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e Comunitária em
São Caetano do Sul
Aprendendo com os conflitos a
respeitar direitos e promover cidadania
AUTORES
Eduardo Rezende Melo
Juiz da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de São Caetano do Sul
Madza Ednir
Pedagoga, especialista em Mudanças Educacionais
REALIZAÇÃO PARCERIA
Lgo. de São Francisco de Paula 34, 4º and. EQSW 103/104, Bloco C, Lote 1, 2ºandar Esplanada dos Ministérios, Bloco T, Anexo 2
Rio de Janeiro - RJ - 20051-070 Setor Sudoeste - Brasília - DF - 70670-350 do Ministério da Justiça - 4o andar, Sala 420
Telefax: 55 (21) 2509-3812 Tel.: 55 61 3038-9252 Brasília - DF - 70064-900
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6 Introdução
31 2. Marcos Teóricos
31 2.1. Fundamentos norteadores
39 2.2. Justificação teórica dos fundamentos norteadores
56 2.3. Deslocamentos conceituais: responsabilidade; modo de resolução do
conflito e atores envolvidos
68 2.4. Novos espaços comunitários e institucionais de resolução de conflitos
116 Introdução
185 6. Conclusão
186 Bibliografia
Estes materiais Esta publicação, o DVD e o CD que a acompanham fazem parte dos materiais que trazem
foram elaborados a público os fundamentos e o modo de estruturação teórico-prática de justiça restaurativa
no âmbito do e comunitária – Projeto Justiça, Educação, Comunidade: parcerias para a cidadania, imple-
Projeto BRA/02/ mentado em São Caetano do Sul, São Paulo, desde julho de 2005. Passados três anos de sua
P51 – SEDH/PR- implementação na cidade, o Projeto já conseguiu gerar práticas e conhecimentos inovadores,
FNUAP, “Segurança
consolidando-os em uma proposta de tecnologia social que está sendo aplicada e recriada
nas Escolas: Uma
em outros municípios do Estado de São Paulo.
Questão de Direitos
Humanos”, numa
parceria com a Essa tecnologia baseia-se na colaboração entre os sistemas Judiciário e Educacional, com ar-
Secretaria Especial ticulação/enredamento de todas as organizações da cidade e envolvimento comunitário. Seu
dos Direitos objetivo: possibilitar a pessoas, comunidades e organizações a tornarem-se protagonistas e
Humanos – SEDH, co-responsáveis pela construção de uma cidade justa, segura e educativa, na qual os direitos
em convênio individuais e sociais dos cidadãos e cidadãs sejam atendidos – em especial, os de crianças,
com o Fundo de adolescentes e jovens das camadas mais pobres.
População das
Nações Unidas – Sua principal ferramenta: a Justiça Restaurativa, uma nova forma de se fazer justiça, onde
UNFPA. os envolvidos em conflitos destrutivos chegam de forma autônoma a acordos, reparando
os danos que diferentes formas de violência causam a indivíduos e grupos, restaurando o
tecido social esgarçado ou rompido pelas situações de desrespeito, prevenindo a violência
pelo tratamento de suas causas, com atendimento aos direitos sociais até então negados e
promovendo uma inserção comunitária mais justa, solidária e cidadã.
Por meio do conjunto de materiais do qual esta publicação faz parte, onde a tecnologia social
desenvolvida em São Caetano do Sul é apresentada, buscamos informar e oferecer instru-
mentos de motivação e mobilização às lideranças interessadas na introdução, fortalecimento
e consolidação de processos de Justiça Restaurativa nos municípios brasileiros.
A quem interessa esse clima de guerra Alguns países foram longe e bem rápido.
constante, já que, afinal, não se vê diminuir, A Nova Zelândia, por exemplo, desde 1989
mas apenas aumentar a ‘criminalidade’ e, adota a Justiça Restaurativa (nos tribunais
na escola, o desrespeito e as infrações dis- e também nas escolas, substituindo as
ciplinares? punições disciplinares), adaptada a partir
de modos de resolução de conflitos de sua
Por que, ao ver alguém como o absolutamente comunidade aborígene, os maoris, tornan-
outro, partimos desde logo para uma lógica do-a modo oficial e geral de resposta a atos
de afastá-lo ainda mais, sem antes tentar infracionais cometidos por adolescentes.
entender melhor o que está em jogo e tentar Lá, como aqui, havia grupos étnicos que
aprender com a diferença? E, se o conflito se eram mais encarcerados que os demais. Os
deu entre particulares, por que um terceiro, maoris, minoria populacional, socialmente
o juiz, tem de necessariamente intervir? Por discriminada e privada de acesso eqüitativo
que, quando intervém, o juiz o faz de um a direitos, eram ‘outros’ em relação a um
modo para certos tipos de conflito, como os certo grupo dominante. Foi justamente
civis, familiares, e de outro, tão radicalmente visando criar modelos mais democráticos
diferente, para condutas que não neces- e justos, que se buscou superar um modelo
sariamente são tão distintas, mas que são tradicional de julgamento, à la inglesa, para
definidas como criminosas? Até que ponto implementar um modelo participativo,
as pessoas que foram afetadas por condutas atento às diversidades culturais e sociais e
desviantes estão satisfeitas com a resposta não excludente.
sionais no espaço escolar e capacitar lideran- meio de três etapas: compreensão mútua 6 O Cantano, Melo, Barter
ças educacionais para facilitar a realização de – as partes passam a se perceber como & Ednir, CECIP, 2005.
círculos restaurativos nas unidades. semelhantes; luto e transformação – as
escolhas e responsabilidades envolvidas
Três escolas voluntárias, que passaram a no ato da transgressão são reconhecidas;
ser chamadas de “pioneiras”, aderiram de acordo – participantes desenvolvem ações
primeira hora à proposta restaurativa (Ver que reparem, restaurem e reintegrem”.6
Por meio da abordagem de Facilitação de Dentre os atores que compõem este sistema,
Mudanças Educacionais desenvolvida pelas estão: os diretores de escolas, representantes
ONGs CECIP – Centro de Criação de Imagem do Fórum, do Conselho Tutelar, da Educação,
Popular, Brasil e APS International, Holan- da Assistência Social, da Saúde e da Seguran-
7 Visite: da7 , esses profissionais foram convidados a ça (Polícia Civil e Militar, e Guarda Civil). Em
www.cecip.org.br reuniões periódicas para reflexão coletiva
www.apsinternational.nl
repensar suas concepções a respeito do con-
flito e da violência na escola, e a desenvolver sobre o objetivo da rede, sobre a redefinição
ou aprimorar competências e habilidades de papel de cada agente, incorporou-se a
39 37 34
59 71 130
Constrangimento 2 Estupro –
Rixa –
Racismo –
Porte de
–
entorpecentes Preconceito –
Tráfico de
– Discriminação –
entorpecentes
Ameaça 24
Agressão física 53
Ofensa 46
Bullying 13
Perturbação de sossego 3
Danos patrimoniais –
Constrangimento 25
Rixa 1
Porte de entorpecentes –
Tráfico de entorpecentes –
Desentendimento 38
Furto 4
Roubo –
Importunação sexual –
Estupro –
Racismo –
Preconceito –
Discriminação –
Embriaguez –
Outros 1
61 41 36
Promotor
Lélio Ferraz de
Juiz Eduardo Rezende Melo. Mediadora Vania Curi Yazbek. Siqueira Neto.
Equipe de Mediadoras
Transformativas e
Facilitadoras de Práticas
Restaurativas.
Da esquerda p/ direita:
Arlete C. Abraão, uma das
Facilitadoras Restaurativas que
opera círculos no Fórum;
Dominic Barter e Monica Mumme;
Maria Inês Salgado.
Da esquerda p/ direita:
Profa. Elisa Amélia
de Godoy Bezulle;
Fátima Montenegro;
Julia Praeiro Theodoro
e Cida Demambro,
supervisora de ensino:
exemplos de Lideranças
Educacionais que
são imprescindíveis
para a disseminação
do projeto nas
comunidades escolares.
Até aqui, oferecemos uma visão geral do Projeto de pelas punições previstas no Sistema Disciplinar e
Justiça Restaurativa em São Caetano do Sul: suas Regimentos Internos.
origens, desenvolvimento, realizações, as pessoas e
instituições que o fazem acontecer. É essencial, então, compreender a diferença filosófica
e ética entre as duas perspectivas, e suas implicações
Mostramos como o Projeto foi se remodelando e para o desenvolvimento da responsabilidade e da
se reestruturando no curso de sua implementação. autonomia dos envolvidos, bem como para a reali-
Não se pode dizer que esteja de todo finalizado por- zação dos direitos humanos e sociais.
que tem revisado seus procedimentos e pretende
ampliar a aplicação de práticas restaurativas em O Capítulo seguinte pretende contribuir nessa
outros contextos institucionais além de escolas direção, apresentando os fundamentos legais da
e Fórum, possibilitando, com isso, uma testagem Justiça Restaurativa, sua justificação filosófica e
mais abrangente das várias alternativas e quais político-criminológica.
implicariam um custo menor e maior eficiência
para sua ampla disseminação. Note-se que se a transgressão da lei é “crime” para a
Justiça, a transgressão da “lei escolar” (Sistema Dis-
Tanto o contexto político de introdução da Justiça ciplinar/Regimento Interno), é “infração disciplinar”
Restaurativa no país como o desenho concreto do para a Educação.A partir da década de 90, observa-se
Projeto em sua evolução histórica representa uma em escolas de grandes metrópoles, como São Paulo,
novidade não apenas na sociedade brasileira, mas na a tendência a criminalizar as infrações disciplinares
própria estruturação dos referenciais restaurativos cometidas por adolescentes e jovens, encaminhando
colocados na literatura internacional. alunos à Justiça por atos de vandalismo, ameaças ou
de agressão violenta. Essas ocorrências, que antes
Por isso, vemos a necessidade de esboçar algumas eram tratadas como eventos graves e recebiam san-
linhas sobre como vem sendo entendida a Justiça ções previstas dentro do Sistema Disciplinar, hoje
Restaurativa, indicando as referências normativas são vistas como “casos de polícia”. Em Campinas, por
que pautaram esta iniciativa para fundamentá-la e exemplo, 30% dos processos do Fórum são devidos
descrevê-la com maior profundidade. a Boletins de Ocorrência abertos por iniciativa de
pessoas da comunidade escolar.
Uma reflexão sobre os marcos teóricos e sobre as
dimensões práticas do Projeto interessa não apenas Esse é um indicador da importância de se promover,
aos juristas, mas a todos os que desejam aplicá-lo, uma ampla discussão, também entre educadores, so-
em especial as lideranças escolares. No espaço bre a contradição que se expressa no fato de a Justiça
escolar, como no espaço judicial, a abordagem estar repensando o conceito de crime, e descobrindo
restaurativa precisa conviver com a abordagem alternativas educativas e inclusivas para lidar com os
retributiva, materializada, na Justiça, pelas puni- autores de atos violentos, enquanto na Educação se
ções previstas pelo Sistema Penal, e na Educação, faz, em algumas escolas, movimento inverso.
Como teoria e prática são inseparáveis, yy no fundamento do sistema criminal, a 13 Para um histórico
do movimento, cf. Zehr,
ilustraremos este Capítulo com alguns partir de uma revisão histórico-crítica Howard. Changing Lenses;
exemplos da aplicação da Justiça do modo como são compreendidos os Weitekampf, Elmar. The
Restaurativa em São Caetano do Sul, conflitos entre pessoas e grupos sociais e o history of restorative
justice, In: Bazemore, G.
em espaços escolares, comunitários e papel assumido pelo Estado diante deles; & Walgrave, Lode. Res-
forenses, tentando revelar o impacto yy no modo de resolução desses conflitos e torative juvenile justice:
repairing the harm of
simbólico na transformação dos de consideração aos direitos das diferen- youth crime, p. 75 e ss.
envolvidos em situação de conflito, para tes pessoas e instâncias envolvidas, tanto
seus apoios – familiares e amigos, para a direta como indiretamente, inclusive o 14 Bazemore, G. & Wal-
grave, Lode. Restorative
comunidade e para as instituições. próprio Estado; juvenile justice: in search
yy na compreensão dos objetivos pretendi- of fundamentals and
an outline for systemic
dos com essa resolução, considerando o reform. In: Bazemore, G.
2.1. Fundamentos
impacto produzido nos “ofensores”, “víti- & Walgrave, Lode. Res-
torative juvenile justice:
mas”, na comunidade em que se inserem e repairing the harm of
norteadores na sociedade como um todo, representada
pelo Estado13.
youth crime, p.46.
Marcos Teóricos 31
ENTENDIMENTOS DO CRIME
Crime definido como violação de regra Crime definido pelo dano às pessoas e às relações
Crime visto como categoricamente diferente de outros Crime reconhecido como relacionado a outros danos
danos e conflitos
Estado e ofensor vistos como partes primárias Vítima e ofensor vistos como partes primárias
Necessidades e direitos das vítimas ignorados Necessidades e direitos das vítimas como centrais
ENTENDIMENTOS DA RESPONSABILIDADE
Débito pago pelo recebimento da punição Débito pago pela ação reparadora
Verdade das vítimas é secundária Vítimas têm a chance de dizer sua verdade
Marcos Teóricos 33
Marcos Teóricos 35
perspectiva ampliada
Regras de Beijing e Diretrizes
Foi já com esta segunda perspectiva, am- de Riad: Justiça Restaurativa
pliada, norteada inclusive pelos parâmetros não apenas restaura o dano
de reforma do Judiciário, que este Projeto mas previne que a violência
estruturou-se. Examinemos em seguida al-
ocorra
guns marcos legais que nos subsidiaram.
Conflito entre alunos de uma escola municipal não participante do Projeto, com acusações
mútuas de responsabilidade. Pelo fato de ter sido lavrado Boletim de Ocorrência, alunos passam
a ser chamados de acusados em ambiente escolar, com sensação de estigmatização e rejeição
por colegas e pais de colegas, como pessoas a serem evitadas. Reclamações de procedimentos
da escola na condução do caso. Encaminhamento para círculo comunitário, com presença de
professores de confiança de todos. Estabelecimento de plano de ação superador do conflito e de
intermediação na escola para se trabalhar a questão do estigma e de procedimentos internos
de condução dos casos. Solicitação pelos envolvidos de implementação do Projeto de Justiça
Restaurativa na escola.
Marcos Teóricos 37
2.2. Justificação
Unidas de nº 12/2002, quando ela se refere
aos princípios básicos para utilização de
programas de Justiça Restaurativa em maté-
ria criminal. Ali se define o que se espera de
teórica dos
um procedimento restaurativo: “o resultado fundamentos
restaurativo significa um acordo construído
no processo restaurativo”. Isso indica os norteadores
requisitos de participação, empoderamento,
satisfação de danos e reintegração social. 2.2.1. Delineamentos do
25 Toma-se o
O reconhecimento e validação do princípio Projeto em torno de sua disposto no art. 75 da
Lei nº 9.099/95 como de-
participativo e de empoderamento para a fundamentação ético- terminante, vinculando-o
filosófica26
ao art. 152 do Estatuto da
autonomia, com a possibilidade legal de Criança e do Adolescente.
que os envolvidos no conflito se acertem/
componham sem a necessidade de um juiz A Justiça Restaurativa propõe-se como um 26 Para todo o
argumento, confronte:
que decida por eles (autocomposição) tem modelo alternativo de justiça, sobretudo ao Melo, Eduardo Rezende.
como conseqüência o caráter vinculante dos retributivo, como forma de se alcançar um Justiça restaurativa e seus
desafios histórico-cultu-
acordos ou planos de ação estabelecidos. Isso acertamento entre ofensor e vítima, supe- rais. Um ensaio crítico
significa que o acordo cria um vínculo legal rando a violência que marca o conflito27 e sobre os fundamentos
ético-filosóficos da
entre as pessoas, e,desde que os princípios aberto à consideração das responsabilidades Justiça Restaurativa em
restaurativos sejam respeitados, esses acor- e necessidades de cada parte envolvida. contraposição à justiça
dos ou planos de ação serão reconhecidos retributiva. In: Ministério
da Justiça, PNUD. Justiça
pelo juiz.25 Compreender os fundamentos éticos e filosó- restaurativa. Coletânea de
ficos dessa nova abordagem passa, portanto, artigos, p. 53 e ss.
Numa definição preliminar sucinta, pode- pela discussão da relação entre indivíduo e 27 Conflito e violência
mos então dizer que é essa a visão de Justiça sociedade: notadamente sobre a fundamen- não são sinônimos.
Restaurativa que embasa o Projeto de S. tação das ações individuais, dos seus limites e Conflitos cognitivos, por
exemplo, são essenciais à
Caetano do Sul: do poder da sociedade e do Estado em relação aprendizagem. Conflitos
Um processo de resolução de conflitos, onde a estas ações. têm um potencial que
pode ser construtivo ou
não cabe punição, com caráter dialógico e destrutivo, dependendo
inclusivo, fundado na autonomia da vontade Para isso vamos chamar em nosso auxílio da forma como são mane-
jados. É preciso evitar que
e na participação de todas as pessoas afetadas três grandes filósofos, dois alemães e um conflitos se transformem
direta ou indiretamente pelo litígio, voltado francês: Immanuel Kant, Friedrich Nietzsche em violência. E quando
isso ocorre, é preciso
ao estabelecimento de um plano de ação para e Michael Foucault. reparar os danos, analisar
o atendimento das necessidades de todos os as causas, e superá-las.
afetados e garantia ampla de seus direitos, (Cf. CECIP- APS Interna-
tional – Conflito, Modo de
com atribuição e reconhecimento voluntário Usar”, 2008, no prelo.
das respectivas responsabilidades.
Marcos Teóricos 39
Marcos Teóricos 41
Tira-se, portanto, a primazia do direito penal (e se vê privado e dos quais deseja se apossar.
por conseguinte da vingança) como fonte de jus- Ou então é encarada como alvo de descarga
tiça, para atribuí-la ao direito das obrigações35 de um ressentimento que igualmente marca 35 Brussoti, Marco. Die
o agressor, por que a relação interpessoal ou Selbstverkleinerung des
mútuas. Mais ainda, o objetivo da resolução do Menschen, p. 95.
confronto deixa de ser apenas o de reconduzir à social o está excluindo e, como tal, lhe reserva
paz, o de restabelecer uma situação original to- apenas um não-lugar37. 36 Para todo o argu-
mento, confira-se Melo,
mada sem crítica como de maior valor. Trata-se Eduardo R. Nietzsche e a
agora de abrir-se à construção de possibilidades Colocá-los um frente ao outro para avaliarem justiça, p. 133 e ss.
negociadas de existência36. o conflito faz com que tenham necessaria-
37 Sobre a contraposição
mente de atentar à perspectiva do outro e, entre atividade e reati-
Dá-se, com isto, a oportunidade à emergên- com isto, de reavaliar suas próprias condutas, vidade e a emergência
da má consciência e do
cia de um outro modo de entendimento da de reavaliar a si mesmos. ressentimento, vide Melo,
postura que se há de ter face ao conflito. E Eduardo R.. Nietzsche e a
justiça, p. 134 e ss.
mais: há uma diversa percepção do outro com Uma aprendizagem - viável apenas quando
quem se confrontou, e,sobretudo, da relação há negociação e estabelecimento do compro-
com a norma. misso - pode emergir.
Marcos Teóricos 43
Conflito em escola. Menino hiperativo instigado pelos demais da classe a provocar situa-
ções de conflito. Pais separados. Mãe ausente às reuniões de classe e no acompanhamento
do filho. Pai sem contato com o filho há anos. Todos chamados à participação no círculo. A
confrontação de perspectivas entre os pais, que até então procuravam resolver os problemas
apenas através da diretoria, permitiu uma mobilização interna maior pela mãe, uma maior
presença do pai, que percebeu as implicações de sua ausência em relação ao filho, e uma
postura de maior solidariedade entre os demais pais, que até então apenas criticavam e
julgavam a mãe do garoto.
Marcos Teóricos 45
Caso de violência doméstica com fatores múltiplos, um dos quais o alcoolismo do genitor.
Estabelecem planos de ação para a convivência respeitosa, superando os pontos de conflito,
com o compromisso adicional de participação do genitor em programa de atendimento a al-
coolistas. Não houve a adequação ao tratamento e novo círculo é solicitado espontaneamente
pelos envolvidos, com o convite a outro programa de atendimento para participar do círculo.
Novo plano de ação é estabelecido, com participação efetiva no programa de atendimento e
cumprimento dos demais pontos acordados no plano.
Marcos Teóricos 47
Exemplo da Prática
Aprendizado para a autonomia na resolução de conflitos e assunção de
obrigações positivas
Conflito ocorrido em escola, entre alunos, com xingamentos e agressão. Participação em círculo
e celebração de acordo. Envolvimento posterior dos alunos em desentendimento, sem violência,
em que o lanche de um dos alunos, um iogurte, estourou, sujando roupa. Os alunos procuraram
espontaneamente a conciliadora, informando o ocorrido e já apresentando, desde logo, um
acordo por eles mesmos celebrado: um levaria a roupa do outro para lavar, um terceiro traria
um novo iogurte, e todos se entenderam quanto às condutas pelas quais deveriam se pautar
para que novos desentendimentos não surgissem.
Vê-se, portanto, que está em jogo não uma A maioria das pessoas tem consciência de
busca por paz a qualquer preço, notadamente que as infrações à lei são tratadas e julgadas
uma paz homogeneizadora, que enrijeça e de forma diferente conforme à área em que
cristalize a vida, voltando-se meramente à ocorrem.
obediência e à sujeição. O que se almeja é
uma paz que não se feche às diferenças, ao Não é o mesmo o tratamento que a Justiça
dinamismo da vida, às mudanças e às tensões dá a conflitos na área do direito civil (um
envolvidas em toda mudança. contrato que não foi cumprido, um negócio
em que uma pessoa possa ter se sentido
Sobretudo, precisamos de uma paz que não prejudicada, um dano causado num aci-
feche os olhos às questões sociais de um país dente qualquer, discussões em torno de
como este: uma paz que repudie a violência, direitos e responsabilidades no âmbito
mas não as oposições e os conflitos de in- familiar), na área do direito administrativo
terpretações, não as demandas outras por (os limites do que podemos fazer em espa-
justiça, social inclusive para além da justiça ço público, como uma praça, a rua...) e na
interpessoal, se for o caso. área do direito criminal (uma pessoa inju-
riou a outra; alguém danificou de propósito
a propriedade de outro ou do Estado; uma
Tensão entre permanência e pessoa se apropria de um objeto qualquer
mudança de outra- furto; duas pessoas se agrediram
e se feriram; uma pessoa usou de violência
Esta tensão entre conflito e solidariedade ou de ameaça para levar os bens de outra
revela-se ainda, neste binômio maior que é -roubo; uma pessoa ameaçou ou coagiu a
a tensão entre o universal e o singular, entre outra....).
a demanda por adaptação, que tende a con-
servar a vida tal como vem sendo vivida, com Há três pesos e três medidas distintas para
ênfase na tradição e nos valores consagrados, se lidar com esses três tipos de situações
e a demanda por resistência, que indica o conflitivas. Como sabemos, no sistema
desejo por expressão da singularidade, mas criminal os conflitos não são chamados
também da novidade, da criação, do sonho. conflitos, mas crimes. E, em razão dessa
Se não podemos prescindir da tradição, definição, eles são mais duramente punidos, 47 Nietzsche, Friedrich.
tampouco o podemos quanto à atualização e o desejo de vingança por parte daqueles Sobre a utilidade e
desvantagem da história
e renovação da cultura, pelo diálogo com os que agora passam a ser vistos como vítimas, para a vida (Consideração
problemas do presente47. é, em geral, maior. Extemporânea II).
Marcos Teóricos 49
O que poucos se perguntam é: qual é a origem termos apontados acima, e a penal, de cunho
histórica essa diferenciação? A que razões e retributivo.
necessidades político-sociais elas respon-
diam? Elas ainda se sustentam hoje? É o que É interessante notar que o Sistema Discipli-
passaremos a discutir em seguida. nar ou Regimento da maioria das escolas
adotou historicamente o modelo penal, de
Por que os conflitos na área criminal são re- cunho retributivo, e não o civil. Em geral, a
solvidos de forma diferente do que nas áreas cada infração disciplinar corresponde um
civil e administrativa? castigo (pena) – advertência, suspensão,
encaminhamento ao Conselho da Escola.
A reflexão sobre os fundamentos ético- Como no sistema penal, as punições na
filosóficos da Justiça Restaurativa, na pers- escola existem porque houve a transgressão
pectiva de radicá-la num contexto mais plural e porque se quer dissuadir novas trans-
e participativo, fundada na negociação e, gressões. À medida em que as punições
portanto, em muito, no direito das obrigações, previstas no Sistema Disciplinar deixaram
necessita, para ganhar corpo, ser conectada à de ter qualquer efeito coercitivo sobre os
uma reflexão histórico-política sobre o pró- alunos, que não encaram como castigo as
prio sistema criminal para se poder pensar advertências e suspensões, algumas escolas
esta reabertura da justiça como instituição e passaram a recorrer ao Sistema de Justiça
seu diálogo com outros espaços de resolução para garantir a ordem - daí os Boletins
de conflitos. de Ocorrência. Ou seja, o fato de que as
punições disciplinares não mudavam o
Numa análise sobre os aspectos, traços e comportamento dos alunos, foi interpretado
percursos da racionalidade penal moderna, não como um sinal de que punições não
Álvaro Pires questiona se realmente existe levam à aprendizagem e não mudam com-
uma diferença essencial no modo de ser das portamento, mas como um indício de que
infrações civis, administrativas e penais. Ele as punições não estavam funcionando por
se indaga, então sobre o sentido de manter- serem leves demais. Portanto, era preciso
se a fragmentação institucional entre as recorrer a métodos mais drásticos, como
distintas formas de resolução de conflitos, encaminhar alunos adolescentes transgres-
vale dizer, a civil, que reconhece a natureza sores às Delegacias de Polícia. Enquanto
negocial e participativa dos conflitos, nos isso, outras instituições de ensino investem
Marcos Teóricos 51
50 Pires, Álvaro. Histoire Para o autor, essa forma adotada pelo sistema
des savoirs sur le crime & penal moderno, de tornar necessária a relação
la peine, p. 19 entre crime e pena, assim como a obrigação
Crime visto como erro contra uma pessoa Crime visto como infração da lei
Tratava-se de um conflito horizontal e não da Com o crime não sendo mais considerado erro, e sim
desobediência de uma ordem política. infração, a partir do século XII, ele se constituí cada
vez mais como um caso particular de desobediência
O foco era a reparação à vítima. à autoridade que não autoriza o fim de hostilidades
pela reparação positiva51.
A verdadeira vítima é a do ato. Não havia uma
autoridade afrontada. Cria-se uma divisão em torno de crenças fundamentais
de que o direito de punir é uma obrigação ou uma
necessidade imperiosa e que, sem punição, não há
justiça judiciária52 .
Temos assim uma correlação que se mostra Uma justiça para os iguais e uma 51 Pires, Álvaro. Histoire
des savoirs sur le crime & la
fundamental para nossa discussão em torno justiça para “os Outros”: Direito peine, p. 20/23
da Justiça Restaurativa. Se a justiça judiciária penal e a noção de Guerra
é apropriada para fins de estruturação do Es- Um segundo grupo de transformações ocorre 52 Pires, Álvaro. Histoire
des savoirs sur le crime & la
tado em favor do príncipe, isto é, todo aquele para levar a uma nova lógica de diferen- peine, p. 19
que pretende deter o poder de domínio, ciação funcional interna no Direito. Essas
percebe-se a íntima correlação entre o modo mudanças resultarão, segundo Pires, numa 53 Pires, Álvaro. Histoire
des savoirs sur le crime & la
de estruturação da administração da justiça autonomização - diferenciação do direito peine, p. 43
– e, portanto, a necessidade e discussão de penal, como subsistema de pensamento e de
seus termos – com relação aos direitos que práticas jurídicas.
estão em jogo.
Na época pré-clássica as noções de vingança
Por isso, para Álvaro Pires, de um ponto de e de guerra eram referenciais na considera-
vista prático, não há nada que nos impeça ção do crime. Em termos legais, a primeira
de transformar nosso direito no futuro, no paulatinamente foi deixada para trás, mas,
sentido de dar mais importância novamente quanto à segunda, houve uma metamorfose
à pacificação do litígio, à reparação positiva ambivalente.
e às soluções menos hostis53.
Marcos Teóricos 53
Marcos Teóricos 55
Marcos Teóricos 57
Sua marca se cola nas pessoas envolvidas A Justiça Restaurativa, mais do preocupada
com o Sistema de Justiça. O estigma de- com a infração à regra, volta-se, sobretudo,
corrente do mero envolvimento com um às conseqüências da situação de conflito,
processo de apuração de ato infracional ou aos danos e, por conseguinte, à relação entre
criminal é manifesto, dificultando as rela- as pessoas envolvidas, tanto as afetadas
ções interpessoais, profissionais de todos diretamente (vítima e ofensor), como indire-
60 Goffman, Erving. os envolvidos60. tamente (família, suportes - amigos, colegas
Manicômios, prisões
e conventos; Becker,
- e comunidade), tendo, portanto, o encontro
Howard. Outsiders. Pesquisas e levantamentos estatísticos indi- e confronto destas pessoas e grupos como
cam que o contato com o Sistema de Justiça condição para atingir seus resultados.
61 Zehr, Howard. Family aumenta o número de ofensas, justamente
group conference. New
Zealand Style. porque aprisionam aqueles taxados de infra- Nisto ela opera uma grande transformação
tores em categorias rígidas e fixas, impedin- de paradigma. A primeira grande trans-
do-lhes transições e deslocamentos internos, formação operada diz respeito ao tipo de
patologizando-os, enfim. No entanto, ofensas, resposta e ação esperada daquele a quem
se consideradas como tais, podem estar mais é imputada a prática de um ato infracio-
relacionadas com o próprio processo de seu nal - na comunidade ou na escola - ou de
desenvolvimento. indisciplina - na escola.
Exemplo da Prática
O caráter diversório da Justiça Restaurativa e plano de ação conjunto entre
vítima e ofensor
Caso de ameaça em escola por parte de aluno contra professora. Intimidada e atemo-
rizada, lavra Boletim de Ocorrência na delegacia. Estimulada a participar do Projeto
de justiça unidade escolar. Chegam a um plano de ação pelo qual comprometem-se a
cumprimentar-se publicamente, de modo a demonstrar que o conflito foi superado,
bem como a elaborar conjuntamente cartazes a serem espalhados na escola sobre
relações respeitosas e cidadania. Apresentados em juízo por força do Boletim de
Ocorrência anteriormente lavrado, comunicam já terem chegado ao acordo, que é
considerado válido e suficiente, sendo extinto o processo.
vergonha – da espécie que seja – à pessoa que dentre os quatro pilares para a educação no
praticou o ato danoso, nem de uma maior século XXI, o Aprender a Ser e o Aprender a
submissão de sua parte à lei, à sua autoridade, Conviver. (Educação, um tesouro a descobrir,
por ter infligido dor à vítima. Ed. Cortez, 1999)
Marcos Teóricos 59
Marcos Teóricos 61
Conflito ocorrido em escola. Menina foi apelidada de ‘testuda’, assim sendo chamada por meses.
Em determinado dia, ela agride violentamente quem a tratava por esse apelido. Em círculo,
aponta o quanto o apelido a incomodava, fazendo-a sofrer. Quem lhe alcunhou e que foi agredida,
disse não saber do impacto daquele apelido na garota. Chegaram a um acordo.
O caso revela o quanto a menina, que se sentia vítima de uma conduta opressora e indese-
jada, por mais que tenha reagido em excesso, sentir-se-ia revitimizada secundariamente se
processada. Sua situação dificilmente permitiria a caracterização de legítima defesa, por ser
questionável o quanto o apelido, que poderia ser tomado como descritivo, pudesse ser consi-
derado como uma injusta agressão e, mais, que sua ação tivesse sido moderada e necessária.
Provavelmente, se processada, poderia ser condenada. O círculo equacionou o problema com
maior profundidade e satisfação a todos.
Marcos Teóricos 63
Marcos Teóricos 65
Exemplo da Prática
Os facilitadores em processo restaurativo
Facilitador de justiça do Projeto comunitário tem o filho envolvido em conflito recorrente com
outro garoto mais velho. Não sabem como resolver o caso; querem a separação dos meninos,
que estudam na mesma escola. Ambos com processos no Fórum pelo mesmo conflito, um na
Vara da Infância, outro no Juizado Especial Criminal. O facilitador tinha receio de participar do
círculo e do modo como seria visto pelos demais. Apesar do medo, os dois aceitam a experiência
e chegam a um plano de ação, valorizando, na pele, o processo, com agradecimento pela opor-
tunidade de ter podido redescobrir pessoalmente o Projeto. Impacto em todos os facilitadores,
que ressignificam o processo como efetivamente algo que lhes pertence, como comunidade, em
seu próprio benefício, não se tratando apenas de uma ação que fazem para os outros.
Marcos Teóricos 67
lescentes, para que possam, por iniciativa mente o outro através de relações organiza- 79 Slakmon, Catherine
própria, resolver seus conflitos entre si ou cionais criativas e democráticas, superando & Oxhorn, Philip. O poder
de atuação dos cidadãos
deles com seus familiares ou membros da uma estruturação meramente burocrática e e a micro-governança da
comunidade; cristalizada. Nesta visão, a Justiça Restaura- justiça no Brasil.In:Novas
yy articulação entre organizações comunitá- tiva há de ser vista, ela também, num círculo direções na governança da
justiça e da segurança.
rias e os detentores de recursos; virtuoso com as autoridades estatais e a
yy estabelecimento de mecanismos formais e sociedade civil de modo a criar condições 80 Braithwaite, John
& Strang, Heather.
informais pelos quais se criam trocas entre de respeito mútuo, civilidade e não-violência Introduction: restorative
os grupos com interesses e necessidades entre os cidadãos80. justice and civil society.
contraditórias77. In: Strang, Heather &
Braithwaite, John, Res-
torative justice and civil
Este movimento é marcado, portanto, pela society, p. 9/10
Marcos Teóricos 69
Marcos Teóricos 71
A inserção da dimensão restaurativa nas lescentes, vale dizer o “direito a ter direitos”,
escolas, com uma visão de desenvolvimento seja reconhecido e garantido (art. 3º).
institucional voltada à substituição da insegu-
rança e violência por diálogo e aprendizagem, Com efeito, na garantia de direitos para uma
funda-se numa perspectiva de direitos e do formação cidadã vêem-se os propósitos tanto
direito a ter direitos, portanto, na perspectiva da lei infanto-juvenil como educacional. Na
de cidadania de crianças e adolescentes, como primeira, busca-se assegurar às crianças e ado-
sujeitos de direitos, nos termos do art. 3º do lescentes todas as oportunidades e facilidades
Estatuto da Criança e do Adolescente. para lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições
Para tanto, há de se colocar o desafio, comum de liberdade e dignidade (art. 1º do Estatuto da
à justiça e à educação, de serem instituições Criança e do Adolescente). Na segunda, voltada
que garantam e, portanto, se relacionam com à educação (art. 1º da LDB) – e esta tanto nos
os adolescentes a partir da perspectiva de seus âmbitos familiares, da convivência humana, no
direitos, individuais e sociais, de seus deveres trabalho, movimentos sociais e organizacionais
e de suas responsabilidades. Como aponta da sociedade civil -, enfatiza-se o desenvol-
Antonio Carlos Gomes da Costa, considerar vimento do educando para seu preparo ao
o adolescente como sujeito em termos pe- exercício da cidadania e qualificação para o
dagógicos implica a superação da educação trabalho (art. 2º da mesma lei).
bancária, criticada por Paulo Freire, que o
toma apenas como receptáculo de conheci- A utilização de um modelo de Justiça Res-
mentos, para ser sujeito do processo educa- taurativa em escolas, procura ser o elo entre
tivo, como fonte de iniciativa, protagonista de os sistemas, de Justiça e de Educação através
ações, gestos e atitudes no contexto da vida de uma filosofia comum de ação, de uma
familiar, escolar ou comunitária. Mais ainda, série de ações e procedimentos integrados
fonte de compromisso, por ser responsável e do estabelecimento de redes e fluxos, que
pelas conseqüências de seus atos e, portanto, permitam a reflexão e autocrítica em toda
também fonte de liberdade. Este, a seu ver, é o situação de conflito. A ação transformadora
primeiro passo de convergência entre justiça depende, efetivamente, de uma mudança
e educação. 84 de visão e de missão, no que concernia a 84 Costa, Antonio Carlos
Gomes da. Pedagogia y
esses conflitos, por parte das instituições justicia. In: Garcia Men-
Dois princípios e direitos fundamentais pre- envolvidas. dez, Emilio & Beloff, Mary.
vistos na Convenção dos Direitos da Criança Infancia, ley y democracia
en América Latina, p.
dão os pilares ainda desta convergência que se Tal como a sanção judicial, o esforço é por 61/62
consolida com a Justiça Restaurativa. Estamos superação de uma visão disciplinar punitiva
falando do direito ao desenvolvimento (art. – ou mesmo, dizem alguns, focada em solução
6º e 27) e do direito à participação (art. 12). de disputas isoladas – para se buscar uma
Ambos são intimamente voltados à formação visão mais holística em que diversos aspectos
para a emancipação e se entrelaçam no direito do comportamento e das práticas institucio-
a que o interesse superior das crianças e ado- nais possam ser considerados.
Marcos Teóricos 73
Marcos Teóricos 75
Marcos Teóricos 77
Caso de roubo. Adolescente primário. Vítima protegida, não desejando revelar seus dados
no processo. Adolescente confesso. Escreve carta à vítima entre apresentação e audiência de
instrução. Estudo interdisciplinar favorável, com a oitiva da vítima, apresentação da carta e
depoimento da assistente social sobre suas impressões acerca das perspectivas do adolescen-
te. Vítima declara então que, ao chegar em casa depois de lavrar o Boletim de Ocorrência na
delegacia, a primeira coisa que fez foi rezar uma ave-maria em favor adolescente. Interessa-se
pelo histórico do menino e aceita participar indiretamente do círculo.
Marcos Teóricos 79
Marcos Teóricos 81
3.1. Procedimentos
Um dos mais fascinantes desafios na
implementação de um Projeto de Justiça
Restaurativa e Comunitária é o desenho
de procedimentos que traduzam de forma
prática os princípios e a filosofia da Justiça
Restaurativa, viabilizando-a nos mais dife-
rentes espaços da cidade.
Este fluxo pauta-se por alguns fatos – como Então, no fluxo, indicamos os caminhos de
um conflito – e ações que serão tomadas para cobrança destas ações, mostrando a quem
a garantia de direitos das pessoas envolvidas devemos recorrer e que ações esses atores
nesse conflito. Fatos e ações são simboliza- deverão tomar para que esses serviços
dos de modo distinto para que possamos sejam implementados. Algumas dessas
nos localizar nesta trajetória, assim como derivações, como o procedimento específico
desdobramentos mais detalhados das pro- de julgamento de atos infracionais ou do de
vidências que se devem tomar em garantia defesa de direitos sociais, por exemplo, serão
desses direitos. Elaboramos um índice que representados pelo símbolo de um fluxo com-
servirá de guia. plementar a este. Este sinal de fluxo aparecerá
também em algumas situações nas quais, de
Um fluxo, ademais, não é um caminho um contexto, como o judicial, se passa a outro,
único. Uma mesma situação, por exemplo, o como o atendimento restaurativo escolar ou
conflito, pode implicar em desdobramentos comunitário.
relacionados a escolhas que devem ser feitas
ou a situações em que ele surge e que são
simbolizadas por uma pergunta.
O derivador deixa o seu lugar institucional como A proposta é capacitar esses agentes sociais
autoridade ao oferecer escolhas entre diferentes em uma diversidade de técnicas de práticas
caminhos às pessoas com as quais se defronta. restaurativas, de modo que possam adequar-
Da mesma forma, faz com que o envolvido na se a diferentes contextos e objetivos, com
situação de conflito deixe o lugar institucional destaque para:
que lhe é reservado (de réu, de vítima, de aluno,
de paciente,de doente,de familiar) para assumir yy círculos restaurativos segundo a meto-
a posição de ator fundamental no processo de dologia da Comunicação Não-Violenta
resolução deste conflito, apropriando-se de seu (Ver p. 137);
lugar no mesmo e vendo-se como responsável yy círculos restaurativos segundo a metodo-
por identificar os termos e condições em que logia Zwelethemba (Ver p. 146).
este conflito, com sua atuação, poderá ser
solucionado. É esta abertura que propiciará Recomenda-se que os círculos sejam coor-
efetivamente o encontro entre os envolvidos no denados por duas pessoas: um facilitador e
conflito, como pessoas, não mais polarizadas, um co-facilitador de práticas restaurativas.
mas dispostas à construção de um plano de Passou-se a adotar como princípio, que o co-
ação que a todas favoreça. facilitador seja preferencialmente adolescente
e aluno de escola, valorizando-se o protago-
nismo juvenil e a importância simbólica de
4.1.3 - Capacitação de que os próprios adolescentes se vejam identi-
ficados no processo de construção da justiça
facilitadores de práticas numa paridade de poder com os adultos.
restaurativas
Para operar círculos restaurativos A formação de facilitadores de práticas res-
comunitários nas escolas e outros locais taurativas é realizada por meio de:
da comunidade, círculos restaurativos
yy 2 encontros de 4 horas em formato de
institucionais na escola, e círculos
workshops vivenciais;
restaurativos institucionais no ambiente
judicial (Fórum, na Vara da Infância e
yy 4 encontros de 8 horas em formato de
da Juventude e Juizado de Violência curso;
Doméstica) yy 10 oficinas de 3 horas, sempre com pe-
riodicidade quinzenal, intercalados por
As pessoas que operam círculos restaurativos encontros dos participantes em pequenos
comunitários e círculos institucionais nas grupos com funcionamento autogerido.
escolas são escolhidas dentre voluntários 108 Em 2005 e 2006,
a capacitação, segundo
que residam no bairro. Podem ser oriundos Em 2007 e 2008, essas oficinas passaram a ser o modelo de Comunica-
de associações de pais e mestres, clubes da específicas por contextos de aplicação (comuni- ção Não-Violenta, para
terceira idade, comunidades religiosas – ou tário,escolar e judicial),quando os participantes facilitadores de práticas
restaurativas atuando
ainda, podem ser educadores das escolas, são preparados para formar grupos de estudo e em círculos escolares
alunos e alunas, com tempo e disposição para de apoio mútuo para um aperfeiçoamento con- e judiciais foi feita por
Dominic Barter; e a dos
o trabalho voluntário. As pessoas que reali- tínuo, e de forma autônoma, de sua prática108. facilitadores de práticas
zam os círculos restaurativos em ambiente Há também a utilização de filmagens feitas restaurativas atuando em
círculos comunitários foi
judicial são assistentes sociais e psicólogos, durante os círculos e de outros vídeos, como realizada, em 2006, por
podendo contar, por vezes, com auxílio de recursos na formação dos facilitadores. Vania Cury Yazbek.
►►Como encontrar outros caminhos mais profícuos para podermos também alcan-
çar os objetivos fundamentais deste país, de erradicar pobreza, marginalização
e reduzir desigualdades pela promoção do bem de todos, sem discriminação
e, portanto, sem violência?
Capacitação de agen-
tes governamentais e
não governamentais
para desempenharem
o papel de encami-
nhadores/ derivadores
de casos de conflito/
violência a procedi-
mentos restaurativos.
Cursos de Forma-
ção de Derivadores
para os envolvidos na
Rede de Atendimento
e outros.
Capacitação de capa-
citadores para acom-
panhar e dialogar com
a prática dos facilita-
dores restaurativos
e formar novos faci-
litadores de práticas
restaurativas.
TEMAS
Dimensões do sistema.
Workshop JUSTIÇA
Ao final dos workshops, cada um deve refletir sobre como está, em relação a como chegou, e
confirmar sua adesão às capacitações correspondentes à sua escolha.
e público-alvo
como instrumento de mudança, além da
capacitação para selecionar quais situações
deveriam ser encaminhadas e como fazê-
A implantação, em meados de 2006, dos lo de forma a garantir a acessibilidade aos
círculos restaurativos comunitários, gerou plantões de atendimento. Posteriormente,
a necessidade de sensibilizar e preparar percebeu-se que a formação para a derivação
pessoas, principalmente as pertencentes às devia ser oferecida a outros participantes da
organizações da rede de atendimento, para Rede de Apoio aos direitos da criança e do
encaminhar casos de conflitos a esse novo adolescente, inclusive diretores de escola e
espaço de resolução. demais gestores escolares.
2.4. Conteúdo
“vender” essa idéia (mudança de pa-
radigma).
»» Como encaminhar um caso para as
O programa inclui três eixos - processo práticas restaurativas de maneira
conversacional, conceitos de violência e de eficiente (com alguma garantia de
justiça restaurativa. acessibilidade).
Uma reflexão importante surgiu da equipe grande interesse em descobrir “como se fala
do Fórum e contribuiu com a reflexão sobre a com os indivíduos para encaminhar” e “como
eficácia do encaminhamento: não é suficiente selecionar os casos para o atendimento res-
uma ação pertinente do derivador; as pessoas taurativo”.
envolvidas também têm seu processo e seu
tempo de busca de ajuda. Esse ponto é facil- Foi possível verificar que os derivadores foram
mente observável quando, no encontro dos di- se apropriando de suas funções no projeto,
ferentes derivadores, fica evidente um circuito bem como contribuindo para sua ampliação
processual na busca de auxílio para resolver através de contribuições valiosas de expe-
um problema de violência. Dessa maneira, o riências vividas e soluções construídas. Cada
encaminhamento tem suas especificidades pergunta colocada foi sempre recebida como
para ser eficaz, mas também necessita do desafio e auxílio aos coordenadores e capaci-
encaixe com o desejo e a prontidão dos envol- tadores na busca de respostas e adaptações
vidos para aceitarem uma mudança. que atendam e viabilizem a continuidade de
sua implementação.
Os principais objetivos e métodos usados
nas primeiras oficinas de capacitação de De forma geral, o formato espontâneo de
derivadores foram sendo reforçados nesses conversação que se instalou nessas reuniões
encontros, e aprofundados frente a questões - sentar em um círculo como se faz em um
que emergiram da vivência prática. processo restaurativo - mostrou que todos
foram se sentindo atores do projeto, capazes
Os participantes que vieram mais de uma de auxiliar-se mutuamente, de pensar juntos e
vez apresentaram questões mais complexas, levantar desafios a serem vencidos, apontando
refletindo e oferecendo contribuições quanto para um resultado muito positivo.
aos procedimentos. De forma geral, notou-se
que a freqüência mais alta foi de profissionais As oficinas, centradas em assuntos práticos
do Fórum e do PSF – Programa de Saúde da e formatadas vivencialmente, foram as mais
Família (agentes de saúde). Estes apresentam bem sucedidas.
e público-alvo
tiva em São Caetano: a técnica de operação
de círculo restaurativo segundo o modelo da
Comunicação Não-Violenta (Ver p. 137).
A existência de espaços diversificados de
resolução de conflitos tem se demonstrado Os candidatos a facilitadores de práticas
fundamental na cidade. Além de espaços restaurativas, então chamados facilitadores
institucionais (como a escola e o Fórum) é de justiça, foram capacitados, por Dominic
essencial que existam lugares, como o espaço Barter, coordenador da Rede de Comunicação
comunitário aberto em escola no bairro Nova Não-Violenta-Brasil, para atuar em círculos
Gerty, para resolução de conflitos nos quais restaurativos institucionais nas escolas (edu-
os procedimentos restaurativos não convivem cadores, profissionais da escola, estudantes)
com hierarquias ou regulamentos e normas e em círculos restaurativos institucionais no
institucionais retributivos, consolidados em Fórum e no Conselho Tutelar (assistentes
instrumentos como Sistema Disciplinar e sociais do Fórum, conselheiras tutelares).
o Regimento Interno das Escolas - e onde
a responsabilidade dos envolvidos é mais Já no início de 2006, percebia-se que essa
nebulosa. técnica, ainda que bastante eficaz, não pare-
cia suficiente para dar conta da diversidade
A diversificação de espaços restaurativos de instituições, conflitos e relações entre as
deve ser acompanhada da diversificação pessoas envolvidas em presença.
de técnicas restaurativas à disposição dos
que utilizam esses espaços. Essa foi a lição Assim, o juiz coordenador do Projeto fez
aprendida logo no primeiro ano de vida do um convite a especialistas da África do Sul
Projeto. para ministrarem um seminário de capa-
Após o acolhimento dos envolvidos que chegam aos locais de atendimento buscando
ajuda, avança-se até a etapa sete, introduzindo aí uma pausa para ponderar sobre a
participação dos envolvidos indiretamente na situação de violência e sobre a inclusão
de representantes de algum grupo de apoio. O encaminhamento prévio e consensual
dos envolvidos, notadamente nos casos de violência doméstica, a grupos de apoio de
minorias ou de atendimento a situações como alcoolismo, drogadição, permite que o
foco do círculo se concentre na dinâmica das relações, mais do que em características
individuais ou em situações que poderiam ser tomadas como patológicas. Consegue-
se, com isso, uma maior promoção de responsabilidade e autonomia, com um maior
comprometimento e respeito por todos.
3.4. Aprendendo
do projeto.
O grande desafio foi legitimar a validade do círculo restaurativo em contextos punitivos (medidas
socioeducativas) impostos pela lei. (X)
Nesse contexto, os desafios são: a)aumentar a eficiência do cunho diversório em relação à justiça
(prevenção da infração), conquistar um caráter de comunidade reintegradora, diminuindo “medidas”
e aumentando “Planos de Ação”; b) superação dos limites da instituição, aumentando o diálogo com
outras dimensões dos conflitos, com a comunidade e como comunidade (acolhimento de adolescentes
em conflito com a lei, projetos sociais nos quais pudessem se engajar...)
O programa foi construído a partir das necessidades emergidas na experiência prática de cada facilitador,
identificadas pela atividade reflexiva preparada por uma carta enviada previamente:
Programa
a) Revisão do histórico da Justiça Restaurativa.
b) Discussão teórica sobre os valores da Justiça Restaurativa e reflexão de como eles permeiam e
organizam a prática de facilitação nos círculos.
c) Etapas do processo: a escolha segundo os critérios pragmatistas de contextualização (Pré-círculo,
Círculo e Pós-círculo).
d) Avaliação da adequação:
»» do caso para a Justiça Restaurativa;
»» do modelo para o caso, partir da experiência vivida e levantar as dúvidas.
e) Aprender a identificar necessidades não atendidas.
f) Como conseguir a adesão para participação da comunidade envolvida indiretamente.
g) Ampliar a noção de responsabilidade: individual e comunitária, articuladas ao empoderamento;
ativa e autônoma.
h) Benefícios da JR para os casos em cumprimento de medidas socioeducativas.
Identificando facilitadores
Identificando facilitadores para círculos no Fórum e no
para círculos na comunidade Conselho Tutelar
A seleção de facilitadores é pensada como A seleção de facilitadores realiza-se por con-
um processo de dupla escolha, cujo resul- vites feitos aos operadores de Direito para
tado é uma adesão ideológica ao projeto. participar de um encontro com duração de 4
Realiza-se por convites feitos à comuni- horas onde é feita uma apresentação detalha-
dade para participar de um encontro com da do Projeto, atividades de sensibilização aos
duração de quatro horas onde acontecem princípios restaurativos e um alinhamento
uma apresentação detalhada do Projeto, de informações sobre a Capacitação. Dentre
atividades de sensibilização aos princípios os interessados, podem estar: conselheiros
restaurativos e um alinhamento de informa- tutelares; técnicos do Fórum; educadores de
ções sobre a Capacitação. medidas socioeducativas.
e público-alvo
formativos, onde prática e teoria dialogam,
os gestores são convidados a perceber não
apenas a dimensão curativa das práticas
O processo restaurativo só pode ser implan- restaurativas (“consertando” as interações
tado na instituição escolar, mobilizando-se danificadas por conflitos destrutivos), mas,
a razão, a emoção e a vontade de seus mem- principalmente, sua dimensão preventiva
bros. Fazer com que os princípios da justiça (disseminando habilidades de comunicação
restaurativa passem a informar as práticas e convivência que evitam que conflitos se
pedagógicas, é diferente de consentir que o tornem destrutivos; possibilitando a reflexão
espaço escolar seja usado para a realização sobre as causas internas da violência escolar
de círculos restaurativos comunitários. e a atuação institucional sobre elas).120
No segundo caso, basta a autorização dos As oficinas são das destinadas ao seguinte
gestores, para que os círculos comecem a acon- público-alvo: diretores; vice-diretores; pro-
tecer. No primeiro caso, os gestores não apenas fessores coordenadores atuando nas escolas,
devem providenciar as condições materiais, supervisores e assistentes técnico pedagógi-
humanas e organizacionais para a implemen- cos (ATPs) das Diretorias de Ensino. (Dire-
tação dos círculos restaurativos escolares, mas tores, vices e professores coordenadores são
precisam atuar como verdadeiras lideranças os responsáveis pelas providências quando
educacionais, definindo-se líder como aquele o Sistema Disciplinar da escola é infringido,
ou aquela que é capaz de motivar, envolver e por isso também fazem a Capacitação para
mobilizar uma equipe, rumo à realização de Derivadores – Ver p. 125).
objetivos definidos coletivamente. 119 119 “Mestres da Mu-
dança” op.cit., Conceito de
Além desses gestores, pretende-se atingir
Liderança.
Nesse contexto, os gestores escolares devem outras lideranças educacionais, essas, não
ser apoiados para se tornarem lideranças institucionais, como alunos, familiares, 120 Veja: Conflito nas
Escolas: Modo de Trans-
educacionais facilitadoras de mudança, membros da equipe docente, com as quais formar, op.cit.
promovendo o envolvimento da comuni- gestores-líderes compartilham análises e
dade escolar como um todo no Projeto de decisões sobre a escola.
4.3. Visão,
dade social por parte dos alunos e no seu VEREST, Bart APS, 1994.
Artigo na Bibliografia.
protagonismo. Ao mesmo tempo, devem ter
objetivos, a oportunidade de experimentar uma nova
maneira, sistêmica, de trabalhar, colocando
conteúdos e a escola em rede com outras organizações e
instituições da comunidade, em especial o
práticas Fórum e o Conselho Tutelar, para garantir os
direitos básicos das crianças, adolescentes
As Oficinas de Formação de Lideranças e familiares.
Educacionais Restaurativas visam apoiar a
equipe gestora da escola em seu esforço de
inserir no cotidiano das unidades escolares 4.3.1. Objetivos
a inovação educacional representada pelos
Círculos Restaurativos, espaços de reso- ►►Por meio de 10 oficinas de quatro horas
lução de conflitos regidos por princípios cada, realizadas mensalmente no espaço
de horizontalidade, respeito mútuo, não das escolas, intercaladas por períodos de
julgamento, diálogo e trabalho em rede. aplicação e experimentação de propostas
4.5. Descrição
mútuas e bullying, podem contribuir para,
em pouco tempo, mudar para melhor o
ambiente da escola.
de práticas e
As chamadas Horas de Trabalho Pedagógico dinâmicas da
Coletivo (HTPCs) podem ser usadas para,
entre outros temas pertinentes ao aperfei- formação de
liderança
çoamento da aprendizagem, debater-se com
os professores a mudança de paradigma
embutida no Projeto Justiça e Educação e
para convidá-los a implementar práticas 4.5.1. Conhecendo os
educacionais restaurativas. O conceito de
se utilizar as HTPCs em um processo de participantes e como
formação/aperfeiçoamento continuado da vêem a escola
equipe docente pode ser novo para alguns.
Em muitas escolas esse tempo é usado yy Distribua a cada participante uma folha
de forma burocrática e não conectada ao com a cópia do Raio X da escola.
desenvolvimento do trabalho coletivo. yy Depois que preencherem individualmen-
As normas de colaboração profissional te, em duplas ou trios, compartilham as
(Garmstom & Wellman, 2000) foram apre- informações.
sentadas e exercitadas no decorrer das
oficinas, para que os participantes pudes-
sem compartilhá-las e exercitá-las com sua
equipe de professores durante as HTPCs e
em momentos informais.
. .............................................................................................................................................
. .............................................................................................................................................
. .............................................................................................................................................
. .............................................................................................................................................
6. Se a minha escola fosse um ser do reino animal ou vegetal, ela seria um/a . .......................
. .............................................................................................................................................
Em seguida, a responsável pela Oficina sintetiza e discute com o grupo as percepções sobre
as escolas onde atuam. Exemplo de parte do quadro resultante:
O símbolo da
A maioria dos
Uma minoria acredita O ponto forte da O ponto fraco escola poderia
profs. acredita
que... escola é... da escola é... ser... (reino animal
que...
ou vegetal)
Eu me senti:
Na sala de aula:
seguro ( ) não muito seguro ( ) inseguro ( ) muito inseguro ( )
Na escola:
seguro ( ) não muito seguro ( ) inseguro ( ) muito inseguro ( )
Esse mês:
Mexeram comigo e ou me intimidaram:
nunca ( ) algumas vezes ( ) muitas vezes ( ) todo o tempo ( )
Me xingaram e ou ameaçaram:
nunca ( ) algumas vezes ( ) muitas vezes ( ) todo o tempo ( )
.................................................................................................................................................
Pertencimento
Ações Educacionais APOIO
(relacionamento, interação)
Ações de Ensino
Sentir-se Competente DESAFIO
(Instrucionais)
►►Solicita-se aos participantes que, em pequenos grupos, respondam à questão: até que ponto
a forma como a escola “pensa” a disciplina dos alunos contribui para que eles possam ver
satisfeitas suas necessidades de pertencimento, competência e autonomia?
Um exemplo:
4.5.4. Possibilitando aos yy As respostas do grupo foram: amor / solida-
riedade; tolerância; transparência; responsa-
alunos a construção das bilidade; respeito; liberdade / autonomia.
129 “As regras estão no Normas de Convivência129, yy Cada grupo apresenta um cartaz com a
sisitema disciplinar. As
normas de convivência à luz dos valores sua escolha.
estão na cabeça e no
coração de todos”. “Confli-
restaurativos
to nas escolas: modo de
transformar”, op. cit. As estrelas
yy Essa atividade poderá ser conduzida, em yy Pede-se aos participantes que, individual-
cada classe, por um Professor-referência, mente, desenhem uma estrela. No centro
em um período especialmente dedicado da estrela, em seguida, escrevam nomes
ao objetivo de envolver os alunos nas de pessoas que fizeram ou fazem diferença
decisões sobre Normas e valores, e teria na vida deles, como exemplos ou modelos
os seguintes passos. de conduta. Em seguida, em cada ponta da
yy Criar com os alunos, em cada classe, uma estrela escrevem um valor ou princípio
Visão da escola que desejam, seguindo associado a essa pessoa.
os mesmos passos da atividade proposta yy As estrela são colocadas no centro da sala e
à p. 175. todos podem ver os trabalhos de todos.
yy Assim como os professores precisam yy Em pequenos grupos, definem os valores
sonhar a escola que querem, os alunos que são considerados mais importantes
também devem sonhar sua escola e sua para melhorar a convivência e a aprendi-
sala de aula. Assim, podem cooperar no zagem na escola.
sentido de melhorá-las.Podem trabalhar yy Em seguida, definem três normas que
em equipe. devem ser seguidas por todos ao tratar
yy Fazer com os alunos o levantamento dos uns com os outros e que expressem seus
valores/ princípios restaurativos. próprios valores mais importantes.
yy Apresentação do representante de cada
grupo. Negociação e ajustes.
Coerência: a disciplina vale A disciplina dos alunos reflete a disciplina profissional dos
para todos professores e lideranças educacionais da escola.
yy Valores e princípios
Se os professores chegam atrasados, os alunos também irão
chegar. Se o diretor trata os professores e funcionários de
forma ríspida, eles vão fazer o mesmo com os alunos.
>>
organizacionais
sinergia entre materiais e procedimentos. Os
diretores de São Caetano do Sul,por exemplo,
participavam de um Curso sobre Gestão que
A realização das Oficinas para Lideranças poderia dialogar com as Oficinas de Forma-
Educacionais demanda a mobilização de re- ção de Lideranças Restaurativas.
cursos materiais, humanos e administrativos.
Os recursos materiais são os mesmos necessá- yy Valorização e disponibilização do tempo
rios à capacitação de Facilitadores de Práticas do gestor, na escola, para atividades de
Restaurativas, além de papel, disponibilidade desenvolvimento profissional e de reflexão
de xerox para reprodução de folhas tarefa e sobre a prática restaurativa com a equipe
outros materiais de escritório. professores: a) o tempo das HTPCs deve ser
utilizado para atividades formativas; b) as
Medidas político administrativas da Diretoria de convocações dos gestores para reuniões e
Ensino e demais órgãos da Secretaria de Estado eventos, de caráter formativo ou informativo,
de Educação podem fazer com que a formação devem deixar tempo para reflexão e para
dos gestores tenha maior impacto na criação de reinterpretação/incorporação das informa-
uma cultura restaurativa nas escolas: ções recebidas; c) possibilitar a priorização,
yy Elaboração de um calendário anual das pelas escolas, dos projetos a serem desenvol-
Oficinas de Formação, publicado em vidos – atuar em muitos projetos ao mesmo
Diário Oficial, num esforço conjunto de tempo, sem a necessária articulação entre
todos os órgãos, e que seja respeitado, sem eles, produz nas gestoras ansiedade, com
convocações de última hora. uma sensação de sobrecarga e de que estão
fazendo tudo de maneira superficial.
yy Alinhamento entre todos os processos for-
mativos de gestores implementados durante yy Elaboração de medidas para valorização
o ano, com encontros dos diferentes capaci- dos educadores envolvidos na operação de
tadores de gestores atuando na Secretaria de círculos restaurativos escolares.
Conclusão 185
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