posturas mais artificiais, funcionando como um tempo
de libertação.
Um outro nome a reter no "fotojornalismo" de retrato é Arnold Newman (1918).
Newman explora a personalidade do retratado pela natureza do ambiente em que esse se insere e
pelo uso expressivo de objectos identificativos, que não raramente se sobrepõem ao sujeito.
Winogrand. Este fotógrafo foi um dos aderentes à revolução que Robert Frank protagonizou na
fotografia, quando lançou The Americans. Assim, entre os anos sessenta e oitenta, Garry
sua visão da sociedade, por vezes com humor e ironia, como acontece nas fotos que realizou em
cemitérios e em jardins zoológicos e que insere em The Animals. Neste caso, Winogrand explorou,
por exemplo, as semelhanças aberrantes, mais inquietantes que humorísticas, entre vários animais e
certos seres humanos, que surgem juntos nas fotos de forma a poderem ser comparados. Noutra
série, Women are Beautiful, o fotógrafo explora o tema "mulheres", fazendo, ocasionalmente,
sobressair as suas contradições e a oposição entre a sua beleza e a miséria. Em ambos os projectos,
angular.
Nos anos sessenta, Leonard Freed, da Magnum, publica Black in White America
(1969), reunindo um conjunto de fotos que impressionam pela efemeridade das expressões dos
rostos e pelas composições que os corpos estruturam no espaço. Em 1980, editará Police Work. A
cobertura da guerra do Kippour, do lado israelita, veio a constituir outro ponto central do seu
trabalho.
Apesar de não ser um documentalista puro, Elliott Erwitt viria, com humor, a fazer
algo parecido ao que fez Winogrand, mostrando a similitude entre muitos comportamentos e gestos
dos animais (representados, assim, de forma algo antropomórfica) e dos humanos, com uma ironia
doce, como se o mundo não passasse de um palco para a comédia da vida. De facto, as suas
fotografias mais famosas são, provavelmente, aquelas em que cães e pessoas se misturam de forma
quase incongruente, mostrando que ninguém está a salvo do ridículo, mas também estimulando uma
atitudes ou regista com humor os tiques da civilização de uma forma tal que nos faz duvidar das
Cartier-Bresson. A Capa foi buscar a noção de que seria necessário a um bom fotojornalista estar no
momento certo no local certo, que é sempre perto do acontecimento. A Cartier-Bresson foi buscar o
conceito do "instante decisivo". Desta forma, Riboud não só procurou estar "lá", "em cima do
acontecimento", como nas suas fotos do Maio de 68, em Paris, mas também (re)encontrar na
realidade geometrias significantes, captar os instantes em que a ordem irrompe no caos, como se
torna saliente nas suas famosas séries sobre a China (1957, 1971 e 1994-95) e na que é
provavelmente a mais famosa das suas fotografias: o poder das armas contra o poder da flor. Ao fim
e ao cabo, Riboud, como René Burri, o mais antigo fotógrafo da Magnum em actividade, procurou
encontar equilíbrios entre a forma e o sentido, na grande tradição da fotografia documental. Outro
traço interessante da sua obra é que, a par James Cameron, Riboud foi um dos fotógrafos ocidentais
transbordantes, rompendo o enquadramento (que parece não chegar para eles), rumo ao fora de
campo. Diane Arbus (1923-1971), por seu turno, realiza um "álbum" de retratos psicológicos, sem
prostitutas e travestis, entre muitos outros exemplos, alinham-se na "montra" da "galeria" de Arbus,
geralmente em planos frontais, por vezes posados, e iluminados por frechadas imoderadas do flash.
ridícula, nem que seja por um trejeito no semblante, enquanto os deserdados do sistema, "a outra
metade", são-no numa perspectiva dignificadora. Arbus foi uma das influenciadoras do actual
momento fotográfico documental. Algumas das suas ideias, pelo menos temáticas, notam-se, por
Ainda nos anos sessenta, o japonês Shomei Tomatsu fotografa, no seu país, os traços
de uma cultura tradicional confrontada e ameaçada pela cultura dominante, de cariz americano.
Bill Owens (1938-) guarda na sua obra a tradição da reportagem clássica, mas viva.
Em Suburbia, um trabalho de 1973, ele conseguiu mostrar a ambiguidade humana dos pequenos
A Magnum
casos, no grande projecto Farm Security Administration, por exemplo, os negativos pertenciam ao
Estado contratante, apesar dos protestos e atitudes de Langue ou Evans. Só em 1947 é que, pela
primeira vez, um grupo de autores-fotógrafos exigiu não apenas a propriedade dos negativos mas
também o direito à assinatura, o direito ao controle da edição do seu trabalho à escala internacional e
"ter tempo" para trabalhar nos projectos fotográficos que frequentemente seriam propostos por eles
próprios. Nesse ano, em torno destes pontos de vista, um núcleo duro de uma geração de ouro do
fotojornalismo —Robert Capa, David Seymour (Chim), Henri Cartier-Bresson, George Rodger—
fundou a Agência Magnum Photos. O significado do acto torna-se claro: o fotógrafo afirma-se
os poderes e os news media. A fundação da agência é um dos indícios que permitem notar a
evolução do jornalismo para um modelo de tipo cão-vigia. Não obstante, 1947 foi também o ano em
que o secretário da Justiça dos Estados Unidos classificou a Liga Fotográfica Americana, que
nascera nos anos vinte, como organização subversiva. Aliás, em 1951, a Liga morrerá, com o
Macarthismo.
Reunir personalidades tão diferentes, mas tão vincadas, como a dos fundadores da
Magnum foi difícil. Provavelmente, tal só foi possível devido à sintonização que o judeu polaco
fascinado pelo Vaticano, Chim, e o britânico humanista, Rodger (que abandonou momentaneamente
Robert Capa e o rigoroso Cartier-Bresson(182). De qualquer modo, vai ser às fortes personalidades e à
diversidade de autoria que a agência, quanto a nós, vai buscar força e riqueza. Estamos convencidos
provavelmente isso deve-se mais ao aspecto económico do que às personalidades expressas quer na
fotografia quer na afirmação de posições sobre o rumo que a cooperativa deve tomar.
dos anos setenta, a Magnum surgia, com a Gamma, a Sygma e a Contact, no topo das agências
especializadas ou que possuiam serviços especializados em fotojornalismo. Por essa década, cada
fotográfica, pela fotografia de autor, pela integridade moral e humanista dos seus fotógrafos e
fotografias e pelo espírito que roça a anarquia. Além dos fundadores, por lá passaram também
outros fotógrafos importantes: Werner Bischof, Ernst Haas e Gisèle Freund (uma excelente
fotógrafa mas também uma das mais importantes estudiosas da fotografia, doutorada em Sociologia
com a tese La Photographie en France au Siécle XIX) juntaram-se à agência em 1949. Entre 1951 e
1958, ingressaram na agência, entre outros, Eve Arnold, Erich Hartmann, Erich Lessing, Dennis
Stock, Kryn Taconis, Jean Marquis, Burton Glinn, Elliott Erwitt, Inge Morath, Marc Ribould,
Wayne Miller, Brian Brake, René Burri (o fotógrafo que está há mais tempo na agência), Bruce
Davidson e Cornell Capa, o irmão de Robert Capa, e que, anos mais tarde, fundaria o International
fotografia. Cornell Capa, porém, sem deixar de ter como referente o interesse humano, não trabalha
McCullin (que viria a demitir-se da agência), Philip Jones Griffiths, Larry Towell, James Nachtwey,
Eugene Richards, Abbas, Guy Le Querrec, Mary Ellen Mark (que abandonaria a agência em 1981,
para fundar a Archive Pictures), Susan Meiselas, Raymond Depardon, Bruno Barbey, Carl de
Keyser e Sebastião Salgado são alguns dos que o fizeram. Com o indiano Raghu Raï (1942-), o
japonês Hiroshi Hamaya (1915-) ou o americano Leonard Freed (1929-), mantêm viva a tradição da
reportagem e do ensaio de projecto. As reportagens de Freed sobre a polícia em Nova Iorque são
Pelos meados dos anos cinquenta, a Magnum atravessou períodos difíceis, devido à
morte em serviço de fotógrafos como Bischof, nos Andes, Capa, na Indochina, e David Seymour
("Chim"), na campanha pelo controle do Suez, em 1956… O mesmo Seymour que, anos antes,
dinheiro. Querem controlar o uso que é dado às suas fotos, sem, com elas, se escusarem a
interpretar o mundo como o percepcionam. São partidários, pois, de uma certa qualidade fotográfica
acentuem o seu ponto de vista. Do nosso conhecimento, há até um caso recente que se passou em
Portugal de controle dos fotógrafos da Magnum sobre a edição do seu trabalho: o Expresso, em
1991, iniciou a publicação de uma série de portfolios destacáveis do projecto Trabalho, de Sebastião
Salgado. A paginação foi feita com a introdução de publicidade pelo meio das fotos e textos.
ensaio. A solução encontrada foi introduzir a publicidade entre dois portfolios. Tal dá também a
ideia do poder que têm fotógrafos da dimensão de Salgado que se associam determinados em
Nos dias que correm, a Magnum, porém, enfrenta alguns desafios: há fotógrafos que
ganham mais do que outros, fotógrafos que aceitam encargos comerciais e publicitários (de
qualidade e originais) enquanto outros criticam tal prática, e há discussões sobre a selecção
fotográfica para a edição de livros colectivos e individuais e para uma das actividades em que a
"família" que pretendia ser aquando da sua fundação, apesar da anarquia "familiar" numa agência
em que quarenta personalidades fortes de ideias muito definidas querem "mandar". Além disso,
individualmente apresentados, e como cerca de 50% dos ganhos dos fotógrafos são para a agência e
há fotógrafos que ganham pequenas fortunas e outros ganham pouco, alguns podem abandonar a
agência por motivos económicos. O economista Salgado já o fez, em 1995, para fundar a sua
nomeados, dez colaboradores e quatro correspondentes. A agência tem escritórios em Nova Iorque,
Paris, Londres e Tóquio. Para se ingressar na agência e se ir progredindo até se atingir a qualidade
reconhecido pelo trabalho desenvolvido. Quer a adesão quer a progressão na "carreira" são votadas
pelos fotógrafos sócios, e em certas votações é necessário assegurar maiorias de dois terços.
fizeram história: o Dia D, de Capa; a foto de Jackie Kennedy no funeral do marido, de Elliott Erwitt;
Abbas; a foto de James Dean, de Dennis Stock; a Primavera de Praga, de Koudelka; o Vietname, de
Griffiths; as minas da Serra Pelada, de Salgado; a home front britânica na II Guerra Mundial e a
tribo africana dos Nubas, de George Rodger (que, por se julgar insensível à morte, procurou realizar,
após a Segunda Guerra, estudos fotográficos sobre civilizações da África Ocidental); as fotos
Difamação, de Robert Capa. Entre inúmeras outras imagens da Magnum, estas são fotos que
outro lado do cinema que os fotógrafos da Magnum mostraram ao mundo com a abordagem que
cisne por vedetas míticas. Foi o último filme de Marilyn e de Clark Gable, que morreram pouco
tempo após as filmagens, durante as quais Montgomery Clift atravessou uma fase difícil.
Pese embora os prémios de "foto do ano" no World Press Photo de Larry Towell e
James Nachtwey, desde meados dos anos oitenta talvez a Magnum tenha abandonado um pouco a
empresas. Mesmo assim, a Magnum foi a agência em que Salgado empreendeu Fome no Sahel e
Trabalho e Abbas se debruçou sobre a revolução iraniana e a África do Sul, o mesmo país onde Ian
Berry denunciou o apartheid; foi a agência onde Susan Meiselas realizou uma invulgar reportagem
sobre a revolução sandinista na Nicarágua, onde Bruno Barbey trabalhou sobre a Polónia do
Solidariedade, onde Eugene Richards fez sentir os dramas humanos —como o da sua mulher— nos
hospitais.
Como a Magnum, existem outras agências cujo objetivo principal é assegurar uma
A norte-americana Black Star orienta a sua produção num sentido mais comercial, mas sem perda de
qualidade.
inicialmente patente no Museum of Modern Art, de Nova Iorque, veio a percorrer "todo o Mundo",
causando um forte impacto e, nalguns casos, críticas sobre a alegada "estreiteza" de pontos de vista e
o carácter ideológico da exposição. Roland Barthes foi um dos que as fez. Vincou mesmo, no seu
livro Mythologies, lançado em 1957, que a exposição era, na sua essência, um sistema de reprodução
de ideias-feitas e gerais, simples e estereotipadas, sobre a natureza humana.
Em qualquer caso, The Family of Man não deixa de corresponder à coroa de glória do
esplendor. Foi uma exposição cuja influência se nota, mesmo hoje, em fotógrafos como Salgado ou
Richards, que recuperaram a tradição dos concerned photographers. E foi também uma exposição
países, sobre a vida do homem à superfície do planeta, desde o nascimento à morte, passando pela
juventude, pela idade adulta e pela terceira idade, pelo amor e pelo trabalho, como num álbum de
família. O objectivo de Steichen era mostrar que, ao fim e ao cabo, todos os seres humanos são
iguais e devem auferir da mesma dignidade, que a vida era semelhante em toda a Terra e que os
clara, as imagens, seleccionadas pelo seu valor simbólico (como acontece na foto de um menino
dormindo numa clareira de um bosque, de Wynn Bullock, que simbolizava a criação) foram
agrupadas num circuito sintáctico que fazia o observador percorrer as etapas da vida. Além disto,
foram mais ou menos ampliadas em função, respectivamente, do seu valor épico ou, ao invés,
complementadas com texto, o que demonstra bem as incapacidades ontogénicas das primeiras.
A exposição começava com uma foto de água e céu a que foram apensos textos
religiosos relativos à criação do mundo: não havendo fotografias de grande parte dos tempos em que
a vida decorre na Terra, as imagens evocadas teriam de ser as literárias. Depois, sucedia-se-lhe uma
foto de um nascimento, seguida de fotos de mães de vários pontos do Planeta com os seus filhos e
de fotos de crianças mais crescidas, de vários locais, jogando e aprendendo. Várias famílias de
mundo. A seguir vinham as fotos dedicadas à educação e à ciência, cuja série terminava com uma
foto inquietante, mas esperançosa, de uma cidade alemã destruída, onde uma criança, dirigindo-se
para a escola, mostrava que, apesar da estupidez assassina do Homem, nunca é tarde para
recomeçar. A secção posterior dizia respeito à solidão humana, nos seus variados aspectos, e depois
surgiam as fotos representativas dos tempos difíceis que a humanidade vivia (e vive) um pouco por
todo o lado: fome, tirania política, etc. As duas secções seguintes contrastavam, já que a primeira
respeitava ao sufrágio universal e a segunda à guerra. Nesta última eram apresentadas uma foto de
um soldado morto numa trincheira durante a Segunda Guerra e uma foto da explosão de uma bomba
de hidrogénio — a mensagem era clara. Nesta altura, o observador já estava perto do final, que
atingiria após percorrer os sectores dedicados à vida em comum e às Nações Unidas. A penúltima
imagem tratava-se de um retrato de Lewis Carroll da Alice da Alice no País das Maravilhas e a
última era uma bela fotografia de Eugene Smith na qual duas crianças passeavam por um caminho
levaram o fotojornalismo a abrir-se a novos temas (droga, ambiente, família…) e cânones estéticos
mais "artísticos". De facto, a realidade social situa-se muito para além de um nascimento ou de uma
morte geral e abstracta, e tem a ver com a justiça e as injustiças, com a desumanidade e humanidade,
"belas" e habilmente dotadas de uma carga significativa, como as da exposição, e tal como Barthes
faz notar na sua afirmação, correm o risco de bloquear a nossa imaginação, como a foto-choque
faria à significação.
Face ao que foi dito, o uso da cor, no campo da renovação fotográfica pós -Family of
Man, não é, assim, inocente, parecendo até que se procura encontrar para a fotografia uma
Outra das reacções à exposição foi a de Otto Steinert, que celebra uma fotografia
subjectiva. Robert Frank começará, por seu turno, as suas deambulações pela América, promovendo
cruzando a visão pessoal com o documento e, de certa forma, emprestando às imagens fotográficas
publicado e reeditado várias vezes. Alguns fotógrafos deram-se assim a conhecer, como William
Por outro lado, na linha da tradição crítica desencadeada por Roland Barthes a
propósito da The Family of Man, Victor Burgin, debruçando-se sobre as relações entre a arte e a
linguagem, viria a demonstrar, como o faria Barthes na revista Communications, que existiam uma
série de mecanismos que dariam sentido à imagem; e Susan Sontag, em On Photography (Ensaios
Sobre Fotografia), tornou explícito o que se intuía: a recorrência a esses mecanismos está longe de
ser inocente. Aliás, depreende-se das palavras de Sontag que toda a foto é um pouco surrealista:
mesmo a fotografia de família comum, ingenuamente espontânea, mas presa a convenções estreitas,
Robert Frank (1924-), um suíço, foi para os Estados Unidos em 1947. Colaborou
com a Harper's Bazar até 1948, ano em que, como freelance, alarga as suas colaborações à Fortune,
tendo sido o primeiro fotógrafo europeu a recebê-la. Do trabalho subvencionado pela bolsa iria
nascer Les Américains, editado em Paris, em 1958. Este fotolivro tornar-se-ia um dos livros de culto
Les Américains trata-se de uma obra quase mítica que causou grandes sensações,
determinante na evolução do medium e do próprio jornalismo: fazendo com que o real fosse a mesa
onde se servia a sua imaginação, Frank renuncia à objectividade do olhar, revoluciona a reportagem
e, assim, pode até considerar-se um precursor do Novo Jornalismo dos anos sessenta.
Les Américains não era uma reportagem clássica, uma vez que não se debruçava
sobre acontecimentos. Era até uma "reportagem" sem acontecimento(s), que tornou Frank num
foto-ensaio nem sequer uma história em imagens. Longe de procurar registar momentos
que registam instantes que roçam o absurdo e que quase não têm em si um sentido que não seja
aquele que o observador lhes possa dar. Um conjunto de imagens muito pessoais, subjectivas,
deambulações quotidianas de um europeu pelos Estados Unidos, quase como Sting canta na canção
do englishman que é um alien em Nova Iorque. Muitas das suas fotos eram enquadradas de través,
enquanto noutras Frank nem sequer olhava pelo visor. Talvez por isso, a edição da versão
emericana de Les Américains foi acolhida com críticas ferozes e algum sarcasmo. Aliás, excluindo
revelava que nos Estados Unidos continuava a não existir grande aceitação da obra de Frank e
menor ainda era a identificação dos americanos que faziam parte da amostra com as fotos de Les
Américains.
autor e o acto de observação do observador. A expressão fotográfica de Frank não visa ascender à
intimista. Com Robert Frank, começou a perder força a herança ideológica da objectividade que se
anterior, assente na verosimilitude. Antes dá força a uma corrente mais próxima do documentalismo
Administration: é preciso recordar as fotografias do FSA dos painéis publicitários, sem pessoas, e
concordamos inteiramente com a alegada visão de Frank. Pelo contrário, julgamos que, por vezes, a
significação "primeira" que o fotógrafo dá à imagem é a significação que passa para o observador,
embora concordemos que o significado das fotos é, em grande medida, outorgado pelo observador.
captando, enquanto viajante, instantes intensamente poéticos, mas imprevisíveis, em cenas banais,
que brotam descontinuamente do real e aparentam ausência de outro significado que não seja este
Mais do que a presença, nas fotos de Frank o que está em causa é o fluído que ele
capta, a ausência, o fora de campo, para onde o observador é constantemente remetido na tentativa
de encontrar um sentido tranquilizador para imagens de onde este mesmo sentido é eclipsado. Ao
observador quase não é permitido "ver", ficar indiferente, antes é obrigado a avaliar, julgar, gerar
sentido: mais vale que falem mal de mim do que não falem de todo, diríamos, evocando o ditado
acontecimentos representados em sub-fotos: os bares de cowboys, os desfiles por ocasião das festas
em algumas cidades, etc. A fotografia de Frank não mostra ideias gerais, mas as particularidades e a
banalidade de cada situação. Robert Frank explora uma estética do aleatório, do banal, seguindo as
Até Frank —explica Victor Burgin (1982)— o fotógrafo via-se a si mesmo como um
caçador de instantes significativos; depois de Frank, o fotógrafo sabe que o significado da foto é, em
grande medida, outorgado pelo observador. Assim, e também em conformidade com Burgin, a uma
prática fotográfica que Robert Doisneau denominou de "fechada" sucede uma voltada para a
polissemia [como é visível no actual documentalismo fotográfico], voltada para todos os sentidos
possíveis, pelo que o importante deixaria de ser o "momento decisivo", mas o interior do fotógrafo.
Robert Frank chegou a dizer que com o seu trabalho tinha procurado produzir
imagens que tornassem todas as explicassões desnecessárias. Talvez por isso, as suas fotos
indireccionadas e não compostas são, mais do que o motivo que as anima, o principal tema da sua
obra: o centro de interesse transfere-se do conteúdo para o formato; melhor dizendo, em Frank o
Friedlander, Garry Winogrand, Diane Arbus, William Klein ou o também suíço René Burri, da
Depois dos anos sessenta, na senda do Novo Jornalismo e das inovações trazidas por
fotógrafos como Frank, vários autores tentaram mostrar que, no campo da semiótica e da
epistemologia, uma imagem fotográfica seria sempre subjectiva por natureza, como foi o caso de
Susan Sontag. Esta americana, em 1973, publicou a sua colectânia de ensaios On Photography
(traduzido em Portugal com o título Ensaios Sobre a Fotografia). No livro, a autora chama a
atenção para que a escolha de variáveis como o ângulo e o plano de abordagem já implicam escolhas
subjectivas que, neste sentido, tornam a fotografia num instrumento de interpretação do mundo.
CAPÍTULO XI
A SEGUNDA REVOLUÇÃO NO FOTOJORNALISMO E A
EVOLUÇÃO DA ACTIVIDADE DOS ANOS SESSENTA
AOS ANOS OITENTA
É pelos anos sessenta que o mundo começa, realmente, a tornar-se a "aldeia
planetária" de que McLuhan falava, pelo menos no sentido de uma maior familiaridade das pessoas
com as ocorrências que agitam o Planeta. A televisão inicia o seu reinado enquanto medium
dominante na Europa, anos após os EUA. Na rádio, é a revolução do transistor que agita as águas,
meios de comunicação, de mais fácil acesso e mais baratos do que nunca, começam a surgir ou a ser
investigados.
Os Golden Sixties são também uma década de crescimento económico, mas que
viram surgir muitos movimentos alternativos, de que os hippies são o exemplo mais conhecido.
Atinge-se um nível de vida nunca visto, embora frequentemente à custa do ambiente. Cresce
imparável e novos estados tomam lugar na cena internacional. Algumas potências coloniziadoras,
porém, resistem, como é o caso de Portugal (até 1974/75). Na antiga Rodésia e na África do Sul, os
brancos não partilham o poder com os negros. Na América do Sul, guerrilhas, golpes de estado e
ditaduras são o pão nosso de cada dia. Mas a América Latina é também uma incubadora de mitos,
como o de Che Guevara, que morreu na Bolívia, a 8 de Outubro de 1967. A foto do seu cadáver,
Foi também nos anos sessenta que se solidificou nas sociedades europeias a
pluraridade política, de que, nos anos setenta, a Península Ibérica e a Grécia vieram a beneficiar,
com o fim dos regimes de Salazar e Caetano (Portugal), de Franco (Espanha) e da "Ditadura dos
Coroneis" (Grécia).
Porém, pouco tempo depois, com o choque petrolífero, a crise económica começa e,
com ela, o desemprego e a crise social que ainda hoje afecta os nossos países, agravada, esta última,
pelas novas tecnologias. Estas, mercê das suas potencialidades de rentabilização dos recursos
das concepções do jornalismo sensacionalista de que ainda se notavam indícios. Tal terá provocado,
Se nos anos cinquenta irrompeu a Guerra da Coreia, nos sessenta os EUA envolvem-
se no Vietname. Nestes conflitos, o fotojornalismo vai ter um papel oposto ao que teve nos grandes
conflitos anteriores. Com menos (auto-)censura, algumas das fotos publicadas na imprensa
ocidental, mormente na norte-americana, em conjunto com a TV, serviram para criar no Ocidente
correntes de opinião contrárias à guerra.(183) O mesmo se passa na guerra civil em Chipre, no Biafra
e em vários outros pontos do globo. Recordem-se, por exemplo, os trabalhos de Don McCullin, um
esteta do horror, ávido de denunciar o mal, que ele afirmava distinguir claramente por trás do
visor.(184) Nessas guerras, tal como em acidentes e em ocasiões dramáticas, o fotojornalismo tende a
a foto-choque.(185)
a que designamos como segunda revolução no fotojornalismo. Os traços mais relevantes dessa
ligados quer ao aumento dos custos de produção e distribuição quer ao desvio dos
Estas últimas, inclusivamente, vão ceder à imagem parte da relevância que davam ao
devido aos prejuízos e à necessidade de poupança(188). Por volta dos finais dos anos
b) Dá-se uma reacção, especialmente francesa (Fig. 34), mas globalmente europeia,
agências de fotos, que, em 1988, tinha nove milhões de clichés nos arquivos), a
fundada em 1981); nos EUA, actuavam, entre outras, a Black Star (que, em 1988, era
semelhante(191);
mais notórias já nos anos oitenta. Todavia, apesar da segmentação dos mercados, a
domínios que não a guerra, como a política, através da criação de mecanismos como,
entre outros, (1) o impedimento a fotografar certos eventos ou partes de eventos, (2) a
"fotos de família" nos grandes eventos (o que permite aos políticos não serem
surpreendidos nas situações "impróprias" em que lhes cai a máscara do poder) e (4) o
ordenar quais as distâncias focais de objectivas que podem ser usadas para retratar os
políticos);
amadores (quer o scoop, quer mesmo as fotos de família, quando nestas surge gente
ilustre ou por qualquer outro motivo) que depois são difundidas por agências ou
outros órgãos de comunicação social; aumenta também a prática do rafler (levar tudo
desta introdução da fotografia no ensino superior, algo que Portugal só viria a assistir
ao fotojornalismo;
j) Dos anos sessenta aos oitenta, chega-se à dominação da "comoção sensível" sobre
"popular". A foto-ilustração de impacto (nem que seja por mostrar corpos e rostos
fotojornalismo premeia-se algo que vende menos, embora não o que pouco ou nada
mexicanos que clandestinamente tentam entrar nos EUA (Stan Grossfeld, prémio
da cor, que, na altura, foi objecto de críticas por quem o via ser a cedência final à
aprendendo a usar a cor, que invadiu as revistas e, nos anos oitenta, os jornais;
l) A partir dos anos setenta, começa a evidenciar-se uma produção fotojornalística de
coberto por uma míriade de fotógrafos, que enfatizam uma retórica da actualidade
susceptível de criar —como diz Virílio— ansiedade sobre o presente(195); talvez por
isso, como sugere Serge Le Peron, as fotos publicadas nos meios de comunicação
etc.(196)
Algo que também é indissociável deste período são, a partir dos anos sessenta, as
relações que se adivinham mais pronunciadas entre as revistas ilustradas e a televisão (no Velho
Continente, vai ser nessa década que a televisão vai conquistar o estatuto de medium dominante,
uma década depois dos EUA). Essas relações podem ter sido desvantajosas para revistas como a
Life, que acabaram por desaparecer. Mas, noutros casos, televisão e revistas tiveram relações que
nos parecem quase simbióticas. É o que aconteceu, por exemplo, com a Sports Illustrated, revista
pode criar interesse por ele, já que, para além de razões já referenciadas, como a de ser o observador
a determinar o tempo de observação, as fotografias são mais definidas, talvez mesmo mais
dramáticas, até pela definição com que captam o pormenor. Mas, para tal, os fotógrafos tiveram, em
muitos casos, de se adaptar ao mundo colorido da TV, passando, por exemplo, a usar rotineiramente
filmes coloridos de alta velocidade (que possibilitam um maior leque de aplicações). Mas a
televisão também pode ajudar a fotografia a quebrar amarras, levando o fotojornalismo à descoberta
televisão para realizar um novo tipo de fotografia: fotografou os Jogos Olímpicos de Munique, em
1972, pela televisão, obtendo imagens de forte colorido mas de estranha granulusidade.
Temos algumas dúvidas no que respeita à superação pelo fotojornalismo das amarras
da normalidade realística, já que hoje a actividade é dominada por uma produção rotineira que
continua a perseguir o realismo e que pouco ou nada engloba o criativo, a arte. Mas julgamos que a
inter-relação entre a fotografia e a televisão que nos parece existir prestará um bom serviço ao
fotojornalismo se contribuir para que ele vença as amarras da rotina para mergulhar na autoria.
Não é em forçar o fotojornalismo a ser igual à arte que está a receita para o
jornalismo fotográfico de hoje. Isto é, não deve perder-se o norte da intenção informativa do
com o ser humano e os seus problemas, bem como para os problemas globais da Terra. Mas
estamos convictos de que representará uma mais valia para o fotojornalismo e para o público que a
actividade se abra a orientações criativas, originais, que podem passar pela insinuação da arte na
fotografia jornalística e pela fuga ao realismo. E que devem passar pela autoria consciente e
provar que se podia fazer bom fotojornalismo usando a cor. E, apesar do debate estético e até
estético-moral (como representar fotograficamente a miséria, por exemplo, com algo "bonito" como
a fotografia a cores?), a cor passa a dominar as revistas e a imiscuir-se com força nos jornais,
sobretudo nas primeiras páginas, a partir da década de oitenta. De qualquer modo, a televisão tinha
uma linguagem específica da fotografia colorida, mais icónica do que a fotografia a preto-e-branco:
basta ver as fotos de James Nachtwey (1948-), talvez o melhor fotógrafo de guerra da actualidade,
na Irlanda do Norte (como aquela que mostra um cocktail Molotov a arder nas mãos de um
manifestante católico, 1981) ou na Nicarágua (como aquela em que se vê uma criança de calças
vermelhas brincando acrobaticamente no canhão de um carro de combate abandonado, 1983) para se
perceber como, através da cor, o observador pode ser levado a concentrar a sua atenção em
primeira experiência de envio de uma telefoto por satélite (o Telstar), da América para a Europa. A
foto representava os quadros directivos da American Telephon and Telegraph, o que releva, já aí,
que a telefoto por satélite não iria trazer grandes novidades ao fotojornalismo, antes favoreceria a
rotinização. Provavelmente, a telefoto não terá tido sequer a mesma influência que a televisão teve
sobre a produção fotojornalística: basta pensar que a primeira guerra televisionada, a do Vietname,
foi também a última grande ocasião em que os fotojornalistas brilharam, ao ponto de as suas
tranques soviéticos nas ruas de Praga três semanas depois da revolta checoslovaca ter ocorrido.
Uma greve tinha impossibilitado a publicação dessas imagens no Reino Unido, apesar de toda a
Europa Ocidental as ter já visto. Isso mostra que, por vezes, a actualidade é um critério de valor-
Devido à seca e à guerra em África, o tema marginal da fome regressa aos jornais e
às revistas pelos finais dos anos setenta, após uma década de quase desaparecimento.
Anteriormente, tinham ocorrido já algumas abordagens do tema, entre outros casos por Margaret
Bourke-White (na Índia dos anos quarenta), Nahum Luboshez (na Rússia dos anos dez) ou Werner
Pelos anos oitenta, a dominação das câmaras é planetária. Levantam-se, com mais
acutilância, os problemas do direito à privacidade. Cresce ainda mais a dificuldade de definição das
jornalístico que por vezes os jornais e revistas adquirem, face à produção massiva e —sobretudo—
rotineira e convencionalizada de grande número de profissionais; e, por outro lado, dada a variadade
temática, estilística e de ponto de vista das imagens fotográficas com interesse jornalístico que são
produzidas actualmente, como as fotos do homem na lua, as fotos dos planetas do confim do sistema
imagem fotográfica. Não só aumenta o espaço consagrado à fotografia, mas também o espaço
dedicado a cada fotografia. E, se grande parte do mercado se orienta para o retrato de celebridades,
para o institucional e para as glamour shots (muito mais, até, do que para a foto-choque), outra fatia,
documentalismo social. Isto passa-se sobretudo nos quality papers: veja-se, a título exemplificativo,
Mary Ellen Mark (1940-), na tradição fotográfica social e documental, ou às fotos de Eugene
Richards (1944-) sobre as urgências hospitalares e os viciados em crack de Nova Iorque. Quer o
Expresso quer o Público consagram também espaços regulares a portfolios dos seus fotógrafos.
Mas o documentalismo fotográfico "preocupado" pode também gerar fenómenos censórios que
interessa denunciar.
presidencial francesa de 1981, o Libé publicou um suplemento de dezasseis páginas elaborado pelos
Eliseu: pela primeira vez depois de muitos anos, um diário encomendava "actualidade quente" à
mítica agência. Mas o Libé não se ficou por aqui: enviou William Klein para cobrir a peregrinação
de João Paulo II em Londres, Salgado para reportar a fome no Sahel, realizou cadernos especiais
sobre a África do Sul e sobre o sindicato Solidariedade, na Polónia, fez Reza e Manoocher
A inflação visual patente desde há vários anos pode, por seu turno, trazer problemas
— "Now that every kind of grief has been presented to the camera, which has recorded it from every
angle, pictures of misery only seem to recall to us pictures of misery. (…) It becomes hard to
parece reviver, sem se esgotar, na obra de Sebastião Salgado, na de Richards ou na de Mary Ellen
Mark.
invasão não houve nos media imagens negativas(199)), no Panamá, no Golfo, na Palestina ocupada,
tanques que se preparava para tomar de assalto as posições dos que protestavam em Tiananmen é
um dos indícios que aponta para que parte da foto-informação passa por vezes à categoria de
símbolo após a sua difusão profusa posterior. Aliás, "Un dos aspectos remarcables na definición da
década [de oitenta] é (…) o paso do descritpivo ó simbólico prá foto fixa."(200)
abandone o papel de "olho do regime" , algo que é agudizado com a glasnot de Gorbatchev. A
(201)
da importância do fotojornalismo numa altura em que os soviéticos paravam para redescobrir o seu
país após décadas em que as rédeas da curiosidade tinham sido mantidas muito curtas.
É justo também destacar que a manipulação permaneceu associada ao medium. A 6
de Fevereiro de 1982, por exemplo, a Le Figaro Magazine publicou uma foto de Matthew Naython
porém, que se tratava de "Le massacre des indiens Mosquitos, farouchement anticastristes, par les
EUA, Alexander Haig, chegou a brandir o jornal como prova do vergonhoso regime sandinista.
Mas a verdade foi trazida à tona e a Le Figaro Magazine acabou por ser condenada em tribunal.
internacional no mesmo ano em que a agência Vu viu a luz do dia: 1985. Se até 1970 as agências
internacional a funcionar desde 1960), pelos anos oitenta o cenário altera-se, pois a crise da United
Press International obrigou esta agência a concentrar-se nos Estados Unidos, sendo o seu território
no estrangeiro ocupado mais pela France Press e pela Reuter (que, a partir de 1984, começou a
distribuir as fotos da UPI sobre os EUA) do que pela AP. A Associated Press mantém-se, contudo,
no mercado, que domina, quer perante as restantes agências noticiosas, quer perante as agências
fotográficas e fotojornalísticas.
novo sentido à batalha tecnológica que iria permitir a melhoria significativa das condições de
transmissão e edição de imagem, especialmente devido às tenologias digitais. Todavia, não se notou
—pensamos— uma alteração substancial dos padrões de qualidade do acto fotográfico, pois o
fotojornalismo tradicional das agências noticiosas não mudou tão fortemente como isso com a
mais são do que "funcionários da imagem", escravos da "actualidade a quente", que não escolhem os
seus temas e aos quais, regra geral, apenas é encomendada uma foto —frequentemente de qualidade
processo de registo electrostático para transmitir e receber fotografias com maior qualidade. No
Konica começou a fabricar a C35AF, com autofoco. Surgem, na mesma altura, as objetivas olho de
As still-video cameras dos anos oitenta representam uma nova evolução. Elas
asseguram uma maior rapidez da transmissão, já que, não funcionando com filme, mas com um chip
que armazena imagens que podem ser transmitidas para um disco de computador, evitam o
dos negativos, o que acelerou o processo de edição e transmissão a partir do tradicional suporte
filme. Por outro lado, a proliferação de computadores portáteis permite uma rápida edição da
imagem. O fotojornalista, para a transmitir, só precisa de chegar ao telefone mais próximo ou, mais
É ainda pelos anos oitenta que os fotógrafos vão começar a usar generalizadamente o
computador para reenquadrar as fotos, escurecê-las ou clareá-las, mudar-lhes a relação tonal e até
retocá-las. A imagem totalmente ficcional torna-se mais fácil e rápida de criar. Por aqui se vê que
as tecnologias não são neutras: nascidas da necessidade de facilitar a vida aos fotógrafos e editores,
as novas tecnologias de manipulação de imagem potenciam a ficção fotográfica a níveis nunca antes
alcançados.
Os diversos pontos que aqui referimos foram também focados por Karin Becker.
Este autor levou a efeito um estudo exaustivo das mudanças enfrentadas pelos fotojornalistas devido
1988. Para ele, quatro áreas de inovação no fotojornalismo podem ser desenhadas a partir do
discurso das revistas, todas elas desafiando os limites do território de trabalho dos fotojornalistas: 1)
fotojornalistas tentariam usar estratégias de controle em relação às quatro áreas de inovação para
controlar os parâmetros do seu trabalho.(202) Vejamos, em síntese, o que o estudo sustenta em relação
a cada área:
À medida que a fotografia a cor conquistava os jornais diários, até mesmo em spot
news perto das deadlines, os fotojornalistas foram perdendo algum controle sobre o
seu trabalho em favor dos editores e pessoal da produção (note-se, porém, que o
não se encontra globalmente instituída a figura do editor fotográfico, pelo menos tal
tornou esta tarefa desnecessária, pois podem-se realizar impressões ou difundir fotos
passaram, assim, numa segunda fase, a fotografar unicamente com filme a cor, o que,
spot news e certas feature photos fossem sujeitas a esses processos. Aliás, a situação
teria mesmo feito distinguir entre o valor de uma "fotografia real" e o de uma foto-
ilustração.
fotojornalismo a cor.
e para a distinção clara entre as imagens que poderiam ser livremente manipuladas
(illustrations e alguns features) e as que só podiam ser manipuladas para realçar mais
A introdução das still video cameras promoveu sentimentos ambivalentes no seio dos
fotojornalistas, além de ter insuflado desconforto nesse corpo profissional, que via
trespassar para a sua área tecnologias da televisão: por um lado, passando menos
tempo nos laboratórios tornava-se possível aos fotojornalistas dedicarem mais tempo
ao jornalismo; por outro, as still video cameras tiravam das mãos do fotojornalista o
especialmente nas (grandes) agências noticiosas. Para nós, tal acentuou ainda mais a
fotojornalista, que assim perde controle sobre o seu trabalho em privilégio dos
consideradas como uma oportunidade de libertação como uma ameaça ao estatuto profissional,
qualquer modo, já não haveria lugar a retrocessos, pois, na versão de Becker, uma vez introduzidas
Por isso, restou aos fotojornalistas acentuarem um discurso em que o controle do fotojornalista sobre
fotojornalismo praticado nas grandes agências noticiosas. Essas agências foram a Europress, a Apis
fotógrafos desta última foram, talvez, os mais audaciosos, mas os da Reporters Associés nem sempre
lhes ficavam atrás, como o provou a "competição" entre Hubert le Campion (Reporters) e Philippe
Vladimir Rychkoff (Lova de Vaysse), filho de um príncipe russo imigrado em Paris, criou, com
Renaud Martinie e André Sonine, a Reporters Associés, em 1954, e tornou-se o seu principal
mentor; Louis Dalmas, Príncipe de Polignac e primo do Príncipe Rainier, um playboy que pertencia
à alta sociedade e que vivia a vida em velocidade (pilotava, até, aviões nas horas vagas) criou a
agência que tem o seu nome em 1958, com o fito de ser sempre o primeiro na caça ao scoop. O
mercado, aliás, absorvia a produção: só em França era preciso contar com a concorrência entre a
fundador. Os meios postos em acção para a cobertura de actualidade eram enormes, em termos
humanos e materiais. Quando a actualidade não era quente, Dalmas não hesitava em mandar os seus
fotógrafos para locais onde pudessem fazer imagens rentáveis. É assim que, em 1960, envia um
jovem repórter ao Sahara. Chamava-se Raymond Depardon (1942-) e foi dar de caras com dois
soldados franceses desaparecidos no deserto, quase a morrer. As fotos de Depardon surgiram depois
Foi também a Dalmas que conseguiu um dos exclusivos mundiais de maior interesse
para Portugal, num exemplo que é igualmente a demonstração dos métodos incomuns que a agência
usava para bater a concorrência: por alturas do sequestro do paquete Santa Maria pelos anti-
salazaristas comandados por Henrique Galvão, Louis Dalmas pensou em fazer descer em
demonstrar uma grande capacidade de adaptação às diversas situações: chegou a ter, por exemplo,
reportagens e os negativos não eram deles. De alguma forma, apesar dos tempos aventurosos que
Louis Dalmas proporcionou, a agência foi asfixiada pelo seu fundador. O mesmo aconteceu às
restantes agências, que até acabaram por desaparecer, dando lugar a uma segunda geração de
agências francesas, dirigida por um outro tipo de empresários, que subsistiriam até aos nossos dias
com um êxito tal que, pelo final dos anos oitenta, ocupavam, em produção e volume de negócios, os
três primeiros lugares do ranking das agências fotográficas: a Gamma, a Sygma e a Sypa.
A Gamma foi, das três, a primeira a ver a luz do dia. Hubert Henrotte, do Figaro,
fundar essa agência. Ainda em Janeiro de 1967, junta-se-lhes Gilles Caron (1939-1970), um dos
fotógrafos que mais se destacou por seguir a máxima de Capa: estar lá, antes dos outros. Por lá
passaram também, Jean Gaumy, Michel Laurent, Sebastião Salgado, Abbas e David Burnett, entre
outros.
em 1970, são um exemplo de virtuosismo e empenho. Cobriu o Maio de 68, em Paris, e o conflito
do Biafra, no mesmo ano, dando a conhecer à Europa esta guerra civil nigeriana. Esteve no Tchad,
em 1970, e passou também pelo Vietname e por Israel, em 1967. Raymond Depardon, no livro
póstumo que consagrou Caron, disse dele que era um fotógrafo bem informado, engagé e anti-
violência. E Cartier-Bresson sentenciou que Caron era digno de lhe suceder E, como é raro Cartier-
Bresson emitir opiniões tão cáusticas, isto talvez se deva ao facto de, tal como refere Margarita Ledo
(1988), Gilles Caron ter introduzido a foto-símbolo na informação pontual, como acontece na foto
em que polícias de cassetete na mão perseguem manifestantes, durante o Maio de 1968, em Paris.
Uma foto que funciona também como testemunho, como prova, como foto-verdade.
autonomia dos fotógrafos quer ao nível da escolha temática (com adiantamento de verbas) quer ao
nível do respeito pelos direitos de propriedade, especialmente no que respeita ao direito de
assinatura e à propriedade dos negativos. De facto, nos objectivos da Gamma inscreve-se, desde a
produção diária e de volume de negócios. Porém, em 1973 estala uma crise entre o pessoal da
agência, que se revolta contra Hubert Henrotte e a sua direcção essencialmente economicista. Este
sai, acompanhado pelos fotógrafos Leonard de Raemy, Henri Bureau, Alain Dejean, Christian
Simon Pictri, Jean Pierre Bornotte (que regressaria à Gamma), James Andanson e Alain Noguès, e
fundará aquela que, pelo final dos anos oitenta, se tornará a maior agência fotográfica do mundo em
1973 a Gamma renasce da crise, como o comprova a cobertura do golpe de Pinochet, no Chile,
realizada por Chas Gerretson. Em 1976, Françoise Demulder, também da Gamma, faz, no Líbano,
uma foto que ganha o prémio da "foto do ano" do World Press Photo. As nuvens tinham passado,
Na Sygma, a orientação será dada pelo mercado. A agência veio, desta forma, a
distinguir-se pela atenção dada ao sector do beautiful people, que, em certa medida, dominará a sua
produção. É, afinal, o que vende: os astros do cinema, os nobres, o jet set, as modelos, os
empresários de sucesso, em suma, algumas figuras públicas. Podemos mesmo dizer que enquanto
agências como a Magnum são agências ao serviço dos fotógrafos, em agências como a Sygma são
negligenciável: em 1974, por exemplo, Henri Bureau fotografou a captura de um agente da PIDE em
Portugal, e, com ela, ganhou um prémio do World Press Photo na categoria das melhores imagens
de actualidade do ano.
"talentoso descobridor de talentos". De facto, foi com Sipahioglu que se iniciaram quer futuros
proprietários de agências, como Annie Boulat (Cosmos), Jocelyne Benzakin (JB Pictures) ou Daniel
Roebuck (Onyx, uma agência fotográfica de show business), quer fotojornalistas referenciais, como
Abbas. Em algumas ocasiões os seus fotógrafos distinguiram-se pelos scoops que realizaram, como
a foto de Nick Wheler que, em 1975, permitiu, pela primeira vez, que se visse a cara do terrorista
Carlos.
Martine Franck, Richard Kalvar e Alain Dagbert fundaram, a 6 de Janeiro de 1972, a agência
fotográfica Viva. Entre estes fotógrafos, Le Querrec é, talvez, o mais importante, apresentando, à
semelhança de Erwitt, uma fotografia viva, centrada nos comportamentos humanos em sociedade,
por vezes bem estranhos. Porém, Kalvar, Martine Frank e Le Querrec sairam da agência, em 1970,
único tema durante um período determinado de tempo. Assim, em 1973 desenvolveram o projecto
documental Families en France, não publicado nesse país, mas que alcançou algum sucesso em
somente imagens violentas, à semelhança, aliás, do que ocorreria se fizéssemos, hoje, uma
retrospectiva das fotos premiadas com o prémio da "foto do ano" do World Press Photo ou do
prémio Pulitzer.
passado váarios anos a dirigir a secção de fotografia do Libération, onde, como se disse, levou a
cabo uma política fotojornalística que o fez aproximar qualitativamente dos anos de ouro do
fotojornalismo.
produção, a caça ao scoop, tudo cobrir, estar em todo o lado, mas sim diversificar as actividades,
respeitar os estilos e pontos de vista de cada fotógrafo, abordar mesmo o que poderá ser dificilmente
vendável, com rigor e exactidão. Tal como a Magnum faz ou, pelo menos, tal como alguns
fotógrafos da Magnum fazem a nível individual, a Vu não trabalha exclusivamente para a imprensa,
embora esta seja a sua principal razão de existência — a sua actividade é alargada às exposições, aos
livros, à publicidade e à moda. Todavia, há pontos onde a Vu difere da Magnum. Por um lado, é
pouco nítido que a Magnum continue, hoje, a orientar a sua produção preferencialmente para a
imprensa. Por outro lado, embora a afirmação nos pareça limitadora, especialmente no que diz
sessenta em diante foram, provavelmente, Le Querrec, Caron, com os seus instantâneos obtidos no
1978, e Notes, em 1979, com fotos do Líbano e do Afeganistão. Por eles se nota que Depardon
prefere a globalidade de uma história à foto única, o que foi talvez, além da discordância com a
linha de mercado que a Gamma seguia, a razão que o levou à Magnum, o enclave do fotojornalismo
de autor, em 1978.
Pode dizer-se que também Gilles Peress (1946-), ao editar o livro Telex Persan sobre
a revolução iraniana, se juntou a esse pequeno grupo de foto-repórteres influentes. As suas fotos
concretizam a assunção da sua subjectividade, por vezes roçam mesmo a ambiguidade, tal a
polissemia que apresentam. São, assim, fotografias que impedem leituras estereotipadas,
preconceituosas. Mas também que favorecem leituras quase "aleatórias", "desconexas", como os
blips informacionais de que falava Alvin Toffler, em A Terceira Vaga.
Vietname
Embora talvez não tanto como é comum dizer-se, a fotografia jornalística teve algum
papel na construção de correntes de opinião sobre a Guerra do Vietname(204), conflito acerca do qual
se descobriu que a televisão nem em tudo dava o mesmo que a fotografia poderia dar: a TV não se
contextualização pela multiplicação de pontos de vista que a fotografia permite tornava-se difícil
para a televisão (envolveria mais meios técnicos e humanos e mais dinheiro; envolveria a
uma máquina fotográfica; implicaria correr o risco de se enfadar o telespectador). Além disso, a
observação de uma fotografia é (pode ser) determinada pelo observador, enquanto a observação de
Podemos dizer ainda que, durante a guerra, se recuperou o papel activo e mobilizador
levou a uma grande procura de imagens, acentuada pela concorrência. A UPI, a AP, jornais,
revistas, rádios e televisões, todos enviavam correspondentes para o país, que se juntaram a dezenas
de freelances. Os editores pediam cada vez mais mortos.(207) Por isso, a utilização das foto-choque
foi frequente, até porque se tratava de um conflito relativamente pouco censurado durante os cerca
de trinta anos em que decorreu, especialmente quando comparado com o que sucedeu no Golfo, no
Panamá ou nas Falkland, locais onde se assistiu a uma autêntica imposição do segredo, a uma
imposição de regula(menta)ção fotojornalística, por parte dos poderes, que reagiam ao que se havia
Muitas das fotos tiradas no Vietname obrigam o observador atento a inquirir-se sobre
se imagens como essas simbolizam o conflito porque resumem e condensam uma característica
proeminênia simbólica devido a representarem uma faceta da guerra que é única e sensacional.(208)
Dentro deste espírito, Graham Greene chegou a protestar contra fotografias de torturas obtidas no
Vietname do Sul com a permissão dos torturadores, numa carta publicada, a 6 de Outubro de 1964,
para o campo fotográfico, pode promover a neutralização afectiva, pode insensibilizar, pode
passivisar, independentemente do efeito profundo, visceral, que, num instante passageiro, uma foto-
propiciou reflexão sobre a insanidade e a insensatez da devastação. Isto passa-se quer através de
algumas spot news quer de algumas foto-reportagens, incluindo foto-ensaios. No dizer de Les
Barry, a Guerra do Vietname teria sido mesmo a escola dos New War Photographers, à semelhança
do Novo Jornalismo.(209) Todavia, como é evidente, os trabalhos dos fotógrafos nem sempre dão
imagens similares da guerra. Thompson, Clarke e Dintz fizeram notar, comparando dois fotógrafos
que cobriram o conflito, que enquanto um se centrou nos aspectos não militares e nas consequências
ambiente de combate.(210)
Entre os autores que estudaram a cobertura de guerra, Edward Epstein afirma que
antes da ofensiva do Tet, em Fevereiro de 1968, as fotos que o público (americano) observou
representavam principalmente uma guerra tecnológica limpa, com ênfase nas operações de combate
americanas e no equipamento militar; depois do Tet, o foco de atenção dos news media americanos
desviou-se para "estórias" que representavam o caos e a confusão perto do colapso.(211) Expressando
dúvidas de que a guerra poderia ser ganha, a cobertura mediática centrou-se também nas
"vietnamização" do confronto: começaram a ser cobertas acções das forças armadas do Vietname do
Sul.(212) Susan Sontag especula até que as fotografias do conflito que mostravam a tragédia, a dor e o
sofrimento não foram realizadas até haver manifestações públicas contra a guerra.(213) Gans aponta a
competição como principal razão para que os órgãos de comunicação social norte-americanos
guerra, ficaram encerrados num sistema do qual nenhum pretendia dar o primeiro passo para sair.(214)
deixaram impressões mais profundas e duradouras do que a televisão, já que as imagens do conflito
que subsistem na memória das pessoas seriam essencialmente construídas através das fotografias
No estudo "Vietnam War Photos and Public Opinion", Michael Sherer conclui que,
nas revistas Time, Life e Newsweek, a cobertura fotojornalística da guerra foi-se modificando em
consonância com as mudanças nas correntes de opinião do público americano: enquanto existiu
apoio público à guerra, as três revistas publicavam principalmente fotos das forças americanas e do
combate, raramente surgindo fotos de situações reais de combate; pelo contrário, quando a opinião
guerras do Vietname e da Coreia na Time, na Newsweek e a Life, que publicou em 1988. Neste
trabalho, o autor constatou que em situações de combate similares, isto é, soldados americanos
enfrentando uma grande ofensiva inimiga, as imagens da guerra diferiam num aspecto substancial:
no Vietname, o público americano pôde observar regularmente imagens que revelavam a face brutal
do conflito (cenas de combate próximas, mortos, feridos, destruição, pessoas enfrentando ameaças
imediatas à vida, etc.); na Coreia, talvez devido à censura imposta pelo general McArthur, a 21 de
Dezembro de 1950, o público americano foi poupado à brutalidade dos combates, em favor de uma
visão mais contemplativa de pessoas simultaneamente chocadas e algo desesperadas mas a salvo das
experiências de combate (fotos realizadas antes ou depois de situações de combate); contudo, não se
registaram grandes diferenças entre quem era fotografado (militares, sobretudo) e as perspectivas em
que o era.(218)
1968 e 1973 na Time, na Newsweek e na Life, Oscar Patterson III concluiu, aliás como Epstein, que
essas revistas não se concentraram nas fotos de tropas americanas em combate, reportando também
outras ocorências, como as conversações de paz; concluiu ainda que a cobertura da guerra não se
tornou mais sangrenta durante esse período e que apenas cerca de 7% de todas as news stories das
mesmas revistas eram dedicadas ao Vietname; finalmente, afirmou que a percepção selectiva que o
público em geral tem sobre os eventos altamente dramáticos reportados pelos news media leva à
projecção pública desses eventos como representativa de toda a cobertura mediática: as fotos mais
traumáticas do Vietname ter-se-iam, assim, imposto de tal modo que toda a cobertura
para que aumentasse o charco de sangue, a fotonecrofilia(220), ou, no ponto oposto, o glamour, as
fotos da beautiful people e o institucional (devido, neste caso, ao peso das conferências de imprensa
mesmo este por vezes sem grandes resultados: a fotografia do General Belgrano a afundar-se
durante a Guerra das Falkland, adquirida a um oficial argentino corrupto e difundida pela Gamma,
não fez com que revistas como a Paris Match vendessem mais. O que focaliza mais as atenções
parece serem as caras, os corpos e os ambientes belos. As fotografias das stars e das starlettes
pesam mais do que as news photos e muito mais do que assuntos como as transformações sociais ou
publicável. O terriotório do fotojornalismo tende a desviar-se para as pessoas, para o show business,
Capa e Cartier-Bresson, o Vietname viu também nascer grandes nomes do fotojornalismo, como
Don McCullin (1935-) (Fig. 35), Larry Burrows (1926-1971) (Fig. 36), Gilles Caron, Catherine
Leroy ou Philip Jones Griffiths (1936-). Noutros locais, revelaram-se fotógrafos como Koudelka
(1938-) (Fig. 37), Susan Meiselas (1948-) (Fig. 38), James Nachtwey (Fig. 39) ou Yves-Guy
Berges.
O documentalismo fotográfico contemporâneo
finais do século passado e princípios do actual, embora não existam sempre similiaridades evidentes
entre as formas de expressão que usam os documentalistas na actualidade e aquelas a que recorriam
os pioneiros do género. Com efeito, hoje os fotógrafos documentais estão provavelmente mais
actual, sem abandonar, por vezes, a acção consciente no meio social, o ponto de vista ou o realismo
fotográfico (que, nalguns casos, estamos em crer, é a melhor opção), promove diferentes linhas de
Parte dos documentalistas actuais não perseguem, portanto, a ilusão de uma verdade
questionando, chegar à "sua verdade", a uma "verdade subjectiva", o mesmo é dizer, a uma visão do
compreensão contextual dos acontecimentos e das problemáticas afigura-se aos olhos desses
fotógrafos como essencial para a sua apreensão e para a apreensão do seu significado.
diversidade cultural e pela polifonia enriquecedora, ao fazer proliferar os pontos de vista, ao ser feito
subjectividade no olhar e à ficção assumida (legitimada até porque as próprias percepções que se
têm da realidade já são mediadas e, deste modo, são também uma ficção sobre a realidade), situam o
Afterimage, órgão do Visual Studies Center de Rochester, é importante pelo rigor dos estudos que
publica: aqui os textos têm uma importância tão grande como a imagem.
A nova fotografia documental combina um estudo atento das temáticas com um largo
espectro de estilos e formas de expressão que usualmente se associam à arte, perseguindo mais o
simbólico que o analógico, a subjectividade do que a objectividade, perseguindo mesmo, por vezes,
a invenção, a ficção construída sobre o real, a encenação interpretativa (Fig. 40). Aqui, a prova de
verdade e credibilidade não tem lugar, não o tendo também a inocência.(223) A fronteira entre o
documento, no sentido originário do termo, e a arte estreita-se e esbate-se nesses casos. Os novos
documentalistas desenvolvem mais comentários visuais sobre o mundo do que geram notícias
visuais sobre esse mesmo mundo. Consequentemente, as linhas de trabalho dos fotógrafos
apresentam frequentemente diferenças assinaláveis, acentuadas pela aposta na autoria. Porém, entre
outros autores, como Salgado (1944-) (Fig. 41), Eugene Richards e Mary Ellen Mark, nota-se uma
Exemplificando, a nova fotografia inglesa, saída do thatcherismo, mistura, numa nova estética
documental, o realismo e o inexpressionismo retórico, o que se nota, por exemplo, em Anna Fox e
Martin Parr. Contudo, paradoxalmente mistura-se nessa estética uma subjectividade quase intuitiva
que parecem espontâneas, mas que nem sempre o são, em imagens que procuram representar
coincidência temática.
Verifica-se, pelo que foi exposto, que, tal como qualquer outro tipo de fotografia, o
documentalismo não pode evitar a influência da história, do meio social, da cultura e do momento
discurso;
4. O fotógrafo tem uma visão específica sobre a representação do seu meio social;
reserva a soberania sobre as modalidades de difusão do seu trabalho, e tal faz parte
integrante do projecto. A utilização de livros e exposições como suportes de difusão
Uma fotografia inserida num livro ou exposta numa galeria não pode ser desprezada
nem olhada muito rapidamente como o é tantas vezes nos jornais e revistas. Ao
maior atenção.
skinheads de Killip;
3. Vidência do real como hiper-real, como falso, como a "foto das cousas", como o
ponto de vista interpretativo ou opinativo. Vai, de facto, mais longe, jogando nos terrenos da
questões que hoje se levantam a alguns fotógrafos estiveram na origem da fundação da organização
Droit de Regard, em França, em 1990. Nesse ano, a organização, animada, entre outros, por Patrick
Zackmann, da Magnum, lançou o Manifesto dos Fotógrafos-Autores, o seu texto fundador, que em
grande medida sintetiza o que vai na alma dos documentalistas actuais. Entre outros pontos, os
fotógrafos-autores reivindicam o direito à subjectividade, a promoção da noção de autoria na foto, o
controle sobre a edição e o mise-en-page (ou o mise-en-scéne nas exposições), o direito à assunção
para o documentalismo, como provam as séries de Trabalho, de Sebastião Salgado, publicadas pelo
Expresso, pelo El Pais, pelo Grama ou pelo Frankfuerter Allgemeine, ou as séries de Migrações, do
mesmo fotógrafo, publicadas pela Visão, em 1995; ou como o provam as políticas que Caujolle
São ainda casos um pouco isolados, mas representam um novo pioneirismo editorial, como o que
animou Stefan Lorant ou Karl Korff nos anos vinte e trinta. Além disso, contra o predomínio da
infografia e do design visual do jornal pós-televisivo, assiste-se, nos quality papers, a um certo
produto que se distinga dos restantes, razão pela qual surgem estas pedradas de profundidade,
o de Berlim, em 1961. Mas o interesse da sua obra reside na utilização desse formalismo: destinou-
se, antes de mais, a mostrar, meticulosa e cruamente, o horror, o martiricídio das vítimas de uma
série de calamidades, em imagens que expressam conceitos, obtidas em sítios tão diferentes e tão
moralistas e humanistas. A sua particularidade residiu na forma como jogava com a estética do
Distinguiu-se pela discrição que colocou no seu trabalho fotográfico, um método cuja
intencionalidade só se percebeu quando publicou uma das críticas mais devastadoras que se fizeram
fotograficamente contra a Guerra do Vietname, o fotolivro Vietname Inc., editado em 1971. As suas
fotos, entre as quais uma de prisioneiros vietcongs ligados por uma corda ao pescoço como se
fossem animais, foram, julgamos, das que mais inculcadas ficaram na memória das pessoas e das
Depois da guerra, foi a Àsia que mais seduziu Griffith. A maior parte das fotos do
seu livro Dark Odyssey, editado em 1997 pela Aperture, são desse continente. Mas o álbum também
integra fotos de África, Inglaterra, França, Granada e do Sudão, onde, em 1988, observou a guerra
movida pelos muçulmanos integristas de Cartum aos cristãos e animistas do Sul do país. Neste país,
são particularmente chocantes as graficamente intensas fotografias que realizou num campo vigiado
onde foram internadas crianças que desenvolveram deficiências psíquicas devido à violência. Essas
fotos são, de algum modo, um protesto visual eloquente contra a violência política.
ambição e empenho com que desenvolvia a sua caça ao scoop. Fotógrafo da Associated Press em
Saigão, Faas organizou uma rede de informadores e de fotógrafos, mesmo amadores, que contactava
lo, o filme de Robert Capa da invasão da Normandia, era um fotógrafo de grande sensibilidade, que
aliava a uma capacidade estético-compositiva uma técnica fora do comum. Era também
formalmente rigoroso: chegava quer a desenhar previamente esboços das fotografias que contava
obter durante as reportagens quer a usar um termocolorímetro na cobertura de guerra. Para uma
reportagem sobre a guerra aérea no Vietname, por exemplo, chegou a fazer doze desenhos para
outras tantas composições fotográficas que ele previa realizar e publicar. Uma dessas estava
concebida para que numa só fotografia se pudessem contemplar o capacete do piloto, os comandos
Para conseguir essa imagem singular, provou vários tipos de aviões das forças americanas e
participou em onze incursões aéreas fotografando. Noutra reportagem, colocou uma câmara no
exterior da carlinga do helicóptero para poder captar o soldado com a metralhadora a partir de fora.
Larry Burrows foi um fotógrafo que, não obstante ter-se colocado numa postura de
observador externo da guerra (chegou a recusar trocar a nacionalidade britânica pela americana),
esteve frequentemente perto do sofrimento das populações. Uma das suas reportagens mais
conhecidas reporta o sofrimento de um menino vietnamita ao qual foi amputada uma perna durante
vietnamita que tinha estado bastante tempo nos Estados Unidos para ser operado e que havia
esquecido a língua materna, pelo que não conseguia comunicar com os seus familiares. Além disso,
desembarcam. Na primeira fase da guerra, ele terá sido mesmo o fotógrafo mais inovador,
mantendo sobre a realidade um ponto de vista assumidamente crítico. Viria a ser um dos 39
repórteres mortos em serviço na Guerra do Vietname, quando, em 1971, ao fotografar a invasão sul-
vietnamita do Laos, o helicóptero em que seguia foi abatido por cima dos desvios laosianos da rota
de Ho Chi Minh.
exemplo, as fotografias mais famosas de outro importante fotógrafo, Josef Koudelka (1938-), são,
porventura, as do esmagamento da Primavera de Praga pelas tropas soviéticas e dos seus aliados do
Pacto de Varsóvia, em 1968. Sem recorrer à estética do horror, e estando "em cima do
povo que se erguia contra a opressão, em imagens que partilham o sentido do heroísmo e a tensão.
Koudelka partiu para o exílio em 1970. Um ano antes as suas fotos tinham sido
difundidas em todo o mundo, sem menção do autor, e Koudelka, como anónimo, recebeu a medalha
de ouro do Robert Capa Overseas Press Club. Será apenas em 1984, após a morte do seu pai, que
tinha ficado na Checoslováquia, que Koudelka reconhecerá a autoria das fotografias. Entretanto, em
Antes da série sobre a Primavera de Praga, Koudelka trabalhou num outro projecto,
desde meados dos anos sessenta: a vida dos ciganos. Constituiu um espólio testemunhal que coloca
questões ao observador sobre a vida e o destino desses nómadas, através do equilíbrio de formas
conjugado com as indecisões gestuais dos sujeitos representados. É nesse equilíbrio formal, cuja
harmonia é quebrada pela estranheza singular de motivos insólitos (como na foto de uma ave
pendurada numa corda pelas patas — Irlanda, 1978), que se joga o sentido de algumas das suas
imagens.
nome de uma exposição colectiva em Rochester, em 1966), Friedlander concentra-se nos espaços
urbanos, mas representando-os como uma associação simbólica criptográfica. Mesmo os ambientes
familiares tornam-se, pela sua abordagem, em coisas estranhas, artificiais. Assim, obriga o
observador a conotar, a interpretar, mesmo que essa interpretação seja frequentemente difícil devido
aos signos que, sob a marca da efemeridade, são postos no campo fotográfico: reflexos nas vitrines
das lojas, arranjos artificiais, letreiros ou televisões difundindo imagens que se tornam quase
fantasmagóricas.
do governo francês. Com o seu trabalho, procuraram documentar os graves problemas vividos pela
Pelo final dos anos setenta, a revolução sandinista na Nicarágua permitiu a Susan
Meiselas (1948-) —que, mais tarde, veio a dirigir a Magnum USA— evidenciar-se como fotógrafa.
Sem temer a proximidade da acção, Meiselas realizou, na Nicarágua, uma foto-reportagem recheada
de acção que se distingue pelo uso simbólico da cor. Todavia, na sua reportagem, Meiselas também
representa o dia a dia do homem comum e dos soldados num ambiente de guerra: ela aposta não
testemunhar com profundidade: é preciso entender para fotografar bem, parece ser a conotação
última que se pode extrair do conjunto da sua obra. O fotojornalista tem de estar informado, tem de
conhecer, tem de se formar e educar, não apenas sobre o seu ofício, mas sobre os problemas que
sobre as road strippers norte-americanas, que virá a originar o livro Carnival Strippers. Ela
partilhou com as strippers três anos de vida, percorrendo o Nordeste americano durante o Verão,
observando como, por alguns dólares, essas jovens mulheres se despiam, permitindo que as
olhassem, tocassem ou até lambessem. Alojou-se com elas nos hotéis baratos, lavou a roupa com
elas, preparou os espectáculos com elas. Passando despercebida, conseguiu realizar fotografias de
valor inestimável, raramente posadas, que geram fortes empatias entre o observador e as
personagens representadas.
Salvador. Neste último país faz uma das suas fotos mais simbólicas: fotografa as sombras de
prisioneiros das forças de segurança, com as mãos na nuca. Foi em El Salvador, mas poderia ter
vezes com o prémio Robert Capa e duas vezes com a foto do ano do World Press Photo (1992 —
foto de uma mulher somali que coloca na terra o seu filho morto pela fome, embrulhado num lençol;
1994 — Hutu ruandês com a cabeça mutilada). [Outros premiados duas vezes foram David C.
Turnley, da Black Star (1988 — um arménio chora o seu filho morto no tremor de terra que
ensanguentou a Arménia; 1991 — um sargento americano faz um esgar de dor ao saber que o corpo
que repousava junto dele era de um seu amigo, vítima de tiros aliados no último dia da Guerra do
Golfo), e Kyoichi Sawada, da UPI/Bettmann News Photos (1965 e 1966, com fotos da guerra do
Vietname).]
humanitária na Somália. Em 1989, tinha reunido no livro Deads of War as suas fotos da guerra na
Nicarágua, da luta fraticida na Irlanda do Norte, da acção dos esquadrões da morte na América
Central e da Guerra Civil do Líbano. Trata-se maioritariamente de spot news, geralmente sem
grande atenção à composição, mas brutais e terríficas. Aliás, um esteticismo exagerado pode ser
contraprudecente quanto se trata de representar a brutalidade dos conflitos, embora também possa
argelina, país onde regressou em 1992, para abordar a problemática do terrorismo fundamentalista.
Esteve também no Congo, no Vietname e no Cambodja. Tem ainda fotografias fora do vulgar da
Amazónia. Aqui, ele tentou combinar o humor e a acção numa fórmula pessoal de fotojornalismo.
Todavia, as suas fotos mais conhecidas são, provavelmente, as da sexta-feira negra da revolução
iraniana: foi o único fotojornalista que fotografou os massacres perpetrados pelas forças da ordem
do lado dos manifestantes que pediam a partida do Xá. Nesse dia, morreram 30 iranianos.
Exemplos de diversidade:
que permite a inclusão no género de uma grande multiplicidade de fotógrafos. Três grandes
agências com nome feito congregam alguns desses fotógrafos, a Magnum, a Vu e a Contact, mas
Martin Parr, da Magnum, hoje aposentado, foi talvez um dos fotógrafos mais
inovadores dos últimos tempos. No seu trabalho, nota-se a procura dos padrões culturais da "classe
média" (mais em termos educacionais que económicos) e a busca dos esquemas de consumo dessa
"classe" — nos lares, nas lojas, nas actividades turísticas. Para gerar significação —especialmente
para representar o consumismo, por ele entendido como exagerado—, Parr usa imagens
minimalistas, cheias de cores fortes (com Paul Graham, Paul Reas e outros, Parr é um dos fotógrafos
do movimento new color), quase atingindo a saturação cromática. O kitsch e a ironia são
acentuados pelas representações patéticas das personagens que surgem nas fotos do autor. A obra
um artritismo social de que enfermaria a sociedade britânica. Nesta linha, ele aproxima-se dos
concerned photographers. No Ano Santo (1993), colaborou no projecto Sobre Santiago: Tres de
Magnum.
ironicamente o universo dos gentlemen britânicos e da "nata da sociedade" nos seus ambientes, que
fez acompanhar de frases corrosivas. A sua abordagem das temáticas sociais concretiza-se, assim,
numa crítica ao capitalismo. Uma das suas fotos mais emblemáticas —mas, porventura, também
mais estereotipadas— é, inclusivamente, aquela em que um corvo pousa sobre uma caveira —a
morte— pousada no limbo das moedas (o capitalismo) e das misérias em que este alegadamente
assenta, estas figuradas por um pano negro sobre o chão. Por trás, adivinha-se o peso das
instituições capitalistas devido ao sólido e pesado edifício que surge no plano de fundo. Esta foto é
ficção discursiva no campo documental, coisa até há alguns anos atrás impensável.
Na Grã-Bretanha, Nick Waplington, que tal como Parr usa significativamente a cor,
publicou Living Room, na Aperture. É um álbum de imagens, realizadas ao longo de quatro anos, da
vida familiar, das pequenas situações do quotidiano, dos operários londrinos que viviam ao lado do
avô de Waplington num programa de habitação social. Em várias fotos, o humor está subjacente,
mas o observador tende mais a rir-se com as personagens representadas do que a rir-se delas.
Waplington joga frequentemente com a estranha organização das pessoas nos espaços domésticos e
Nan Goldin. A sua fotografia é ultra-intimista, uma vez que, com as suas fotos, apenas olha para a
sua vida e a dos seus amigos, que são os únicos sujeitos representados nas imagens, um pouco à
semelhança do que Larry Towell fez com a sua família e Eugene Richards com a sua mulher. A
Aperture já publicou um livro de Nan Goldin, com fotografias realizadas em Nova Iorque,
passionais. São imagens com flash, directas, sem maneirismos, em enquadramentos que aproximam
O Reino Unido pós-industrial de Chris Killip e In Umbra Res, de Paul Graham, uma
abordagem da martirizada cidade de Belfast, são dois outros trabalhos documentais recentes e
emblemáticos. Graham concentra a atenção no que está perto de si, no lugar onde se desenvolvem
Jane Evelyn Atwood é outra das fotógrafas que elege temas que vão contra as rotinas
e os news values dominantes na imprensa: os cegos, a prostituição, a SIDA. Jane Atwood não se
preocupa tanto com o número de temas, mas sim com o seu tratamento, feito ao longo de projectos
que duram muito tempo. A fase final do trabalho, a edição, é algo que a fotógrafa não abdica de
controlar, desde o texto ao design e à editoria.
Numa abordagem não estereotipada, Jane Evelyn Atwood representou, por exemplo,
a dor dos doentes e idosos nas camas "da morte", agarrando-se, por vezes, a móveis, tentando
levantar-se, erguer-se para a última centelha de vida, angustiados pela eminência da morte, que,
porventura, não vêem como libertação mas como liquidação. São imagens chocantes, as que a
fotógrafa nos oferece. São imagens que mexem com a consciência tranquila dos bem instalados,
que não querem ver e preferem a ignorância. Para estes, ver talvez não seja apenas um direito, mas
um dever.
Patrick Zackmann é, por seu turno, um incondicional defensor da subjectividade do
olhar fotográfico, o que se demonstra pelo empenho que colocou na fundação da Droit de Regard.
fotografados, partilhados com o fotógrafo, e a atenção aos objectos significativos, como ocorre
numa foto em que o relógio de parede está implantado na escultura do tronco e cabeça de um
culturista musculado.
Patrick Zachmann elegeu a diáspora chinesa no mundo como tema do seu trabalho
após 1986. A sua visão, sendo pessoal e subjectiva, tem, contudo, mais preocupações documentais
Miguel Trillo debruça-se sobre a cultura urbana, incluindo as culturas juvenis, usando
planos frontais, retratando com contexto, lutando pelos seus frames. Manuel Sendón também
representa a cultura urbana, mas em Paixases faz sentir não só o desejo de natureza que apresentam
os citadinos como também o absurdo que é procurar satisfazer esse desejo através de cartazes
afixados em paredes. Todavia, a representação fotogáfica é, aí, enganosa, pois parece, de facto, que
as pessoas se movem em cenários naturais e em espaços abertos: é a vida na natureza como uma
ficção resultante dos desejos urbanos; é mesmo o mundo estranho das selvas de betão em que a
própria natureza é mostrada pelas suas representações. Trata-se de uma das expressões mais visíveis
A exemplo dos outros dois fotógrafos espanhóis, o galego Xurxo Lobato, chefe de
fotografia do Voz de Galicia, atenta no kitsch, nos contrastes entre o urbano e o rural, o beato e o
pagão, na sua pátria. O suporte livro é o seu preferido para a difusão do seu trabalho de projecto,
encerrada, encaixada, em paredes de betão, mas em que se nota a vontade de sair daí,
preferencialmente a grande velocidade, como nos parece que sugerem algumas fotografias de Work
Stations, nas quais o movimento dos sujeitos é acentuado pela utilização de velocidades lentas
(efeito de arrastamento).
cientista norte-americana Ethel Rosenberg, executada com o marido na cadeira eléctrica, em 1953,
americana Mary Ellen Mark nota-se uma identificação estilística e temática. Não só é o ser humano
o centro da abordagem fotográfica como também, nas obras de todos eles, se revela um certo
humanismo, que talvez chegue ao humanitarismo. Trata-se, afinal, de uma revivência do concerned
photojournalism.
os quais avultam um trabalho sobre as emergências hospitalares e outro sobre os viciados em crack
de Nova Iorque. Mas o seu trabalho mais emblemático continua a ser o que fez sobre o sofrimento
da sua mulher, que tinha um cancro num seio. Richards acompanhou-a nas suas visitas ao hospital e
durante os tratamentos, até que, ao fazer uma mastectomia, Dorothea morreu. Juntos tinham
não estereotipada: as pessoas não são categorizadas, não é apenas o negro do subúrbio que é viciado
ou vítima da violência. Não é apenas nos bairros pobres, mas em toda a cidade, que se vêem
pedintes. Não se distinguem arquétipos raciais e de classe nas imagens. E emana também das suas
fotografias uma naturalidade e uma graça cândida que resulta da ausência aparente de efeitos
compositivos: o fotógrafo parece que se anula para deixar que a foto conte a "estória" das pessoas
representadas. Todavia, ao contrário de Ellen Mark, os sujeitos das fotos de Richards aparecem
frequentemente como vítimas, o que, nessas situações, e de certa forma, tende a transformá-los em
arquétipos. O contexto é sugerido pela série global de imagens e pela atenção dada ao ambiente.
mesmo território temático da de Richards, que já tinha sido também o de Riis e Hine: os
marginalizados. Nos anos sessenta, Ellen Mark foi uma das primeiras fotógrafas a cobrir as lutas
pelos direitos cívicos, nos EUA. Contudo, como se referiu, os marginalizados que fotograficamente
representa não surgem dominantemente como vítimas: pensam, agem, e frequentemente agem mal e
paradigmático: os meninos têm armas e podem usá-las. Ou não. Na cultura de rua, possuir uma
arma é ter poder, um poder que pode transformar outros em vítimas, um poder ameaçador e
irresponsável de meninos que não fizeram uma socialização integradora e cuja personalidade ainda
está em formação. Tendo problemas, eles também se podem transformar num problema para os
outros.
Num foto-ensaio posterior sobre a Florida, Mary Ellen Mark usa a cor. E é a cor
local convidativa ao descanso e à simplicidade —o céu azul, o pôr-do-sol avermelhado— que vai
contrastar com as figuras dos residentes locais que se pavoneiam empertigaitados pelas ruas, pelas
praias e pela vegetação subtropical. Trata-se, afinal, de mais uma representação da comédia da vida.
Eugene Smith e dos fotógrafos do compromisso social, sobretudo de Hine. E é também um dos
nomes mais marcantes e conhecidos da fotografia documental na actualidade, pois, pela forma como
obriga o observador a olhar para as suas imagens. A receita de Salgado ainda combina a intenção
Portugal, em 1975, durante o Processo Revolucionário em Curso (PREC), uma época em que
Portugal fazia primeiras páginas nos jornais de todo o mundo, especialmente nos europeus. Já aí se
adivinham a perfeição formal, a estética e a beleza deliberada que tenta dar às suas fotos,
mediato, em vez de ao imediato. Só mais tarde, em Fome no Sahel, é que se destrinça essa
preocupação pela perenidade, pela mudança dos conceitos de temporalidade dos media.
qualidade dos contrastes tonais, na textura da imagem (predomínio do grão), na utilização frequente
menos "agressivos"). Nestes planos ele espalha composições clássicas, equilibradas e lumínicas
(por vezes a lembrar a pintura religiosa e mística), frequentemente horizontais. Daqui resulta não só
uma certa calma mas também uma certa doçura no olhar, que corresponde a uma intenção
humanitária — a de intervir em prol dos sujeitos fotografados. Se as suas intenções são informar e
espectáculo, numa sociedade democrática alegadamente preparada para ver e onde tudo seria
mostrável. Ao invés, ele situa-se sobretudo no que é de importância mediata, no que é profundo e
complexo nas sociedades humanas, sem o reduzir (pelo menos, propositadamente) a versões
uma certa parte da sociedade humana, e a foto dispensa a tradução. E é interessante notar que
alguns quality papers abrem as portas à edição dos seus projectos fotográficos. Neste sentido, ele,
de alguma forma, rompe com os critérios dominantes de noticiabilidade, rompe com as rotinas que
Em Trabalho, o seu projecto mais ambicioso até agora executado, Salgado aborda o
domínio do trabalho social, a ordem que emerge do caos, as relações entre os trabalhadores e o
fotógrafo põe em evidencia quer as relações de domínio quer as de subordinação, embora raramente
as de compreensão (repare-se nos danos irreparáveis dos garimpeiros da Serra Pelada à floresta
amazónica). Trabalho é uma narrativa, uma epopeia, sobre a sobrevivência do trabalho manual num
mundo que avança para a pós-modernidade.
Salgado. É através deles que o fotógrafo consegue que as suas imagens tenham sentido, pois é
através da forma que Sebastião Salgado explora o real como um signo, usando para o efeito,
também signicamente, a linguagem fotográfica, com base num código gramatical reconhecível.
Sebastião Salgado sobre o mundo questionam esse mesmo mundo. Deixam o observador entre a
afirma que para ele não há momentos decisivos, apenas "vidas decisivas, com toda a sua cultura e
Pode dizer-se que Salgado concilia a estética com a informação e esta com o
Tal como algumas das suas fotografias se transformaram em símbolos, também Sebastião Salgado
se transformou num símbolo de uma fotografia humanista, por vezes mesmo humanitária. E,
mesmo sendo um documentalista, Salgado afirma que os seus livros são um subproduto, uma vez
que em primeiro lugar trabalha para a edição na imprensa. (Do nosso ponto de vista, Salgado tem
razão. As fotos que representam a humanidade não podem ser apenas para os livros ou para as
exposições, já que assim não só jogam a favor da não democratização da cultura e do conhecimento
como também o seu impacto é menor. Elas têm de regressar às páginas dos jornais e das revistas,
têm que estar disponíveis nos ecrãs dos computadores, seja em home pages na Internet ou inseridas
uma brilhante geração de fotógrafos humanistas, entre os quais também podemos incluir Lam Duc.
O projecto mais conhecido deste fotógrafo é, julgamos, o trabalho da organização Equilibres com as
crianças da Roménia — se a fotografia não consegue mudar o mundo, pode contribuir para
mobilizar a opinião pública, como o provou Lewis Hine, com o seu relevante contributo fotográfico
1996, Les travaux et les jours. Neste álbum, reúne fotografias a preto-e-branco, simbólicas, por
vezes alegóricas, sobre o trabalho, cheias de força poética e calor humano, por vezes mesmo cheias
Pierre Josse e Bernard Pouchèle, que publicaram, em 1996, o álbum La nostalgie est
derrière le comptoir, fizeram uma volta ao mundo, com paragens pelos pontos de encontro que são
os cafés, os bares e os pubs, que fotografaram a preto-e-branco e nos fazem sentir saudades por algo
prepara os seus trabalhos. Durante duas décadas, Cristina Rodero fotografou os rituais e as festas
religiosas católicas e "pagãs" da Espanha profunda, buscando o autêntico entre o visível. Ela é um
exemplo do fotodocumentalismo europeu actual, que persegue a autoria e não hesita em recorrer a
olhar questionador sobre o mundo. O significado das fotos pode, porém, escapar ao observador
O alemão Eberhard Grames, que chegou a ser exibido no Museu de Arte Moderna de
Nova Iorque, preocupou-se, logo após a reunificação alemã, em registar as paisagens da Alemanha
Oriental, que pareciam estar paradas nos anos cinquenta, antes que desaparecessem ao ritmo
documental sobre animais e os seus donos, visando explorar as relações que entre eles se
estabeleciam.
O brasileiro Claudio Edinger, que trabalha para a Gamma e está radicado nos Estados
Unidos, foi uma das revelações do Visa Pour l'Image de 1991, com o testemunho implacável que
deu ao mundo sobre as condições de vida dos deficientes mentais no Brasil. O polaco Witold
Krassowski notabilizou-se pela documentação que reuniu sobre o povo polaco —os seus
comportamentos, as suas atitudes, as suas acções de rua— nos anos das lutas antiditatoriais e do
pós-comunismo, que condensou no livro Visages de l'Est, editado também em 1991. No ano
seguinte, Carl de Keyser, da Magnum, iniciou um projecto documental sobre os grupos religiosos
americanos, enquanto um ano antes o seu companheiro de agência Guy Le Querrec acompanhou
1993, um projecto na mesma temática de Keyser: a vida dos Menonitas. É um documento pleno de
serenitude, que indicia o amor de Towell pela Terra. O mesmo sentimento detecta-se, aliás, ainda
no seu "álbum de família", um projecto intimista que revaloriza a célula base da sociedade, que está
tão próxima de nós mas em que tantas vezes não reparamos ou até esquecemos.
Entre os novos documentalistas, os jovens Eric Vazzoler, Ute Mahler, Jitka Hanslova
e Thomas Sanders tornaram-se notados a partir do momento em que expuseram na Galeria Poirel,
imagens que despoletava mais a vontade de agir sobre o mundo do que debater esse mundo. As
fotografias violentas que faziam parte do conjunto pareciam contribuir para exorcizar os fantasmas e
Visa Pour l'Image, um trabalho inovador desenvolvido por Peter Ginter, Peter Menzel, Alexandra
Boulat e Louis Psihoyos, da agência Cosmos. Trata-se de Material World, um projecto colectivo em
que famílias "típicas" (isto é, consideradas "típicas" pelos fotógrafos) dos Estados Unidos,
Argentina, Mali, Japão, Bósnia e Rússia, entre outros países, foram fotografadas em frente às suas
casas, em pose, rodeadas dos seus bens. Uma forma de salientar diferenças e convergências na
As famílias motivam também o projecto que Uwe Ommer pretende realizar até ao
ano 2000. Este documentalista tem por objectivo fotografar mil famílias de 150 países, nos seus
viragem do milénio.
Abril de 1995, um trabalho documental sobre os últimos comboios a vapor na Índia, que nos
mergulha num tempo passado que teimosamente se perpetua no presente devido aos problemas
económicos do país. A Índia surge, assim, aos olhos do observador como um país adiado no tempo,
uma perspectiva que também parece emergir de um foto-ensaio anterior sobre as escolas indianas e
filipinas.
menos, lançar uma maior compreensão sobre ela—, conjugando um olhar positivo sobre temas
que não o são. Nas fotos encenadas da série Strangers, por exemplo, ele faz posar prostitutas e
prostitutos pagos num cenário em que a sua actividade marginal adquire um estatuto de
insignificância, perto, talvez mesmo, do zero absoluto. Assim, di Corcia obriga à implicação do
observador na contextualização da imagem, de forma a que este chegue às relações fenoménicas
para as quais pretende chamar a atenção: 1) a prostituição é uma chaga social, mas os profissionais
têm direito à dignidade e compreensão; e 2) é preciso ter em atenção até que ponto a prostituição
SIDA ou a Hepatite B.
Viviane Moos, com as suas fotos das prostitutas do Recife, no Brasil, o indiano
Raghubir Singh, que fotografa as gentes do seu país, desde 1966, o italiano Dario Mitidieri, que, ao
serviço do The Independent e do The Sunday Telegraph, fotografou as crianças das ruas de
Bombaim, com um toque de poesia, e Colin Gray (1956-), com a série Parents, uma reflexão sobre
os laços familiares e ao que ocorre na sua órbita, são a prova de que os temas sociais continuam
A Índia, seu país natal, é o grande tema orientador do trabalho de Raghubir Singh.
Este fotógrafo trabalha principalmente em cor, e os seus dois grandes projectos executados até ao
reunidos em livro: The Grand Trunk Road, um fotolivro pretende olhar com atenção para a rota
mítica com o mesmo nome, que atravessa o Norte do país, Bombaim, o Este e o Oeste, fazendo a
ponte entre o moderno e o antigo; e Bombay, uma obra onde Singh tenta revelar ao mundo as
documentalista "tradicional", que, sem abdicar da autoria, se insere na linha dos concerned
Paolo Pellegrin, um italiano da agência Vu, que trabalha na linha dos concerned
abordou as migrações na Europa e os problemas da SIDA na Europa e no Uganda, onde seguiu uma
Cordesse tem sido bastante divulgado, talvez porque se pode alinhar, em certa medida, com os
dos leitores de jornais e revistas "de qualidade" ou "sérios". A sua primeira reportagem foi realizada
em 1991, quando acompanhou uma equipa dos Médicos Sem fronteiras nos campos de refugiados
curdos do Iraque. Está agora a trabalhar num projecto sobre a SIDA. Todavia, por vezes a linha de
trabalho de Cordesse é essencialmente fotojornalística (em sentido estrito), como na ocasião em que
fotografou a guerra civil na Somália, onde testemunhou a fome, e na altura em que fez uma
especialistas até 1996, ano em que o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque organizou uma
exposição sobre a sua obra que, até 1999, percorrerá os EUA, a partir da Big Apple, e o mundo. No
entanto, as suas fotografias, que se inscrevem na tradição documental humanista, sempre foram
vendidas a preços superiores à média. De facto, ao contrário de outros grandes fotógrafos afro-
americanos, como James van DerZee (o fotógrafo de casamentos que regista para a posteridade o
renascimento burguês do Harlem, e cuja originalidade apenas foi reconhecida no fim da sua vida),
relativamente cedo, tal como outro americano negro, Gordon Parks, o paradigma do sucesso
A obra de Roy DeCarava impressiona mais pelo negrume sombrio do que pela
Harlem). As imagens finais da exposição revelam, além disso, uma dedicação dificilmente
superável ao trabalho em laboratório, visível na saturação dos negros, nos contrastes e no grão
finíssimo.
anterior (e, provavelmente, posterior) nos locais adivinha-se pelos objectos observáveis dentro do
campo fotográfico. São fotos que remetem, assim, para o fora de campo, para a exploração do
contexto. Noutras fotos, alguns rostos são amputados pela metade, o que gera o mesmo efeito
exploratório, pois, pelo menos, o observador é obrigado a reintegrar a imagem. Noutras fotos ainda,
Cartier-Bresson.
figura do autor-artista, que, sem fugir à grande tradição fotográfica documental, não abdica de um
olhar próprio sobre o mundo — mais do que um ponto de vista interventor, é apenas a
subjectividade da vidência e a compreensão do mundo que lhe aparentam interessar. Não publicou
muito, mas o que publicou tem qualidade: The Sweet Flypaper of Life (1955), Roy DeCarava:
Photographs (1981) e The Sound I: The Jazz Photographs of Roy DeCarava (1983). Este último
principalmente com as figuras de rua, concentrando a atenção na pessoa como ser social. Não são,
deste modo, as figuras públicas que lhe interessam, mas a gente comum, próxima dele, mesmo
testemunhar, como o fizeram Vroman ou Curtis, e cuja temática incide principalmente nas
revelador da sua visão sobre a alma russa, focando a gente comum, que labuta, sofre e alegra-se
enveredaram, em certas ocasiões, por este campo. O fotógrafo publicitário e de moda Jean
Larivière, por exemplo, empreendeu, em 1996, um vasto projecto pessoal sobre a Birmânia. O
resultado é uma série de fotos que o colocam na linha da grande tradição do humanismo fotográfico
a preto e branco: planos gerais, composições equilibradas e lumínicas, contrastes cuidados, grão que
tanto pode ser fino ou grosso, consoante o efeito pretendido, presença do elemento humano, mesmo
que seja preciso descobri-lo na grande paisagem, nos grandes cenários naturais ou urbanos. A
fotografia de Lariviére é, pois, uma fotografia lírica, poética, que, embora sem preocupações de
registadas no Mundo a partir dos inícios dos anos oitenta. É o ano da queda do Muro de Berlim, que
simboliza, talvez, o fim da era das ideologias políticas. Esta, nos escombros da Primeira Guerra
Mundial, havia substituído a era do progresso e do positivismo em que a fotografia nasceu (século
XIX). Por sua vez, as crenças que virão a substituir a era das ideologias políticas ainda se estão a
desenhar, mas talvez tenham a ver com os valores do individualismo, com a visão da economia
como praxologia, com a formulação da comunicação como nova ideologia, e com a "ressureição" de
Deus, isto é, com o Sagrado a invadir, de novo, o Profano, como tão bem soube expressar
conturbado dos anos oitenta e noventa. Nesta época, entre outros fenómenos, dá-se: a) a queda da
também das migrações (tema do mais recente projecto fotodocumental de Salgado); c) a irrupção em
força das novas tecnologias da comunicação e informação, como as redes globais, e a emergência de
o conflito das Falkland, o raide aéreo norte-americano sobre Tripoli, a Guerra do Golfo, a invasão
Tchéchénia, entre muitas outras, sobretudo locais, étnicas (mesmo se com base política de luta pelo
respeito (pelo menos teórico) pelos direitos humanos; g) o fim de conflitos locais como o de El
"humanitária", com o caso da Somália; j) a multipolaridade e a emergência dos EUA como a única
sua cultura-miscelânia de vocação planetária, o que, associado à potência da sua economia e das
suas convicções culturais e ideológicas triunfantes (mercado, democracia, direitos humanos…), faz
prognosticar que o próximo século poderá ser americano. Mesmo assim, desde os finais dos anos
oitenta que os olhares do mundo estão concentrados na Europa, devido a acontecimentos como (a) a
queda dos regimes socialistas do Leste e a sua transição para democracias representativas e
economias de mercado, (b) as adesões à União Europeia, antecedidas de referendos, (c) a refundação
política italiana, (d) os conflitos na ex-Juguslávia, (e) o alargamento da NATO e (f) a morte da
Princesa Diana e os respectivos funerais, num acidente alegadamente provocado por paparazzi, que,
fotojornalismo (isto é, se entendermos o fotojornalismo num sentido vasto, de tal forma que inclua a
factores:
problemas nunca antes colocados à actividade, no âmbito da sua relação com o real;
sob este prisma, há ainda a contar com as potencialidades abertas pela transmissão
digital de telefotos por satélite, desde Janeiro de 1988, mês em que, durante o rali
Paris-Dackar, a agência France Press transmitiu a primeira; por via disto, a estética
(embora, neste caso, seja necessário contar com o regime ditatorial soviético), mas os
própria estratégia militar foi programada a pensar nas imagens(226), que, pela primeira
no elemento humano. Por outro lado, porém, algumas portas, como a dos tribunais,
c) As novas tendências gráficas seguidas por grande parte dos jornais, e que se
condições de lisibilidade, pelo que muitas das fotografias inseridas tendem, cada vez
das necessidades editoriais dos quality papers e para a edição de livros e realização
de exposições; alguma fotografia de autor (e não só) encontra-se também disponível
nas redes, como a Internet [o projecto 24 Hours in Cyberspace, por exemplo, foi
autor tem sido também publicado em postais ilustrados de grande consumo, um facto
Ronald Goldman;
a entrevista valia pelas informações recolhidas, agora ela vale também, não raras
vezes, pelo entrevistado. A esta situação não será alheia a televisão, pois, neste
Estes factores levam a que, a nosso ver, na actualidade os debates sobre ética e
são os que mais agitem a profissão, especialmente em torno de quatro pontos: 1) direitos de autor e
reserva de soberania da autoria, o que passa pelo direito à criatividade, à inovação e à originalidade,
pelo direito à assinatura e pelo direito e imperativo ético-deontológico do controle dos autores sobre
a edição de imagens fotojornalísticas (o fotógrafo californiano Brett Weston passou o seu 80º
aniversário a queimar os seus negativos, preocupado com a utilização que lhes poderia ser dada após
em que os assuntos se relacionam com tragédias humanas, escândalos, figuras públicas e casos de
para a sua transmissão e difusão, que obrigam os fotojornalistas a um treino constante sob stress; e
presença no campo oposto ao do reino da photo vulgaris. Da mesma maneira, desde os anos setenta
e oitenta que pequenas agências de fotógrafos, mais do que de fotografias, isto é, agências que
aberto pela Magnum, agência a que Salgado já pertenceu. São os casos das americanas Contact e JB
Pictures e da francesa Vu. Elas contribuem, junto com jornais e revistas "de qualidade", para
pautam sobretudo pelo rigor informativo e analítico, também têm recorrido a esse modelo, o que
provocará, estamos convencidos, mesmo no campo das agências noticiosas com secção
desporto e a violência, violência esta entendida numa formulação global, urge encontrar outros
caminhos. E que violência global é essa que encontramos nos órgãos de Comunicação Social? Eis
o que escreveu, em 1988, Margarita Ledo Andión, no seu livro Foto-Xoc e Xornalismo de Crise:
"Violencia formal nos tempos e nos ritmos; violencia na
sinteticidade dos tratamentos, na reducción a estereotipos; violencia técnica;
violencia ó desmembrar o fotógrafo do control de edición e dos pés de foto;
violencoa na descontextualización; nas rotinas productivas e na liturxia que fai a
'Un'. Violencia sobre do elemento 'Foto de Prensa' ó convertila nun puro recurso
gráfico ou alerta visual agás cando é un elemento de tensión.
Violencia na mesma mecánica profesional —asumida— que prefere o
tema da violencia e que escolle, prá lectura, a aproximación do plano ó tope, a
morte sen fora de campo, a imaxe mui contrastada, o efecto surpresa, os efectos
especiais."
geralmente a sua actividade pela especialização e por vezes perdem controlo sobre o seu
a informação visual separaria os "verdadeiros" profissionais das restantes pessoas que se dedicam à
actividade.(232)
Por via de todos os factores reportados, pode falar-se da existência de uma certa crise
no fotojornalismo, mas, por outro lado, essa hipotética crise pode apenas corresponder a uma
adaptação. Mesmo que tal venha a significar um empobrecimento dos conteúdos, a tendência do
fotojornalismo sofre na actualidade. Entre 1973 e 1978, a agência francesa já tinha atravessado um
período de crise, ligada a uma restruturação que teve de ser levada a efeito devido à saída de
Depardon e à entrada de outros fotógrafos, como Salgado e Abbas, que aí permaneceram até
ingressarem na Magnum. Mas depressa recuperou, e, de 1980 a 1992, atravessou uma fase de bons
negócios e inegável qualidade fotográfica.(233) Em 1992, porém, a agência perdeu dinheiro pela
primeira vez em 15 anos, devido à diminuição do volume de negócios. O que aconteceu foi que os
manter o sistema retributivo baseado numa percentagem nas vendas, enquanto os fotógrafos lutavam
electrónicos e interactivos, em que parte das imagens já são pequenos filmes vídeo e não imagens
fixas, as fotos continuam (ainda?) a ter lugar. De facto, mais de cem anos após o começo da
aparição regular da fotografia na imprensa, a conclusão a tirar é a mesma: texto e imagem não são
forma diferente).
fotografias de reportagem e documentais, particularmente notada a partir dos finais anos oitenta.
Mesmo na Magnum, supostamente depositária de uma certa tradição fotográfica que colocaria o
conteúdo e o uso acima do lucro, há fotógrafos que permitiram que as suas fotos servissem a
publicidade comercial — é o caso de uma foto de Trabalho, de Sebastião Salgado, usada para uma
campanha da Le Creuset, e de uma foto de nudistas, de Elliot Erwitt, integrada numa campanha da
Levi's. A Benneton é, porém, o caso mais famoso entre as empresas que usam o fotojornalismo
jornalísticas chocantes, como por exemplo uma foto de Thérèse Frare sobre a agonia de um doente
com SIDA e uma fotografia sobre o trabalho infantil, obtida por Jean-Pierre Laffont, da agência
Sygma.
Notícias, em 1996, ou o jornal sueco Svenska Daglabet, em 1992, durante uma campanha-choque
sexo, morte, casamento, guerra, religião. Por vezes publicitaram-se também fotos truncadas, como
uma em que a imagem de uma criança no ventre materno se sobrepõe a um cenário da Guerra do
Golfo no qual o fumo dos incêndios nos poços de petróleo invade o céu. As fotos eram de Robert
consequências. Não só a arte se introduz nos domínios da fotografia documental e jornalística como
também estes géneros fotográficos são frequentemente aproveitados para fins artísticos. Uma das
fotos cuja utilização artística é frequente —e que até se tem divulgado em postais— é a célebre foto
de Abbas realizada, em 1978, numa escola de polícia sul-africana, ainda durante o apartheid: na
imagem, um polícia branco, erecto, fardado, com um bastão, é fotografado contra um fundo de
várias filas de candidatos negros à polícia, alinhados em tronco nú, de calções e sapatilhas.
Notícias "quentes", como alguns dos conflitos bélicos que ocorreram na década de
oitenta, entre eles a Guerra das Falkland (1982) e a invasão de Granada (1983), tiveram uma
cobertura fotojornalística inconsequente. As fotos não eram tão "quentes" como o que
representavam. Por seu turno, acontecimentos como o raid americano sobre Tripoli nem sequer
cobertura empenhada e a cobertura censurada. Dos grandes combates e dos muitos mortos,
nomeadamente civis, poucas fotos há. Mas há dos refugiados: a foto do ano do World Press Photo
de 1996 (referente a 1995) é marcadamente simbólica: a criança sofredora que parte na velha
camioneta pela rugosa estrada de terra, olhando, de braços erguidos de desalento, para uma terra que
Falkland, em Granada e no Panamá. Porém, durante a guerra civil libanesa, embora mais ou menos
pontualmente, notaram-se alguns rasgos dessa vertente essencial do fotojornalismo. Tal é provado
pela foto sobre a desolação dos refugiados palestinianos, de Françoise Demulder, da Gamma, que
ganhou o prémio "foto do ano" do World Press Photo de 1976; ou pela foto dos refugiados, também
palestinianos, de Sabra e Shatila, massacrados por falangistas cristãos, que valeu a Robin Moyer, da
Black Star, a trabalhar para a Time, o prémio da foto do ano do World Press Photo de 1982. Ambas
evidenciam até como determinadas imagens podem funcionar, dentro do sistema, contra o sistema
dominante. Mas, na guerra Irão/Iraque, um conflito que o Ocidente seguiu com atenção, devido ao
petróleo e à ânsia de ver o fim do fundamentalismo islâmico iraniano, não se notou também
qualquer reinvenção ou até mesmo qualquer pequena revivência do fotojornalismo de guerra "à
Vietname".
No conflito das Falkland, a Gamma foi a agência mais beneficiada, já que possuía no
terreno um correspondente na altura da invasão argentina. Mas esta ocorrência nada vai beneficiar a
Argentina: a guerra das imagens foi perdida também por este país, que deixou que se fotografasse a
ânimos nas terras de Sua Magestade e tornando difícil outra resposta britânica que não fosse a
fotografias do afundamento pelos britânicos do navio General Belgrano, uma das glórias da marinha
Sygma, que teve sozinho no terreno, durante quatro dias, o fotógrafo Fabian Cevallos. Este só pode
fotografar a guerra de longe, mas teve a vantagem de a sua produção ser exclusiva.
em que uma mulher branca beijava um atleta negro profissional. Tal evidenciou que não só as fotos
têm efeitos como também que os seus efeitos podem ser revelar o que vai no âmago de muita gente,
incentivar ódios ou amores, tristezas e alegrias, raiva e calma, solidariedade e desumanidade. Neste
caso, mostrou bem que os sentimentos racistas estão ainda bem à superfície em muitos americanos.
XXX, foi a primeira vez que um grande evento foi fotojornalisticamente coberto recorrendo-se
apenas à fotografia digital. A ocorrência talvez represente o início de uma era para o
fotojornalismo.
Fotógrafos e trabalhos
Há fotógrafos que se vêm distinguindo de há algum tempo para cá, orientando a sua
produção por linhas que por vezes não se podem delimitar como estritamente documentais ou
fotojornalísticas. Marie Laure de Decker, que já se havia distinguido no Vietname, onde se estreou
ao serviço da Paris-Match, elegendo temas algo marginais ao conflito e ao choque, como o da
prostituição em Saigão, é um dos bons exemplos, ao fotografar as revoltas negras na África do Sul
antes do fim do apartheid. Alexandra Boulat, com as suas fotos da ex-Juguslávia, é outro exemplo
(re)conhecido, tal como o são a catalã Kim Manresa, que realizou brilhantes reportagens sobre as
ruas de Barcelona, Georges Mérillon, da Gamma, que fotografou na Roménia e no barril de pólvora
chamado Kosovo, ou Stephane Compoint, da Sygma, que fez a cores e de maneira mais
espectacularizada o que Salgado fez a preto-e-branco: fotografias do combate aos incêndios nos
poços de petróleo koweitianos após a Guerra do Golfo. É justo também referir o marroquino Daoud
Aoulad-Syad, que publicou, em 1991, o livro Marrocains, e que se pode considerar um seguidor de
Cartier-Bresson, quer no que respeita ao "instante decisivo", quer no que respeita à intenção
Patrick Chauvel é um dos fotógrafos que mais perigos corre hoje em dia e é também um seguidor da
máxima de Capa: deve-se estar perto da acção. Foi o que fez no Panamá, em Beirute, em El
Salvador, no Cambodja e no Haiti. Mas também o que fez em Nova Iorque, onde abordou a
violência urbana. Eric Bouvet, da Saga, tornou-se conhecido após a apresentação das suas fotos de
Serajevo, Beirute, Mogadíscio, Angkor e Halabja, no Iraque. Luc Delahaye cobriu, para a Sipa, a
revolução romena, a Infitada, a guerra civil libanesa, a guerra no Afeganistão, a guerra na Bósnia, a
Ruanda e, já na Magnum, a guerra na Tchechénia, tal como o fez o inglês Paul Low. O arménio
fazendo depois uma série de reportagens sobre a sua terra, em pé de guerra. São percursos
semelhantes que se repetem nos horrores dos nossos dias, porque estes também se repetem.
Roménia, no Egipto e na Sardenha, revelando-se também como retratista de uma série de escritores.
Com o alemão Frank Siberbach (1958-), que pratica uma fotografia humanista na tradição
documental a preto e branco, e o francês Antonin Borgeaud (1967-), que abordou a condição social
dos povos do Sahara Ocidental, do Perú, de Cuba e da Mongólia, são alguns dos jovens talentos do
estão a tornar-se também nomes importantes do fotojornalismo actual. O primeiro esteve nas
guerras do Iraque, Juguslávia, Sudão, Iémen e da Tchechénia. Esteve também no Afeganistão, onde
fotografou as crianças de Kabul. Por seu lado, foi graças às fotos na Tchechénia que o segundo se
tornou conhecido.
actuação, o seu método, que determina o género fotográfico. As fotografias mais bem pagas de
Sebastião Salgado talvez sejam as do atentado ao Presidente Reagan, que são puras spot news. O
mesmo acontece com Dario Mitidieri, que, apesar de ser conhecido essencialmente por projectos
onde a manipulação da cobertura jornalística fez notar que o jornalismo pode estar a atravessar uma
crise. De facto, apesar do fascínio público com as "bombas inteligentes" e as tecnologias de ponta, a
cobertura da Guerra do Golfo —em pools organizados pelo Departamento de Defesa dos EUA ou
pelo Governo iraquiano, como já referimos— consistiu principalmente em material banal, como o
áreas de actividade militar, censura militar e a auto-regulação mantida pelos news media:
combate, acções bélicas, avaliação do poder militar, etc.). Um aspecto, porém, foi novo: a enorme
dos americanos. Por um lado, esta situação pode levar-nos a pensar em hipotéticas acções de
propaganda desenvolvidas pelas relações públicas militares com objectivos como o de desviar a
atenção dos custos humanos do conflito; por outro lado, pode levar-nos a reflectir sobre o papel
desempenhado pela indústria bélica e pelos estados que se dedicam à produção e comercialização de
armas, quer nos conflitos em si (crescentemente controlados, como se viu no Golfo, por uma elite
fotográfica dos equipamentos militares, que inscreve em três estratégias centrais de difusão
de Diane Walker, da Time, premiada no World Press Photo de 1991, onde Bush se
a acentuar o carácter problemático da cobertura fotojornalística da Guerra do Golfo, muitas das fotos
obtidas pelos fotógrafos militares ou civis das pools foram distribuídas pelo Departamento de
Defesa americano e não pelos órgãos de comunicação social. Essa distribuição por vezes foi
efectuada para áreas localizadas, como a Europa, impedindo outros pontos do mundo de "ver" o
mesmo. A célebre fotografia de Ken Jarecke de um soldado iraquiano carbonizado na cabine do seu
camião, por exemplo, não foi publicada, durante a guerra, nos Estados Unidos, e a sua publicação na
Europa originou alguns protestos, mesmo por parte do público: por exemplo, alguns leitores do The
Observer, o primeiro jornal britânico a publicar a foto (3 de Março de 1991), insurgiram-se contra a
sua inclusão, pois consideravam que a foto ultrapassava os "limites do admissível". Tal realça o
carácter cultural das fotos, já que durante a história se foram estabelecendo limites ao
fotograficamente visualizável. Um outro elemento em favor desta asserção é que fotos como a
referenciada despem a guerra de toda a auréola de epopeia que ainda possa ter, apesar do
Quando rebentou a guerra, numa altura em que a imprensa ainda discutia se aceitava
Golfo, foi visível que esta se orientou para a criação do mito da tenologia. A um nível mais
primário em termos de geração de sentidos, foi visível que o fotojornalismo se orientou para a
criação do mito do armamento inteligente (sabe-se, hoje, que a maior parte das bombas despejadas
sobre o Iraque eram gravitacionais, como as da Segunda Guerra Mundial), através do destaque dado
às fotos de armamento e tecnologia. Conforme também pudemos constatar pela imprensa americana
e portuguesa, das raras fotos em que surgiam soldados a actuar no terreno —o que traduz
negligencia na cobertura dos custos humanos do conflito—, grande parte eram de exercícios
militares e não de confrontações bélicas. Além dessas fotos, a restante produção consiste em
Importante também sobre a Guerra do Golfo foi o que foi negligenciado na cobertura,
especialmente nos EUA: fotografias das baixas aliadas não-americanas, das demonstrações públicas
contra a guerra nas nações aliadas, da vida civil na Arábia Saudita durante o estacionamento das
tropas aliadas, das tropas e baixas civis e militares iraquianas e das baixas civis das nações atacadas
Por seu turno, a Life protagonizou um dos casos mais relevantes da manipulação da
general Schwarzkopf rodeado por um grupo de soldados, supostamente tirada depois da "vitória".
personalizar a guerra (Bush vs. Saddam, frequentemente colocados em confrontação através das
fotos inseridas nos jornais), o que permitiu uma exploração emocional dos cidadãos através de uma
Esses e outros dados, como as diferenças entre os fotolivros sobre a guerra, destroem
pela base o mito da objectividade fotojornalística. Por exemplo, entre o livro da Time-Warner,
Desert Storm: The War in the Persian Gulf, que inseria essencialmente fotografias "patrióticas"
(com símbolos que apelavam ao patriotismo) e "iconográficas" realizadas pelos fotógrafos das pools
do Departamento de Defesa, e o livro da Harry N. Abrahams, In the Eye of Desert Storm, que punha
o acento tónico nas consequências humanas do conflito, inserindo fotos mais "gráficas", a distância
Estamos, portanto, de acordo com Margarita Ledo Andión (1993), quando a autora
galega exclama que a Guerra do Golfo veio demonstrar, mais uma vez, a urgência de se discutir o
direito a ver.
O Ruanda
O caso recente dos massacres no Ruanda veio tornar a concentrar a atenção no
poder, desencadeiam de imediato o massacre dos tutsis. A 9 de Abril, a Sygma e a Sipa enviam
regressar aos Estados Unidos. A 10 de Abril, as primeiras fotografias dos massacres começam a
chegar a Paris, mas não despertam as redacções. No princípio de Maio, Patrick Robert vai regressar
à capital francesa sem que a sua agência tivesse vendido uma única foto. Tal, a nosso ver,
Se bem que, a 27 de Abril, o Le Monde tivesse publiado uma reportagem a dar conta
dos massacres, só a 18 de Maio é que o tema vai chegar às primeiras páginas, com o Le Quotidien
de Paris a publicar uma foto chocante na "um", e o pico da cobertura mediática é atingido entre 14 e
algumas questões ficam no ar: será que realmente já nem mesmo a violência vende? Terá a foto-
choque perdido o seu espaço? Será que no "fotojornalismo" se tornaram mais importantes as fotos-
A fotografia digital
popularização. Em 1989, a Canon, a Nikon e a Sony já possuiam as still video cameras, que, não
obstante, eram analógicas. Nesse ano, surgiram no mercado as primeiras câmaras digitais: a Rollei
Digital Scanback, a Fujix Digital Still Câmara e a Kodak Professional DCS. Surge também
1990, a Kodak lança o Photo CD e, no ano seguinte, a Philips coloca no mercado um sistema de CD
interactivo, ao mesmo tempo que a Canon, a Xerox e a Kodak põem à venda fotocopiadores
digitais. Hoje, a tecnologia já permite a ligação directa das máquinas aos computadores e/ou a
interfaces próprios, como modems que permitem o envio rápido das fotos.
Porém, alguns casos dos finais dos anos oitenta e princípios dos noventa vieram
igualmente, que as novas tecnologias vão provavelmente destruir de uma vez por todas a crença de
que uma imagem fotográfica é um reflexo natural da realidade. As "culpas" recaem sobre a
fotografia digital.
publicidade de jornalismo;
numa fotografia "ao baixo" para que a fotografia pudesse ser colocada "ao alto", na
primeira página;
fotografias para a primeira página, pois elas serão vistas mais como ilustração do que
como documento.
f) A Newsweek de 16 de Janeiro de 1989 trazia uma imagem sobre o filme Rain Man
g) Em 12 de Agosto de 1990, o The New York Times apresentou uma imagem digital
The New York Times juntava, numa imagem, Saddam Hussein e James Baker num
pseudo-encontro cordial;
i) A revista Spy, em resposta satírica à capa da Vanity Fair com Demi Moore grávida,
colocou a face de Bruce Willis sobre o corpo grávido da mulher; a TV Guide, por seu
j) O Washington Post removeu uma actriz secundária de uma foto em que ela surgia
total;
milhares de impulsos electrónicos. Isto torna possível armazenar fotografias numa disquete ou num
disco, tal como transmiti-las por satélite logo após a sua realização. Trata-se, afinal, de tecnologias
que, a este nível, permitem vencer o tempo e o espaço com maior comodidade e qualidade. Além
disso, o armazenamento em disco permite, por exemplo, quer a visualização da foto em monitores
de TV, com o recurso a um Photo CD, quer a sua reprodução tradicional em papel. Mas também
computador.
fotografia tradicional quanto à realidade física. Enquanto a fotografia digital vive de processos
analógicos e contínuos (a fotografia é 'análoga' à luz que lhe deu origem), a imagem digital é uma
realidade discreta, codificada num código de zeros e uns, subdividida uniformemente numa grelha
finita de células —os pixels— cuja gradação tonal de cor pode mudar em função do código. Na
fotografia tradicional o suporte é o negativo, que, por vezes, aporta mais informação do que nos
apercebemos à primeira vista. Na imagem digital a resolução tonal e espacial é limitada e contém
uma quantidade fixa de informação. Uma vez ampliada, revela a sua micro-estrutura.
com exactidão. Transmitidas, digitalizadas ou copiadas são sujeitas a alguma degradação. Porém, a
imagem digital pode ser repetida até ao infinito sem perda de qualidade, mas também é fácil e
rapidamente manipulável através da substituição de dígitos no código binário —de zero e uns— que
a sustenta.
É por essa razão que uma imagem digital pode ser totalmente sintetizada
computacionalmente, ser resultante de uma digitalização de outra imagem, ver a sua perspectiva
alterada através das mudanças da zona de sombras, ser pintada electronicamente ou ser até sujeita a
uma mistura de todos esses processos, possuindo ainda assim coerência interna, um processo que
relacionados, portanto, com a forma como a alteração electrónica das imagens se tornou fácil e de
difícil (virtualmente impossível) detecção. Se, num certo sentido, a fotografia é sempre uma forma
exemplo, alterar, na imagem, as cores do cabelo, da roupa, dos olhos e da pele, alterar penteados,
apagar objectos e/ou palavras e material gráfico neles inscritas, colocar frente a frente pessoas que
nunca se viram, inserir pessoas em ambientes diferentes, entre várias outras operações. A foto
digital não deixa, porém, de ser um espaço a explorar no que toca à intervenção subjectiva e
produção de sentidos no jornalismo, pois facilita, por exemplo, a truncagem. Mas deverá, em todo o
fotográficas seja novo — vimos, no nosso percurso ao longo da história, como isso foi prática se não
comum, pelo menos ocasional, tal como os procedimentos laboratoriais de "melhoria" da imagem
Rebel Sharpshooter.
acabavam por ser detectadas por especialistas e, algumas vezes, mesmo por pessoas comuns,
quando, por exemplo, se tratava de uma truncagem mal feita ou quando se conhecia o original ou até
inscrever novas regras de confiança. Aliás, neste último campo, Shiela Reaves descobriu que a
computacional de imagens depende da categoria das fotos. Seriam intolerantes no que respeita à
alteração de spot news e mais tolerantes no caso de fotografias de soft-news, como as features
jornalísticas. Com base nessa grelha, seria possível prever que fotografias essencialmente
ilustrativas, como a de O.J. Simpson na capa da Time, poderiam ser objecto de manipulação,
enquanto outras, como as spot news, dificilmente seriam manipuladas, excepto, eventualmente, no
são das mais relevantes para o fotojornalismo actual, especialmente no campo deontológico, até
porque a tecnologia da imagem digital está a ter cada vez maior utilização e é provável que venha a
perto da transgressão. O presidente da NPPA, por exemplo, apregoava, em 1989, que não se podia
usar a tecnologia da imagem digital para criar mentiras.(236) E o crítico de fotografia do The New
York Times, indo mais longe, advertia contra a eventual desrealização do mundo fotografado (perda
Em Portugal ainda não ecoaram com força os ecos do debate internacional acerca das
novas tecnologias aplicadas ao fotojornalismo, talvez porque os fotojornalistas e editores ainda não
se tornaram sensíveis ao problema. Mas, noutros países já se têm produzido algumas propostas:
Outubro de 1989.
facto.
questão do controle económico sobre a imagem digital se tornam problemáticas, pois não existem
negativos. Aliás, a fotografia digital nem sequer permite um acto equivalente à destruição dos
negativos e a própria miscelânia de partes de todos que por vezes se faz na imagem digital torna
tecnologias.(238) Desta forma, no campo jornalístico podem estar a insinuar-se novas formas de
resistência à fotografia, latentes desde os anos quarenta. Essas formas de resistência, de base
Não é que as práticas de construção imagética sejam recentes. Desde que os soldados
posaram para Fenton, e passando por Gardner, Thomson, Weegee, Rosenthal e, eventualmente,
Smith, entre tantos outros, que a história do fotojornalismo oferece exemplos e desconfianças. O
que parece provado é que os processos de sobreposição de novas e velhas técnicas e tecnologias ao
acto fotográfico "puro" origina resistência. Inclusivamente, apesar de existirem autores, como
Goldberg, que apontam para a existência de diferentes padrões de fidelidade ao real(240), outros
exploram de uma forma denunciante a capacidade de afastamento referencial da fotografia
A crescente aceitação das novas tecnologias de imagem pelos news media traz
problema é que essas tecnologias têm flexibilidade quer para directamente "registar" a realidade,
quer para construir totalmente uma imagem quer ainda para combinar elementos criados com os
mas, noutras ocasiões, a tarefa é difícil ou mesmo impossível. Como já dissemos, esta
impossibilidade virtual é maior no campo das imagens digitais e menor no campo da fotografia
tradicional.
Não é que o ser humano esteja desprovido de defesas contra a manipulação
imagética: a educação, a cultura e a experiência levam as pessoas, julgamos, a não aceitar, hoje, tão
facilmente as fotografias como representações válidas da realidade que tomam parte directa na sua
mundivivência. Nesta matéria, há filmes que mostram como se fazem manipulações e fotos que se
sabe terem sido manipuladas. De qualquer modo, não é por isso que o fenómeno da imagem digital
deixa de levantar questões incomodativas e preocupantes. Num estudo de 1993, James D. Kelly e
Diona Nace, por exemplo, descobriram até que a credibilidade duma foto semelhante às que se vêem
todos os dias na imprensa não se alterava significativamente quando um dos grupos estudados via
antecipadamente um vídeo sobre manipulação digital de imagens enquanto o grupo de controle não
o via.(242) Esta ocorrência pode demonstrar que, por muito grande que seja a literacidade no domínio
da imagem digital, as fotos sujeitas a manipulação, quando esta é desconhecida para o receptor,
tendem a ser tão credíveis como as restantes. No mesmo estudo, os autores chegaram ainda a outra
conclusão interessante: a credibilidade de uma foto pode ser maior ou menor do que a da publicação
em que surge, isto é, a credibilidade de uma fotografia poderá ser semi-independente em relação à
publicação, mas quando a publicação é credível a credibilidade da foto tende igualmente a atingir
maiores níveis de credibilidade, e vice-versa, embora tal dependa da natureza da informação que
aporta: "People believe photos if they make sense —if the information they provide fits comfortably
within their existing understanding of the world— not because they are exact renderings of
reality."(243)
digital pode ser uma oportunidade para levar à desconstrução do mito da objectividade fotográfica.
A introdução das tecnologias de imagem digital nos news media escritos começou na
década de oitenta, numa primeira fase com as operações de retoque, halftoning, correcção cromática
e separação de cores.(244) Nos Estados Unidos, em 1989, o Wall Street Journal estimou que 10% de
todas as fotografias a cor publicadas na imprensa norte-americana eram digitalmente retocadas ou
alteradas.(245)
campo da imprensa e não é nítido, sequer, que deva ser travada, inclusivamente não só porque
podem haver alturas em que a manipulação digital dá à imagem valor acrescentado, mesmo em
temos de interpretação e análise, mas também porque a digitalização facilita a reescrita de legendas
e o arquivo.
do que a fotografia tradicional, oferecendo mais oportunidades para a intervenção humana. Entre os
se ou atenua-se o contraste;
efeitos semelhantes aos dos filtros na fotografia tradicional, quer thresholding filters,
que põem em branco puro todas as zonas claras e em preto puro todas as zonas
escuras, gerando efeitos mais dramáticos e singulares, quer ainda posterization filters,
que simplificam a estrutura tonal de uma imagem num menor número de níveis;
— Reenquadramento;
— Sombreamento (shading);
(background);
— Retoque e pintura;
— Mascaramentos;
— Mistura de imagens;
— Efeitos atmosférios;
— Ampliação e redução;
— Rotação e reflexão;
— Corte e colagem;
— Efeitos de travagem ou de escorrimento do movimento;
— Distorções.
suportes de prata, cujas vendas têm vindo a diminuir, a Kodak, a Fuji, a Minolta, a Nikon e a Canon
denominaram Advanced Photo System (APS). Este sistema foi apresentado em Janeiro de 1996.
O filme APS tem 24mm, o que o torna incompatível com o sistema de 35mm. Os
negativos ficam sempre dentro da cassete, para evitar que se deteriorem. Para os acompanhar é feita
Nesta banda são gravados 400 bytes de informação sobre dados relevantes para o processamento das
processamento das imagens, que, com automatismos, faz correcções em ordem a "melhorar" a
qualidade das fotos. Mas também facilita leituras por parte do fotógrafo e do processador,
O sistema também permite a troca de filmes mesmo quando ainda estão a meio. Uma
vez recolocado, o filme é automaticamente levado até onde ainda não está exposto.
As ampliações podem ser executadas em três formatos: panorâmica, tradicional ou
H-HDTV (20,3 por 35,5cm). É possível pedir a realização de impressões, receber as fotos ou
Não nos parece que o Advanced Photo System venha a ser um sistema de eleição para
alguns anos. Cremos, aliás, que, pelo menos no fotojornalismo, a maioria dos consumidores, a
mudar de sistema, mudará já para o "sistema do futuro" —o digital— e não para um sistema
intermediário, conforme nos parece que é o APS. Além disso, é, realmente, um sistema destinado
sobretudo a amadores, que poucas vantagens traz para o fotojornalismo e até pode reduzir a
implicação do fotógrafo no acto fotográfico, uma vez que o domínio técnico que lhe é exigido
diminui.
CAPÍTULO XIII
FOTOGRAFIA E FOTOJORNALISMO EM PORTUGAL
A divulgação da fotografia em Portugal nos seus primeiros tempos está, em grande
medida, associada a um pequeno número de pioneiros amadores, entre os quais vários estrangeiros.
J. Silveira fotografa Lisboa, entre 1849 e 1856. Frederick Flower (1815-1889) fotografa o Norte
Douro—, a vida rural e os equipamentos do campo, como os poços, as noras e as azenhas), de 1845
a 1859, recorrendo ao calótipo. O Barão de Forrester (1809-1861) faz imagens do Douro, um
trabalho praticamente desconhecido, realizado entre 1854 e 1857. Em 1846, William Barclay,
publica Le Portugal pittoresque et architectural déssinée d'aprés nature, cujas litografias devem ter
com várias condições de iluminação, fazendo várias impressões da mesma matriz e até recorrendo à
instala um estúdio em Lisboa, em 1848, dois anos após Vicente Gomes da Silva (1827-1906) ter
para a introdução da fotografia no País. Aliás, o retrato é o grande tema da fotografia portuguesa
Panorama faz uma análise da daguerreotipia, que é a primeira notícia conhecida sobre fotografia
de Agosto). Tal denuncia a grande permeabilidade à cultura francesa que Portugal tinha, pese
contribuiu também para que o medium emergente fosse divulgado em Portugal. Mas a primeira
Litterario e Instructivo.
1862, começa a ser editada, em fascículos, a Revista Pittoresca e Descriptiva de Portugal, sob a
direcção de Joaquim Possidónio Narciso da Silva. É uma publicação que consagra um grande
espaço à fotografia arquitectónica. Em 1865, Augusto Xavier Moreira começa a editar o conjunto
Monumentos Nacionaes.
começa a fotografar paisagens e a retratar tipos sociais, embora sem preocupações de solidariedade.
possibilitadas pela sua riqueza, Relvas tornou-se, provavelmente, no fotógrafo amador português
fotografa a construção da linha férrea do Douro), Domingos Alvão (1872-1946) e Marques de Abreu
(1879-1958), cuja obra fotográfica e editorial é uma das últimas manifestações portuguesas do
documental e industrial do país, que se edita até 1915. A 9 de Fevereiro de 1881, surge, em Lisboa,
o primeiro número do jornal ilustrado português A Illustração Universal. No ano seguinte, publica-
Carlos Relvas.
tempo das grandes explorações portuguesas de África, levadas a cabo por Serpa Pinto, Capelo e
Ivens, e na linha dos primeiros levantamentos fotográficos que marcaram o final do século passado,
volumes. Esta obra, iniciada em 1877, foi prefaciada por Luciano Cordeiro, e revela um conjunto de
personalidades coloniais que sustentam o processo de colonização estão algo ausentes. Mesmo os
colonos são representados como desenraizados, enquanto os negros surgem em posturas um pouco
artificiais: a Europa estranha o negro, mas o branco é também um estranho em África. No último
quartel do século passado, Cunha Moraes publica também, em O Occidente, fotografias de Angola e
São Tomé, na mesma época em que Emílio Biel (1838-1915) executa um trabalho de referência de
Portugal, as gravuras de madeira continuam por algum tempo. Em 1885, porém, n'A Illustração, de
Marianno Pina, que era impressa em Paris, são inseridas fotogravuras de fotos da capital francesa,
mas só em 1890 é que começam a ser publicadas com regularidade em Portugal fotogravuras em
halftone, principalmente na Revista Illustrada, de António Maria Pereira. Pelo meio, por volta de
1887, Paulo Plantier (1840-1908) choca os lisboetas com os seus "retratos de 'flagrantes'"(250), que
Quase mil fotografias de retrato ficam patentes ao público numa exposição que
decorre em Janeiro de 1890, em Lisboa. No dia 8 desse mês, Fialho de Almeida escreve no jornal
pela mão de Arnaldo Fonseca. Chamava-se precisamente Tratado de Fotografia. José Júlio
Rodrigues introduz o flash de magnésio em Portugal nesse mesmo ano, para fotografar os túneis de
Nos finais do século, a fotografia tinha conquistado até a Casa Real. Surgia no Diário
a imprensa, frequentemente por intermédio de artistas como Rafael Bordalo Pinheiro. No inovador
Diário de Notícias, que, ao contrário do estilo dominante de então, dava mais atenção às notícias do
que à opinião panfletária, aparece a primeira ilustração a 14 de Junho de 1877 — um mapa. A partir
de 1901, a reportagem desenhada fez escola no DN e, algum tempo após, é a fotografia passada a
desenho (decalque e contornos) que se vai tornando a forma mais comum de ilustração nos jornais
portugueses —como n'O Século—, cuja evolução no sentido do uso jornalístico da foto é similar à
do Notícias.
Pelo início do século XX, as revistas ilustradas, com a segunda série da Illustração
partir dos anos dez, e, em parte, graças às melhorias nos processos de reprodução. Mas, durante
alguns anos vão coexistir esses dois vectores da reportagem gráfica, quer nas revistas, quer nos
jornais, pelo que, no ano da implantação da República —1910— as fotos ainda rareavam nos
Foi a 2 de Fevereiro de 1907, em O Comércio do Porto. Nesse mesmo ano, o Diário de Notícias
publica, a 27 de Julho, a sua primeira fotografia: tratava-se de um retrato do só por isto lembrado
coronel Caldeira Pires, que ia assumir o comando do regimento de Infantaria 26. E é este último
jornal que vai inserir, a 4 de Fevereiro de 1908, várias fotografias do regicídio, em que morrem o
Rei D. Carlos e o príncipe herdeiro. A partir de meados dos anos dez, generaliza-se o recurso à
repórteres fotográficos próprios. Porém, vai ser preciso esperar até 1940 para que um foto-repórter
conseguisse obter a carteira profissional do Sindicato Nacional dos Jornalistas — André Salgado, do
jornal Novidades.
fotógrafos desses tempos com obra mais extensa. Trabalhando como freelance, colaborou
sobretudo com a Illustração Portugueza, de 1903 a 1918, e com O Século, o "seu" jornal. Benoliel
"(…) cobriu quase todos os acontecimentos políticos. Mas a sua genialidade estava na forma como
abordava os fait-divers (...): a mesma rua onde se davam as revoluções [a queda da Monarquia, a
instauração da República e a ascenção e queda da I República foram tempos muito agitados] era o
lugar onde se vendiam pentes, o mesmo cais onde se despediam os políticos era o lugar onde se
também Benoliel vestia à altura das ocasiões, falava várias línguas, averiguava os horários mais
propícios para estar nos locais onde ia fotografar e chegava a gritar nos comícios "É para O
Século!" para fazer parar as pessoas. Chegou a fazer parar uma procissão da Senhora da Saúde, na
Benoliel é uma testemunha da época em que se vendia água fresca e capilé pelas ruas
clientes conversando e encostando-se nas esquinas, transportando, depois, de tudo um pouco, desde
pesadas mercadorias a leves cartas de amor, os miúdos refrescavam-se na água que jorrava das
fontes ou das bocas de água. A atenção que deu a todos esses pormenores da vida na grande cidade
tornam-no um dos precursores do moderno fotojornalismo dos anos vinte, que aproxima as pessoas
daquilo que lhes está próximo, obrigando-as a olhar com outros olhos o que se passa à sua volta.
Século, foi, provavelmente, a revista nacional mais inovadora na sua época, sobretudo na sua
segunda série (1903-1924), altura em que publica quase só fotografias acompanhadas de textos
curtos. A sua paginação quase antecipa, por vezes, a das revistas ilustradas dos anos vinte/trinta.
Sem chegar às receitas que a La Vie au Grand Air já tinha introduzido a partir de 1898, a Illustração
chega a publicar, em Fevereiro de 1909, uma dupla página de Afonso XIII e D. Manuel II
conversando de costas, num plano geral, sem que os Monarcas ibéricos posassem, quase ao estilo da
sobre um dia na vida do Presidente Teófilo Braga: a leitura dos jornais, o almoço, a viagem de
eléctrico, etc.
alguns dos quais exerceram a sua actividade até meados deste século. São os casos de Aurélio Paz
dos Reis (1862-1931), um dos pais do cinema nacional, e Arnaldo Garcez (1886-1964), que fará a
cobertura da I Guerra Mundial, onde esteve empenhado o Corpo Expedicionário Português (embora
o conflito tenha, sob o prisma da fotografia, passado quase despercebido aos jornais e revistas
nacionais). Com eles, a foto-reportagem começa, realmente, a despontar em Portugal, numa linha
que se vai afastando do documentalismo por vezes pictoralista e realista-naturalista que dominava a
Artur Leitão Bárcia (1871?-1945), da revista Serões, Anselmo Franco (1879-1965), que, depois de
1906, colabora com os jornais República, Luta e O Século, entrando, em 1910, para o Diário de
Notícias, onde fica até à reforma, em 1965, e Alberto Carlos Lima, que, desde o início do século,
trabalhou, até 1949, ano em que morre, para Brasil Portugal, Occidente, Serões e Illustração
Portugueza.
mesma década e na seguinte, Portugal viu surgir um grande número de revistas ilustradas, como a
Vida Mundial, que sobreviverá até aos anos setenta, e a terceira série da Illustração Moderna (1926-
1932), dirigida pelo fotógrafo Marques de Abreu, e na qual participam Álvaro Martins e Miguel
Monteiro, entre outros. As duas séries anteriores dessa revista tinham sido editadas entre 1898-1899
e 1900-1903, tendo ambas sido dirigidas por Marques de Abreu, mas a primeira contou com a co-
A agitação da I República fazia com que a classe média ansiasse por ordem. O
marechal Gomes da Costa desencadeia, então, em Braga, a 28 de Maio de 1926, um golpe militar.
Marcha sobre Lisboa, depõe o Presidente Bernardino Machado e instaura um regime ditatorial.
professor chamava-se Oliveira Salazar. O resto da história é conhecida. Salazar vai demitir-se,
as finanças públicas, afasta os militares para segundo plano e instaura um regime ditatorial-
discrição, ganharam em força e grafismo"(253), um pouco à semelhança do que viria a acontecer nas
revolta antigovernamental de 1927, a censura endurece e nasce a polícia política. A partir de Julho
de 1932, mês em que Salazar é nomeado Presidente do Conselho, a censura e a repressão agudizam-
se.
Os anos vinte-trinta não deixam, porém, de ser uma época em que em Portugal se
privilegia, suportada pelos serviços de propaganda, a fotografia anedótica, monótona e isolada dos
Salões de Fotografia, baseada na paisagem, nos tipos etnográficos, no registo de casas brasonadas,
castelos, casas típicas, pelourinhos, realizações da engenharia e arquitectura do Estado Novo, etc. É
por essa época que se torna notado o filho de Joshua Benoliel, Judah Benoliel (1900-1968), que, a
partir de 1924, colabora com Pátria, ABC, O Século e Diário Popular, onde fica até à sua morte, em
1968.
A partir dos anos vinte, as grandes revistas ilustradas dos dois mais importantes
diários da capital, O Século e Diário de Notícias vão atrair alguns grandes fotógrafos. Salazar Diniz
(1900-1955), Deniz Salgado (1895-1963), Ferreira da Cunha, José Lobo e Marques da Costa, entre
o Grande Circuito Hípico de Portugal, em 1925, ou as voltas a Portugal em bicicleta, que se iniciam
também frequentes, quer em ocasiões de Estado quer em ocorrências como batidas de caça.
Abundam os planos gerais, mesmo nos retratos, e já se notam alguns dos critérios de ponto de vista
que ainda hoje se registam no fotojornalismo, como a preocupação com o "registo", testemunha da
história, que, na actualidade, leva o fotojornalista, por exemplo, a fotografar toda uma mesa numa
conferência de imprensa, mesmo que em várias pessoas só uma intervenha. Pessoalmente, julgamos
até encontrar aqui influências da pintura — lembremo-nos, por exemplo, das "últimas ceias" que os
após 1928, ter algum espaço no Notícias Ilustrado, que edita, algumas vezes, fotos em grandes
exuberantes álbuns Portugal 1934 e Portugal 1940, que incluem contribuições de vários dos
fotógrafos "modernistas" dos anos vinte: Mário Novaes (1899-1986), SanPayo (1890-1974) —
brilhante retratista que construiu, a partir dos anos vinte, uma autêntica galeria da sociedade
portuguesa— e Judah Benoliel. Entre 1938 e 1939, edita também os cinco volumes de Alguns
fotográficas eram de Marques da Costa. Sobre a obra, escreve António Sena: "Na época do
relançamento do periodismo fotográfico (…) não deixa de espantar a frescura, talvez 'naïve',
combinando o melhor fotojornalismo (…) com imagens, no mínimo, inesperadas, numa edição
oficial."(254) De qualquer modo, o fotojornalismo dos anos trinta e quarenta em Portugal não deixa de
estar, principalmente, ligado à propaganda nacional, pelo que era feito de abordagens grandiosas das
realizações do Estado Novo e de retratos mais ou menos oficiais das figuras do regime.
geográfica do País obrigou a um esforço propagandístico alemão e britânico, tendo circulado no País
português, até porque lançou dentro de portas o trabalho de grandes fotojornalistas estrangeiros que,
trabalhando para os governos dos seus países, cobriram o conflito.
Madeira, a revolta de 1931. Perestrello —que colaborou com o Diário de Notícias do Funchal, não
se torna notado pela qualidade do seu trabalho, mediana, mas por a sua obra ser uma espécie de
álbum de recordações do poder. Fotografa até hoje, tendo juntado um espólio maioritariamente
constituído por fotos de visitas oficiais à Madeira e de figuras públicas nacionais e estrangeiras em
férias no arquipélago. Todavia, também fotografa fait-divers, como, nos anos cinquenta, o primeiro
Século. Chama-se Beatriz Ferreira e ficará no diário até que os excessos "revolucionários" do pós-
25 de Abril fizeram encerrar o grande jornal da capital, em 1977, aquele que foi, durante o Estado
Novo, o diário mais lido na província e, com O Primeiro de Janeiro, do Porto, um dos órgãos de
desempregados. Hoje, Beatriz Ferreira, com mais de 80 anos, subsiste com uma modesta pensão e
com a venda de algumas das suas fotografias. E já teve mesmo de vender duas das velhas máquinas
A década em que se começa a dar atenção a William Klein e Robert Frank é uma
Life. Além das revistas estrangeiras, é importante salientar o estímulo que para o fotojornalismo e,
de um modo geral, para a fotografia portuguesa, constituiu a exposição The Family of Man. Embora
não tenha estado patente no País, foi exibido o filme da mesma e vendido o seu catálogo. Mas
houve resistências grandes por parte dos fotógrafos de salão, entre outros, pelo que, no Boletim do
Grupo Câmara, se dizia que a exposição abordava "(…) o valor humano, em prejuízo do
das novas tendências da fotografia documental é, provavelmente, Lisboa, Cidade Triste e Alegre,
editado, em 1959, em sete fascículos mensais, tendo sido um fracasso editorial tão grande que, em
Vitor Palla pela cidade, fotografando o seu quotidiano, entre 1956 e 1959. Assiste-se, no álbum, à
celebração de um olhar polissémico, subjectivo e intimista, poético e lírico, sobre o mundo citadino
de Lisboa, mas cujas conotações propositadas talvez sirvam, pela contextualização, para levar o
O álbum é uma obra assumidamente colectiva, em que as fotos, ao contrário das dos
salões, não são assinadas. O trabalho vive do experimentalismo fotográfico, do desfoque, da foto
tremida, do esfumado e fluído (flou), dos cortes, das sobre-revelações, das sequências, do alto-
contraste, das oposições, das difracções e das variações de tamanho e formatos. É uma Lisboa
humana, vibrante e viva que emerge contra o estatismo das fotos nítidas e "bem" compostas dos
salões, que, sem nada inovar, dominavam a fotografia portuguesa da época. (Fig. 42)
Um outro caso curioso é o de Rosa Casaco, agente da polícia política PIDE e um dos
fotógrafos de salão mais conhecidos, que publica, em 1954, o livro Salazar na Intimidade, um olhar
fotografará brilhantemente, mesmo sob o peso da censura, a Guerra Colonial. Deste conflito,
porém, os jornais praticamente só mostram cenas dos embarques e desembarques das tropas.
Manuel Graça, do Província de Angola, que reportou cruamente as matanças atrozes (que envolviam
Na imprensa dos anos sessenta, além de Augusto Cabrita, que publicou algumas
importante no jornalismo diário foi, sem dúvida, Eduardo Gageiro (1935-), que ainda hoje continua
mas instantâneos no sentido da fotografia única, com pouca atenção à contextualização, que quase
fazem dele um fotojornalista com traços que também se reconhecem em Eugene Smith (lirismo e
grupo de palestinianos nos Jogos Olímpicos de Munique, em 1972. Enviou o rolo para O Século
também pela paciência de quem procura ir mais longe no domínio das representações dos
acontecimentos. Foi ele que soube esperar por D. Maria diante da urna de Salazar, até que a
governanta o beijasse na testa. Foi assim que a fotografou, e o resultado foi uma imagem que
representa bem a complexa teia "provinciana" de relacionamentos pessoais que rodeava o Presidente
objetos como elemento de conotação da imagem —o cão brincalhão de Cavaco Silva, os brinquedos
de peluche de António Vitorino de Almeida, as luvas de boxe de Champalimaud, Eanes, com uma
Ilustrado, de Miguel Urbano Rodrigues, até este fechar. Chegou a ser preso pela PIDE, devido a
fotografias que "(…) davam uma má imagem de Portugal"(256), como a de uma mulher da Nazaré a
trabalhar toda vestida de negro ou a de uma manifestação de estudantes reprimida pela polícia, mas
teve a sorte de, na altura, ser correspondente da Associated Press, pelo que as pressões
deixa de explorar as significações. É, aliás, dele, a foto que provavelmente melhor sintetiza o que se
passou no 25 de Abril, funcionando como um signo condensado: Salgueiro Maia morde os lábios.
A revolução ia na rua, a tensão era grande, mas a aposta do jovem capitão de Santarém estava quase
ganha.
Regressando aos anos sessenta, é nesta década que Sena da Silva (1926-) inaugura,
por seu turno, um estilo fotodocumental que o faz aproximar de Robert Doisneau, graças à atenção
que confere aos gestos, atitudes e comportamentos do quotidiano das pessoas comuns. Na linha
intimista de Vitor Palla e Costa Martins, dá-se ainda conta de Castello-Lopes (1925-) e Fernando
Lemos (1926-). Por essa altura, nas fotografias de Castello-Lopes, que fotografa a partir de 1956,
revive-se a tradição humanista notória em The Family of Man, que começava a ser criticada por
alguns sectores.
impulsionou-o a documentar o País, ao longo de várias décadas, numa série de levantamentos com o
cariz de auxiliares "científicos", mas as suas fotos apresentam um toque humanista e esteticista que
no Diário de Notícias, Fernando Farinha, Eduardo Baião, Ezequiel de Sousa e Acácio Franco (1951-
), que depois esteve na Lusa, onde coordenou a Fotonotícia, estando agora no Tal & Qual.
O desenvolvimento do fotojornalismo português sofreu um atraso provoado, ao que
cremos, pelas condições em que a imprensa se moveu e desenvolveu ao longo da ditadura, num País
pobre, atrasado, analfabetizado, sujeito à "lei da rolha", reprimido. Assim, se na época do Vietname
o fotojornalista era rei, em Portugal as páginas dos jornais raramente concediam relevo ou até algo
mais do que a simples condição de "boneco ilustrativo" às fotografias, e as revistas ilustradas por
vezes pouco melhor eram. Da Guerra Colonial praticamente apenas se publicam fotos dos
cargas policiais.
irmandade cultural entre os povos ibéricos. Repetirá o tema em 1992/94, numa nova série,
produzindo imagens que tanto dão conta da vastidão da Serra da Estrela como providenciam uma
observação próxima das pessoas que percorrem as ruas de Coimbra. Por seu turno, John Davies
fotografa a Bairrada.
A acção dos fotógrafos estrangeiros que elegeram Portugal como tema foi bastante
benéfica para o arejamento do nosso fotojornalismo e, de uma forma mais vasta, mesmo da
fotografia nacional. Alguns deles, como Krause e Davies, vieram a ser expostos nos encontros de
também de rompimento com os cânones estéticos arcaicos dominantes no Estado Novo. Portugal
abre-se ao mundo e, particularmente, à Europa, e com o País abrem-se, para arejar, as portas da sala
Portugal de grandes fotógrafos de grandes agências — por cá passam, em trabalho, Salgado, Gilles
Peress, Guy le Querrec e Josef Koudelka, entre outros, e, em 1975, é atribuído pela primeira vez um
prémio do World Press Photo a uma fotografia obtida em Portugal, embora não por um
revolucionário de 1974.
mundo, mas também para a misceginação da cultura fotojornalística, inscreve-se Georges Dussaud,
que se debruça sobre Portugal e publica Les Portugais, a partir da leitura de Torga. Jean-Claude
Martinez, que fotografa os pescadores de Mira, entre 1991 e 1992, é outro deles.
Coimbra (desde 1980) vão contribuir para esse arejamento da fotografia portuguesa, permitindo o
contacto com a obra de muitos fotógrafos que representam o que de melhor se vai fazendo por esse
mundo fora. A inauguração do Curso de Fotografia da Escola Superior Artística Árvore e, entre
fotojornalismo, mas também a emergência de uma nova geração de fotojornalistas, bem formados,
cheios de garra e francamente bons. Em 1985, inclusive, o Sindicato dos Jornalistas reconhece o
(1950-), d' O Independente, Domingos Caldeira (1953-), José Reis e Luís Carvalho (1954-), que, na
linha do documentalismo fotográfico contemporâneo, operam uma ruptura com o statu quo e com as
rotinas fotojornalísticas na imprensa portuguesa. O mesmo se pode dizer de Jorge Guerra (1936-),
"sua" Lisboa marcado pela percepção que de Lisboa tem o fotógrafo, assumindo essa percepção,
para si, o estatuto de "real". Trata-se de um trabalho documental que reúne fotos desde meados dos
anos sessenta, altura em que desenvolveu o projecto Lisboa, Cidade de Sal e Pedra, no qual recorre
sistematicamente à teleobjectiva, e cujas fotos foram quase todas obtidas desde à beira-rio para as
mesmo se recortadas no meio da multidão. Luís Palma e Maçãs de Carvalho (que esteve na revista
Fotografias de Lisboa à Noite (1983) e, em 1984, Castello Lopes lança Perto da Vista. Foram as
Fotográfico de Lisboa expôs em 1996. São imagens que representam o desenraizamento da primeira
geração emigrante num espaço culturalmente desajustado, a comunidade fechada em que os hábitos
nacionais se mantinham, como as vizinhas a falar à janela, o quintal de couve galega à beira do
que personagens e objectos se tornam vultos, na linha do subjectivismo ficcional de Robert Frank ou
Bill Brandt. Por vezes, porém, parece emergir das fotos um ténue desejo de registar mais
intersubjectivamente o real, mas sem que as imagens deixem de ser polissémicas e comunicativas:
compreender estados de alma, ambientes, e tensões. Fotos, portanto, que apostam no contexto.
oitenta, na primeira fase da sua obra. Habitando na Holanda, Rodrigues ligou-se ao grupo
Eu e o Tempo. José Rodrigues é mais um dos fotógrafos que faz uma fotografia que oscila entre a
nacional, um dos seus trabalhos mais notados foi o projecto sobre as minas de São Domingos, no
também escolheu as minas como um tema do seu trabalho, mas, desta feita, as do Pejão. Por seu
mais largos e tendem, nalguns pontos, a libertar a foto da sua função testemunhal, de atestado, de
confirmação.
Expresso, no ensaio fotojornalístico; Daniel Blaufuks (1963-), que protagoniza uma fotografia onde
mistura espaços e personagens, em géneros que vão da foto de moda à de reportagem; Mariano
Piçarra, cuja fotografia documental é marcadamente simbólica; Rui Fonseca, que trabalhou a linha
de costa; Augusto Alves da Silva (1963-), que lança sobre a paisagem degradada e o ambiente
estragado um olhar subjectivo; Nuno Félix da Costa (1950-), com o seu "desfile de vaidades"
portuguesas; e António Júlio Duarte, com as suas fotos de um Macau de sombras e posicionamentos,
em que o real se tende a confundir com o virtual, a essência com a aparência, por vezes acentuando
o lado irónico de algumas situações, à maneira de Erwitt, outras vezes evidenciando a graciosidade e
documentalismo português são Manuel Miranda (com fotos interessantes sobre a noite) e Henrique
destes fotógrafos não deixa de ser ele próprio na abordagem que faz do real.
há alguns anos atrás. Teve uma importância decisiva na matéria o nascimento dos semanários
Expresso, nos anos setenta, e O Independente, nos oitenta, e do diário Público —talvez o diário
Há, pelo menos, uma trintena de bons fotojornalistas, espalhados por várias
publicações e agências, entre eles, por exemplo: Pereira de Sousa (1942-) e Armando Moreira
Público; Alfredo Cunha e Adelino Meireles, que também estiveram no Público; Luís Vasconcelos
(1952-), que esteve no extinto O Diário; Pedro Bettencourt de Azevedo (1965-), Francisco Silva e
Céu Guarda (1960-), que estiveram n’O Independente, semanário onde ainda permanece o hábil
retratista João Tabarra; Graça Sarsfield, também uma retratista de eleição; Luís Carregã, que esteve
Presse e da Gamma; Rui Ochôa (1948-), Sérgio Granadeiro e Luís Carvalho (1954-), no Expresso;
Lucília Monteiro e Inácio Ludgero (1950-), na Visão; Joaquim Proença Lobo, do extinto O Jornal.
Na Agência Lusa, gostamos especialmente de Manuel de Moura (1950-), pela força ou graciosidade
que consegue imprimir à generalidade das suas fotos, mesmo em assuntos triviais, bem como pela
Naquele Tempo, um fotolivro que resume o principal do seu trabalho, desenvolvido a partir dos anos
setenta até hoje, no Século, Século Ilustrado, Vida Mundial, ANOP, NP, Lusa e Público: são fotos
Chiado e, entre outras, de Moçambique, (1993). Com um portfolio deste último trabalho, Alfredo
José de Oliveira Tavares (1939-), que na altura estava no Diário de Lisboa, obteve
uma das cáchas recentes de fotojornalistas portugueses: foi o único fotojornalista a captar imagens
da tentativa de assassinato do papa João Paulo II, em Fátima. Américo Mariano, que estava no
Público, realizou, em 1992, na Somália, uma das foto-reportagens mais marcantes das realizadas na
década de noventa por fotojornalistas portugueses. 1992 é também o ano em que a revista do
Expresso inicia a publicação de uma série de trabalhos dos fotógrafos da Magnum, como uma
Uma nova atenção foi outorgada à fotografia em Portugal, a partir de meados dos
anos oitenta. O medium começou a ter direito a artigos regulares nos jornais e revistas. A 7 de
Outubro de 1989, o Expresso consagrou até a sua revista aos 150º aniversário da fotografia. Julho
de 1993 foi o Mês da Fotografia, em Lisboa, o que, a par dos encontros de Coimbra e Braga, não só
atraiu a atenção de interessados e menos interessados como também contribuiu para divulgar o
País.
expõem em paris, em Novembro de 1992, durante o Mois de la Photo. Rui Prata apresentou fotos
de esculturas do século XVII da martirologia cristã, José Afonso Furtado expôs fotografias de África
jardins. Além destes, estiveram presentes os fotógrafos Fernando Lemos, Aníbal Lemos, José
Maçãs de Carvalho, José Pastor, Sílvia Seova e João Tabarra.
que visava representar as diversas faces da vida na cidade. Para tal, sob a coordenação de Teresa
Siza, os fotógrafos portugueses Augusto Alves da Silva e Bruno Sequeira, o americano Larry Fink e
A Fink coube a tarefa de representar o quotidiano dos pescadores e das artes da pesca,
uma actividade que está a desaparecer. Nas suas fotos revive-se, mais uma vez, a grande tradição da
Basilico, por seu turno, procurou evidenciar a passagem do tempo e as rupturas que
Quanto aos portugueses, Bruno Sequeira realizou uma espécie de arqueologia da era
industrial matosinhense, com particular destaque para os indícios da outrora florescente indústria
conserveira. Augusto Alves da Silva deambulou pela zona rural da cidade, mais incaracterística.
trouxeram como principal inovação uma aposta importante na produção fotográfica portuguesa
contemporânea e na produção fotográfica sobre Portugal. O projecto colectivo "Sul", que procurou,
Wurtstemberger, Martine Voyeux, António Júlio Duarte, José M. Rodrigues (que também
apresentou a série monográfica "Alentejo", dedicada aos vestígios do paganismo), Daniel Schwartz,
Lisboa também não foi esquecida. O rio, as gaivotas, as pombas, a ponte, as gentes,
alvos do trabalho a preto e branco empreendido por Cristophe Bourguedi, Bernard Plossu, Frédéric
Bellay, Giovanni Chiaramonte, Paulo Nozolino e John Davies. E, mais uma vez, foram expostas as
África, vista por fotógrafos portugueses e africanos, foi também um tema central dos
Encontros, tal como as recordações do velho Império Português, que da Europa se estendia ao
Pacífico, passando pelas ilhas atlânticas, por África, pelo Índico e pela América do Sul. José Maçãs
de Carvalho, Steve Cox, Inês Gonçalves, Mica Costa Grande, António Leitão Marques, Mariano
Piçarra, José M. Rodrigues, Sérgio Santimano, Bruno Sequeira, Fazal Sheikh, Evandro Teixeira,
Pedro Vasquez e Dominique Wade foram os fotógrafos que trabalharam neste projecto, de vocação
autopromoção que vivia, essencialmente, de fotografias jornalísticas realizadas pelos seus foto-
repórteres e publicadas no jornal. Chamámos aqui esta ocorrência porque é exemplificativa da força
testemunhal que o fotojornalismo ainda tem mas também da força promocional que ele pode ter
numa esfera de luta oncorrencial. Desprezar a fotografia jornalística, nos dias de hoje, poderá
Foi conhecido, também em 1996, que o repórter fotográfico do Público Daniel Rocha
tinha vencido a edição portuguesa do Prémio Europeu de Fotografia da Fujifilm, com um trabalho
bibliotecas portuguesas —mesmo nas bibliotecas das instituições universitárias— são pobres.
sua evolução histórica dispersas em várias publicações, especialmente no livro Uma história de
Fotografia, de António Sena, o qual, como já dissemos, nos foi muito útil para a elaboração da
Além dos já citados, entre os livros consultados para a elaboração deste trabalho,
publicados sobre fotojornalismo nas principais revistas científicas ou noutros espaços devotados ao
alguma utilidade, até para se perceberem quais as preocupações actuais da comunidade académica
Time davam uma imagem tendencialmente negativa do Terceiro Mundo(257), o que vinca as possíveis
fotojornalismo. Conforme intuiram Michael Singletary e Chris Lamb, no mesmo ano, talvez as
fotografias "negativas" atraiam mais a atenção e possibilitem uma gratificação mais rápida.(258) Estes
autores chegaram também à conclusão de que as fotografias vencedoras dos prémios anuais de
em termos de emoção, um desvio tendencial para a "negatividade": 81% das fotografias vencedoras
nas categorias de news e de features relacionavam-se com acidentes, desastres, crime e violência (a
persuasiva de uma mensagem que recorresse à fotografia seria maior se a imagem fosse "positiva",
isto é, transmitisse sensações agradáveis, como alegria.(260) Talvez se possa relacionar esta ideia com
a descoberta de James Fosdick, que, em 1966, demonstrou que 65% das fotos publicadas em três
diários do Estado de Wisconsin e no Christian Science Monitor eram soft news sobre
que essas fotos não contribuíam para mudanças na consciência política e social do público.(261) De
qualquer modo, no estudo de Dyck e Coldevin e numa série de pesquisas efectuadas anteriormente,
geralmente concluiu-se que, embora atraindo a atenção, as mensagens articulando texto e fotografia
persuasiva de uma mensagem que recorra à fotografia tende a ser maior quando a imagem é
"positiva" poderia operar mudanças ao nível dos critérios de noticiabilidade e captação de imagem
Salgado e outros fotojornalistas que não enveredam por uma "estética do horror", poderia ser que, ao
durante os anos que analisou a Time e a Newsweek (1971, 1976 e 1980), as fotografias jornalísticas
sobre os Estados Unidos dominavam ambas as revistas, que apenas incluíam cerca de um terço de
fotos de outros países.(263) Além da construção do real promovida pelo jornalismo, tal facto releva o
valor-notícia da proximidade, mesmo em dois órgãos de Comunicação Social dos mais empenhados
numa estratégia de internacionalização do seu mercado. No mesmo trabalho, o autor demonstra que
as fotografias do estrangeiro publicadas nas revistas eram mais violentas que as dos EUA. Mostra
também que a América Latina, a África e as Ilhas do Pacífico recebiam pouca atenção das citadas
revistas e diz que a maioria das fotos publicadas quer pela Time quer pela Newsweek eram soft news
de interesse humano.(264)
Association, dos EUA, os autores concluíram que as mulheres eram actores primários apenas em
cerca de um terço das fotos. Todavia, em mais de metade dos casos eram representadas, por
exemplo, como vítimas necessitando de ajuda, raramente sendo mostradas, por exemplo, como
profissionais.(265) Além disso, apenas 3,7% das news photos e 10,8% das feature photos premiadas
pela National Press Photographers Association haviam sido realizadas por mulheres, apesar destas
atingirem 11,7% dos membros da NPPA.(266) Tal situação parece contrariar as conclusões das
Singletary e Lamb, face às pesquisas de Slattery e Fosdick, seria que homens e mulheres
contribuíssem quer para as news photos quer para as feature photos em proporção com os números
da sua adesão à associação profissional dos fotojornalistas americanos, o que não se verifica.
recompensa mediata.(269) Além disso, a maioria das fotos premiadas dizia respeito a acontecimentos
locais e regionais, e quase 25% mostravam feridos ou mortos, embora apenas 2,7% fossem tão
detalhadas que mostrassem pormenores como o sangue. Singletary e Lamb concluíram que este
relutância dos editores em difundir fotos que pudessem ofender os leitores.(270) Os autores
mostraram ainda que a maior parte das feature photos premiadas eram séries, compostas por um
número médio de 4,4 imagens, e que cerca de 25% dessas fotos eram grandes planos de expressões
faciais; mostraram também que a maioria das fotos analisadas foi realizada durante o dia e que,
contrariamente ao que esperavam, as fotos que obtiveram primeiros prémios não tinham conteúdos
b) A proximidade fez com que a maioria das fotos premiadas tivessem unicamente
interesse local;
não.
Resumindo, os autores provaram que as fotos do seu universo de estudo poderiam ser
categorizadas em função dos valores-notícia tradicionais e que, regra geral, focavam um pequeno
número desses valores: as feature photos enfatizavam a proximidade e o interesse humano, enquanto
Universidade do Tennessee, fez uma análise semelhante sobre 35 fotografias vencedoras de prémios
Pulitzer. Segundo o autor, estas fotos giravam à volta de oito motivos: 1) distúrbios; 2) segurança;
excentricidades e singularidades.(274)
Analisámos as trinta e nove fotografias do ano do World Press Photo e chegámos, entre outras, às
seguintes conclusões: a) Quase 90% das fotos premiadas são fotos-choque e estimulam recompensas
imediatas; b) Cerca de metade dos sujeitos principais representados nas fotos são homens, um terço
são crianças e apenas 14% são mulheres, o que evidencia um notório desequilíbrio no tratamento
dos subgrupos sociais; além disto, as mulheres raramente são apresentadas em posturas "activas" no
contexto, mas sim em papéis de solicitadoras de auxílio e similares; c) Cerca de 35% das fotos
mostram mortos ou feridos, mas só duas são detalhadas; d) Só em duas fotos os sujeitos
representados eram figuras públicas nas datas em que as fotos foram realizadas; e) Todas menos
uma das fotos reportam-se directa ou indirectamente à violência, especialmente à violência bélica
Num estudo editado em 1996, Michael Griffin e Jongsoo Lee, após analisarem 1104
fotografias sobre a Guerra do Golfo publicadas na Time, na Newsweek e no U.S. News & World
Report, concluíram que o espectro tipológico dessas fotografias foi estreitamente limitado,
sobretudo dos EUA— em detrimento da faceta humana do conflito. Além disso, segundo os
No campo da imagem das relações raciais criada pelo jornalismo, existem alguns
estudos interessantes, embora respeitem sobretudo aos Estados Unidos. Alguns desses estudos
Assim, em 1964, Verdelle Lambert descobriu, num estudo sobre a Look, que havia
um aumento das referências não-raciais aos afro-americanos nas notícias, entre as quais as que
articulavam texto e imagem. Concluiu, a partir deste dado, que os editores da Look cada vez mais
membros da sociedade.(278)
Da mesma maneira, também Carolyn Martindale, no seu livro de 1986 The White
Press and Black America, após analisar a forma como eram representados os afro-americanos em
245 números de The New York Times, The Boston Globe, The Chicago Tribune e The Atlanta
Constitution, incluindo nas fotografias, afirmou que os editores desses jornais mostravam um desejo
Alice Sentman, por seu turno, debruçou-se sobre a cobertura fotojornalística dos afro-
americanos na Life, de 1937 a 1972, tendo concluído que eram dispersamente representados e que,
portanto, a Life não dava à sua audiência a possibilidade de ter acesso a representações da vida
Em 1990, Paul Martin Lester e Ron Smith estudaram as fotografias publicadas nas
revistas Life, Newsweek e Time entre 1937 e 1988. Chegaram à conclusão que os afro-americanos
tinham ganho visibilidade com o decorrer dos anos. Esse aumento dever-se-ia mais à cobertura de
acontecimentos dramáticos do quotidiano e de actividades de figuras-públicas, como acontece para
e artes do entretenimento.(281) Para eles, essa via seria a (politicamente) correcta.(282) Porém, os
mesmos autores descobriram também que, apesar disso, a percentagem de apresentação de fotos
americana, tendo concluído que tal mostrava, apesar de tudo, confiança nas coberturas
estereotiopadas.(283)
Newsweek e na Time isso não acontecia.(284) Também evidenciaram que na era pré-direitos civis as
O mesmo Paul Martin Lester, num estudo editado em 1994 sobre 250 mil fotografias
inseridas nos jornais The New York Times, Chicago Tribune, New Orleans Times e San Francisco
Chronicle, mostra que a cobertura dos afro-americanos aumentou, mas que o preço da visibilidade
fotojornalísticos. Uma das conclusões globais que podemos extrair desses estudos é que a imprensa
exemplo, foi frequente a inclusão de imagens que, numa leitura menos atenta, passavam por
imagens do teatro de operações, mas que em letras miudinhas anunciavam que se tratava, por
que nas fotos publicadas entre Junho de 1973 e Junho de 1974 nas páginas do Washington Post e do
Los Angeles Times os homens surgem mais vezes do que as mulheres, excepto nas secções de
"sociedade". Assim, a cobertura fotonoticiosa não reflectiria, nesses jornais, os papéis que as
como acontecimentos desportivos não profissionais, não eram cobertos. Tal demonstraria, na óptica
da autora, que o fotojornalismo diário vive sobretudo da rotina. Esta consagraria critérios de
noticiabilidade que secundarizariam as mulheres, mesmo quando elas deveriam ser notícia, por
Repetindo a pesquisa de Susan Miller, Roy Blackwood, em 1983, descobriu que nos
mesmos jornais as representações fotográficas de homens dominavam ainda mais do que em 1974 as
em 1983, por Blackwood, eram de 4 para 1 no Post e de 3 para 1 no Times. Só nas secções de
"sociedade" é que a relação se tornava equilibrada. O autor chegou, assim, à conclusão de que, em
1983, havia um desfasamento ainda maior entre o real e a sua representação fotográfica nos dois
jornais.(289)
fotografias de mulheres publicadas na Time e na Newsweek em 1938, 1953, 1963, 1975 e 1983 se
focalizavam nos corpos, enquanto as fotografias de homens se centravam nos rostos, embora o papel
social dos sujeitos representados tivesse influência mediadora nesta tendência.(290) No mesmo
trabalho, os autores compararam as expressões faciais dos sujeitos retratados em anúncios das
revistas Time, Ms., Fortune e Ebony de 1976, 1981 e 1986, particularmente a posição da boca, tendo
constatado que as mulheres mais do que os homens eram fotografadas com a boca aberta,
presumivelmente, como dizem os investigadores, uma expressão entendida como menos séria.(291)
Daddario analisou as secções especiais sobre fatos de banho que mostram modelos femininas
posando em praias solarengas e exóticas, inseridas em edições especiais da Sports Illustrated que
vendem quase o dobro dos restantes números. Daddario concluiu que as atletas são marginalizadas
pela sua colocação simbólica em determinadas páginas de informação e pelo maior volume de
imagens consagradas às modelos, e assegura ainda que a revista cria uma associação entre atletismo
A imagem que resulta das representações fotográficas da Terceira Idade nos anúncios
publicitários editados na Life e na Ebony, entre 1978 e 1987, foi analisada, por seu turno, num
conclusão de que as pessoas idosas foram representadas numa proporção (menos de dois por cento)
manifestamente inferior ao seu peso na população americana; nestes anúncios as pessoas idosas
foram ainda, regra geral, representadas em conjunto com pessoas mais jovens e de forma a
contribuir para uma visão estereotipada e algo negativa da velhice, devido à sua associação mais a
anúncios sobre laxantes, cuidados ambulatórios, seguros de vida, planos de poupança e equivalentes
do que, por exemplo, a anúncios sobre carros, viagens e lazer.(294) Consequentemente, a Terceira
Idade seria poucas vezes vista como um público-alvo a atingir através dessas revistas.(295)
autor mostrou que, no período sob análise, apenas o Washington Post tinha realizado uma cobertura
tendencialmente neutral das acções do senador, enquanto o Los Angeles Times, o Chicago Tribune e
da campanha eleitoral de 1984 para a presidência dos Estados Unidos foi o tema de um artigo
surgido em 1986, da autoria de Sandra Moriarty e Gina Garramone. As autoras evidenciaram que,
Reagan, embora na ponta final se tivesse verificado o contrário, com Mondale a marcar pontos. A
candidata Ferraro, apesar de ter tido direito a quase duas vezes mais fotos publicadas do que Bush,
Um sinal das pressões políticas ou, pelo menos, do triunfo das tácticas e estratégias
das relações públicas dos políticos, é o aumento da cobertura fotográfica dos presidentes americanos
(pelo menos) nos jornais New York Times, Atlanta Constitution, Los Angeles Times e St. Louis Post-
Dispatch, ocorrida a partir de 1960 e notada, pelo menos, até 1988 (ano do estudo que o demonstra),
devido à disponibilização interessada, por parte da Casa Branca, de um cada vez maior número de
opportunities).(299)
A presença de fotografias nas primeiras páginas dos jornais também foi várias vezes
analisada. Michael W. Singletary, em 1978, mostrou que de 1936 a 1976, embora tenha aumentado
o total de fotos nas páginas um do Chicago Tribune, do Los Angeles Times, do Philadelphia
Inquirer, do St. Louis Post-Dispatch, do New York Times e do Washington Post, tinha decrescido de
59,4% para 29,9% o número de fotos em grande plano; os temas mais comuns nas fotografias foram
sempre a política e actividades públicas (quase 40% das fotos), o interesse humano (entre 25-30%),
acidentes e desastres (diminuiu de 14,5% em 1936 para 9,7% em 1976) e crime e corrupção
(diminuiu de 9,3% para 5,9%).(300) Notou-se, também, um aumento do respeito pelos direitos de
autor, manifestado no aumento do número fotos assinadas, o aumento da produção própria dos
forneceu 20,7 por cento das fotos publicadas na primeira página dos jornais, percentagem que
aumentou para 36,7% em 1956 e decresceu para 26,7% em 1976, ficando pela primeira vez abaixo
do índice de produção própria. Se à AP associarmos a UPI, verificamos que as duas agências são
Em 1988, Paul Martin Lester mostrou que cerca de metade das fotografias nas
primeiras páginas de 1986 do USA Today, do Chicago Tribune, do New Orleans Times-Picayune, do
New York Times e do Los Angeles Times eram mug shots, isto é, fotos "tipo-passe" (embora podendo
não ser posadas), com particular destaque para o USA Today(303), provavelmente devido às suas
características "pós-televisivas"). USA Today que, aliás, pode ser um jornal dirigido para público
masculino (talvez porque os homens comprem mais jornais), sendo esta situação partiularmente
Ainda em 1988, num outro estudo, Paul Martin Lester provou que, apesar da
proliferação de infográficos, mapas e outro tipo de "informação" visual, as fotografias eram ainda o
principal elemento visual das primeiras páginas dos já referidos jornais, mesmo que combinadas
com outros elementos visuais (em 300 primeiras páginas analisadas, havia 1148 fotografias, 133
combinado com uma ilustração); a maioria das imagens mostrava homens brancos (79%) e 87%
dessas imagens só mostravam sujeitos brancos.(305) Um estudo de 1987 punha o acento tónico na
americana (59% dos jornais usavam ocasionalmente a cor e 32% usavam-na sistematicamente).(306)
Em 1974, G. Norman Van Tubergen e David L. Mahsman fizeram ver que a natureza
positiva, negativa ou neutra de uma imagem influenciava as atitudes dos observadores face aos
sujeitos representados; quando estes eram figuras desconhecidas, as fotos contribuíram mais
ideias que obtinham sobre as pessoas representadas nas "estórias" durante a leitura do texto, pois as
fotos acompanhavam as ideias dos textos(308), o que vai ao encontro das conclusões de Wanta e
Leggett, que verificaram que as jogadoras de ténis eram usualmente representadas nos serviços de
ideia de que os editores seleccionam (algumas?) fotos de acordo com estereótipos e preconceitos
leitores que observavam fotografias (em grande plano facial) dos sujeitos das "estórias" eram mais
rápidos a atribuir-lhes características pessoais do que os leitores sem acesso a essas imagens; além
disso, consoante essas fotos fossem negativas, neutras ou positivas também os leitores tendiam a
Um estudo de Anna Banks de 1994 vai bastante ao encontro dos objectivos da nossa
tese. A autora debruça-se sobre a selecção fotográfica que os editores fazem para as revistas,
argumentando que as escolhas são influenciadas quer pelos códigos culturais que as imagens
contêm quer pelas práticas culturais e organizacionais em que os editores se vêem imersos; a
produção fotonoticiosa é colocada, assim, no contexto das rotinas, dos valores profissionais e do
cultural, como construções, e não como simples descrições ou reflexos dos acontecimentos.
Perspectivá-las dessa forma permite lê-las como parte das forças políticas, sociais e culturais sob as
na boca, frente aos repórteres, a 22 de Janeiro de 1987, as fotografias resultantes criaram, na hora da
sua publicação, um dilema entre ética, (bom) gosto e valor sensacionalístico das imagens. Robert C.
Kochersberger Jr. estudou os jornais da Pensilvânia, de Nova Iorque e da Carolina do Norte, tendo
chegado à conclusão de que nestes dois últimos estados americanos, devido, provavelmente, à sua
menor proximidade da acção, as fotografias foram usadas menos sensacionalisticamente.(313) Mas,
dentro da Pensilvânia, os jornais num raio de cem milhas da cidade natal do governante foram
menos sensacionalistas na publicação das fotos do que os restantes(314), o que poderá ter a ver com
uma maior susceptibilidade em publicar fotos chocantes sobre uma figura-pública da região
infelizmente, como vem sendo hábito, quase em exclusivo nos Estados Unidos.
homens e as mulheres fotojornalistas nos EUA, tendo concluído que poucas diferenças se notavam,
mas que a pequena vantagem era das mulheres.(315) Na década de oitenta, em dois estudos separados,
Barbara Bethune traçou o perfil dos fotojornalistas americanos: jovens, brancos, homens e com
bacharelatos.(316) Outras conclusões do maior desses estudos, que envolveu a maioria dos
fotojornalistas filiados na NPPA, foram que a satisfação laboral aumentava com a idade e que os
fotojornalistas que tinham voz activa na tomada de decisões respeitantes à sua actuação nos seus
recrutamento dos fotojornalistas da região Oeste das Montanhas Rochosas, mostraram que os
editores preferem profissionais com capacidade de escrita, capacidade para avaliar o que é notícia e
conhecimentos de direito dos media, além, evidentemente, de domínio da técnica fotográfica e dos
equipamentos.(318)
mês de beligerância da Segunda Guerra Mundial realizada pelos diários portuenses foi
fotografia é rica, diversificada e complexa. Da mesma maneira, mesmo que curta, a história do
momento esse também ele complexo e problemático na sua multiplicidade e rápida mutabilidade.
Não foi, no entanto, nosso propósito, ser exaustivos ao escrever este livro, mas tão só
traçar as linhas que permitam uma aproximação histórica suficiente para entender parte das razões
pelas quais o fotojornalismo na actualidade se faz e é entendido de uma maneira e não de outras, até
permitam uma reflexão mais proveitosa aos responsáveis pelo fotojornalismo português e aos
fotojornalistas, em termos de política fotojornalística a implementar e seguir. Estamos
que terão de ser impulsionadas através de intervenções primeiras ao nível das culturas de empresa e
As mudanças nas culturas de empresa, quanto a nós, devem casar (a) uma esfera de
liberdade/criatividade/responsabilidade que deve ser outorgada aos foto-repórteres, com (b) uma
diversificação produtiva capaz de satisfazer não só o mercado tradicional mas também as novas
exigências dos quality papers, com (c) os novos imperativos ético-deontológicos que emergem no
a diversidade, fomentada, aliás, pela acção pessoal de diversos fotógrafos, notam-se também linhas
evolutivas no estilo, nos pontos de vista, nos géneros fotográficos, seja de Hine a Salgado, de Beato
conformaram a irrupção de rotinas e convenções. Mas também permitiram a fuga a essas rotinas e
convenções.
mundo. Por isso, importa ao fotojornalismo encontrar novos usos sociais e novas funções, que
reconheçam o que, com o tempo, se tornou evidente: a dimensão ficcional e construtora social da
realidade que a intervenção fotográfica aporta. Nesta linha, aliás, vários fotojornalistas começaram,
como vimos, após a Segunda Guerra Mundial, a reivindicar e praticar o seu direito à subjectividade
assumida, encarando a fotografia não como o "espelho do real", mas mais como uma metáfora ou
até uma metáfora-metonímia da realidade. Por via desta opção, arte, e intenção
campo dos news media, embora existam fotojornalistas que insistem na distinção, por influência
socio-ideológico-cultural.
comum, a passar pelo espelho do real tal como este se apresenta perante a câmara num breve
instante, isto é, o que a foto regista "é verdade", aconteceu, e o fotógrafo esteve lá para o
testemunhar. Esta noção da fotografia como espelho do real, imagem reflectida que não mente, está
fotografia digital, estamos convencidos de que terá ecos no futuro. Não é de espantar: lançada num
ambiente positivista, a fotografia desenvolveu-se, inicialmente, numa época histórica em que o valor
do facto era grande, pelo que é com alguma naturalidade que a foto —vista como um registo,
funcionando como prova— se ligou à ciência, aos governos, aos militares, à indústria e,
verbais e as representações da realidade que esses enunciados criavam, acompanhados, agora, pelas
fotos. Segundo Schiller, era comum então, na imprensa britânica e americana —que viria a
máquina de registar a verdade exacta" e à câmara como metáfora para as actividades dos repórteres.
Mesmo quando eram publicadas gravuras de madeira, a imprensa, para reforçar a credibilidade
comum, para construir "verdades", sim, mas apenas "verdades" subjectivas ou mais ou menos
intersubjectivas. Contudo, mesmo essas "verdades" foram e são continuamente revistas, devido às
novas aportações imagéticas que o fotojornalismo vai trazendo, momento a momento, aportações
essas que alimentam ou qualificam, modificam e desafiam as ideias, valores, princípios, ideologias,
mitos, crenças e expectativas que transportamos dentro de nós. Vimos aliás, no nosso percurso ao
tarefas estéticas, políticas, culturais, económicas e ideológicas, entre outras. Mudou também, ao
longo da história, o entendimento sobre o papel que nesse campo o fotojornalismo pode ter, mas
entroncou com as crenças que no século XIX existiam sobre o realismo fotográfico, permanece
vivo: "(…) the news form continues to be shaped by professional attitudes that closely correspond to
assumptions about photography's ability to 'tell the truth' in unbiased, accurate accounts of world
events."(320) Assim, no fotojornalismo a ideologia da objectividade tem uma espécie de
correspondência na máquina fotográfica, encarada como um elemento "neutro" por parte dos
fotógrafos, que se esquecem dos procedimentos ópticos, químicos e técnicos que se escondem por
trás da aparência do medium, que se esquecem que o equipamento tanto abre portas (por exemplo, as
teleobjectivas permitem captar pormenores a maior distância) como as fecha (os fotojornalistas, ao
contrário dos redactores, não são admitidos em alguns locais, como em certos julgamentos).
normalidade realística e "objectivante", já que, hoje em dia, a actividade é dominada por uma
produção rotineira que continua a perseguir o realismo e que pouco ou nada engloba o criativo, a
arte e, por vezes, mesmo o ponto de vista. Mas estamos de acordo em que a inter-relação entre a
fotografia e a televisão que nos parece existir prestará um bom serviço ao fotojornalismo se
contribuir para que ele vença as amarras da rotina e da convencionalidade para mergulhar na
autoria. Não é em forçar o fotojornalismo a ser igual à arte que está a receita para o jornalismo
fotográfico de hoje. Isto é, não deve perder-se o norte da intenção informativa do fotojornalismo —
uma mais valia para o fotojornalismo e para o público que a actividade se abra a orientações
criativas, originais, com ponto de vista, que podem passar pela insinuação da arte na fotografia
jornalística e pela fuga ao realismo. E que devem passar pela autoria consciente e responsável,
maior formação, à acção do meio académico e à própria constatação das mudanças. Novos padrões
éticos e novas responsabilidades estão a acompanhar essa revisão nos pontos de vista. Em suma,
com os debates em curso os fotojornalistas parecem estar a traçar as novas fronteiras delimitadoras e
definidoras do seu estatuto e do estatuto do seu trabalho no seio das organizações noticiosas, nesta
nova idade mediática cuja chegada foi anunciada a partir dos anos oitenta.
Como nos parece ter provado também, na história do fotojornalismo há cinco tipos de
forças que se fazem sentir simultanea e interactivamente: a acção pessoal, a acção social, a acção
ideológica, a acção cultural e a acção tecnológica. Elas contibuiram e contribuem para que o
forças que nos parece permitirem explicar por que é que as (foto)notícias são como são permitem-
nos, parece-nos, igualmente explicar a evolução que o fotojornalismo registou até hoje.
a) Acção pessoal
suas temáticas, das suas tipologias, das tendências compositivas, etc., (também) como
um produto das pessoas e das suas intenções, nomeadamente dos autores. E, se bem
mercado novos artefactos técnicos, novas revistas e álbuns ou novas agências, por
exemplo.
b) Acção social
do trabalho produtivo em grupo e/ou organizações, que são mais do que o somatório
das pessoas que as constituem, que estão sujeitas a constrangimentos e que têm
necessidades. Por isso, o produto fotojornalístico pode ser mais o resultado não
planeado de (1) restrições motivadas pelo que aparenta ser razoável em função dos
fotojornalismo sofre, assim, a influência das alterações sociais e das mudanças sócio-
organizacionais.
lucro, etc.
c) Acção ideológica
A acção ideológica pode verificar-se pelas semelhanças de entendimento do mundo,
do medium e da profissão por parte dos fotojornalistas, tal como são exibidas quer
a legitimação da actividade.
por exemplo, devem compartilhar certas ideias, valores, crenças e expectativas sobre
as formas de que a fotografia se pode servir para expressar o mundo social ou até as
próprias individualidades dos fotógrafos, em função dos seus interesses, por exemplo
cultural (frame) ele é entendido como notícia; pelo contrário, as defesas de teses de
diversidade, que também se pode incluir nesse quadro, um quadro que, aliás, reflecte
deslocalizada.
e) Acção tecnológica
limitantes: por exemplo, o uso de uma teleobjectiva traz sempre por acréscimo efeitos
de compressão do tema.
ideológica e da acção cultural parece-nos ser notória, por exemplo, na assimilação pessoal, social,
ideológica e cultural de novos temas, novas práticas, novas ideias ou novas técnicas e tecnologias.
Assim, sem prejuízo do facto de a acção pessoal se poder traduzir pela inovação e, deste modo, pelo
desfazer do rotineiro, como no caso da fotografia de autor, o efeito conjugado desses três tipos de
acção leva, geralmente, à conformação produtiva e, deste modo, à irrupção de rotinas produtivas no
fotojornalismo:
a) Ao nível temático, encontramos no fotojornalismo (entendido numa expressão
jornalístico dominante.(322)
surgem num estado de coisas e conformam outro estado de coisas. Quando emergem
imagem fotojornalística, sobretudo nos casos das agências noticiosas, dos jornais e
das revistas, e que se joga num fotojornalismo cada vez mais (falsamente)
quer nas estratégias para obtenção de imagens, quer nos procedimentos internos dos
diferentes, usam tácticas que não repugnariam a Solomon. E é também assim que
obtenção/execução) — lucro.
cultural a vários níveis. Por um lado, a utilização crescente das novas tecnologias de
produtivas fotojornalísticas.
imagem digital, o controle dos fotojornalistas sobre o seu produto cada vez surge
mais não apenas como um direito, mas sobretudo como um imperativo ético que
deverá ter desejável correspondência nos códigos deontológicos, mesmo em códigos
documentalismo.
objectivantes, "sem" ponto de vista e realistas: há, neles, espaço, por exemplo, para a encenação
ficcional. Aliás, a encenação é (quase) tão velha como a fotografia (recorde-se, por exemplo, a
e adereços aliada à pose) são exemplos de criação ficcional cujas implicações provavelmente
perfeitas do mais puro real. Mas a exploração de novas linhas no documentalismo, como é visível
em Martin Parr, quer nos seus projectos mais antigos quer nos mais recentes sobre decoração
menor notoriedade: tal é visível, sobretudo, nos retratos posados e individualizados de sujeitos
representativos que fez em várias das séries do projecto. Trata-se, aqui, da "encenação" dos corpos
e dos gestos, tendo por pano de fundo o ambiente e por agasalho as roupas. É preciso que se diga,
porém, que nestas abordagens há sempre o risco (ou a potencialidade?) da estereotipização, como
tinha já alertado Dorothea Lange quando reclamava contra a conversão num estereótipo da sua foto
Em segundo lugar, pensamos ter demonstrado que a (ilusão da) "verdade fotográfica"
tem com a fotografia jornalística uma relação precária, embora nem tanto para o senso-comum.
entre estes pólos não se cristalizou numa tradição única. Quer a fotografia quer a realidade são
documental é uma falsa questão. Proceder segundo cânones estéticos identificáveis com a arte
poderá ser proveitoso caso assim se ofereçam pistas para o observador chegar ao nível das
significações dos acontecimentos e das problemáticas. É o que acontece, entre muitas outras, nas
fotos que tiram partido dos efeitos de arrastamento, da desfocagem ou da angulação. Neste ponto,
até já secundarizamos as regras mais clássicas de composição, que, em si, já são um procedimento
actual se faz sentir transnacionalmente. A fotografia é um dos media que se podem caracterizar
como possuindo uma certa "universalidade" de linguagem, independentemente das práticas e leituras
fotográficas culturalmente mais localizadas que se possam fazer de uma foto — a pose pode, como
alertou Barthes, ser entendida de formas diferentes, e Einstein deitando a língua de fora tanto pode
(4) Ken Baynes (Ed.) (1971) — Scoop, Scandal, and Strife: A Study of Photography in Newspapers.
(21) Dona B. Schwartz e Michael Griffin (1987) — "Amateur photography: The organizational maintenance of an
aesthetic code", 198-224.
(25) Talbot, por exemplo, publica The Pencil of Nature em 1844, querendo provar a natureza mecânica e analógica
(espelho do real) da fotografia. A câmara seria uma réplica do olho.
(26) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 9.
(27) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 9. (Tradução livre: "(…)
conduziu-os ao confronto com ambientes hostis, censura, equipamento falível, gostos convencionais
dos editores fotográficos e dos leitores, a distorção das seus próprias pre-conceptualizações, as
limitações inerentes ao que a fotografia pode comunicar.")
(28) Veja-se Karin E. Becker (1989) — "Photojournalism". In Erik Barnouw (Ed.) — International Encyclopedia of
Communications, Vol. 3, 285. No mesmo sentido, escreve Marie-Loup Sougez (1991) — Historia de
la fotografia, 92; Veja-se, porém, Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise,
17. Neste livro, esta última autora refere que os redactores da Time-Life dizem que o primeiro
documento de imprensa ilustrada moderna é uma reprodução de uma gravura ad-hoc que tenta encenar
uma tentativa de assassinato da raínha Vitória, também publicada no The Illustrated London News, em
1842. Hermann Biow, um outro fotógrafo de Hamburgo, terá também realizado fotografias do mesmo
incêndio desta cidade, que entretanto se perderam. Ver: Richard Lacayo e George Russell (1990) —
150 Years of Photojournalism, 11.
(29) Dizem-no Karin E. Becker (1989) — "Photojournalism". In Erik Barnouw (Ed.) — International Encyclopedia of
Communications, Vol. 3, 285; e Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 17.
(30) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p. Os autores adiantam ainda que "Nos primeiros tempos, as imagens (…) eram
entregues a gravadores que as reprodziam em madeira (xilografia). Esta técnica (…) envolvia (…) a
utilização de uma mão de obra especializada, lenta e relativamente cara (desperdiçando, assim, a
vantagem do automatismo). Punha também em causa a 'veracidade' da imagem: com efeito, os
gravadores muitas vezes acrescentavam elementos da sua 'lavra' às imagens que reproduziam,
chegando até a assiná-las." (s.p.). O The Illustrated London News chega mesmo a manifestar-se
contra a substituição da reprodução em desenho artesenal pela fotogravura, conforme revela Margarita
Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 18.
(31) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 11.
(32) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 1 e 11.
(33) Luís Humberto Marcos (1989) — "Dados cronológicos para a história da fotografia e do fotojornalismo". In O
Fotojornalismo Hoje — Catálogo da Exposição Comemorativa dos 150 Anos da Fotografia, 10.
(34) Luís Humberto Marcos (1989) — "Dados cronológicos para a história da fotografia e do fotojornalismo". In O
Fotojornalismo Hoje — Catálogo da Exposição Comemorativa dos 150 Anos da Fotografia, 10.
(35) Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 17. A autora reporta-se, contudo, a BORGÉ,
Jacques e VIASNOFF, Nicolas (1982) — Histoire de la photo de reportage. Paris: Ed. Fernand
Nathan.
(36) O naturalismo surgiu por volta de 1880, como reacção aos artifícios correntes nos meios da foto-arte, como a
montagem de negativos. Os fotógrafos naturalistas procuravam reproduzir a natureza tal como ela é
percebida e celebravam o campo nas suas fotografias. Peter Henry Emerson (1856-1936) é talvez o
pai do movimento, estatuto que adquire com a publicação de Naturalistic Photography, em 1890.
(37) As bases do pictoralismo são diversas, mas encontram-se condensadas no texto La photographie est-elle un art?,
de Robert de la Sizeranne. Os pictoralistas, que recolhem alguma coisa do impressionismo,
advogavam que a fotografia deveria ser entendida como uma das belas-artes, mas que para o ser
deveria aproximar-se compositiva e tematicamente à pintura.
(38) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 31. (Tradução livre: "As
descrições das batalhas eram higienizadas pela distância e pelo tempo, deixando o público
observador fora do processo da guerra em si.")
(40) Sobre Nadar, partilhamos a opinião de Gisèle Freund (ed.: 1989) — Fotografia e Sociedade, 53; e de Luís
Humberto Marcos (1989) — "Dados cronológicos para a história da fotografia e do fotojornalismo".
In O Fotojornalismo Hoje — Catálogo da Exposição Comemorativa dos 150 Anos da Fotografia, 10 -
11.
(41) Gisèle Freund é citada por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 24.
(42) Robert Delpire, Michel Frizot et al. (1989) — Histoire de Voir. vol. 1, s.p.
(43) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 17.
(44) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 17.
(45) Citado em: Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 10. (Tradução
livre: "Assegura representações precisas e charmosas das cenas mais distantes ou evanescentes.
Fixa, por um processo quase instantâneo, os detalhes e características de eventos e locais, que de
outra maneira a imensa maioria dos seres humanos nunca poderia levar para casa.")
(46) Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 19. A autora dá exemplos da polémica instalada,
acrescentando o seguinte, em nota de rodapé: "Abaixo asinados de artistas en contra, como o
académico Ingres, por misturar arte e industria; defensas polo espíritu ilustrado —Delacroix— que a
entende como unha grande contribuición ó estudo da realidade; Baudelaire —argaña que os
franceses non dan tirado— enfrentándoa como instrumento de incultura e trivialización pró público...
mentres, na súa defensa da modernidade, descríbea luíndo 'le transitoire, le fugitif, le contingent',
liñas na que Jean Clair ve a premonición do foto-reporter, en concreto de Cartier-Bresson." (p. 19,
nota 9).
(48) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p.
(49) Marie-Loup Sougez (1991) — Historia de la fotografia, 160. Todavia, a autora, em nota de rodapé, reporta-se a
Newall, Beaumont (1978) — The History of Photography, 4ª Edição, New York: Museum of Modern
Art, pois, segundo Newall, existiram daguerreótipos de soldados da guerra entre o México e os
Estados Unidos, em 1848.
(50) O facto de a primeira "foto-reportagem" de guerra ter sido previamente censurada é bastante conhecido. Repare-se,
por exemplo, em Gisèle Freund (ed.: 1989) — Fotografia e Sociedade, 108 — "A expedição de
Fenton tinha sido encomendada na condição de que ele jamais fotografasse os horrores da guerra,
para não assustar as famílias dos soldados."
(51) Expressões usadas por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 61.
(52) Robert Delpire, Michel Frizot et al. (1989) — Histoire de Voir. vol. 2, s.p.
(53) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 11.
(54) Vicki Goldberg (1992, 16 de Agosto) — "A deliberate, unflinching witness to history", H22.
(55) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 14 e 24.
(56) Peter Pollack (1961) — Histoire mondiale de la photographie. Paris: Hachette. Pollack é citado por Marie-Loup
Sougez (1991) — Historia de la fotografia, 165.
(57) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(58) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(59) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(60) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(61) De uma forma geral, uma certa "cronomentalidade" é inculcada nos jornalistas através dos processos de
socialização e aculturação na empresa e na profissão. Como defendeu Philip Schlesinger (1977), em
"Newsmen and their time machine", os jornalistas são membros de uma cultura ocidental consciente
do tempo. Segundo o autor, a consciência que os jornalistas têm da passagem do tempo é maior do
que na maioria das restantes profissões, devido, principalmente, à existência de deadlines e ao facto da
estrutura de competição definir a notícia como uma mercadoria perecível que exige, para o seu fabrico
diário, uma estrutura de produção baseada no valor do imediatismo. Para Schlesinger, a capacidade de
vencer o tempo seria mesmo a demonstração mais clara de competência profissional.
(62) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(63) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(64) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(65) William F. Thompson (1994) — The Image of War: The Pictorial Reporting of the American Civil War.
(66) Karin E. Becker (1989) — "Photojournalism". In Erik Barnouw (Ed.) — International Encyclopedia of
Communications, vol. 3, 285.
(67) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 11.
(69) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p.
(72) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p. Ver também: Tausk, Petr (1978) — Historia de la fotografia en el siglo XX.
Barcelona: GG, referenciado por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise,
18.
(73) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p.
(74) Karin E. Becker (1989) — "Photojournalism". In Erik Barnouw (Ed.) — International encyclopedia of
communications, vol. 3, 286. (Tradução livre: "Apesar disto, os jornais resistiam ao custo da
reorganização da produção e contratavam gravuristas do exterior para desenhar fotografias. O seu
investimento nos gravuristas também satisfazia os standards da arte visual e fornecia imagens mais
vivas do que a rudimentar tecnologia fotográfica da época era capaz.")
(75) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940", 33.
(76) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940", 33.
(77) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940", 34. (Tradução livre: "Este modo de usar a foto era inspirado nos conceitos
artísticos da pintura, principalmente da pintura de retrato e de paisagem. Estes dois géneros por
vezes juntavam-se numa montagem: destacava-se o assunto principal das fotos em tomadas próximas
e montavam-se na foto de uma paisagem estática realizada depois do facto, no cenário dos
acontecimentos. A montagem era usada (…) mas morrerá completamente no final da década de
Trinta, tal como as silhuetas e os contornos.")
(78) Susan D. Moeller (1989) — Shooting War: Photography and the American Experience of Combat.
(79) Para a caracterização da evolução histórica do jornalismo, reportamo-nos a Jesús Timoteo Álvarez (1992) —
Historia y modelos de la comunicación en el siglo XX. El nuevo orden informativo, 50-142. O autor
diz que os jornais políticos e jornais de "élite" (que buscavam a precisão informativa) coexistiam, nos
anos Trinta do século passado, com a primeira geração de imprensa popular. Para Timoteo Álvarez,
estes últimos jornais possuiam: 1) Linguagem e capacidade expressiva adaptada à audiência; 2)
Capacidade técnica para aumentos de tiragem e redução dos custos de produção; 3) Mentalidade
industrial que identifica o êxito com o benefício económico; 4) Crescimento do mercado devido às
grandes concentrações urbanas e às necessidades de informação/formação das pessoas numa sociedade
competitiva; 5) Infraestrutura de capacidade crescente tanto no que diz respeito à distribuição do
produto (caminhos de ferro) como à recepção de notícias (telefones e telégrafos); e 6) Vontade dos
estados e do pensamento liberal triunfante em usar os meios de comunicação como educadores para a
democracia. Por volta de 1880, surge, nos EUA e na Europa, a segunda geração de imprensa popular,
sensacionalista, com o World, de Pulitzer, à cabeça (tirava 375 mil exemplares em 1892). Quais as
características do modelo de Pulitzer, seguido em maior ou menor grau por outros jornais americanos
e europeus? a) Preço de venda acessível; b) Linguagem simples, clara, sintética, breve e directa,
facilmente assimilável; uso de géneros jornalísticos activos, como a entrevista e a reportagem; c)
Sensacionalismo formal, com grandes títulos, grafismo inovador, uso de ilustrações, agressividade e
um certo grau de escândalo; d) Autopromoção constante; e) Tomada de posição em agências
noticiosas e outras empresas; f) Estabelecimento de um corpo de jornalistas competente e fundação da
primeira escola universitária de jornalismo do mundo, na Universidade de Columbia, em Nova Iorque;
g) Atenção ao mercado, ao ponto de haver conexões entre os interesses dos leitores e os do jornal; para
isso, promovia-se uma informação cuidada, que fosse útil e eficaz, uma ética social clara e populista, a
favor da liberdade, da ordem, do respeito e do trabalho e contra a corrupção, os abusos de poder, etc., e
recorria-se a um sensacionalismo de conteúdos, através de notícias de "interesse humano" e
campanhas sensacionalistas ("I make news!", isto é, "Eu provoco a notícia!") com que os leitores se
identificavam. Por volta de 1895, surge, no âmbito da imprensa popular, a imprensa amarela (ou
yellow journalism, jornalismo "amarelo"), cujo maior expoente terá sido Hearst. Este empresário
começa com o San Francisco Examiner e alarga, mais tarde, a sua actuação ao New York Journal. O
jornalismo amarelo partilha das mesmas características do jornalismo sensacionalista (baixo preço,
títulos grandes, ilustrações…), mas de forma radical, exagerada e, por vezes, extrema. Chegam a
inventar-se notícias, mesmo que fossem desmentidas no dia seguinte, trabalha-se com base no rumor,
provocam-se escândalos. Jesús Timoteo Álvares acusa mesmo Hearst de ser o principal instigador da
guerra hispano-americana de 1898 (pp. 65-67). Alguns resquícios de jornalismo "amarelo"
perduraram durante o século XX, especialmente na imprensa "cor-de-rosa" ou "do coração", embora
de forma menos exagerada do que no modelo de Hearst. Este fracassa por volta de 1901, mas na sua
linha evolutiva surgiram os tablóides sensacionalistas da actualidade.
É com a perspectivação da imprensa como indústria editorial que se começa a notar a objectivização
da linguagem, do discurso jornalístico, tendo em vista ganhos de audiência que aumentassem os
lucros.
Neste campo também é interessante atentar no livro de Paul H. Weaver (1996) — News and the
Culture of Lying: How Journalism Really Works.
Weaver, um antigo repórter e editor da revista Fortune, concentra-se, em parte, naquele que ele
considera ter sido o importante papel de Pulitzer para o desenvolvimento do que denomina como uma
"cultura da mentira" no jornalismo ocidental. Ele sustenta que, com Pulitzer, o jornalismo enveredou
por um caminho que conduziu a uma "cultura da mentira": passou a concentrar-se no imediato e não
no mediato e permanente, nas informações prestadas pelas entidades oficiais (interessadas) e nos
pseudo-aontecimentos e não nos verdadeiros acontecimentos, nas crises fabricadas para terem
projecção mediática e nos seus desenvolvimentos dramáticos (que não ocorreriam sem essa projecção)
e não nas problemáticas sociais. Acrescenta Weaver que os relações públicas e os jornalistas
realizaram um casamento simbiótico de conveniência, em que os segundos vivem em grande medida
das informações (extremamente necessárias para se fabricarem as notícias) prestadas pelos primeiros.
Só que os relações públicas subordinam as suas acções aos interesses das organizações, pelo que
raramente a informação que difundem é de real interesse público e se reporta à governação.
Com Pulitzer, salienta ainda Paul Weaver, a imprensa transformou-se com a adopção de técnicas como
a da pirâmide invertida, que enfatizaria certas "estórias" e perspectivas, com a adopção de formas
gráficas inovadoras, como os títulos curtos e muito carregados na primeira página, e com a ligeireza e
featurização com que temas por vezes importantes são tratados. Além disso, ao patrocinar a criação
da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia, Pulitzer teria promovido a separação dos
jornalistas do seu estatuto de cidadãos comuns. Os jornalistas teriam, assim, passado a ver-se como
profissionais ocupando um estatuto especial enquanto "auto-legitimados" representantes do público e
não como cidadãos normais que tomam parte de um sistema democrático. Consequentemente, como
profissionais "objectivos" e "desinteressados", teriam passado a identificar o seu dever com a
reportação do que as fontes oficiais emitem, sem procurar a "verdade". "When officials script and
enact events and simulate sentiments for the media's consumption, they meet the simple dictionary test
of misrepresentation. When journalists present these made-for-media impersonations as authentic
news, they meet it, too." (p. 4) (Tradução livre: "Quando entidades oficiais preparam eventos e
simulam sentimentos para o consumo mediático, elas fabricam uma informação desvirtuada,
desnaturada ou mesmo falsa. Quando os jornalistas apresentam estas simulações elaboradas para os
media como autênticas notícias, eles também embarcam na desvirtuação e desnaturalização da
informação.") Em função da auto-adopção de um estatuto de representantes do público, "auto-
legitimados", os jornalistas teriam negligenciado a análise (algo que a imprensa de qualidade, quanto a
nós, está a recuperar), em nome do profissionalismo "objectivo", e teriam adaptado formas de news
judgement que lhes auto-outorgariam a capacidade de definir o que é importante e significativo,
argumentando ao mesmo tempo que nada mais fariam do que reportar o mundo. Ironicamente, como
Weawer sublinha, o processo de selecção noticiosa e os critérios de noticiabilidade são parcialmente
subjectivos.
(83) Richard Lacayo e George Russell (1990), em Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, dizem que foi apenas por
ocasião da Grande Guerra.
(84) Klara Tony (S/D) — Histoire de la Photographie de 1900-1945. Surge uma citação deste autor em Margarita Ledo
Andión (1988), Foto-xoc e xornalismo de crise, 25.
(85) Familiaridade sobre os acontecimentos e sobre as figuras públicas não significa conhecimento. No mesmo sentido,
sobre o discurso jornalístico, apelidado de "jornalês", escreve E. Barbara Phillips (1976), em "What is
news? Novelty without change?". Journal of Communication, Vol. 26, 4. Ver também: Robert A.
Hackett (1984) — "Decline of a paradigme? Bias and objetivity in news media studies".
(88) Gisèle Freund vê unicamente como pais da fotografia documental Eugène Atget e Heinrich Zille — Vd. Gisèle
Freund (ed.: 1989) — Fotografia e Sociedade, 93 - 97. Inclusivamente, para ela, "Heinrich Zille é o
primeiro fotógrafo 'empenhado', para quem só conta aquilo que vê. Ele é o primeiro de uma linhagem
de fotojornalistas incorruptíveis, que o seguiram sem o conhecer a partir dos anos trinta. Para ele,
como para eles, a personalidade do fotógrafo deve desaparecer modestamente por detrás da máquina,
que não é outra coisa que o instrumento sensível graças ao qual uma situação ou uma personalidade
se revela." (p. 95) Quanto a nós excessivamente, parece-nos que Freund vê a principal característica
identificativa da fotografia documental na ideia de afastamento sujeito (fotógrafo) — objecto
(fotografado); para nós, porém, é fotografia documental a que se desenvolve essencialmente em
termos de projecto e que tem em vista, precisamente, documentar a realidade da forma como esta é
percepcionada pelo fotógrafo, ainda que acentuando pontos de vista, como no caso dos fotógrafos do
compromisso social. Aliás, parece-nos algo contraditório admitir um afastamento objectivante do
fotógrafo (Zille) face ao objecto e ao mesmo tempo classificá-lo de "empenhado".
(89) Salgado é citado por: Jorge Calado (1991) — "A última união".
(93) O movimento futurista preocupava-se com a velocidade, o movimento e a energia, procurando traduzir estes
elementos nas artes visuais. Assim, os seus temas, escolhidos na vida quotidiana, eram representados
em movimento. Na fotografia, tal podia obter-se recorrendo-se à exposição múltipla. A expressão do
dinamismo que os futuristas procuravam teve também outra localização: a cronofotografia de Marey,
que pretendia estudar o movimento dos seres vivos.
(94) Os expressionistas procuravam representar emoções e sentimentos através das artes visuais. O tema devia, dessa
forma, ser escolhido com base na sua adequação à expressão de determinada emoção ou sentimento e
os motivos surgiam muitas vezes deformados.
(96) O movimento construtivista, de concepções abstractas, centrado em Moscovo, visava promover sínteses das artes
plásticas (fotografia, pintura, escultura, arquitectura, etc.). A construção do plano fotográfico no
momento da visão era talvez a principal motivação do fotógrafo construtivista, que usava
frequentemente o picado e o contra-picado para favorecer a abstracção (Germaine Krull (1897-1985)
foi uma das mais exímias utilizadoras desta técnica). Entre outros artistas, um dos expoentes do
construtivismo, o russso Alexander Rodtschenko (1891-1956), usou fotomontagens para ilustrar
poemas de Maiakovsky, em 1923. Rodtschenko pertencia, porém, à tendência produtivista no seio do
movimento, que preconizava o privilégio da técnica sobre a arte, sob o alibi da eficácia produtiva.
(97) O dadaísmo foi um movimento artístico negativo saído das cinzas da Primeira Guerra Mundial. Alguns artistas
rejeitaram a arte no seio da cultura dominante, pois, segundo eles, só homens impregnados desta
cultura eram capazes de provocar catástrofes como o conflito de 1914-1918. Como pretendiam
ridicularizar a arte "erudita", jogavam, por exemplo, com o papel do acaso, atirando, por exemplo,
pedaços de cartão para uma tela (pintura) ou para um papel que fotografavam (fotografia). Um
dadaísta pintou uma cópia da Mona Lisa com bigode, talvez o exemplo mais acabado do que
pretendiam os dadaístas.
(98) A importância dos movimentos artísticos para a renovação na fotografia é abordada por Margarita Ledo Andión
(1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 20.
Quanto ao movimento Bauhaus, o seu nome advém do da escola estatal de arquitectura em Weimar
(Alemanha), mais tarde transferida para um edifício construído de raíz em Dessau, no qual se
procuraram aplicar os princípios do movimento. Este edifício foi fechado pelos nazis, em 1933. Na
Bauhaus, acreditava-se que o design e a função eram inseparáveis. A orientação geral do movimento
dirigia-se em prol do racionalismo, da comunidade, contra o individualismo ou mesmo o romantismo.
Em grande parte por isso, as diversas artes plásticas eram tratadas subordinando-se à arquitectura.
Kandinski, Gropius e Moholy-Nagy (que fundou a New Bauhaus, em Chicago) são alguns dos
expoentes do movimento. Este último foi até o introdutor da fotografia no movimento, utilizando,
fotogramas (que, sem intervenção óptica, possuiam um rigor técnico que os distinguia do carácter
lúdico que Man Ray dá à mesma técnica), fotomontagens, ampliações, exposições múltiplas, planos
picados, etc.
É preciso também referir que não foram apenas os movimentos referidos por Margarita Ledo Andión a
influenciar as mutações que se dão na fotografia a partir do início do século XX. A partir da segunda
metade do século XIX, os impressionistas (que procuravam sobretudo captar as impressões de luz e
cor) exerceram alguma influência sobre a fotografia, tendo alguns deles usado as fotos como
"apontamentos". Degas, que desenhou um dos cavalos fotografados a trote por Muybridge (um dos
principais expoentes da conquista da travagem do movimento, que orquestrou, com uma bateria de
câmaras fotográficas, antepassadas do photo finish, um autêntico super-olho humano, a prótese capaz
de captar o que olho humano não capta), Gauguin, Cèzanne e Toulouse-Lautrec são alguns dos nomes
que se podem citar. Já no início do século XX, os neo-impressionistas usaram também a fotografia
como "apontamento", como o fazem muitos outros artistas plásticos hoje em dia.
O impressionismo irá influenciar a obra de fotógrafos como o inglês Cecil Beaton (que fotografou em
Portugal, nos anos Quarenta, provocando alguma incompreensão) e, segundo o que Luis Gutiérrez
Espada (1980) escreve em Historia de los medios audiovisuales (desde 1926). Cine y Fotografia, 55,
o movimento evoluirá, posteriormente, para o glamour, para o culto da beleza humana. No mesmo
livro, o autor identifica algumas técnicas de expressão impressionistas em fotografia: desfoque,
movimento da máquina, cobertura da objectiva com vaselina.
(106) Repare-se em algumas movimentações na Alemanha ou em língua alemã durante a República de Weimar: em
1919, o arquitecto Walter Gropius funda a Bauhaus; em 1921, Einstein recebe o prémio Nobel; em
1924, ano em que morre Kafka, Thomas Mann publica A Montanha Mágica; a psicanálise de Freud e
dos seus discípulos faz furor; na música, destacam-se Alban Berg, Paul Hindemith e os maestros
Wilhelm Furtwangler e Bruno Walter; na pintura dominam Kandinsky e Franz Marc, entre outros; no
teatro, temos Brecht e no cinema Fritz Lang.
(107) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p.
(108) Teresa Siza e Paulo Alexandrino (1991) — Apontamentos de Fotojornalismo (original dactilografado não
publicado), s.p.
(121) Se em alguns jornais portugueses se pratica ou aproveita essencialmente a fotografia rotineira e burocratizada, esse
não é, por exemplo, o caso do Público. Um grito revoltado do fotojornalista João Paulo Pimenta,
desse jornal, é indiciático: fotografando uma actividade em que o autor esteve envolvido ("Observar
Aves em Serralves"), na Fundação de Serralves, no Porto, em Setembro de 1995, e a um comentário
provocador deste — "Então, conseguiste os 'bonecos' que querias?" — Paulo Pimenta reagiu, cáustico
e muito sério: "Bonecos não, fotografias!".
(122) Expressão empregue por Margarita Ledo Andión (1995) — Documentalismo fotográfico contemporáneo. Da
inocencia á lucidez, 31.
(123) Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 29.
(124) Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 29-30.
(125) Henri Cartier-Bresson (1984, Abril-Maio) — "L'imaginaire d'aprés nature". In Catálogo Expo Primavera
Fotográfica a Catalunya, citado por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de
crise, 31.
(126) Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 32-33.
(127) C. Brothers (1992) — "The antropology of civilian life: French and British press photography of civilian life in the
Spanish Civil War".
(128) Recorremos, aqui, à semiótica peirceana. Por ícone entendemos os signos cujo significante e significado possuem
uma relação de semelhança; por símbolo entendemos os signos cuja relação entre significante e
significado é artificialmente imposta, convencionada, e assim aprendida. Para o caso, é interessante
notar que passa despercebida a fotografia como índice, ou indício, característica que a fotografia
apresenta antes de outras. Como diz Philippe Dubois a propósito desta sistematização: "1) A primeira
destas posições vê na fotografia uma reprodução mimética do real. Verosimilitude: as noções de
similiaridade e de realidade, de verdade e de autenticidade, compreendem-se e sobrepõem-se
exactamente segundo esta perspectiva: a fotografia é concebida como um espelho do mundo, é um
ícone.
2) A segunda atitude consiste em denunciar esta faculdade da imagem em fazer-se cópia exacta do
real. Toda a imagem é analisada como uma interpretação-transformação do real, como uma
formalização arbitrária, cultural, ideológica e perceptualmente codificada. Segundo esta concepção,
a imagem não pode representar o real empírico (cuja existência é, de resto, ela própria posta em
causa pelo pressuposto que sustém semelhante concepção: não haveria realidade fora dos discursos
que a falam), mas apenas uma espécie de realidade interna, transcendente. A fotografia é, aqui, um
conjunto de códigos, um símbolo.
3) (...) A terceira maneira de abordar a questão do realismo em fotografia assinala um certo retorno
ao referente, mas sem a obsessão do ilusionismo mimético. Esta referencialização da fotografia
inscreve o medium no campo de uma irredutível pragmática: a imagem fotográfica torna-se
inseparável da sua experiência referencial, do acto que a funda. A fotografia é primeiramente índice.
Somente depois pode tornar-se semelhante (ícone) e adquirir sentido (símbolo)." [Philippe Dubois
(1992) — O Acto Fotográfico, 47.]
(129) Cartier-Bresson é citado por Robert Delpire, Michel Frizot et al. (1989) — Histoire de Voir. vol. 3, 9. (Tradução
livre: "A fotografia é, num mesmo instante, o reconhecimento simultâneo da significação de um facto
e da organização rigorosa das formas visualmente percebidas e que exprimem e significam esse
facto.")
(130) Margarita Ledo Andión (1995) — Documentalismo fotográfico contemporáneo. Da inocencia á lucidez, 51.
(131) Margarita Ledo Andión (1995) — Documentalismo fotográfico contemporáneo. Da inocencia á lucidez, 51.
(133) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 80. (Tradução
livre: "Durante os anos vinte, a fotografia começou a emergir como um modo mais directo de
descrição do que as narrativas verbais, e a introdução dos filmes despertou um interesse crescente na
cultura visual.")
(134) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 80.
(135) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940".
(136) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940".
(137) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence".
(138) Subscrevemos Barbie Zelizer (1995), que no artigo "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of
resistence" (p. 79) escreve: "The notion of the interpretive community offers a useful filter throught
which to consider the relationship between technology and journalism (…)". (Tradução livre: "A
noção de comunidade interpretativa oferece uma noção de filtro através da qual se pode analisar a
relação entre as tecnologias e o jornalismo.") Partindo do princípio de que existem mecanismos de
acção colectiva (socio-cultural) que por vezes se sobrepõem à acção individual, o conceito de
comunidade interpretativa aplica-se à dinâmica de grupos. Diariamente, as pessoas de um grupo
interpretariam o mundo recorrendo a instrumentos partilhados de compreensão desse mesmo mundo.
Fish (1980), Radway (1984) e Lindlof (1987) são alguns dos académicos que aplicam o conceito,
sobretudo para explicar o comportamento de audiências face a estímulos mediados. Zelizer (1992,
1993 e 1995), porém, dando, entre outros, o exemplo do caso Watergate, aplicou a noção de
comunidade interpretativa aos jornalistas — "(…) journalists are seen as constituing a community that
is united throught its collective interpretations of the events of public life. Journalists can be found to
use informal discourse to adress, challenge, and negotiate what they do as reporters, thereby setting
new standards of practice for other members of the profession. For journalists (…) the salience of
their shared boundaries for collectively interpreting public events has helped shield them from public
scrutinity (...) journalists have demonstrated that they interpret key events in their professional lives in
shared ways." (Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of
resistence", 79 — Tradução livre: "(…) os jornalistas são vistos como constituindo uma comunidade
que é unida através das suas interpretações colectivas dos eventos públicos. Os jornalistas podem ser
encontrados usando discursos informais para endereçar, mudar e negociar o que fazem como
repórteres, assim procurando novos padrões para a prática profissional. Para os jornalistas, o realce
que é dado à sua esfera profissional compartilhada na interpretação colectiva dos eventos públicos
ajudou-os a protegerem-se do escrutínio público (…). [Os jornalistas demonstraram] que
interpretam os eventos chave das suas vidas profissionais de forma compartilhada.") Extrapolando,
julgamos poder afirmar que que os (foto)jornalistas geram, por vezes, interpretações colectivas e
sentidos determinados para a introdução das novas tecnologias na sua vida profissional. Falta explicar
como funcionam e que significação geram as interpretações profissionais sobre a introdução das novas
tecnologias, as suas ameaças e as suas potencialidades, as dificuldades de aprendizagem e as
necessidades de formação, sobretudo no que respeita aos problemas de definição do universo da
actividade. A principal ameaça directa aos contornos profissionais poderá ser uma hipotética futura
fusão de funções entre fotógrafos e repórteres de imagem-vídeo, já algo presente nas still video
cameras.
(139) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 90.
(140) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 83 - 88.
(141) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 81.
(142) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 78 - 79. (Tradução
livre: "Os jornalistas [redactores] dessa época estavam tão interessados em delimitar o seu território
face à intrusão dos fotógrafos que apenas parcialmente levavam em linha de conta o que envolvia a
configuração da adaptação tecnológica à fotografia. Eu julgo que o jornalismo falhou o desafio de se
adaptar à fotografia por não perceber completamente o seu lugar apropriado na profissão. Esse
desafio foi delineado numa altura em que a telefoto tornou possível transmitir imagens tão
rapidamente como as palavras, mas as repercussões dessa omissão continuam a permear os modos
contemporâneos de encarar as mais recentes tecnologias de imagem aplicadas às notícias.")
(143) Karin E. Becker (1989) — "Photojournalism". In Erik Barnouw (Ed.) — International Encyclopedia of
Communications, vol. 3, 288.
(144) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 89. (Tradução
livre: "No caso da telefoto, as estratégias interpretativas dos jornalistas [redactores] pouco
contribuiram para o reconhecimento do fotojornalismo como um interface entre fotografia e
jornalismo: o discurso de resistência dos jornalistas prejudicou uma compreensão completa da
fotografia e dos seus praticantes."]
(147) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940", 34. (Tradução livre: "O moderno fotojornalismo, que nasceu pela década
de trinta, afastou-se da decoração. O crescimento dos tablóides e das câmaras de pequeno formato
redefiniram as fotografias como conteúdo. (…) À medida que os fotógrafos ganhavam autoridade, o
espaço reservado na imprensa às fotografias foi aumentando de tamanho, mostrando acção e
detalhe.")
(148) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 80. A este respeito,
consultar também: K.G. Barnhurst (1994) — Seeing the Newspaper; e J. Szarkowski (1973) — From
the Printed Page.
(149) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and Cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940", 34. (Tradução livre: "De uma forma geral, a escala das fotografias
aumentou no período. Apesar de fotos maiores começarem a aparecer nos anos Vinte, o contraste
entre pequenas e grandes fotos aumentou no período. No início as fotografias eram sobretudo planos
gerais e médios. Mas os grandes planos tornaram-se mais frequentes a partir dos finais dos anos
vinte e os planos gerais declinaram a partir de 1936. Estas ocorrências eram consonantes com a
emergência do fotojornalismo moderno, que valoriza os eventos e o detalhe emotivo.")
(150) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and Cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940", 34. (Tradução livre: "(…) algumas fotos de significância histórica".)
(151) Os acontecimentos adquiririam tal estatuto por serem inesperados e se destacarem da superfície da imensidade de
factos que fazem o mundo. Adriano Duarte Rodrigues (1988) escreve mesmo em "O acontecimento"
que o registo de notabilidade que providencia a transformação do facto em acontecimento se manifesta
prioritariamente no excesso (um massacre será notícia pelo excesso), na falha (o avião que cai devido
a uma falha mecânica) e pela inversão da normalidade (o homem que morde o cão). A imprensa
reporta-se, porém, frequentemente, a "acontecimentos previsíveis", que pela sua própria natureza não
podem comparar-se aos verdadeiros acontecimentos, sendo, como diz Boorstin, pseudo-
acontecimentos. Daí, como é notório, na designação pseudo-fotografias-jornalísticas adaptámos a
terminologia que Daniel Boorstin (1971) usa em "From news-gathering to news-making: A flood of
pseudo-events", in W. Schramm e D.F. Roberts (Eds.) — The process and effects of mass
communication. No artigo, o autor refere-se aos pseudo-acontecimentos, "acontecimentos" previstos,
suscitados ou provocados, por exemplo, por jornalistas com o fito de alimentar uma "estória"
encerrada, ou por políticos ou relações públicas, essencialmente com o objectivo de os pseudo-
acontecimentos serem objecto de discurso jornalístico, como acontece com as conferências de
imprensa. Ao artigo de Elihu Katz (1980) — "Media events: The Sense of Occasion", fomos buscar a
noção de acontecimento mediático para conceptualizar as fotografias mediáticas. Os acontecimentos
mediáticos são um tipo de "acontecimento" diferenciável do pseudo-acontecimento. Para Katz, os
media event seriam acontecimentos igualmente provocados para serem objecto de cobertura
jornalística, mas que não ocorreriam sem a presença dos news media. O autor categoriza os
acontecimentos mediáticos em missão heróica, ocasião de Estado e disputa.
Ao artigo de Harvey Molotch e Marilyn Lester (1974) — "News as purposive behavior: On the
strategic use of routine events, accidents and scandals", fomos buscar o termo promotores de notícias
(news promoters), pessoas que, nas suas interações (não determinísticas, mas conformativas) com os
jornalistas, tentam fazer passar determinados frames (enquadramentos contextuais) e, portanto, levar a
que as notícias adquiram determinados sentidos. Os news promoters seriam, assim, os indivíduos que,
para terceiros, identificam uma ocorrência como notória, por algum motivo. No campo dos cultural
studies, encontramos uma designação semelhante a news promoters. Trata-se do conceito de primary
definers, explorado por Stuart Hall et al. (1973), no artigo "The social production of news: Mugging in
the media", in Stanley Cohen e Jock Young (Eds.) — The Manufacture of News. Hall et al. diferem,
porém, de Molotch e Lester, ao apontar como crucial e determinística a relação estrutural entre os
primary definers e os media, razão pela qual preferimos a designação promotores de notícias.
(152) John Nerone e Kevin Barnhurst (1995) — "Visual mapping and cultural authority: Design changes in U.S.
newspapers, 1920 - 1940".
(154) Empregamos aqui a expressão no sentido que lhe é dado por Margarita Ledo Andión (1993), no livro O diario
postelevisivo. Na obra, a ex-decana da Faculdade de Ciências da Informação da Universidade de
Santiago de Compostela caracteriza a imprensa "pós-televisiva", reportando-se ao seu grande
expoente, o utilitário e altamente ideológico USA Today (basta ver o ênfase da palavra "Money" a
denominar a secção de economia), embora também se reporte às mutações na imprensa galega: "(…) a
prensa diaria galega segue a se publicitar a si mesma a través de mitos, como o da independencia ou
a obxectividade, proprios dunha fase xa sobrepasada da cultura profesional, encubrindo o temor a
unha súa aberta definición verbo da opinión ou a entender que a información se constrúe dende
realidades complexas de acordo coas convencións xornalísticas; que o que se publica é evaluativo
coma calquera forma de Discurso. Por iso, cando pontualmente lle é necesaria, continúa a botar man
de técnicas disimuladas e confusas que non son acordes com papel que hoxe se reclama para a prensa
na Europa, e, sobremaneira, com modelos informativo-interpretativos que, no seu conxunto, se sitúan
os títulos galegos de xornal." (p. 12) Todavia, o livro desenvolve-se principalmente em torno da
influência da televisão, medium poderoso, sobre a imprensa. Esta estaria a consagrar soluções de
"lisibilidade" (p. 20), de "deseño global" (p. 9), que por vezes preteririam o fotojornalismo em função
do jornalismo gráfico e iconográfico [mas não da fotografia de protagonistas (p. 20), pois o vedetismo
é marca da cultura televisiva - "...nos resistimos a lle chamar por este mesmo nome [foto] á expansión
da imaxe fotográfica de persoas como centro do mundo dos Media" (p. 40)]. A autora salienta: "(…)
novas variables como deseño e infografismo, novos tratamentos tipográficos ou de estilo,
seccionalizados, prospectiva de audiencias, imaxe de marca para as cabeceiras de prensa, xa
constituíron un vocabulario permanente tanto para enfrontar proxectos de transformación e de
actualización da prensa coma para a concepción e creación de novos productos." (p. 11) A
influência da televisão, ao nível do conteúdo, levaria a imprensa, por outro lado, a abandonar o modelo
informativo-interpretativo. Jornais e revistas privilegiariam a "informação de serviços" (p. 14), o
"local" (p. 17) e a "vida", secundarizando a política (p. 26). Tal originou, por exemplo, que o The New
York Times, "diario de texto e de política, segundo o estereotipo que mellor vulgariza o modelo en
cuestión" (p. 13), titulasse em manchete a abertura da temporada da truta (p. 14). A apetência pelos
serviços seria também uma condicionante do desenvolvimento do jornalismo iconográfico e gráfico:
basta lembrar os gráficos da secção de economia, por exemplo. Não obstante, fazendo-se eco de Mike
Gordon, director de Desenho do Atlanta Journal-Constitution, Margarita Ledo Andión manifesta
preocupação "(…) polo sobexo de fragmentariedade que xa se instalou na producción de mensaxes"
(pp. 16 - 17) ao tentarem-se descomplexificar artigos complexos segmentando-os em artigos
independentes. "É (...) a primeira alerta para o síntoma de incomprensibilidade que adquiriron, xa,
os gráficos, en parte pola domesticación e insignificancia a que se veu abocando o seu uso na prática
informativa, cunha función sobre maneira de decoración." (p. 17) Para Margarita Ledo, "A foto, a
gran perdedora [da Guerra do Golfo], demonstra súa vixencia como necesidade (...). Os infográicos,
a imaxe dixital e virtual, esgotan unha historia demasiado curta e deixan entrever, como
contradicción, a súa dificultade de lectura cando teñen que funcionar sos. Eis o paradoxo nun xénero
que nace ó abeiro das tecnoloxiás punta para prensa e como instrumento de lectura rápida." (p. 36).
A autora acusa alguma imprensa de estar a desnaturalizar-se: ao submeter-se a uma política editorial
de imitação do ecrã, transforma-se num produto de marketing. Segundo Margarita Ledo, isto
representaria um risco para a democracia e, citando Caujolle, para a estrutura da nossa memória
histórica. (pp. 36-40) Sistematizando as suas asserções, a autora refere que "A estratexia neotelevisiva
neutraliza as posibilidades comunicativas da escrita, elemento diferencial en prensa, ó forza-lo xogo
rutinario e redundante de unidades de significación.· A imaxe (foto, ilustración, gráicos) estase a
manipular como recurso de sinalización, como insignificante ou como síntese de datos temporalmente
efémeros. · Os xéneros desactualízanse e desinfórmanse, organizándose a modo de crónica de
costumes. · O tempo de lectura remata no primeiro nivel de achegamento a un medio, substituíndo o
eslogan 'primeiro vese, logo lese' polo de 'ollar e guindar'. · O deseño exprésase como stiling e como
organizador de materiais e non como unha das compoñentes comunicacionais." (pp. 48 - 49) O que a
leva a interrogar-se: "Como recupera-lo estatus que lle tirou xa á foto o visual?". (p. 39) Neste
trabalho, a ex-decana da Faculdade de Ciências da Informação da Universidade de Santiago de
Compostela aborda ainda a crise no fotojornalismo. Este género jornalístico, que vive das imagens
fixas, estaria a ser derrotado num conflito com a televisão, que vive de imagens animadas. Durante a
Guerra do Golfo, o sistema de funcionamento em pools a que as chefias militares obrigaram os
jornalistas, estranhamente acomodados, acentuou essa visão:"O conflicto da foto é coa televisión e (...)
concluiremos que, sexa cal sexa o contido da información en imaxes, o privilexio - confirmado cos
acontecimentos do Golfo - teno a televisión". (p. 36)
(155) Luis Gutiérrez Espada (1989) — Historia de los medios audiovisuales (desde 1926). Cine y Fotografia, 80 e 89.
(156) Keim, citado por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 34.
(157) Paul Hightower (1980) — "A study of the messages in depression-era photos".
(158) Recorde-se que Herbert Gans (1979), em Deciding What's News, identificou o small tawn pastoralism, a nostalgia
pela pequena cidade de província, como um dos valores que eram caros à imprensa norte-americana de
expansão nacional (mais precisamente: ABC, CBS, Newsweek e Time).
(159) Robert Delpire, Michel Frizot et al. (1989) — Histoire de Voir. vol. 3, 56.
(160) Fundamo-nos, também aqui, nas pesquisas do Professor Doutor Ricardo Jorge Pinto, da Universidade Fernando
Pessoa. Ele segmenta a evolução do jornalismo após a Segunda Guerra Mundial em três fases: 1)
Primeira fase da Nova Ordem Internacional da Informação (NOII); 2) Segunda fase da NOII; e 3) Fim
da NOII/Período actual.
Assim, após a Segunda Guerra Mundial e até meados da década de Oitenta surge a Nova Ordem
Internacional da Informação. As suas raízes encontram-se no artigo 19 da Declaração Universal dos
Direitos do Homem (1948). Este artigo consagra os seguintes pressupostos:
Segundo o mesmo artigo, o direito humano à informação consiste na liberdade que cada pessoa tem de
"(…) investigar e receber informações e opiniões e de difundi-las, sem limitação de fronteiras, por
qualquer meio de expressão".
No mesmo sentido, vai o articulado no artigo 10 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das
Liberdades Fundamentais, proclamada pelo Conselho da Europa, em 1950: "Toda a pessoa tem direito
à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de receber ou comunicar informações
ou ideias sem que possa haver ingerência das autoridades públicas e sem consideração de
fronteiras…"
I) Estas ideias levam à primeira fase da NOII (1945 - 197…), caracterizada pelo fosso informativo
Norte-Sul, e com as seguintes características:
a) A lei do mercado configura-se como a principal reguladora dos circuitos informativos; estes são
essencialmente regulados pelos mecanismos de oferta e da procura; praticam-se as doutrinas do free
flow da informação;
b) Sem regulação estatal, as organizações noticiosas dos grandes países desenvolvidos do Hemisfério
Norte atingem a hegemonia, controlam os grandes circuitos informativos e gerem os fluxos de
informação; as grandes agências noticiosas "internacionais", que já existiam na altura, tornam-se
todas-poderosas: France Press, Reuter's, UPI, API e TASS;
II) A conjuntura desenvolvida na primeira fase da NOII leva a uma "revolta" dos países
desfavorecidos, logo no início da década de setenta. Entra-se na segunda e última fase da Nova
Ordem Internacional da Informação, que duraria até meados dos anos oitenta. A revolta tece-se em
dois vectores:
b) Movimento dos Países Não Alinhados, que, em 1973, em Argel, denunciou o "colonialismo
informativo", reconhecendo que os países membros pouco retribuiam as informações provindas dos
países favorecidos. Além disso, devido aos critérios de valor-notícia de proximidade geográfica, os
países mais favorecidos privilegiavam as suas próprias notícias. Em 1976, em Nova Deli, elabora-se
uma carta onde se prevêm duas soluções:
d) Os oligopólios ganham por vezes maior capacidade de intervenção que os Estados, adquirindo força
política e económica; diluem-se as fronteiras.
(161) Consultar, por exemplo, Gisèle Freund (ed.: 1989) — Fotografia e Sociedade.
(167) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 82. (Tradução
livre: "(…) os jornalistas [redactores] no princípio evitaram a adaptação (…) até que os
acontecimentos da Segunda Guerra Mundial os forçaram a reconsiderar a sua posição.")
(168) J. Price (1945, 23 de Junho) — "Cameramen launch national organization", Editor and Publisher, 36, é citado por
Barbie Zelier (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 82.
(Tradução livre: "(…) Os fotógrafos —antes chamados 'ilustradores de jornais ou 'repórteres de
imagem'— tornaram-se fotojornalistas.")
(169) J. Lewinski (1978) — The Camera at War, 136. (Tradução livre: "(…) um corpo experimentado e altamente
organizado de estatuto reconhecido.")
(170) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 82, cita H. L. Kany
(1947, Abril) — "Experts eye pictures: Photographer as reporter", The Quill, nº 8, 10. (Tradução livre:
"(…) um estatuto igual ao de qualquer repórter.")
(172) Leon Sigal escreveu: "(…) a semelhança das suas histórias assegura aos jornalistas que compreendem o que se
está a passar no mundo." [Leon Sigal é citado por Michael Schudson (1988) — "Por que é que as
notícias são como são?", 23. É uma hipótese a considerar que o mesmo se passe para as fotografias
inseridas nos jornais, em muitos casos idênticas ou similares. Além disso, a repetição de fotos
(sobretudo de agências) de jornais para jornais poderá dar aos editores a sensação de que, sob as
pressões tirânicas do tempo e do espaço, escolheram bem e não erraram, o que, entre outras coisas,
lhes permite subtrairem-se às críticas [aplicamos aqui uma ideia da socióloga norte-americana Gaye
Tuchman, no célebre artigo: Gaye Tuchman (1972) — "Objectivity as strategic ritual: An examination
of newsmen's notions of objectivity"].
(173) Joe Rosenthal (1946, 31 de Março) — "Rosenthal describes his technique on Iwo", 13.
(174) Vicki Goldberg (1992, 16 de Agosto) — "A deliberate, unflinching witness to history", H22. (Tradução livre:
"(…) a veracidade é tanto uma questão de mostrar às pessoas como a guerra pode parecer como de
reproduzir o que a ocasião coloca à frente da objectiva.")
(175) Susan D. Moeller (1989) — Shooting War: Photography and the American Experience of Combat.
(176) Roland Barthes é citado por Robert Delpire, Michel Frizot et al. (1989) — Histoire de Voir. vol. 3, 9. (Tradução
livre: "O revés da fotografia parece-me aqui flagrante: repetir a morte ou a nascença não faz
aprender, à letra, nada, [aqui, a fotografia] não faz mais do que eternizar os gestos do homem para
melhor os desmontar.")
(177) Christian Zimmer (1984) — Le retour de la fiction. Paris: Ed. du Cerf, é citado por Margarita Ledo Andión
(1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 37.
(178) Nos dias de hoje, o espaço aberto aos paparazzi pode associar-se ao modelo junkdog journalism (jornalismo vira-
latas). Como certos teóricos norte-americanos, de que são exemplo George Donohue, Phillip Tichenor
e Clarice Olien (1995), em "A guard dog perspective on the role of media", ou portugueses, como
Ricardo Jorge Pinto, julgamos ser válida, em certa medida, a percepção de vários modelos no sistema
jornalístico Ocidental pós-1939: 1) Lapdog journalism; 2) Watchdog journalism; 3) Guard-dog
journalism; e 4) Junkdog Journalism. Estes modelos não têm fronteiras temporais nítidas e, por vezes,
coexistem. Nos modelos lapdog e watchdog, a época em que se tornaram predominantes não coincide
nos diferentes países (estados como Portugal e Espanha, que hoje claramente se incluem num contexto
Ocidental de jornalismo, viram a sua imprensa ser sujeita à censura durante os anos de ditadura, pelo
que, enquanto nas democracias ocidentais o jornalismo enveredava pela lógica da vigia dos poderes,
por vezes mesmo por uma lógica de contrapoder, na Península esse modelo só veio a surgir e regular-
se após o período mais ou menos conturbado que marcou o fim das ditaduras ibéricas). Além disso, de
igual modo podem-se usar todas conceptualizações referidas para se descreverem comportamentos
actuais dos news media.
Este modelo correlaciona-se com os condicionalismos a que o jornalismo esteve sujeito na Segunda
Guerra Mundial e com a existência de mecanismos de censura e auto-censura. Durante o conflito,
havia uma disciplina jornalística muito rigorosa, de forma a evitar que os interesses das potências
envolvidas fossem colocados em causa. Depois da guerra, esse clima manteve-se e o jornalismo
tornou-se, em grande parte, numa máquina de sustentação das estruturas de poder. Esta forma de
actuação foi acentuada pela vigência de um modelo descritivo de jornalismo, que reduz a intervenção
do jornalista. Uma das marcas estilísticas deste tipo de jornalismo são as extensas citações directas
das fontes do poder que abundavam ao longo dos textos.
Neste paradigma, ainda dominante ao nível do "jornalismo sério", defende-se que o jornalismo deve
servir a sociedade civil, pelo que o seu papel é o de vigia e de controle dos poderes. Pretende-se,
mesmo, por vezes, que o jornalismo se integre numa lógica de contrapoder.
Neste modelo, alarga-se o leque das fontes de informação às fontes não institucionais e às fontes
alternativas, que anteriormente pouco eram usadas. Passam-se também a cultivar mais as fontes
intermédias nas instituições e não somente as estruturas de topo.
Em meados dos anos oitenta, inicia-se o processo de desregulamentação dos media e assiste-se, em
vários países da Europa Ocidental, ao alargamento do sector privado à televisão e à rádio (o que
ocorria, desde sempre, nos EUA). Com isto, aumenta o número de órgãos de comunicação social e a
concorrência, diminuindo a dependência estatal que asfixiava o jornalismo.
A propósito do modelo watchdog, é preciso salientar que o jornalismo ocidental pode estar a deixar de
tornar-se num paradigma de contrapoder para se tornar numa miscelânia de junkdog journalism e de
palco onde se confrontam todos os poderes. [Francisco Pinto Balsemão, intervindo num debate sobre
"Direitos da Pessoa e a Comunicação Social", a 16 de Abril de 1994. Sobre o mesmo tema escrevem
François de Virieu (1990), em La médiacracie, e Ricardo Jorge Pinto (1992), em A Revolução
Copernicana da Informação, 38-41].
As tentativas (frustradas?) de controle dos news media sobre os poderes chega a tal ponto que se
procura principalmente o "lixo", como os casos amorosos das figuras públicas ou a corrupção, de
maneira não só a revelar o mau funcionamento do poder mas também, e, porventura, principalmente, a
atrair a atenção do público e seduzir o mercado. Exagera-se e usam-se armas eticamente duvidosas
para se conseguir a informação desejada. É por isso que os paparazzi ainda hoje possuem campo de
manobra, talvez até mais campo de manobra, na esfera da fotografia de imprensa. Esse tipo de
jornalismo seria então um tipo "disparatado" de jornalismo.
A emergência do modelo junkdog coincide com aquele que consideramos ser o fim da Nova Ordem
Internacional da Informação, em meados dos anos Oitenta, devido ao processo de desregulação do
sector mediático e às novas tecnologias da comunicação. A abertura do leque das fontes, o recurso
sistemático a fontes não identificadas e a concorrência entre numerosos órgãos de comunicação social
empurraram para o sensacionalismo. Contudo, a par da tendência para a investigação sensacionalista,
começou a exigir-se ao "jornalismo sério" a investigação rigorosa e a análise fundamentada. Desta
forma, no "jornalismo sério" o papel do jornalista adquire maior relevância e talvez se possa falar num
aumento da liberdade de expressão, através de:
Estes factores podem vir a impulsionar novas fases na evolução do jornalismo. Mas a evolução poderá
revelar-se perigosa se se subverter a actividade. De facto, postulamos que a concorrência tornou-se
um critério de valor-notícia e, num clima de competição, nenhum órgão de comunicação social quer,
ou mesmo pode, ficar para trás na divulgação de uma "estória", ainda que seja mais um pedaço de
"lixo". A deontologia profissional está em crise e o funcionamento "em matilha" coloca um novo
problema: como todos querem ser diferentes apesar da tendencial homogeneidade de conteúdos, o
caminho só pode ser o da diferenciação no ângulo de abordagem dos temas, no ponto de vista e no
estilo. Daí até à ficção e à invenção pura, o caminho pode ser curto. (Durante a Guerra do Golfo, as
televisões mostraram imagens de aves atoladas em petróleo para ilustrar um "desastre ecológico"
ocorrido nessa região devido ao derramamento intencional de petróleo pelos iraquianos no Golfo
Pérsico. Todavia, as imagens eram de um desastre de um petroleiro na costa Norte francesa. A
imprensa, neste caso, seguiu a televisão, publicando essas imagens, obtidas através dos registos vídeo
e não da actividade fotojornalística. Podemos até colocar a questão: será que o fotojornalista do futuro
será na essência um técnico de vídeo? Isto é, será que a integração de funções motivada pela
necessidade de rentabilização dos recursos humanos devido à concorrência e à concentração horizontal
oligopólica não levará a que, no futuro, os fotojornalistas sejam simultaneamente repórteres de
imagem-vídeo e operem já não com as clássicas máquinas fotográficas mas sim com câmaras de
vídeo?)
Dentro dos diferentes géneros jornalísticos, o que provavelmente melhor exemplifica a actual
tendência do jornalismo é a entrevista.
Durante o modelo descritivo, que, conforme Michael Schudson (1988) escreve em "Por que é que as
notícias são como são?", regulou o jornalismo a partir dos anos vinte/trinta (EUA), sucedendo a um
modelo opinativo, a entrevista sempre foi um utensílio que permitia ao jornalista obter mais
informações. O núcleo da notícia eram os factos, as personagens eram um meio para chegar a eles.
Só interessava conhecê-las parcialmente. No actual paradigma de jornalismo, analítico-explicativo e
especializado, as personagens começaram a tornar-se num aspecto tão central como qualquer outro —
surge a construção simbólica de perfis humanizados que se opõem ao jornalismo declaratório do
modelo descritivo. A entrevista deixa muitas vezes de ser um meio (de obtenção de informações) para
se tornar num fim em si mesmo. Estamos, inclusivamente, convencidos de que este é um dos factores
que promove a proliferação das fotografias de retrato na imprensa de hoje, a par do processo de
estrelização decorrente das analogias que o jornal "pós-televisivo" tem com a televisão. Contudo, é
importante notar que grande parte dessas fotografias não podem ser entendidas como
"verdadeiramente" fotojornalísticas, já que funcionam essencialmente como ilustrações. São lisas,
aplanadas.
Assim, na actualidade, a entrevista assume ainda um outro papel: promover o entrevistador, que
frequentemente chega também a surgir nas fotografias, principalmente quando se trata de entrevistas a
figuras-públicas de grande destaque, como o Presidente da República. Nas conferências de imprensa,
o destaque que por vezes é dado nos registos fotográficos aos jornalistas também pode ser
exemplificativo desta tendência, excepto nas ocasiões em que se intenta guiar o processo de produção
de sentidos para significações determinadas.
A TV foi talvez o medium que mais influenciou a alteração do processo de entrevista, uma vez que
oferece caracterizações mais "perfeitas" das pessoas (imagem, voz, etc.).
A partir de meados dos anos oitenta, as inovações gráficas do "jornal pós-televisivo", permitidas pelas
novas tecnologias, contaminaram os jornais clássicos e romperam com as regras rígidas que
condicionavam anteriormente a apresentação do produto jornalístico; a enorme diversidade gráfica dos
jornais e revistas (que não corresponde, geralmente, a outra tanta heterogeneidade nos conteúdos)
relaciona-se, provavelmente, com as tentativas de conquistar um mercado altamente concorrencial
(mostrar dinamismo, culto da diferença, etc.).
Na rádio e na televisão também se dão profundas mudanças, a partir dos anos setenta/oitenta. Na
rádio, elas registam-se, por exemplo, na utilização de várias vozes, na proliferação das vozes
femininas e na utilização abundante de cenários sonoros. Na televisão, as mutações passam
parcialmente pela recorrência à infografia, pelo aumento do ritmo do som e da imagem, pela inovação
nos formatos e pela montagem fora dos cânones tradicionais.
Guard-dog Journalism
George Donohue, Phillip Tichenor e Clarice Olien (1995), em "A guard dog perspective on the role of
media", colocam ainda a metáfora do jornalismo guard dog, que sugere o jornalismo dependente de
alguns grupos cujo poder e influência é tal que conseguem criar os seus próprios sistemas de
segurança mediáticos. Os guard dog media existem sobretudo nas pequenas cidades americanas
dependentes da agricultura ou de uma grande empresa, apresentando-se, por vezes, quase como a
newsletter dessa empresa ou, então, como community media. O jornalismo guard dog faria a sua
aparição nesses media quando forças externas ameaçam o status quo local e a coesão do grupo.
Noutras alturas, o "cão-de-guarda" estaria adormecido. Exemplificando, se uma lei colocasse em
causa uma empresa poluidora que empregasse a grande maioria dos trabalhadores de uma localidade,
seria provável que a imprensa local reagisse contra a lei, argumentando, por exemplo, que os
investimentos em tecnologia não poluidora poderiam arruinar a empresa e colocar os trabalhadores no
desemprego, atraindo a miséria. Além das metáforas lapdog, watchdog, junkdog e guard dog, existem
autores que caracterizam o jornalismo como parte de uma oligarquia de poder (Stuart Hall et al.
(1973), em "The social production of news: Mugging in the media", ou Chomsky e Herman (1988),
em Manufacturing consent, são alguns exemplos que nos parecem relevantes).
No mesmo campo, Eduardo Prado Coelho (1995, 21 de Outubro), em "Elementos para a crítica da
razão jornalística", afirma que a comunicação social dos nossos dias criou a sua própria ideologia, a
"razão jornalística", cuja característica principal seria existir no espaço trans-ideológico da "opinião
pública". Imbuídos da "ideologia da razão jornalística", os jornalistas cultivariam uma atitude de
desconfiança face a quaisquer formas de poder. Esta desconfiança formular-se-ia numa espécie de
tese implícita, segundo a qual toda a posição é a dissimulação da defesa de interesses pessoais, pelo
que o jornalista deveria arrancar a "verdade escondida" às aparências. Para essa missão ser bem
sucedida, o jornalista vê-se como acima de qualquer crítica, que é entendida como decorrente da
molestação de interesses e de intuitos censórios e limitadora da liberdade de imprensa. Muito críticos
relativamente à "ideologia do sucesso", os jornalistas viveriam na "obsessão" de construirem ídolos e
de os destruirem. Aqui se alimentaria o seu "imaginário romanesco". (Não nos parecendo que Prado
Coelho seja aqui original, o seu texto não deixa de vir ao encontro das qustões que se levantam num
modelo de junkdog journalism. A sua reflexão é útil enquanto exercício de reformulação e reforço de
conceptualizações conhecidas no campo das ciências e epistemologia da comunicação social.)
(179) Expressão usada por Ricardo Jorge Pinto (1992) — A Revolução Copernicana da Informação (monografia de
licenciatura não publicada).
(182) Margarita Ledo Andión (1995) — Documentalismo fotográfico contemporáneo. Da inocencia á lucidez, 23.
(183) É preciso ter aqui em atenção que análises sistemáticas da cobertura televisiva americana da Guerra do Vietname
revelaram que a percepção popular de que a Guerra do Vietname foi observada com recurso à TV
como se o conflito se desenrolasse à porta de casa, com constante exposição pública ao sangue, é
largamente um mito. Ver, por exemplo: Daniel Hallin (1986) — The "Uncensored War": The Media
and Vietname.
O uso da Foto-Xoc, cada vegada máis apresurado e enfático, vai tomando corpo en conxunión con
outros elementos que caracterizan o fenómeno comunicación-información na actualidade. No
funcional poderáse vencellar á Foto-Xoc coa eficacia do terror informativo —deica efectos psico-
sociais de parálise ou de fuxida—; con tendencias inequívocas prá xendarmización das sociedades;
con modelos culturais que queren un receptor pasivo a nutrirse, cíclicamente, co maniqueísmo
necrófilo das tensións que determina o binomio culpa-purificación." (p. 9)
(186) Michel Guerrin (1988) — Profession photoreporter. Vingt ans d'images d'actualité, 13.
(187) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 130.
(188) Michel Guerrin (1988) — Profession photoreporter. Vingt ans d'images d'actualité, 117.
(189) Michel Guerrin (1988) — Profession photoreporter. Vingt ans d'images d'actualité, 12.
(190) Michel Guerrin (1988) — Profession photoreporter. Vingt ans d'images d'actualité, 35.
(191) Michel Guerrin (1988) — Profession photoreporter. Vingt ans d'images d'actualité, 12.
(192) Borgé e Viasnoff, citados por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 43.
(193) Expressões usadas por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 75.
(194) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 130.
(195) Paul Virilio (1994) — The Vision Machine.
(196) Serge Le Peron é citado por Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 47.
(197) Margarita Ledo Andión (1988) — Foto-xoc e xornalismo de crise, 98.
(198) Richard Lacayo e George Russell (1990) — Eyewitness. 150 Years of Photojournalism, 165. (Tradução livre:
"Agora que todos os tipos de sofrimento foram apresentados à câmara, que os registou de todos os
ângulos [?!], as fotografias da miséria apenas parecem recordar-nos fotografias de miséria. Tornou-
se difícil determinar se o sentido moral é aguçado ou endurecido pela exposição à calamidade.")
(232) D. M. Lindekugel (1994) — Shooters: TV News Photographers and Their Work. "Ter olho" para a informação
visual não deixa, porém, de ser uma expressão dotada de uma certa ingenuidade. Apesar da
capacidade individual que possamos reconhecer em cada fotojornalista, no acto fotográfico confluem
também variáveis sociais e culturais. Todo o fotojornalista transporta consigo a sua cultura, a sua
história, o seu meio social.
No primeiro período do parágrafo, usámos a forma ortográfica "profissionais" entre aspas porque,
segundo Najjar, ainda não existe uma conceptualização adequada da ENG photography como
profissão autónoma. No dizer de Orayb Najjar, a actividade não cumpre todos os critérios que os
sociólogos identificam como pré-requisitos para um estatuto profissional. [Orayb Najjar (1995) —
Resenha crítica ao livro de D. M. Lindekugel (1994) — Shooters: TV News Photographers and Their
Work. Journalism Quarterly, vol. 72, nº 2, 483.]
(233) "Gamma, Histoire d'une agence en crise", 17.
(234) A desregulamentação dos media levou ao aparecimento, na Europa, de uma série de empresas privadas de
televisão, que, para competirem e gerarem lucros, tiveram de implementar tácticas de grande
agressividade comercial, baixando os preços da publicidade e desviando, consequentemente,
publicidade da rádio e da imprensa.
(235) Shiela Reaves (1995) — "The vulnerable image: categories of photos as predictor of digital manipulation", 706.
Shiela Reaves reporta-se à classificação de fotografias da National Press Photographers Association
(NPPA).
As spot news são definidas como fotografias não planeadas de acontecimentos (imprevistos); neste
caso, a intervenção dos fotojornalistas praticamente reduzir-se-ia a focar: a sua cultura e a sua
presença far-se-iam sentir em menor escala no acto fotográfico. Reaves afirma mesmo que a
qualidade técnica das spot news é frequentemente pouco importante quando são avaliadas em
concursos. O aspecto "bruto" da imagem até pode funcionar para o observador como a ideia de que o
fotógrafo não teve tempo para reflectir e compor. (p. 708) As spot news são, assim, associadas à
oportunidade (p. 709), no sentido de que são tiradas no momento exacto, antes que a situação se
desvaneça.
No meio dessas duas qualidades situam-se as feature photos, que a associação profissional dos
fotojornalistas dos EUA define como fotos de situações mais ou menos comuns, mas de forte interesse
humano. Neste sentido, são "intemporais" e a sua qualidade prende-se com a capacidade de introduzir
novidade, frescura e eficácia na abordagem do tema. A fotografia fotojornalística documental vive em
grande medida deste tipo de fotos. Segundo LaBelle, uma marca de todas as feature photos premiadas
é o cândido e espontâneo momento captado por um fotógrafo paciente e curioso. [Dave LaBelle
(1989) — The Great Picture Hunt: The Art and Ethics of Feature Picture Hunting.] Um exemplo de
feature photos é o das fotografias de pessoas em actividades exteriores. Por vezes, como revelam
Rom Mann e Paul Lester, as feature photos causam controvérsia, pois há fotógrafos que pedem aos
sujeitos das fotos para posar ou até que acrescentam adereços à composição, transformando uma
situação encontrada numa encenação. [Ron Mann (1985, Janeiro) — "Ethics in Photography: Avoid
Preconceived Ideas". ASNE Bulletin, 30-31; Paul Lester (Ed.) (1990) — The Ethics of
Photojournalism.] Assim, as feature photos possuem um carácter de espontaneidade que as distingue
do fotodocumentalismo, pois, quando se destrinça fotojornalismo de fotodocumentalismo, nota-se que
a diferença fundamental reside no método, uma vez que a intenção é a mesma: dar testemunho.
Nota-se, por aqui, que a categorização das fotografias é importante para o fotojornalistas, pois permite-
lhes processar rapidamente novos dados em função do seu conhecimento e experiência anteriores.
[Inferência a partir de: Edward E. Smith (1981) — Categories and Concepts.] Há até autores que
afirmam que, face às deadlines, a categorização é o ponto de partida para os jornalistas classificarem
rapidamente os eventos, fabricarem "estórias" e fazerem inferências. [S. Holly Stocking e Paget H.
Gross (1989) — How Do Journalists Think? A Proposal for the Study of Cognitive Bias in
Newsmaking.] Teoricamente, a semiótica pode ajudar a explicar por que é que os fotojornalistas e
editores de imagem categorizam as fotos. A fotografia seria, neste contexto, valorizada sobretudo pelo
seu carácter denotativo. Contudo, como já Barthes dizia, a fotografia possui um campo conotativo, em
grande medida historio-cultural, e, por isso, rico em simbolismos culturais. Barthes postulava que a
fotografia não é neutra nem passiva, antes possui uma grande riqueza em conotações expressivas e
simultâneas que podem gerar diferentes sentidos de uma só vez. [Roland Barthes (1984) — O Óbvio e
o Obtuso, 13-25.] A propósito, Hartley salienta que enquanto o nível denotativo dá uma aparência
"objectiva" à imagem fotográfica, as conotações, especialmente se forem subtis, dão-lhe poder no
campo da construção das convenções sociais, das ideologias e mesmo da construção da noção do que é
(do espaço) público. [John Hartley (1992) — The Politics of Pictures.] No mesmo sentido, John
Berger acrescenta que a fotografia é tão poderosa que pode não só transmitir ideologia política como
tornar-se uma arma que se pode usar, mas que também pode ser usada contra cada ser humano. [John
Berger (1980) — "Understanding a photograph", 294; John Berger (1980) — About Looking.] Com as
potencialidades da manipulação computacional de imagem, a fotografia torna-se numa arma ainda
mais perigosa.
Num estudo anterior, de 1993 ("What's wrong with this picture? Daily newspaper photo editors'
attitudes and their tolerance toward digital manipulation"), Shiela Reaves havia já concluído que os
511 editores fotográficos inquiridos eram largamente intolerantes em relação às alterações ou
manipulações computacionais das imagens que não fossem acentuar o brilho, o contraste e pouco
mais.
(236) John Long (1989, 6 de Outubro) — "Truth, trust meet new technology". In The Electronic Times (Publicação do
Encontro sobre Fotojornalismo Electrónico em Martha's Vineyard), cit. por William J. Mitchell (1992)
— The Reconfigured Eye. Visual Truth in the Post-Photographic Era, 16.
(237) Para nós, os fotojornalistas podem entender-se como uma subcomunidade interpretativa da comunidade
interpretativa dos jornalistas. Esta comunidade divide-se em subcomunidades, em função da (a) carga
social e da (b) carga cultural e ideológica que esses profissionais transportam. Mais precisamente, a
comunidade interpretativa, num plano geral, depende, de uma forma vasta, (a) da cultura profissional e
comunitária, bem como (b) da acção do meio social; as subcomunidades interpretativas estabelecem-se
essencialmente ao nível organizacional, dependendo (a) da cultura e da ideologia profissionais, mas
também das organizacionais, bem como (b) da acção conformadora do meio social, isto é, da
"redacção" (para o caso, do sector de fotografia) e da organização.
(238) Barbie Zelizer (1995) — "Journalism's 'last' stand: Wirephoto and the discourse of resistence", 88.
(240) Vicki Goldberg (1992, 16 de Agosto) — "A deliberate, unflinching witness to history", H22.
(258) Michael W. Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 106. Apoiamo-nos, aqui,
na teoria dos usos e gratificações, segundo a qual as pessoas usam a Comunicação Social para obter
gratificações ou satisfazer necessidades (libertação emocional, compensação, informação, etc.).
Assim, o consumo dos meios de Comunicação Social seria activo e não passivo; o público faria
escolhas, motivadas pelo que desejaria consumir. Conforme assinalou Denis McQuail, se o uso dos
meios de comunicação não fosse selectivo, então eles não poderiam ser potenciais instrumentos para a
resolução de problemas, e nós julgamos que eles têm essa capacidade. Consultar, por exemplo: Denis
McQuail (1991) — Introducción a la teoria de la comunicación de masas, 298-304; Denis McQuail e
Sven Windahl (1993) — Communication Models, 133-157; e José Rodrigues dos Santos (1992) — O
Que é Comunicação, 112-117. Já a tendência para a negatividade enquanto critério de valor-notícia
poderá ser explicada por estudos recentes na área da psiquiatria e neurobiologia. Atente-se, pois, nas
conclusões de António R. Damásio (1995), em O Erro de Descartes. Este cientista afirma que são o
sofrimento e a dor que nos dão maior protecção para a sobrevivência. A dor constituiria "(…) a
alavanca para o desenvolvimento apropriado dos impulsos e instintos, e para o desenvolvimento de
estratégias eficazes de tomada de decisão." (p. 268) Para ele, "(…) se a solução proposta para o
sofrimento individual ignorar as causas de conflito individual e social, é pouco provável que resulte
por muito tempo (…) é a informação associada à dor que nos desvia do perigo iminente (…). É
difícil imaginar que os indivíduos e as sociedades que se regem pela busca do prazer, tanto ou mais
do que pela fuga à dor, consigam sobreviver. Alguns dos desenvolvimentos sociais contemporâneos
em culturas cada vez mais hedonistas conferem plausibilidade a esta ideia". (p. 270) Portanto, o
desvio para a negatividade dos news media poderia corresponder a um instinto de sobrevivência.
Neste sentido escreve também o psicólogo de Harvard Daniel Goleman (1995), em Emotional
Intelligence: "Pensamos que a inteligência é a razão e acreditamos que agimos sempre com lógica,
mas é um erro. Aquilo que nos move é o afecto, a decisão vem do sentimento, mesmo quando estamos
convencidos do contrário" (Citado por Laurinda Alves (1996, 3 de Fevereiro) — "QE é que é", 25.)
(259) Michael W. Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 107.
(260) Evelyne J. Dyck e Gary Coldevin (1992) — "Using positive vs. negative photographs for Third World fund
rising", 577. Este estudo, porém, baseava-se numa amostra não representativa da generalidade da
população (canadiana).
(261) James S. Fosdick (1966) — "Picture Content and Source in Four Daily Newspapers".
(262) Malcolm Fleming e Howard Levie (1978) — Instructional Message Design: Principles from the Behavioural
Sciences, 249.
(263) Kuo-jen Tsang (1986) — "News photos in Time and Newsweek" Roy E. Blackwood, no artigo de 1987
"International news photos in U.S. and Canadian papers", em que analisou as fotografias publicadas
nos jornais New York Times, Toronto Star, Minneapolis Star and Tribune e Winnipeg Free Press,
chegou também à conclusão de que os jornais canadianos davam maior atenção aos acontecimentos de
carácter internacional ou estrangeiro do que os jornais americanos.
(265) Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 106.
(266) Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 106.
(267) Karen Slattery e Jim Fosdick (1979) — "Professionalism in Photojournalism: A Female-Male Comparision".
(268) Wilbur Schramm (1949) — "The nature of news". Schramm fala da recompensa imeditata quando se refere a
notícias de crime, corrupção, violência, acidentes, desastres, eventos sociais e interesse humano. Tal
pressuporia uma rápida gratificação do receptor mas um menor valor durável. A recompensa mediata
adviria das notícias sobre educação, actividades públicas, ciência, saúde, ambiente e problemas
sociais, que talvez não ofereçam uma gratificação rápida mas que podem possuir um valor manifesto
susceptível de dar reompensas ulteriores.
(269) Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 105.
(270) Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 105.
(271) Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 106-108.
(272) Ver Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 108.
(273) Michael Singletary e Chris Lamb (1984) — "News values in award-winning photos", 108.
(274) Stephen T. Plunkett (1975) — Sensationalism in Pulitzer Prize Winning Photographs: A Cluster Analysis.
(275) Jorge Pedro Sousa (1986) — "News values nas 'fotos do ano' do World Press Photo: 1956-1996".
(276) Michael Griffin e Jongsoo Lee (1996) — "Picturing the Gulf War: Constructing an image of war in Time,
Newsweek, and U.S. News & World Report".
(277) Podemos definir "estereótipo" como uma imagem mental estandardizada que representa uma opinião
simplificadora mais forte do que a razão. Por vezes, porém, os estereótipos ajudam-nos a
compreender o real (ou a pensar que o compreendemos).
(279) Carolyn Martindale (1986) — The White Press and Black America.
(280) Alice Sentman (1983) — "Black and white: Disparity in coverage by Life magazine from 1937 to 1972".
(281) Paul Lester e Ron Smith (1990) — "African-american photo coverage in Life, Newsweek and Time, 1937-1988".
(282) Paul Martin Lester (1994) — "African-american photo coverage in four U.S. newspapers, 1937-1990", 381.
(283) Paul Lester e Ron Smith (1990) — "African-american photo coverage in Life, Newsweek and Time, 1937-1988".
(284) Paul Lester e Ron Smith (1990) — "African-american photo coverage in Life, Newsweek and Time, 1937-1988".
(285) Paul Lester e Ron Smith (1990) — "African-american photo coverage in Life, Newsweek and Time, 1937-1988".
(286) Paul Martin Lester (1994) — "African-american photo coverage in four U.S. newspapers, 1937-1990", 380.
(287) Sobre os aspectos específicos da cobertura fotojornalística da Guerra do Golfo consultar Michael Griffin e
Jongsoo Lee (1996) — "Picturing the Gulf War: Constructing an image of war in Time, Newsweek,
and U.S. News & World Report". Sobre os debates epistemológicos em curso que se prendem com a
questão da confiança nos "registos" fotojornalísticos podem consultar-se os seguintes artigos: Dona
Schwartz (1992) — "To tell the truth: Codes of objectivity in photojournalism"; Kent Brecheen-
Kirkton (1991, Winter) — "Visual silences: How photojournalism covers reality with the facts"; e
Jisuk Woo (1994, Summer) — "Journalism objectivity in news magazine photography". A relevância
da literacidade visual para uma correcta leitura da imagem é visível em: Paul Messaris (1994) —
Visual Literacy: Image, Mind and Reality.
(288) Susan H. Miller (1975) — "The content of news photos: Women's and men's roles".
(289) Roy E. Blackwood (1983) — "The content of news photos: roles portrayed by men and women".
(290) D. K. Dodd et al. (1989) — "Face-ism and facial expressions of women in magazine photos". O termo "face-ism"
foi proposto por Archer, Kimes e Barrios para descrever a tendência para as fotografias e desenhos
enfatizarem os rostos dos homens e os corpos das mulheres como parte do processo de
reconhecimento [Dana Archer, Debra D. Kimes e Michael Barrios (1978) — "Face-ism".]
R. C. Adams, Gary A. Copeland, Marjorie J. Fish e Melissa Hughes (1980), em "The effect of framing
on selection of photographs of men and women", após mostrarem a 40 pessoas fotografias de
candidatos a cargos políticos, concluiram que os grandes planos dos homens e os planos médios das
mulheres a partir da linha do busto, da cintura ou ligeiramente acima dos joelhos ("plano americano")
eram preferidos pelo público. Os autores julgam que o fenómeno poderá estar relacionado com
propostas da psicologia contemporânea, segundo as quais os papéis sexuais seriam apreendidos a
partir das distinções arquetipais entre as pessoas. Os papéis sexuais seriam assim aprendidos
concomitantemente com a aprendizagem de percepções pessoais distintas em função do sexo, no seio
de uma determinada cultura.
McCain, Divers et al. observaram, por seu lado, uma interacção significativa entre o sexo e o plano da
fotografia, com os homens a serem percebidos como mais dinâmicos (uma das dimensões da
credibilidade) em grandes planos e planos médios, enquanto as mulheres eram percebidas como mais
dinâmicas (e, consequentemente, mais credíveis) em planos de conjunto ou planos gerais (planos de
corpo-inteiro). Os autores também concluiram que quanto mais esguio fosse um corpo mais favorável
seria a recepção. [Thomas A. McCain, Lawrence Divers et al. (1973) — "The effects of body type and
camera shots on interpersonal attraction and source credibility". ]
(291) D. K. Dodd et al. (1989) — "Face-ism and facial expressions of women in magazine photos".
(292) G. Daddario (1992) — "Swimming against the tide: Sports Illustrated's imagery of female athletes in a swimsuit
world". Women's Studies in Communication, vol. 15, nº 1, 49-64.
(293) Sharon Bramlett-Solomon e Vanessa Wilson (1989) — "Images of the eldery in Life and Ebony, 1978-1987".
(294) Sharon Bramlett-Solomon e Vanessa Wilson (1989) — "Images of the eldery in Life and Ebony, 1978-1987".
(295) Sharon Bramlett-Solomon e Vanessa Wilson (1989) — "Images of the eldery in Life and Ebony, 1978-1987".
(297) Sandra E. Moriarty e Gina M. Garramone (1986) — "A study of newsmagazine photographs of the 1984
presidential campaign".
(298) Sandra E. Moriarty e Gina M. Garramone (1986) — "A study of newsmagazine photographs of the 1984
presidential campaign", 734.
(299) Rodger Streitmatter (1988) — "The rise and triunph of the White House photo opportunity".
(300) Michael W. Singletary (1978) — "Newspaper photographs: A content analysis, 1936-76", 587. Ver também o
capítulo 2 sobre história do fotojornalismo para associação dos factos verificados à evolução da
actividade.
(301) Michael W. Singletary (1978) — "Newspaper photographs: A content analysis, 1936-76", 587-588.
(302) Michael W. Singletary (1978) — "Newspaper photographs: A content analysis, 1936-76", 587.
(303) Paul Martin Lester (1988) — "Front page mug shots: A content analisys of five U.S. newspapers in 1986".
(304) Philip C. Geraci (1984) — "Newspaper illustration and readership: Is USA Today on targuet?", 412.
(305) Paul Lester (1988) — "Use of visual elements on newspaper front pages".
(306) Keith Kenny e Stephen Lacy (1987) — "Economic forces behind newspapers' increasing of color and graphics".
(307) G. Norman van Tubergen e David Mashman (1974) — "Unflattering photos: How people respond".
(309) Wayne Wanta e Dawn Leggett (1989) — "Gender stereotypes in wire service sports photos".
(310) Laurence B. Lain e Philio J. Harwood (1992) — "Mug shots and reader attitudes toward people in the news".
(311) A. Banks (1994) — "Images trapped in two discourses: photo-journalism codes and the international news flow".
(312) A. Banks (1994) — "Images trapped in two discourses: photo-journalism codes and the international news flow".
(313) Robert C. Kochersberger Jr. (1988) — "Survey of suicide photos use by newspapers in three states".
(314) Robert L. Baker (1988) — "Portraits of a public suicide: Photo treatment by selected Pennsylvania dailies".
(315) Karen Slattery e Jim Fosdick (1979) — "Professionalism in photojournalism: A female/male comparison".
(316) Beverly Bethune [1986?] — "A profile of photojournalists on two metropolitan newspapers"; Beverly Bethune
(1984) — "A sociological profile of the daily newspaper photographer".
(317) Beverly Bethune (1984) — "A sociological profile of the daily newspaper photographer".
(318) Steve Pasternack e Don R. Martin (1985) — "Daily newspaper photojournalism in the Rocky Mountain West".
(319) Dan Schiller (1977) — "Realism, photography and journalistic objectivity in 19th century America".
(320) Karin E. Becker (1991) — "To control our image: photojournalists and new technology", 382.
(321) Reportamo-nos aqui à forma como Michael Schudson agrupa as teorias que procuram explicar por que é que as
notícias são como são, conforme se encontra expresso em: Michael Schudson (1988) — "Por que é
que as notícias são como são?".
(322) Esta afirmação é sustentada pelas pesquisas de um professor da Universidade Fernando Pessoa, Ricardo Jorge
Pinto. Para ele, de um paradigma descritivo de jornalismo estaria a passar-se para um modelo
analítico, por influência da televisão. Assim, se de 1945 aos finais dos anos oitenta se procurava
descrever o discurso jornalístico como tendencialmente neutro, objectivo, imparcial, etc, assente nos
géneros eminentemente informativos (notícia, reportagem, entrevista), a partir do início dos anos 90
transita-se para um modelo analítico, em que o jornalista assume a análise (mais do que a opinião). O
jornalista passa a preocupar-se com a explicação dos acontecimentos, e não unicamente com o seu
relato "factual". Rejeita-se a objectividade, classificada como meta ideal ou até perfeito absurdo, e
assume-se a honestidade como o valor fundamental do jornalismo. Além disso, as personagens,
incluindo o "homem-comum" (atente-se, por exemplo, na programação televisiva que valoriza a
realidade espectacular ou fomenta a espectacularização da realidade, como os reality shows), tornam-
se um aspecto central, quase tão central como a informação. Daí a revalorização da entrevista no
modelo analítico do jornalismo — ela deixa de ser um meio para tornar-se num fim em si mesma. No
mesmo sentido de Ricardo Pinto, sustentam John Nerone e Kevin Barnhurst (1995), no artigo "Visual
mapping and Cultural authority: Design changes in U.S. newspapers, 1920 - 1940", 40: "The modern
reporter —the professional journalist— is an identifiable expert and an author. The expert-author
explains the news, whereas the old reporter reported it. The virtue of the professional journalist is
expertise and discernment, finding the timeless moral of the historical significance of a rush of events;
whereas the virtue of the old reporter was in showing that rush, which seems urgent and compelling of
itself. One finds sense and historical drama where the other finds profusion and amazement. An
inexact measure of these differing journalisms is the use of bylines and signatures, design elements
(...). Bylines illustrate in microcosm the way that social control gets mapped in the physical form of
newspapers." (Tradução livre: "O repórter moderno —o jornalista profissional— é um especialista e
um autor. O especialista-autor explica as notícias, enquanto o antigo repórter as reportava. A
virtude do jornalista profissional revela-se no seu discernimento e nos seus conhecimentos de
especialista ao ser capaz de encontrar a moral eterna da significância histórica entre um enorme
afluxo de eventos, enquanto a virtude do velho repórter estava em mostrar esse fluxo de eventos, que
pareciam todos urgentes. Um encontra sentido e drama histórico onde o outro encontra profusão e
estupefacção. Uma medida inexacta destes diferentes jornalismos é o uso de assinaturas como
elemento de design. (…) As assinaturas ilustram num microcosmos a forma como o controle social é
cartografado nos jornais.")
(323) Porém, por exemplo ao nível da Agência Lusa, ao contrário do que ocorre em agências fotográficas como a
Magnum, não nos parece que os repórteres fotográficos defendam ou mesmo pretendam um controle
directo sobre a utilização das imagens que obtêm. Já a omissão do nome do fotógrafo pelos órgãos de
comunicação social que usam as imagens colide frontalmente com as perspectivas dos fotojornalistas
sobre o trabalho que efectuam. Aliás, é sempre de colocar a hipótese de o anonimato do fotógrafo
afectar negativamente o trabalho produzido, embora tal seja contrabalançado pelo profissionalismo
(ideológico). Ver: Jorge Pedro Sousa (1997) — Fotojornalismo Performativo — O Serviço de
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