Professional Documents
Culture Documents
•
Professor do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba e presidente da Comissão
de Direitos Humanos da mesma universidade.
1
V. Cezar Roberto BITENCOURT, Falência da Pena de Prisão, Saraiva, 2001;
2
Michel FOUCAULT, Sobre a Prisão IN: Microfísica do Poder, Graal, p. 131-132, 2000;
3
V. Site na internet:www.conjunturacriminal.com.br
4
V. Constituição da República Federativa do Brasil, art. 3º, incisos I ao IV;
2
O paradigma que ora vai ser apresentado exige uma interpretação do direito
penal enquanto garantia (própria do direito penal mínimo)6. Nesse sentido, para
este modelo, o direito penal trata-se de uma garantia contra o arbítrio estatal e sua
função política7 sobrepuja qualquer outro fim pretendido com o direito penal. A
função política do direito penal guarda um intenso compromisso com a 1ª Geração
de Direitos do Homem, as declarações de direitos individuais, referindo-se a idéia
de limitar o poder de punir do Estado. Logo, o paradigma de jurisdição
penitenciária, que iremos expor, tem por fundamento maior oferecer mecanismos
que buscam limitar o poder de punir do Estado.
5
V. Constituição da República Federativa do Brasil, art.1º, inciso III;
6
V. Luigi FERRAJOLI, Direito e Razão: teoria do garantismo penal, Revista dos Tribunais, 2002;
7
Cláudio BRANDÃO, Introdução ao Direito Penal: análise do sistema penal a luz do princípio da
legalidade, Forense, p. 43 e segs., 2002
8
V. Janaina Conceição PASCHOAL, Constituição, criminalização e direito penal mínimo, Revista dos
Tribunais, 2003; V. tb. Vera Regina Pereira de ANDRADE, Sistema Penal Máximo X Cidadania
Mínima: códigos da violência na era da globalização, Livraria do Advogado, 2003;
9
Luiz LUISI, Os princípios constitucionais penais, SAFE, p.30-32, 2003;
10
J.J. Gomes CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almendina, p. 327, 2002;
11
Francesco PALAZZO, Valores Constitucionais e Direito Penal, SAFE, p. 43 e segs., 1989;
3
12
Andrei Zenkner SCHMIDT, A Crise de Legalidade na Execução Penal IN: Crítica à Execução Penal:
doutrina, jurisprudência e projetos legislativos, Lumen Juris, p. 50, 2002;
13
Noam CHOMSKY, A Minoria Próspera e a Multidão Inquieta, Editora UNB, 1999;
14
Ana MESSUTI, O tempo como pena. Trad. Tadeu Antonio Dix Silva & Maria Clara Veronesi de
Toledo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 19-50;
4
15
apud Ana MESSUTI, Ib idem, p. 50;
16
Michel FOUCAULT, Vigiar e Punir: história da violência nas prisões, Vozes, p. 117 e segs. 1999;
17
Michel FOUCAULT, Sobre a Prisão IN: Microfísica do Poder, Graal, p.129-144, 2000;
18
Cezar Roberto BITENCOURT, Falência da Pena de Prisão, Saraiva, p. 11-14;
19
Edmundo OLIVEIRA, Política Criminal e Alternativas à Prisão, Forense, p. 05, 2001;
20
Cezar Roberto BITENCOURT, Falência da Pena de Prisão, p. 57-80.
5
21
Michel FOUCAULT, Vigiar e Punir, Vozes, p. 201, 1999;
22
Michel FOUCAULT, Vigiar e Punir, Vozes, p. 200, 1999;
23
V. Anabela Miranda RODRIGUES, Novo Olhar sobre a Questão Penitenciária, Revista dos Tribunais,
2001;
6
24
Antonio García-Pablos de MOLINA, Criminologia, Revista dos Tribunais, p.190, 2002; V. tb. César
LOMBROSO, O Homem Delinqüente, 2001;
25
Franz von LISZT, La Idea del Fin en el Derecho Penal, Editorial Comares, p. 80-91, 199, 1995;
26
Ib Idem, p. 85-87
27
Cezar Roberto BITENCOURT, Falência da Pena de Prisão, Saraiva, p. 82-88, 2001;
7
4. Os Modelos de Ressocialização
28
Antonio García-Pablos de MOLINA, Criminologia, Revista dos Tribunais, p. 467, 2002;
29
Antonio Garcíaz-Pablos MOLINA, Criminologia, Revista dos Tribunais, p. 474-475, 2002;
30
Salo de CARVALHO, Pena e Garantias: uma leitura de Luigi Ferrajoli no Brasil, Lumen Juris, p. 202 –
207, 2001;
31
Salo de CARVALHO, Pena e Garantias: uma leitura de Luigi Ferrajoli no Brasil, Lumen Juris, p. 195,
2001;
8
Neste modelo, o juiz não volta sua atenção para o controle do perfil pessoal
do apenado (este programa vinculado a um paradigma mínimo nega a utilização de
um direito penal de autor e a necessidade de reforma moral do apenado), mas sim
9
32
Salo de CARVALHO, Pena e Garantia: uma leitura de Luigi Ferrajoli no Brasil, Lumen Juris , p. 193 e
segs, 2002;
33
Andrei Zenkner SCHMIDT, A Crise da Legalidade na Execução Penal IN: Crítica à Execução Penal:
doutrina, jurisprudência e projetos legislativos, Lumen Juris, p. 68-69, 2002
34
Sobre os efeitos do art. 118, I da LEP diante da nova ordem constitucional, observe julgamento nº
295.047.534 da 4ª Câmara Criminal do TJRS IN: Crítica à Execução Penal: doutrina, jurisprudência e
projetos legislativos, p. 698-699, 2002;
35
Ricardo Brito de Albuquerque FREITAS, As Razões do Positivismo Penal no Brasil, Lumen Juris, 173
e segs., 2002;
11
Penal brasileiro e da LEP, não foram recepcionadas pela Constituição, uma vez
que não atendem ao critério do direito penal de fato, fundamento do processo
acusatório, da ampla defesa e do contraditório, característica essencial do princípio
constitucional do devido processo legal. Nesse sentido, o juiz deve ainda agir
sobre a máxima de dê-me o fato, que eu lhe darei o direito, se não há fato (fato
futuro não é ainda fato), não existe fundamento para repressão penal, pelo
contrário, prevalece o princípio da liberdade individual que é constitucionalmente
intangível na ausência do fundamento de fato. Por fim, este modelo de análise
exige, simplesmente, que o juiz da execução penal constitucionalize a LEP e não,
como faz na maioria dos casos, ordinarize a constituição36, desrespeitando,
abusivamente, o princípio da supremacia constitucional.
36
Andrei Zenkner SCHMIDT, A Crise de Legalidade na Execução Penal IN: Crítica à Execução Penal:
doutrina, jurisprudência e projetos legislativos, Lumen Juris, p. 76, n.53, 2002;
12
submeter alguém a todas as mazelas do cárcere que são por demais ofensivas a
dignidade da pessoa humana.
37
Esta drástica redução somente deve operar-se em sede de apuração de falta disciplinar. No tocante ao
requerimento de direito público subjetivo do réu, a ampliação dos atores faz-se necessária, podendo
qualquer dos atores administrativos, familiares e até mesmo qualquer do povo, intervir e reivindicar
direitos para os apenados, sem restrições para legitimidade destes requerimentos em virtude da condição
peculiar do preso que permite a criação de um microsistema jurídico de defesa do seu direito bastante
amplo e favorável.
38
Muitos contestam a existência de um Processo de Execução Criminal autônomo, em virtude da
oficialidade do ato pelo qual o juiz determina o lugar de cumprimento da pena. Entretanto, hoje em dia,
até mesmo este início de forma oficial vem sendo contestado, além de que, especialmente nas faltas
disciplinares, persevera o princípio da presunção de inocência, pois se trata de um fato completamente
novo, garantindo-se a ampla defesa e o contraditório. Obviamente, diante das repercussões trazidas pelas
faltas graves, algumas redundando em modificação substancial da pena por uma mais intensa do que a
que está originariamente prevista no Código Penal, ou até mesmo um acréscimo na quantidade de pena a
ser cumprida superior a de alguns delitos, não há como se negar, sob um parâmetro garantista, a
necessidade de reinterpretação constitucional do processo de execução penal que passa a seguir os
trâmites normais previstos para o devido processo legal em matéria penal, ou seja, o modelo acusatório,
impedindo-se a oficialidade do juiz, necessitando da apreciação do órgão ministerial para o
processamento.
13
Por fim, vale lembrar que o princípio do Estado Social é limitado pelo
princípio democrático do Estado de Direito. Assim, o argumento de segurança, que
é próprio do Estado Social (presente nos relatórios das comissões de classificação
e nas avaliações médicas e sociais da execução), nunca poderá determinar a
supressão ou a não concretização de um direito individual, previsto na constituição
de forma concreta. Nem mesmo a título de juízo de proporcionalidade, tendo em
vista que o valor administrativo de segurança não é um juízo concreto, mas uma
prognose abstrata (médica, sociológica ou administrativa), pode-se afastar, de
14
6. Considerações Finais
39
Andrei Zenkner SCHMIDT, A Crise da Legalidade na Execução Penal IN: Crítica à Execução Penal:
doutrina, jurisprudência e projetos legislativos, Lumen Juris, p. 90, 2002;
40
Salo de CARVALHO, Pena e Garantias: Uma leitura de Luigi Ferrajoli no Brasil, Lumen Juris, p. 207,
2001;
15
41
Gizlener NEDER, Nota Introdutória IN:Georg RUSCHE & Otto KIRCHEIMER, Punição e Estrutura
Social, Editora Revan, p.14, 2004;
16
A banalidade do mal foi o tema discutido por Hanna Arendt em seu livro
Eichmann em Jerusalém43.Tomara que as autoridades brasileiras se dêem conta da
banalização do mal reproduzida nos carceres, antes de, como Eichmann, carrasco
nazista, terem que prestar contas às suas vítimas perante um tribunal constituído
por elas. Na obra Eichmann em Jerusalém, Hannah Arendt revela o quanto a
incapacidade de reflexão, ou seja a incapacidade de construir fora dos parâmetros
legais e burocráticos desenvolvidos pelo Estado, no caso o Estado totalitário
Nazista, pode provocar imensas tragédias humanas. Eichmann foi condenado a
morte, porém é aterrador observar que, mesmo diante de um tribunal formado por
judeus, em Jerusalém, ele demonstrava não compreender os motivos pelos quais
estava sendo julgado, ainda que diante dos relatos das vítimas de suas ações. Para
ele, tudo o que tinha que havia feito durante a guerra era legal e legitimo, pois
estava cumprindo ordens validas e, tratando-se de um funcionario exemplar do
Estado Alemao, exerceu seu papel de servidor do Estado, cumprindo a lei e ordens
legítimas do regime vigente e, portanto, tudo que havia feito encontrava-se
perfeitamente justificado. No Brasil atual, é exatamente isto que implica a crise do
Sistema Penitenciário, tendo em vista que fundamentando-se numa interpretação
ordinária da lei, sem observar a preservação de valores constitucionais inalienáveis
e convenções internacionais de direitos humanos, os operadores do direito mantêm
pessoas detidas em péssimas condições e dão ordens que violam a dignidade da
pessoa humana, argumentando estas decisões com base numa abstrata e intangível
idéia de segurança. A incapacidade para pensar pode tornar homens comuns e
aparentemente inofensivos em cruéis personagens da história. Ocorreu com
Eichmann, que por ausência de uma reflexão ética não se comoveu diante da
42
Georg RUSCHE & Otto KIRCHEIMER, Punição e Estrutura Social, Editora Revan, p. 43-58, 2004;
43
Hannah ARENDT, Eichmann em Jerusalém: Um relato sobre a banalidade do mal, Companhia das
Letras, 1999;
17
tragédia de suas vítimas e ocorre ainda hoje na crise pela qual passa o Sistema
Penitenciário brasileiro e mundial, juízes, promotores e diretores de
estabelecimentos penitenciários não se comovem diante da tragédia da vida dos
presos, porque não conseguem pensar suas decisões conforme o paradigma do
Estado Democrático de Direito e continuam utilizando-se do hobbesiano e
autoritário modelo do Estado Segurança. Na crise penitenciaria, no encontramos,
mais uma vez, diante da banalidade do mal.
7. Referências Bibliográficas
MESSUTI, Ana. O Tempo Como Pena. Trad. Tadeu Antonio Dix Silva e Maria
Clara Veronesi de Toledo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003;