Há proteínas que apresentam a extraordinária capacidade de catalisar
reações químicas. Elas recebem o nome de enzimas. Sua descoberta foi data do século dezoito, quando se iniciaram os estudos sobre digestão dos alimentos. Na década de 1850, Louis Pasteur descobriu que a fermentação alcoólica era feita por um microrganismo e estabeleceu o conceito de que as enzimas fossem células vivas; esse ponto de vista, chamado de vitalismo, prevaleceu por décadas. Em 1897, Eduard Buchner conseguiu preparar um extrato de levedo de cerveja, que apesar de não conter células intactas ainda transformava glicose em álcool. Demonstrou-se, portanto que as enzimas, como as demais proteínas, originária das células, atuavam independentemente da célula intacta e viva (RAW, 1967). À medida que as noções vitalistas da vida eram desaprovadas, o isolamento de novas enzimas e a investigação das suas propriedades avançaram a ciências da bioquímica (LEHNINGER, 2006). O isolamento e a cristalização da uréase por James Summer em 1926 forneceram um grande avanço aos estudos iniciais das enzimas. Sumner descobriu que cristais de uréase consistiam inteiramente de proteínas e postulou que todas as enzimas fossem proteínas. Na ausência de outros exemplos, essa idéia permaneceu controversa por algum tempo. Apenas em 1930 a conclusão de Sumner foi amplamente aceita, depois que John Northrop e Moses Kunitz cristalizaram a pepsina, tripsina e outras enzimas digestivas e descobriram que elas também eram proteínas. Durante esse período, J.B.S. Haldane escreveu um trabalho intitulado Enzimas. Embora a natureza molecular das enzimas ainda não fosse inteiramente apreciada, Haldane fez sugestões admiráveis que as interações das ligações fracas entre as enzimas e seu substrato poderiam ser usadas para catalisar uma reação. Essa idéia está no âmago do nosso entendimento atual da catálise enzimática (LEHNINGER, 2006). As enzimas são notáveis dispositivos moleculares, que determinam o perfil de transformações químicas. Além disso, as ações de muitas enzimas são reguladoras. Suas características mais impressionantes são os seus poderes catalíticos e a sua especificidade. Pela utilização de um repertório completo de forças intermoleculares, as enzimas aproximam substratos a uma orientação ótima, o prelúdio do fazer e quebrar ligações químicas. Em essência, elas catalisam reações pela estabilização dos estados de transição das espécies químicas de maior nível de energia, nos caminhos das reações. Fazendo isso seletivamente, uma enzima determina qual das várias reações químicas potenciais realmente ocorrem. As enzimas podem também agir como interruptores moleculares, na regulação da atividade catalítica e na transformação de energia, por causa da sua capacidade de acoplar as ações de centros de ligação separados (STRYER, 1996). A manutenção da vida celular depende da contínua ocorrência de um conjunto de reações químicas, que devem atender duas exigências fundamentais: precisam ser altamente específicas, de modo a gerar produtos definidos, e devem ocorrer a velocidades adequadas à fisiologia celular – a insuficiência na produção ou na remoção de metabólitos pode levar as condições patológicas. A presença de enzimas dirigindo todas as reações celulares permite a solução simultânea das duas dificuldades. Para se ter uma idéia do papel indispensável das enzimas, basta lembrar que, mesmo reações que tem água como reagente são catalisadas por enzimas. Como catalisadores, as enzimas aumentam de várias ordens de grandeza a velocidade das reações que catalisam e por serem altamente especificas, “selecionam”, entre todas as reações potencialmente possíveis aquelas que efetivamente irão ocorrer (MARZZOCO, 1999). Após os antibióticos, as enzimas são os produtos mais explorados na indústria biotecnologia e há algum tempo, as preparações de enzimas microbianas vêm sendo largamente utilizadas para uma variedade de propósitos na produção de numerosos alimentos. Elas também são utilizadas nas indústrias químicas e farmacêuticas. Reações catalisadas por enzimas utilizando-se células intactas de microorganismos vêm sendo utilizadas ao longo da historia, principalmente na fabricação de cerveja, vinhos e panificações. Todos os processos de fermentação, inclusive de alimentos fermentados, são manifestações de reações enzimáticas. As enzimas isoladas têm sido utilizadas há mais de 50 anos no preparo de rações de animais e outras aplicações industriais. Muitas das enzimas obtidas de vários tipos de microorganismos podem ter um uso comercial. Por isso devem ser separadas das células que as produzem e purificadas. Em qualquer caso, a enzima deverá purificar-se o mínimo necessário para eliminar as atividades que produzem interferências porque, em alguns casos, como as determinações analíticas, é necessário utilizar altos níveis de purificação. Atualmente comercializam-se em todo o mundo de 1500 toneladas de enzimas por ano, correspondente a um mercado estimado em mais de US$ 2 bilhões. Sendo que mais de ¾ deste valor é constituído somente por quatro enzimas: protease bacteriana usadas em detergentes, a gluco-amilase, a- amilase bacteriana e a glucose-isomerase, utilizada na industrialização de xaropes de glucose e frutose da partir do amido. A obtenção de enzimas comerciais pode ser feita a partir de fontes animais, vegetais e microbianas. Sua produção pode ser aumentada pela transferência genética para um microrganismo hospedeiro. Esses microrganismos geneticamente modificados podem então, ser cultivados sob as melhores condições. Desde a última parte do século XX, a pesquisa sobre enzimas tem sido intensa. Ela levou à purificação de milhares de enzimas, à elucidação da estrutura e do mecanismo químico de muitas delas, a fabricação e o entendimento geral de como as enzimas trabalham (LEHNINGER, 2006).