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br
Índice
Í
10 No meio
15 Cartum
Marco Jacobsen

16 Construção
Casa bonita, sem estresse nem remorso

30 Água
Uma arca para a seca?

Reciclagem
Resíduos 20 34 Preservação
Mão amiga e mais verde

Uma usina para o lixo 36 Música


Boas vibrações

44 11 Atitudes -Empresas
Regeneração que rende capital

50 11 Atitudes - Governo
Particularmente conservadas

62 Entrevista
Gustavo Fruet

66 Web
Ciberativismo verde

70 Política
Resíduos Destinação certa

Sucata 24 74 Carros
A hora da conversão
Quando as máquinas morrem
76 Clima
Pode acontecer com qualquer um

80 Consumo
Garrafas mais amigáveis

84 Tecnologia

87 Coluna
Delson Amador

88 Velho Ambiente

11 Atitudes 90 Da Redação
OngS 38
Cuidado, você está sendo seduzido
54 CApa Cidades Sustentáveis

Em busca de cidades sustentáveis, poder público,


iniciativa privada e organizações têm dado
importantes passos para reverter os danos ao
planeta e conquistar a dignidade integral do ser
humano. Um grande negócio para a indústria
de soluções limpas e inteligentes, uma grande
oportunidade para a evolução de novos conceitos
políticos, mas ainda falta o mais importante: a
participação massiva da população, que deve
conhecer para saber cobrar e ajudar a construir uma
cidade melhor pra se viver.

A foto que aparece na capa desta edição mos-


tra a Praça do Japão, em Curitiba. A capital pa-
ranaense e outras, como Florianópolis, Vitória,
Brasília e até mesmo São Paulo, trazem muitas
vantagens a seus habitantes, mas nem por isso
podem ser chamadas de sustentáveis. No en-
tanto, se nossas cidades somarem experiên-
cias, muito pode se avançar neste caminho.

Brasília: a capital federal foi inteiramente projetada, mas não é exatamente o que se pode chamar de cidade sustentável.

Desenvolvimento com equilíbrio


7 Março/2011
Editorial
E
Uma publicação da Novo Ambiente Editora e Produtora Ltda.
CNPJ/MF.: 12.011.957/0001-12

H
Rua Professor João Doetzer, 280 - Jardim das Américas - 81540-190 - Curitiba/PR
Tel/Fax: (41) 3044-0202 - atendimento@revistanovoambiente.com.br
revistanovoambiente.com.br á pouco mais de 10 mil anos, a humanidade
Ano 01 - Edição 10 - Março/2011 - Distribuição dirigida e a assinantes
desenvolveu técnicas agrícolas que permiti-
ram abandonar a vida nômade e fixar-se nas
Impressão - Posigraf A tiragem desta edição de 30 mil exemplares
Tiragem - 30 mil exemplares é comprovada pela BDO Auditores Independentes. primeiras cidades de que se tem notícia.
Diretoria-Geral
Dagoberto Rupp
De lá para cá, muita coisa mudou, em especial no que
dagoberto@revistanovoambiente.com.br tange às concentrações humanas em espaço urbano.
RELAÇões de mercado financeiro
João Rodrigo Bilhan Jaqueline Karatchuk O Brasil, tão jovem em relação às nações do velho
rodrigo@revistanovoambiente.com.br jaqueline@revistanovoambiente.com.br
ADMINISTRATIVo continente, viveu no último século um processo céle-
Paula Santos
paula@revistanovoambiente.com.br
Mônica Cardoso
monica@revistanovoambiente.com.br
re de migração do campo para a cidade. Com isto, viu
comercial (DEC) nascer suas primeiras metrópoles e os problemas ine-
Paulo Roberto Luz
paulo@revistanovoambiente.com.br
João Augusto Marassi
joao@revistanovoambiente.com.br rentes às grandes urbes.
João Claudio Rupp Rodrigo Nardon
joaoclaudio@revistanovoambiente.com.br nardon@revistanovoambiente.com.br A Revista Novo Ambiente, ciente de que é na cidade
conselho editorial que vivemos e nelas estão nossas ansiedades e sonhos,
Dagoberto Rupp João Claudio Rupp
dagoberto@revistanovoambiente.com.br joaoclaudio@revistanovoambiente.com.br mantém mensalmente a discussão sobre os avanços e a
João Rodrigo Bilhan
rodrigo@revistanovoambiente.com.br
João Augusto Marassi
joao@revistanovoambiente.com.br falta deles, nestes espaços de convívio coletivo.
Carlos Marassi Fábio Eduardo C. de Abreu
marassi@revistanovoambiente.com.br fabio@revistanovoambiente.com.br Nesta edição, as questões relativas a uma cada vez
Paulo Roberto Luz
paulo@revistanovoambiente.com.br
Edemar Gregorio
edemar@revistanovoambiente.com.br
mais inevitável nova revolução urbana ganharam profun-
didade e viraram tema de capa.
Auditoria e controller - Marilene Velasco Projeto gráfico - Rafael de Azevedo Chueire
mara@revistanovoambiente.com.br rafael@revistanovoambiente.com.br Será possível reorganizarmos nossas cidades, alinhan-
editor-Chefe - Edemar Gregorio revisão - Karina Dias Occaso
edemar@revistanovoambiente.com.br karina@revistanovoambiente.com.br do-as a conceitos modernos de sustentabilidade?
Central de Jornalismo Nossos profissionais foram ao asfalto das metrópoles,
Carlos Marassi
marassi@revistanovoambiente.com.br
Estanis Neto
estanis@revistanovoambiente.com.br subiram os morros e suas ocupações irregulares, olharam
Fernando Beker Ronque
fernando@revistanovoambiente.com.br
Marcelo Ferrari
ferrari@revistanovoambiente.com.br
as aprazíveis mas nem sempre equilibradas cidades do
Davi Etelvino Oberti Pimentel interior e revelaram algumas desilusões e outras esperan-
davi@revistanovoambiente.com.br oberti@revistanovoambiente.com.br
Leandro Dvorak Uirá Lopes Fernandes ças da vida em sociedade.
leandro@revistanovoambiente.com.br uira@revistanovoambiente.com.br
Paulo Negreiros Dagoberto Rupp Filho O tema, por complexo, estará em nossas edições fu-
negreiros@revistanovoambiente.com.br dagoberto.filho@revistanovoambiente.com.br
Leonardo Pepi Santos Carolina Gregorio turas com o detalhamento de cada um dos mais relevan-
leo@revistanovoambiente.com.br
Leonilson Carvalho Gomes
carol@revistanovoambiente.com.br
tes itens que compõem as pré-condições para a esperada
leonilson@revistanovoambiente.com.br nova era das cidades. Nesta edição, muito mais que apon-
atendimento e assinaturas
tar caminhos, a missão é induzir nossos leitores à reflexão
Mari Iaciuk Raquel Coutinho Kaseker
mari@revistanovoambiente.com.br raquel@revistanovoambiente.com.br sobre temas que dizem imediato respeito a ele. Com cer-
ILUSTRAÇÕES
Marco Jacobsen
Webdesign
Fernando Beker Ronque
teza, não voltaremos à vida nômade de nossos antepas-
marcojabsen@revistanovoambiente.com.br fernando@revistanovoambiente.com.br sados; porém, para continuar vivendo em aglomerados
logística urbanos, teremos de repensar nossa presença neles e
Juliano Grosco
juliano@revistanovoambiente.com.br buscar formas de harmonizar nosso convívio com o meio
Juvino Grosco Ricardo Adriano da Silva
jgrosco@revistanovoambiente.com.br ricardo@revistanovoambiente.com.br ambiente, do qual não podemos prescindir.
Marcelo C. de Almeida Tiago Casagrande Ramos
marcelo@revistanovoambiente.com.br tiago@revistanovoambiente.com.br
Alexsandro Hekavei Aélcio Luiz de Oliveira Filho
alex@revistanovoambiente.com.br aelcio.filho@revistanovoambiente.com.br Boa leitura!
Bem-Estar
Clau Chastalo Maria Telma da C. Lima
clau@revistanovoambiente.com.br telma@revistanovoambiente.com.br
Ana Cristina Karpovicz
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Paulo Fausto Rupp
paulofausto@revistanovoambiente.com.br
Central de Jornalismo
Maria C. K. de Oliveira Janete Ramos da Silva
maria@revistanovoambiente.com.br janete@revistanovoambiente.com.br

FSC
Desenvolvimento com equilíbrio
9 Março/2011
Artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da Revista, sendo de total responsabilidade do autor.
A Hora do Planeta
Existe uma grande torcida para que o Brasil fique às escuras
por uma hora na noite do dia 26 de março. Felizmente não é
mais um apagão, mas sim uma forma melhor de ver o mun-
do – e contraditoriamente mais clara –, chamando a aten-
ção não apenas para a energia, mas principalmente para as
questões ambientais. A Hora do Planeta, que começa a par-
tir das 20h30, é uma iniciativa da ONG WWF e ocorreu pela
primeira vez em 2007, em Sidney (Austrália), mobilizando
seus moradores. No ano seguinte, já eram 35 países. O Coli-
seu (Roma), a Sidney Opera House (Sidney) e a Golden Gate
(São Francisco) foram alguns dos ícones globais que tiveram
suas luzes desligadas. Em 2009 foi a vez de o Brasil entrar na
mobilização. Em 2010, todos os países do G20, assim como
outras 105 nações, apagaram suas luzes na Hora do Planeta.
Monumentos como Cristo Redentor, Congresso Nacional,
Teatro Amazonas, Ponte Estaiada, Torre Eiffel, London Eye,
Fontana de Trevi e Empire State foram alguns dos 1.383 íco-
nes que ficaram no escuro por 60 minutos.

No meio
Transgênicos crescem em todo o planeta
Sementes transgênicas estão em 148 milhões de hectares plan- Veja os dez maiores produtores de culturas
tados por mais de 15 milhões de produtores ao redor do mundo. geneticamente modificadas:
O relatório anual do Serviço Internacional para a Aquisição de
1 EUA (66,8 milhões de ha)
Aplicações em Agrobiotecnologia (Isaaa, na sigla em inglês), di-
vulgado no fim de fevereiro, aponta para um crescimento, em 2 Brasil (25,4 milhões de ha)
2010, de 10% em relação ao ano anterior. Em área plantada, o 3 Argentina (22,9 milhões de ha)
Brasil é o que mais cresceu: 19%.
4 Índia (9,4 milhões de ha)
5 Canadá (8,8 milhões de ha)
6 China (3,5 milhões de ha)
7 Paraguai (2,6 milhões de ha)
8 Paquistão (2,4 milhões de ha)
9 África do Sul (2,2 milhões de ha)
10 Uruguai (1,1 milhão de ha)
Commodities nada verdes
O Instituto Brasileiro de Economia Aplicada (Ipea) está lan- pode ter impactos como o deslocamento de populações
çando um importante conjunto de estudos sobre os eixos de rurais, redução de terra para produção de alimentos, uso
desenvolvimento brasileiro. No volume sobre biodiversida- intenso de agrotóxicos que contaminam o solo e em con-
de, Jorge Hargrave, um dos autores da pesquisa, aponta que sequência contaminam a água”, explica Hargrave. Ele disse
as commodities (como soja) para exportação geram impac- ainda que falta no Brasil uma cultura que leve em conta as
tos negativos ao meio ambiente ao usar de forma intensiva questões relativas ao meio ambiente na gestão pública.
diversos recursos naturais: “Na produção de cana-de-açúcar, Para os gestores, as questões ambientais são vistas como
de soja, há uma grande utilização de parcelas do solo que um entrave ao desenvolvimento.

Enfim: sistema nacional


de alerta de desastres
Foi preciso um prefeito do interior do Rio de Janeiro, mais
precisamente de Areal, durante a tragédia na Região Ser-
rana, mostrar que muitas vidas podem ser salvas com um
simples alerta. O país então despertou para o cúmulo de
seu despreparo: a falta de um sistema nacional que pudes-
se mobilizar populações em caso de catástrofes. No dia 25
de fevereiro, o Ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio
Mercadante, anunciou o início do funcionamento do siste-
ma nacional de alerta de desastres ainda neste inverno. O
caráter experimental do sistema nada mais é do que a inte-
gração de sistemas de monitoramento do clima já existen-
tes no Brasil, como os radares da Aeronáutica, do Instituto
Nacional de Meteorologia (Inmet) e do Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (Inpe). Só então o governo avaliará
quais equipamentos serão comprados para complementar
o sistema. A mobilização das cidades ficará por conta do
Sistema Nacional de Defesa Civil, que poderá fazer uso de
sirenes. O núcleo do sistema atuará 24 horas em uma sala
de operações e será formado por uma equipe de quatro
profissionais: um meteorologista, um especialista em de-
sastres naturais, um hidrólogo e um geólogo. Para compor
os turnos, serão necessárias 30 pessoas.

Desenvolvimento com equilíbrio


11 Março/2011
Indústrias e mudanças climáticas
A tendência de um mercado cada vez mais exigente quan-
to à preservação ambiental levou a Confederação Nacional
da Indústria (CNI) a trazer uma série de orientações, prin-
cipalmente a respeito de mudanças climáticas. As orienta-
ções, apresentadas sob o título “Estratégias Corporativas
de Baixo Carbono: Gestão de Riscos e Oportunidades”,
evidenciam passos e fases que as indústrias devem seguir,
como o alerta sobre a necessidade de um diagnóstico para
mensurar as emissões dos gases de efeito estufa (GEE), o
modo como perceber e avaliar os riscos para a empresa e
a forma como identificar as oportunidades de crescimento
empresarial.

Resultados do horário de verão


O resultado do horário de verão deste ano foi considerado
“altamente positivo” pelo governo. O Brasil economi-
zou 2.376 megawatts. De acordo com o Operador
Nacional do Sistema (ONS), o horário de verão, que
vigorou de 17 de outubro a 20 de fevereiro, resultou
em uma redução de 4,4% na demanda de energia no ho-
rário de pico, nas regiões onde o sistema foi adotado. No
ano passado, a diminuição foi de 4,7% nas regiões Sudes-
te e Centro-Oeste e de 4,8%, na região Sul. A economia da
geração térmica evitada com a adoção do horário de verão foi
estimada em R$ 30 milhões.

5 bilhões de embalagens
A Tetra Pak anuncia o marco de 5 bilhões de embalagens produzidas no
Brasil com o selo de certificação da Forest Stewardship Council (FSC) em
2010. O selo garante que o papel utilizado como matéria-prima das
embalagens seja proveniente de áreas florestais que seguem rigoro-
sos padrões de gerenciamento quanto aos aspectos sociais e am-
bientais e outras fontes controladas. A empresa também criou
o site Rota da Reciclagem (www.rotadareciclagem.com.br), um
mecanismo muito útil onde você digita seu endereço e, quase que
instantaneamente, aparecem todas as opções de cooperativas ou
comércios de materiais recicláveis no entorno. Aparecem também
postos voluntários de recebimento de materiais recicláveis. Vale a pena
dar uma olhada, você vai se surpreender com a quantidade de locais como
esses mais perto do que imagina.
No meio
Guia: aves do Pantanal e Cerrado
O guia “Aves do Brasil: Pantanal e Cerrado” é o primeiro de uma série de cinco volumes que abordam as aves de todos os
biomas brasileiros, permitindo sua identificação. A publicação ajuda a preencher uma grande lacuna catalográfica sobre a
fauna brasileira. Em tempos de valorização da biodiversidade no discurso internacional, o Brasil mal faz o dever de casa e o
inventário sobre nossas espécies é muito precário. O guia, uma parceria entre a Wildlife Conservation Society (WCS) e a edito-
ra Horizonte, será lançado na livraria FNAC-Pinheiros, na cidade de São Paulo, dia 22 de março, dia às 19h. O primeiro volume
da série apresenta 740 espécies de aves do Pantanal e do Cerrado, entre nomes bastante conhecidos, como a ema e a arara-
-azul-grande, e espécies ainda pouco conhecidas pelos cientistas, como o belo pica-pau-do-parnaíba e o raríssimo tiê-bicudo.
A maioria das descrições é acompanhada de ilustrações precisas feitas por renomados artistas especializados em aves, como
Guy Tudor, o maior ilustrador de aves sul-americanas. São 322 páginas com mais de 1.000 ilustrações. Valem as penas!

R$ 1,4 bilhão para turbinas eólicas


A Bioenergy, uma das pioneiras no Brasil na geração de eletrici-
dade a partir da força dos ventos, acaba de fechar contrato com
a GE para adquirir 18 turbinas eólicas ainda em 2011, 36 em
2012 e uma opção de compra de até 250 para 2013. Os equipa-
mentos serão utilizados em projetos comercializados nos leilões
de 2009 e 2010, assim como na primeira venda de energia eólica
no mercado livre brasileiro, cerca de 100 megawatts (MW) mé-
dios arrematados pela Cemig em dezembro de 2009.
A empresa conta com empreendimentos de R$ 1,7 bilhão em
energia eólica somente no Rio Grande do Norte. No total, a em-
presa soma projetos de mais de 1.400 MW. No último leilão de
energia de reserva, a Bioenergy cadastrou 16 projetos de usinas
eólicas, que perfazem aproximadamente 514,8 MW.
No meio
Nova Comissão de Meio Ambiente

Giovani Cherini (PDT-RS) é o novo Presidente da Co- peuta holístico e escritor de autoajuda, surpreenda justa-
missão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável mente pelo seu carisma nas negociações.
da Câmara dos Deputados. Apesar de não constar como tal Por ser a mais numerosa bancada suprapartidária, a
na lista do Departamento Intersindical de Assessoria Par- vitória dos ruralistas em temas como a aprovação do novo
lamentar (Diap), Cherini, agrônomo de formação, é consi- Código Florestal parece certa, diante de uma pequena re-
derado ruralista, assim como Oziel Oliveira (PDT-BA), o 1o sistência ambientalista que não pode lhes fazer frente, ao
Vice-Presidente. menos no Congresso Nacional. Tanto que o Deputado Sar-
Como Deputado Estadual, cargo que exerceu por 16 ney Filho (PV-MA), indicação dos verdes, terá que se con-
anos, Cherini conseguiu a aprovação de leis ambientais de tentar em presidir a Comissão em 2012, presumindo que
alguma expressão mas de baixa prioridade. Ele estará no se cumpram os acordos informais com o PDT de se ter uma
centro de um grande debate nacional, que anteverá quais espécie de rodízio de presidentes. Quando os verdes esti-
consequências o novo Código Florestal, proposto pelo De- verem no comando, e se estiverem, assuntos como o novo
putado Federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), terá para o país. A Código já estarão com seus destinos selados, já que se pre-
torcida é para que Cherini, tecnólogo cooperativista, tera- vê uma aprovação definitiva ainda este ano.

• Proporção de ruralistas
na Câmara dos Deputados
em um universo de
513deputados
Veja quem faz parte da Comissão de Meio Am-
biente e Desenvolvimento Sustentável da Câ-
mara dos Deputados (gestão 2011).

Giovani Cherini (PDT-RS)* - Presidente


Oziel Oliveira (PDT-BA)* - 1º Vice-Presidente
Cláudio Cajado (DEM-BA)

140 ruralistas Irajá Abreu (DEM-TO)*


Sarney Filho (PV-MA)
Penna (PV-SP)
Leonardo Monteiro (PT-MG)

• Número de ruralistas por partido


Márcio Macêdo (PT-MG)
Marina Santanna (PT-GO)
Zé Geraldo (PT-PA)
Valdir Colatto (PMDB-SC)
PMDB 36 PTB 10 Nelson Marchesan Jr. (PSDB-RS)*
Ricardo Trípoli (PSDB-SP)
DEM 24 PDT 9 Rebecca Garcia (PP-AM)

PP 24 PPS 6 Toninho Pinheiro (PP-MG)


Augusto Carvalho (PPS-DF)
PSDB 22 PSC 5 Estefano Aguiar (PSC-MG)

PR 15 Outros 8
Jorge Pinheiro (PRB-GO)

* Classificados como Ruralistas pelo Departamento


Dados do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

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Março/2011 14
15Desenvolvimento com equilíbrio
Março/2011
Ilustração: Revista Novo Ambiente/Marco Jacobsen
CONSTRUÇÃO Wood Frame

Casa bonita,
sem estresse
nem remorso
Nós conhecemos bem as casas em wood frame, mas só pela tela da TV ou
do cinema americano. Utilizada por sociedades evoluídas na praticidade e
sustentabilidade arquitetônica, a técnica já ensaiou flertes com o mercado
brasileiro, mas ainda não caiu nas graças do grande público. Agora ela
chega ao país mais forte do que nunca. É inteligente, aconchegante,
estilosa. O objetivo dos projetos é o bem-estar, tendo a sustentabilidade
como princípio.

V
iver bem é continuar em uma espécie de A tecnologia é utilizada em nove entre cada dez
sonho bom mesmo depois que se acorda. casas canadenses e em dois terços das construções
Para isso, fundamental é não ter estresse dos Estados Unidos, país em que a prática de
para construir seu pequeno Olimpo nem consciên- erguer casas de forma modular e utilizando
cia pesada com os impactos que isso causou. Vá lá, placas de madeira já dura mais de um século.
o método construtivo em wood frame seduziu nossa Por aqui, ainda é incipiente, apesar das van-
equipe de reportagem, porque as casas são bonitas, tagens (a começar pela obra em si, o pesa-
trazem grandes vantagens funcionais sobre a cons- delo daqueles que querem construir suas
trução convencional e reduzem em até 90% o núme- próprias moradias).
ro de resíduos gerados durante a obra.
Casa-modelo com fachada deck. Linha Slim – Contemporânea.

Desenvolvimento com equilíbrio


17 Março/2011
A Tecverde é hoje uma referência neste tipo de
projeto e garante a entrega da chave na mão do pro-
prietário em três meses, contando a fase de projetos,
liberação de financiamento, produção das placas e a
própria obra. E sem aqueles remendos provisórios A iluminação natural proporcionada
que acabam virando definitivos, ou aquele problema pelo grande número de janelas e
que o pintor teve com a cunhada do irmão e por isso portas de vidro, somado à instalação
atrasou em mais um mês a conclusão dos trabalhos.
A variedade de tipologias arquitetônicas é infinita, de painéis solares, proporciona
tudo depende da viabilidade técnica e econômica. significativa economia de energia,
A iluminação natural proporcionada pelo grande assim como o isolamento térmico.
número de janelas e portas de vidro, somado à ins-
talação de painéis solares, proporciona significativa
economia de energia, assim como o isolamento tér-
mico. “Em cidades mais frias, como Curitiba, pode-
-se passar o ano todo sem ligar o ar-condicionado, e
quando ligado, atinge rapidamente e mantém a tem-
peratura desejada”, aponta o arquiteto Pedro Mo-
reira, Coordenador de Projetos da Tecverde, que diz
que a economia neste quesito, incluindo sistemas de
calefação, pode chegar a 50%.
Sobre a durabilidade das casas, que, aos olhos do
consumidor brasileiro, acostumado a construções mais
robustas, parece não ser tão grande, Pedro lembra: “Nos
EUA, é comum encontrar casas com mais de 50 e até
100 anos em ótimo estado. O tratamento da madeira
não vence, e todo o projeto é pensado a fim de se evitar
patologias. Os painéis de parede, piso e cobertura são
produzidos em nossa fábrica, o que garante um controle
muito maior da qualidade de nossas casas.”
O desenho da casa é primoroso, com grandes
vãos livres que permitem a ocupação inteligente com
uma ótima sensação espacial. No site da construto-
ra, há um simulador bem interessante e fácil de usar,
para quem quer testar possibilidades, e o custo da
obra se atualiza a cada alteração.

Nos EUA, é comum encontrar


casas com mais de 50 e até
100 anos em ótimo estado. O
tratamento da madeira não vence,
e todo o projeto é pensado a fim
de se evitar patologias. Os painéis
de parede, piso e cobertura são
produzidos em nossa fábrica, o que
garante um controle muito maior
da qualidade de nossas casas.
Pedro Moreira, Coordenador de Projetos da Tecverde

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Março/2011 18
Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes

Menos impacto
A redução de 90% nos resíduos da obra é um alí-
vio tanto para os proprietários, que costumam assu-
mir esse passivo, quanto para a natureza, para a qual
muitos destes transferem o problema. Em miúdos,
nas construções convencionais, toneladas de resídu-
os inaproveitáveis são despejados diariamente nos
lixões, agravando o problema que já é enorme.
Placas de madeira podem não ser exatamente
ecológicas, mas não há dúvidas de que neste caso a na-
tureza ganha bastante. “A madeira utilizada é o pinus
tratado, proveniente de florestas plantadas. O con-
traventamento é feito por chapas de OSB – oriented
strand board –, que é um aglomerado de madeira. O
estudo que temos é de que uma construção em wood
frame emite 80% menos CO2”, conta Moreira. Um dos
motivos para isso é que a própria madeira, que vem
de espécies exóticas como o pinus e o eucalipto, que
não pertencem à nossa mata nativa, uma vez instalada,
mantém o carbono fixado em sua própria estrutura.
Neste caso, as vantagens na emissão de gases causa-
dores do efeito estufa são grandes em relação às cons-
truções convencionais, que utilizam cimento e outros
elementos de grande impacto ambiental.
A técnica em wood frame ainda é incipiente no
Brasil e, embora se aproxime muito de um modelo
sustentável ideal de construção, ainda precisa cair
no gosto do consumidor brasileiro para criar, quem
sabe, uma nova e inteligente forma de “montar” ci-
dades sem desmontar o meio ambiente.

Desenvolvimento com equilíbrio


19 Março/2011
Reciclagem Resíduos

Uma usina
para o lixo
Vem do oeste paulista um exemplo de trata-
mento de lixo urbano e doméstico. Fundada
em 1988 por um engenheiro visionário para
sua época, a única usina de triagem e com-
postagem de lixo doméstico totalmente pri-
vada do Brasil é capaz de processar 10 mil to-
neladas de resíduos por mês.

I
magine criar uma usina. Agora imagine criar
os equipamentos que farão esta usina funcio-
nar. Além de desenhá-los, fabrique-os você
mesmo. Complique um pouco mais e pense também
em uma “linha de produção” para processar um pro-
duto que todos nós descartamos – o lixo – e, após es-
tes desafios, ainda vender parte deste lixo como adu-
bo de alta qualidade, e os materiais que interessam
ao mercado da reciclagem como alumínio, plástico,
papel, metais e vidro.
Se você está se perguntando se isto é possível, a res-
posta está na cidade de São José do Rio Preto, interior de
São Paulo, e é positiva. A Usina de Triagem e Composta-
gem de Lixo Doméstico opera no município e é adminis-
trada pela Constroeste Ambiental, núcleo empresarial
da Constroeste, todas empresas do Grupo Faria.

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 20
Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonardo Pepi

. de São José do Rio Preto onde ocorre a triagem de resíduos sólidos e a compostagem de resíduos orgânicos.
Usina

Desenvolvimento com equilíbrio


21 Março/2011
Os trabalhos da Constroeste Ambiental na região • Para onde vai seu lixo?
vão além da operação da usina. A empresa é respon-
sável pelo gerenciamento dos resíduos sólidos urba-
nos (domiciliares, comerciais, industriais, serviços de
saúde e outros), desde a coleta, o transporte, trata-
mento, destinação e disposição final.
A usina destaca-se por sua inovação e pioneiris-
mo, sendo a única no Brasil inteiramente do setor
privado. “Atendemos não apenas o município, mas
também outros da região”, lembra o Diretor Comer-
cial da área ambiental da Constroeste Ambiental,
Aviemar Reis, idealizador do projeto.
A concepção da usina, o desenho de sua planta,
os equipamentos e os melhoramentos posteriores à
sua implantação foram todos feitos pela própria em-
Pessoa joga
lixo lixo
presa, mostrando que é possível instalar uma unida-
de de triagem e compostagem de lixo com tecnologia no
inteiramente nacional.
“Podemos instalar unidades como esta confor-
me as necessidades locais e regionais. Para uma cida-
de do tamanho de São José do Rio Preto (mais de 400
mil habitantes), implantamos a usina em um espaço
de 60 mil m²”, explica Reis, que recebeu com exclusi-
vidade uma equipe da Revista Novo Ambiente para
percorrer toda a usina.

o caminhão recolhe
e leva até a usina de
triagem

uma parte vira aterro


outra vai para o
adubo sanitário
fardos
outra vira
de recicláveis
revistanovoambiente.com.br
(alumínio, PET, papel, etc.)
Março/2011 22
Adubo e reciclagem
Após a coleta, os caminhões gem, passa por um processo de blica, a prevenção de acidentes am-
entram no pátio da usina e um compostagem. É triturada, em se- bientais por falta de manejo de lixo
novo trabalho começa. O lixo que guida “descansa” em um galpão e a despoluição de mananciais, rios
conhecemos, ensacado em sacos para eliminar umidade e, após eta- e córregos ao se evitar acúmulo de
plásticos, entra em uma complexa pas que incluem peneiras indus- resíduos na área urbana. Qual o va-
rede operacional de triagem, ma- triais, transforma-se em adubo de lor destes benefícios para o meio
nipulada por pessoas e máquinas. alta qualidade. Uma fração desta ambiente e as pessoas?
É feita a separação dos resídu- parte orgânica não aproveitável “Um consórcio entre um gru-
os em fração orgânica e inorgânica, termina em uma área de 52 alquei- po de municípios de determinada
além do tratamento separado dos res da própria Constroeste Am- área pode investir em uma usina
resíduos dos serviços de saúde. biental, um aterro sanitário com para as mesmas finalidades. O ta-
Da orgânica, surge o adubo após vida útil estimada em 40 anos. manho da usina é adaptável às ne-
a compostagem. Da inorgânica, é Segundo a Constroeste Am- cessidades locais, e os ganhos am-
aproveitado material que é vendido biental, o adubo ali gerado foi con- bientais são óbvios. Nossa empre-
para indústrias de reciclagem, como siderado de alta qualidade por estu- sa tem total conhecimento para a
alumínio, metais, papel, papelão, dos de universidades reconhecidas execução e acompanhamento do
plásticos e vidro. pelo setor agrícola. As vendas do projeto, além de fornecer toda a
“Mais de 50% de todo o lixo produto advindo da compostagem tecnologia”, finaliza Aviemar Reis.
é reaproveitado, e o resíduo de crescem a cada ano. Fica aí o exemplo de que existem
melhor aproveitamento é o vi- Os resultados vão além dos ga- soluções para questões complexas
dro, o único material que não tem nhos com o gerenciamento do lixo como os resíduos urbanos, desde
perda, sendo totalmente reapro- diretamente relacionados às ven- que os recursos sejam investidos
veitável na reciclagem”, explica o das para o mercado de reciclagem corretamente, aliados à educação
Diretor Comercial. e de adubo. Não são computados ambiental da população, trabalho
Já a parte orgânica, formada na operação de uma usina como que a empresa também faz no pró-
por restos de alimentos, cascas de esta, que transforma mais de 10 prio espaço da usina, que é aberta
frutas e outros tipos de resíduos mil toneladas de resíduos por mês, a visitação e recebe com frequên-
não reaproveitáveis para recicla- a redução de gastos com saúde pú- cia, grupos escolares.

Podemos instalar unidades como esta


conforme as necessidades locais e
regionais. Para uma cidade do tamanho
de São José do Rio Preto (mais de 400
mil habitantes) implantamos a usina em
um espaço de 60 mil m².
Aviemar Reis, idealizador do projeto

. para resíduos orgânicos.


Aterros
Resíduos Sucata

Quando as
máquinas morrem
revistanovoambiente.com.br
Março/2011 24
Foto: Revista Novo Ambiente/Paulo Negreiros

Elas já foram o sonho de consumo, o ápice da tecnologia embarcada, o


símbolo de uma era de mudanças impetuosas em direção à modernidade.
Corpos de metal outrora orgulhosos, que cortavam o ar, tiveram seus
cromados reluzentes cobertos pela pátina do abandono. O tempo que por
elas era vencido sem piedade cobrou seu preço e seguiu seu interminável
curso, deixando-as à mercê dos cruéis dentes da corrosão. As pequenas
gotas de história que intermitentemente pingam junto com o óleo sujo
das engrenagens emperradas simbolizam o encerramento de um ciclo de
vida. Afinal, a melhor máquina de hoje, um dia, vira sucata.

. fora de uso. Brasília.


Aviões

Desenvolvimento com equilíbrio


25 Março/2011
Sobrevida

A
conteceu com o Concorde (famoso jato Há, no Brasil, um grande mercado de veículos
comercial supersônico franco-inglês) e sinistrados e peças de reposição usadas e/ou recu-
com a maioria das locomotivas a vapor. peradas. Não se trata de obscuros “desmanches”
Aconteceu também com os charmosos bondes elétri- irregulares, nem de “robautos” (aquelas feiras de
cos de várias capitais e continuará acontecendo com rua cheias de peças velhas e de origem duvidosa)
qualquer tipo de transporte que o ser humano inven- espalhados pelo país e mergulhados na ilegalidade,
tar. A sina do modelo mais avançado é ceder o seu lu- mas de comércios legítimos, que geram empregos e
gar na vanguarda para uma nova geração. Mas o que, recolhem impostos. Por isso, e pensando na regula-
afinal de contas, acontece com o trem que saiu de li- ção da atividade de “reciclar” veículos e na adoção
nha, com a aeronave que já foi “canibalizada” – o ter- de melhores práticas que visem inclusive as ques-
mo é meio repugnante, mas faz sentido se pensarmos tões ambientais, o Cesvi (Centro de Experimentação
que ele diz respeito a peças ainda utilizáveis reapro- e Segurança Viária) fomenta projetos de lei como o
veitadas em outros veículos – e principalmente com PL 372/2005, que busca disciplinar a atividade dos
os carros, ônibus e caminhões acidentados, ou sim- desmanches. Vetado integralmente pelo governo fe-
plesmente velhos, que “já deram o que tinham que deral por “contrariar o interesse público”, o projeto
dar”? A reciclagem parece ser a resposta mais óbvia teria, segundo o Cesvi, cinco vertentes principais bas-
para esta pergunta, porém há outras alternativas que tante interessantes (veja quadro).
são empregadas na hora de “dissecar” a obsoleta A carcaça desmontada, livre de todas as peças que
“carcaça” que estava enferrujando sob o tempo. podem voltar à circulação (inspecionadas, testadas, nu-
meradas e certificadas), é aproveitada por empresas
siderúrgicas e fundições como matéria-prima, após a
A reciclagem parece ser a resposta limpeza e triagem dos materiais que a compõem. Com
outros tipos de veículo, não é diferente. Excetuando-se
mais óbvia para esta pergunta, casos em que há entraves legais para o processamen-
porém há outras alternativas que são to, como sucatas que façam parte de massas falidas de
empregadas na hora de “dissecar” empresas, por exemplo, em que há necessidade de uma
decisão judicial para seu desembaraço, o procedimento
a obsoleta “carcaça” que estava adotado pode ser similar. Reside na propriedade do veí-
enferrujando sob o tempo. culo, muitas vezes, a “culpa” pela permanência prolon-
gada em pátios, hangares e estaleiros.

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 26
A permanência das estruturas
remanescentes em espaços
abertos pode se tornar, em
breve, mais do que um assunto
restrito aos círculos econômicos
e ambientais. Pode se tornar
um assunto de saúde pública.

De que material é feito?


Um dos passos importantes para entender como se
dá o processamento de carrocerias, cascos e fuselagens
Depósito de carcaças, é analisar sua composição. Os metais que integram esse
tipo de estrutura são divididos (preparem as apostilas
depósito de mosquitos de química) em duas categorias: ferrosos, basicamen-
te compostos de ferro e aço; e não ferrosos, como as
ligas de cobre, níquel e chumbo. Reaproveitá-los é co-
A permanência das estruturas remanescentes mercialmente interessante, pois este expediente não
em espaços abertos pode se tornar, em breve, mais despende tanta energia quanto a extração da matéria-
do que um assunto restrito aos círculos econômicos -prima bruta e a redução do minério para metal. Saindo
e ambientais. Pode se tornar um assunto de saúde um pouco da “sucata de transportes”, especificamente,
pública, haja vista que, por possuírem “vazios estru- o raciocínio funciona melhor ainda quando se trata do
turais”, cavidades, entre outros recursos próprios do alumínio, pois o Brasil é campeão mundial na recicla-
design para o qual foram concebidas – um carro, um gem das latinhas que são feitas deste material. Na reci-
avião, um navio foram feitos para se movimentar, não clagem geral do metal, o país é o terceiro maior recicla-
ficar parados apodrecendo –, podem facilmente con- dor do mundo. Nesta conta entram, aí sim, os compo-
verter-se em berçários VIP para as larvas do Aedes ae- nentes automotivos do superpossante de 20 anos atrás
gypti, o mosquito transmissor da dengue, que ronda – promovido de relíquia a matéria-prima para os novos
a casa de todos os brasileiros neste começo de ano. sonhos de consumo, de uma nova geração.

Foto: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes


BENEFÍCIOS QUE TRARIA O
PL 372/2005

• Economia
- Movimentação do mercado de consumo formal por
meio da venda de peças reutilizáveis.
- Aumento de empregos na cadeia de reciclagem, já
que a tendência é que novas empresas de reciclagem
se estabeleçam para atender a demanda gerada.
- Aumento na arrecadação de impostos (trabalhistas/
tributários/etc.) com a formalização do setor de des-
montagem de veículo.
- Possibilidade de criação de novos projetos susten-
táveis atrelados a este novo setor formal.

• Trânsito
- Veículos mais seguros, com a melhoria da qualidade
da frota, devido ao acesso a peças com custos reduzi-
dos, principalmente para veículos mais antigos.
- Minimização da poluição do ar, diante da possibili-
dade da manutenção preventiva.
- Diminuição de congestionamentos nos grandes
centros por conta de veículos parados nas vias por
falta de manutenção.
- Redução do número de acidentes envolvendo veí-
culos sem manutenção.

• Saúde
- Mitigação da dengue e outras doenças em regiões
onde há concentração de veículos em pátios.
- Não contaminação do solo próximo a represas, ma-
nanciais e lençóis freáticos.
- Melhor qualidade do ar nos grandes centros.

• Meio ambiente
- Redução da poluição ambiental por meio da remo-
ção e destinação dos componentes que são conside-
rados perigosos, como a bateria e os fluidos, e tam-
bém por meio da neutralização dos componentes
pirotécnicos (airbags e pré-tensores dos cintos de
segurança) e gás refrigerante do ar-condicionado e
líquido de arrefecimento do radiador.
- Respeito às leis ambientais já aprovadas pelo governo.

• Social
- Redução do índice de veículos roubados, com o ob-
jetivo de reduzir criminalidade.
- Empregabilidade, por meio da criação de empregos
formais no setor de desmonte de veículos.

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 28
. abandonado em Paranaguá (PR).
Ônibus

Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes


Água Dia Mundial

Uma arca
para a seca?
No mês do Dia Mundial da Água,
é inevitável refletir sobre a gestão
de um dos mais valiosos serviços
ambientais planetários – a água.
O desequilíbrio ambiental que se
mostra em cheias e estiagens reflete
a urgência de uma abordagem
cuidadosa no consumo e uso de um
bem que é sinônimo de vida.
Q
uando Noé recebeu as instruções divinas
para a construção de uma arca capaz de
salvar a existência da humanidade, ou
pelo menos sua continuidade, e a de todos os seres
vivos da Terra, preparando-se para um dilúvio de
proporções catastróficas, sem querer já nos dava um
importante exemplo de planejamento.
Avisado da fúria divina contra os incessantes pe-
cados humanos, a serem punidos com a extinção da
vida, foi incumbido de salvar uma parcela represen-
tativa desta natureza após um acordo com Deus, que
diplomaticamente optou por poupar o construtor da
arca, considerado o último dos justos.
Visto a possibilidade cataclísmica, após o plano
foi executada a obra. Para além das questões religio-
sas ou científicas que podem ser discutidas acerca do
episódio, o fato é que, desde Noé, nossa relação com
as águas vem sendo um desafio.
O tema pertinente à água hoje está diametral-
mente oposto ao problema do excesso após um di-
lúvio ordenado pelas mãos de Deus. Hoje a escassez
está na ordem do dia.
A situação global do uso e consumo da água é
alertada há tempos pelo Programa das Nações Uni-
das para o Desenvolvimento (PNUD), que defende o
direito fundamental de todo ser humano de dispor
de pelo menos 20 litros de água potável por dia, gra-
tuitos para os mais pobres.
Ainda segundo a Organização das Nações Uni-
das, cada pessoa necessita de 3,3 mil litros de água
por mês (cerca de 110 litros de água por dia) para
atender às necessidades de consumo e higiene.

Desenvolvimento com equilíbrio


31 Março/2011
Consumo Global de

Água
Fonte: PNUD / UNWater

70% Agricultura
(principalmente irrigação)
22% Indústria 8% Uso público

Área irrigada no mundo


(Aproximadamente 280 milhões de hectares)

9% 68%
Europa
Ásia

17% 5%
Américas
África
• 1%
Oceania

Área irrigada no
Brasil 4,5 milhões de hectares Fonte: IBGE / ANA / MMA

Apesar de a agricultura ser responsável pela reti-


rada de cerca de 70% da água de rios e aquíferos
no mundo, somente 18% das áreas cultivadas são
irrigadas, e 40% da produção mundial de alimen-
tos provém de agricultura irrigada.
Fonte: SIEBERT, Stefan; DÖLL, Petra; FEICK, Sebastian; HOOGEVEEN, Jippe; FRENKEN, Karen. Global Map
of Irrigation Areas versão 4.0.1. Universidade Johann Wolfgang Goethe, Frankfurt am Main, Alemanha;
Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Roma, Itália, 2007.

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 32
Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Economizar não é difícil


Exemplos práticos não faltam. A Eletrobrás, 21,2%, o menor do país e próximo do ideal de 20%
maior companhia do setor de energia elétrica da indicado pelo Ministério das Cidades.
América Latina, criou sua própria Política de Recur- “Com os investimentos permanentes em manu-
sos Hídricos com o objetivo de “orientar a utilização tenção, tecnologia, treinamento e substituição de re-
racional dos recursos hídricos no atendimento ao des antigas, queremos ficar abaixo dos 20%”, afirma
mercado de energia e no desenvolvimento das ativi- o Diretor-Presidente da Sanepar, Fernando Ghigno-
dades executadas pelas empresas Eletrobras”. ne. Segundo a companhia, que fornece água para 2,5
Em São Paulo, a Companhia de Saneamento Bá- milhões de imóveis residenciais, comerciais e indus-
sico do Estado de São Paulo (Sabesp) promove, des- triais no Paraná, com ações como acompanhamento
de 2009, o Programa de Uso Racional da Água (Pura). diário das perdas em todos os municípios atendidos,
Desde seu início, foi adotado em escolas, condomí- auditorias semestrais, criação de um programa de
nios, prédios comerciais e instituições de governo, metas e investimento de R$ 6,49 milhões na aquisi-
resultando na economia de mais de 70 milhões de ção de equipamentos de medição e monitoramento,
litros de água por mês. as perdas foram reduzidas, em média, em 60 litros
E no Paraná, a Companhia de Saneamento do diários por ligação de 2005 a 2010.
Paraná (Sanepar), foi eleita, após pesquisa do jor- Exemplos estão à mesa. Resta saber se a grande
nal O Estado de São Paulo, que utilizou dados do “arca” em que vivemos – o planeta Terra – precisará
Sistema Nacional de Informações sobre Saneamen- de outra arca, como a de Noé, para salvar parte de
to (SNIS), a melhor empresa do Brasil no controle sua natureza. Mas, caso isso aconteça, sofremos o
de perdas no abastecimento de água, apresentan- risco de terminar em uma arca encalhada na escas-
do um Índice de Perdas de Faturamento de apenas sez de água ao invés de navegar em um dilúvio.

Desenvolvimento com equilíbrio


33 Março/2011
preservação Exército

Mão amiga
.
e mais verde
O convívio dos homens do Exército nos biomas brasileiros sempre foi pacífico e preservacionista.
Foto: Ascom/EB

A Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P) pretende


criar um Estado de baixo carbono, mais econômico e responsável
quanto à magnitude de seus impactos. Muitos setores do
governo já aderiram voluntariamente ao procedimento e isso vai
fazer uma grande diferença ambiental.

Q
uase 300 mil pessoas são destinadas à de- Ambiente em contar com a parceria do Exército em
fesa da pátria. Elas vigiam, fiscalizam, levam três novas fronteiras da agenda ambiental: a prote-
saúde e apoio aos brasileiros. São as nossas ção das florestas e o acesso aos recursos genéticos,
Forças Armadas. Necessitando um investimento de cer- combatendo a biopirataria; a geração de novos ativos
ca de R$ 400 bilhões até 2030, segundo o plano de rea- financeiros com a implementação da Política Nacional
parelhamento desenvolvido pelo Ministério da Defesa, de Resíduos Sólidos, buscando novos patamares de
as Forças Armadas, embora combalidas, possuem um distribuição de renda e justiça social; bem como a so-
rico e extenso material humano. E seus impactos são in- fisticação de tecnologias de eficiência energética para
discutíveis, tanto na estabilidade geográfica americana formulação de uma estratégia nacional competitiva
quanto nas questões ambientais. Se o Exército brasileiro, que permita ao Brasil, definitivamente, fazer a transi-
por um lado, garantiu, pelo menos em boa parte, a inte- ção para uma economia de baixo carbono.
gridade da Amazônia, por outro, seus 200 mil homens Outros órgãos do governo já aderiram há mais
também geram um passivo preocupante. Se calcular- tempo à adoção de rotinas ambientais de preservação,
mos que cada um desses homens produz meio quilo de como o Ministério Público, principalmente com a capa-
lixo por dia, então teremos cerca de 3 mil toneladas de citação dos gestores para as compras sustentáveis, tema
resíduos por mês, só no Exército. Os números desta pe- que deve ser reforçado na agenda ambiental de 2011.
quena situação são apenas suposições, e possivelmente A Procuradoria Regional da República da 1a Re-
sejam muito superiores a isso. gião, que já aplica o A3P há um ano, vai mais longe
Não apenas para lidar com esse volume de re- e está sempre em busca de soluções sustentáveis.
cursos e resíduos em corporações governamentais, Neste ano, quer construir um minhocário, que ser-
surgiu a Agenda Ambiental na Administração Pública virá como espaço de compostagem do lixo orgânico
(A3P), em 1999, criada pelo governo federal. A ade- produzido na Procuradoria.
são foi lenta no começo, mas nos últimos anos come-
çou a ganhar força.
A entrada do Exército, no início de março, neste O que é a A3P?
pacto de reavaliação das suas operações e de seus
próprios e desnecessários impactos vai trazer resul-
tados expressivos. Tendo metas e objetivos claros de A Agenda Ambiental na Administração Pública
como essas centenas de milhares de homens poderão é coordenada pelo Ministério do Meio Ambien-
agir efetivamente para preservar o meio ambiente, a te e constitui um conjunto de valores socioam-
teoria vira prática vitoriosa mais rápidamente e em bientais que geram ações sustentáveis no am-
escalas significativas. O General de Brigada e Chefe biente do trabalho. Desde a mudança de inves-
de Relações Internacionais e Meio Ambiente Floria- timentos, compras e contratações de serviços
no Peixoto Neto garantiu que, até o final de 2013, as pelo governo até a conscientização e utilização
ações da A3P estarão em plena execução nas 1.226 responsável dos recursos naturais e resíduos ge-
unidades do Exército espalhadas por todo o país. rados, os órgãos buscam apagar suas pegadas
Empolgada com esse poderoso reforço, a Ministra ambientais e melhorar a relação custo-benefí-
do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disse durante a cio de suas operações. No site do Ministério do
assinatura do acordo: “Temos a oportunidade de ser Meio Ambiente, existem detalhados materiais
o primeiro Exército de baixo carbono do Planeta, com- sobre como implantar o A3P e uma boa bibliote-
prometido com as mudanças climáticas mundiais.” A ca com títulos e cases de primeira grandeza.
Ministra declarou a vontade do Ministério do Meio

Desenvolvimento com equilíbrio


35 Março/2011
Música Psicodália

Boas
vibrações

Festival que celebra a natureza e a harmonia entre as pessoas


durante o período de carnaval reuniu 30 bandas e cerca de 4 mil
participantes em uma fazenda no interior de Santa Catarina. Além
de muita música, peças de teatro, mostra de cinema, oficinas e
workshops, a interação entre os participantes, e deles com o meio
ambiente, faz a essência do Festival Psicodália.

revistanovoambiente.com.br Tom Zé em grande performance no Psicodália 2011.


Março/2011 36
Fotos: Revista Novo Ambiente/Estanis Neto

E
les são loucos e cabeludos. Andam descal-
ços, tocam e ouvem música o tempo todo.
Música de qualidade. Para celebrar o car-
naval, escolhem sempre um refúgio junto à natureza.
Neste ano, cerca de 4 mil se reuniram em Rio Negri-
nho, interior de Santa Catarina. Nas edições anterio-
res, outras cidades onde se pode curtir a natureza,
como Morretes, Antonina e Lapa, no Paraná, e Angra
dos Reis, no Rio de Janeiro, também abrigaram o Fes-
tival Psicodália.
Durante o dia, o Palco do Sol recebia variados
estilos, vindos de todos os cantos do Brasil. Mais de
200 grupos já se apresentaram no Festival, cuja pri-
meira edição ocorreu em Angra dos Reis, no ano de
2001. Durante a noite, a festa era na tenda principal,
sempre com grandes nomes da música brasileira. O
mais esperado deste carnaval foi o baiano Antonio
José Santana Martins, o Tom Zé. Em anos anteriores,
bandas como Os Mutantes e Casa das Máquinas dei-
xaram a marca na história do evento.
Os shows aconteciam a qualquer momento, não
só nos palcos, mas também entre o público. A sinto-
nia entre os acampados permitia manifestações cole-
tivas emocionantes. Um simples grito, que começava
em um lugar qualquer da fazenda, corria as barracas
como um tsunami, pura vibração.
A principal preocupação, tanto dos organizado-
res como dos participantes, foi de ter diversão com o
mínimo de interferência no ambiente. Além de sepa-
ração eficiente de lixo, bituqueiras estavam espalha-
das por diversos pontos. Lixo no chão era coisa rara.
Figura carimbada no Psicodália, o músico curitibano
Plá transformou em canção sua história de amor pela
bicicleta. As letras estimulam o uso, como em “Inva-
são das Bicicletas”, que diz: “bicicletas são para gen-
te, o motor quente não poluente. Parem os carros,
diminuam os carros, queremos pedalar em todo lu-
gar. Parem os carros, diminuam o cigarro, queremos
respirar, queremos cantar.”

Na paz
Os tumultos e brigas, que infelizmente ocorrem
nas grandes festas de carnaval, passam bem longe do
Psicodália. Durante os cinco dias do festival, os segu-
ranças tiveram pouco ou nenhum trabalho. Nenhuma
briga foi registrada, nada de tumultos ou desentendi-
mentos. A energia é outra, direcionada para música e
artes. Yoga, meditação, ciências cósmicas, contação de
histórias baixavam a adrenalina injetada pelos shows
musicais e por uma tirolesa de 650 m de comprimento
que cortava a fazenda pelo alto.
atitudes ONGs

Cuidado,
você está sendo
seduzido
O Instituto Akatu é a atitude verde e amarela desta edição
porque trabalha no nível mais profundo de grande parte
dos problemas socioambientais: a consciência sobre o
consumo e os sedutores convites da publicidade. O que
faz o Akatu diferente – e exemplar – é a qualidade de suas
pesquisas e materiais produzidos, o que aumenta em
muito as chances de sucesso perante o desafio de fazer
com que o consumidor entenda seu poder e o impacto
que suas inocentes compras podem causar.

J
á consumimos de tudo. Animais, armas, pedaços
de terra. Vagas no céu e escravos. Jogos e entreteni-
mento. Medicamentos, alimentos e a cada dia mais
soluções para o bem-estar dos nossos. Não é exagero dizer
que o desejo de consumo tirou o homem das cavernas. O
comércio o fez caminhar e espalhar-se pela face do planeta.
Dos princípios da classe burguesa até o neoliberalismo, foi
um pulinho de alguns séculos, os mais prósperos da huma-
nidade, e a força da atividade chega a ser tão grande que
não raramente consumimos o que sequer precisamos ou o
que usamos apenas uma vez na vida.

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 38
Foto: Stock Photo
É um poder sedutor que, em uma definição mais dor. Não bastava dar ‘dicas’ de comportamento. O
popular, nos “empurra goela abaixo” produtos inú- consumidor precisava entender a extensão e a gra-
teis ou que, nocivos como são durante sua produção, vidade da questão com a qual estava lidando. Preci-
não valem os benefícios que carregam dentro de sava conhecer os impactos que suas escolhas de con-
suas embalagens. sumo tinham sobre os outros e, acima de tudo, sobre
A partir de uma atitude em verde e amarelo, o si mesmo. Precisava entender que sua mudança de
Instituto Akatu trabalha em uma esfera mais profun- comportamento tinha um grande peso sobre o pro-
da e por uma perspectiva muito interessante para cesso de construção da sustentabilidade e também
ações de grande escala. Vai ao âmago do proble- se sentir mobilizado a envolver outras pessoas nesse
ma do consumo: a falta de consciência do poder de processo”, conta Hélio Mattar, Diretor-Presidente do
transformação do consumidor. Instituto Akatu pelo Consumo Consciente.

Empoderando o consumidor Atitudes frente ao consumo


“Empoderar”, termo utilizado pela ONG com a Nos últimos anos, o Akatu tem servido como
definição de “dar poder”, é um dos princípios que uma importante base de dados por meio de suas
norteiam as ações do Akatu, partindo do pressupos- pesquisas sobre o consumidor brasileiro, e os resul-
to de que o consumidor tem grande poder de deci- tados mais recentes levaram à edição de “O Con-
são no mercado, fazendo valer uma aliada, conquis- sumidor Brasileiro e a Sustentabilidade: Atitudes
tada a duras penas e muitas vezes esquecida pelo ci- e Comportamentos frente o Consumo Consciente,
dadão comum: a democracia. Na livre escolha como Percepções e Expectativas sobre a Responsabilidade
uma arma legítima, pacífica e poderosa do consumi- Social Empresarial. Pesquisa 2010”, realizada em 12
capitais brasileiras e apresentada em parceria com o
Instituto Ethos no fim do ano passado.
Um dos resultados que mais chamou a atenção é
Foto: Ascom/Akatu
que 56% dos 800 consumidores entrevistados nunca
ouviram falar de sustentabilidade e apenas 16% con-

Não bastava dar ‘dicas’ de


comportamento. O consumidor
precisava entender a extensão
e a gravidade da questão com a
qual estava lidando. Precisava
conhecer os impactos que suas
escolhas de consumo tinham
sobre os outros e, acima de
tudo, sobre si mesmo.

Hélio Mattar, Diretor-Presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente


Ouviu falar mas
• Grau de conhecimento não sabe definir
do termo Sustentabilidade
9% •

Não ouviu falar Definição correta


• 56% 16% •


19% Definição errada

seguiram dar a definição correta. A análise mais ób- lidar com a grande crise econômica também acaba-
via destes e de outros números é de que há muito o ram por desencadear a voracidade no consumo.
que se fazer para dar um “upgrade” de pensamento Uma das campanhas da Akatu que mais chamaram
na população nacional. Nas esferas mais altas do po- a atenção da imprensa, acabando por colocar definitiva-
der brasileiro, muitas decisões importantes estão em mente o Instituto entre os mais respeitados do país, foi a
andamento sobre um assunto do qual mais da meta- “1/3 de tudo que você compra vai direto para o lixo”, que
de da população sequer ouviu falar. alertava o consumidor para a problemática do desperdí-
A pesquisa, quando comparada a outra publica- cio de alimentos. A forma clara de apresentar os núme-
da em 2006, evidencia pontos favoráveis, mas o que ros tornou-se incisiva e decisiva para a adesão da grande
se destaca mesmo é o fenômeno da “festa do consu- mídia e de parceiros de porte, mas para gerar uma trans-
mo” com o crescimento da classe C e o aumento de formação em grande escala como esta ainda há muito
renda da população. O acesso ao crédito e medidas caminho pela frente. A população brasileira parece res-
de cortes de impostos do governo como forma de ponder ainda de forma lenta aos apelos sustentáveis.

Classe social Escolaridade


100% • Perfil dos consumidores
90% pela compreensão
24% do significado de
34%
80% Sustentabilidade
70% 57%
60% 74%
50% Classe A/B

40% 76% Classe C/D


66%
30%
Universitário
20% 43%
10% 26% Ensino Fundamental
ou Médio
0%
Sabe o Não sabe o Sabe o Não sabe o
significado significado significado significado

Desenvolvimento com equilíbrio


41 Março/2011
Mais é menos
A atual campanha do Instituto pelo consumo
consciente, “Mais é menos”, foi lançada no Dia Mun-
dial sem Carro do ano passado e é uma pequena obra-
-prima pela simplicidade, beleza e eficiência em comu-
nicar um conceito tão estranho a tantos. Em uma das
peças publicitárias, uma árvore aparece “esvaziada”
ao lado de um prédio inflado às suas custas.
A série de animação Consciente Coletivo, parceria
entre o Akatu, a HP Brasil e o Canal Futura, é uma das
três finalistas à medalha de ouro na categoria Progra-
ma Animado do Festival Internacional de TV e Cinema
de Nova Iorque 2011. “Por meio de um exemplo con-
creto, o consumidor será levado a refletir sobre como
suas escolhas de consumo interferem no cotidiano de
sua cidade”, comenta Hélio Mattar.

Missão do Instituto Akatu:

“Mobilizar as pessoas para o uso


do poder transformador dos seus
atos de consumo consciente como
instrumento de construção da
sustentabilidade da vida no planeta.”

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 42
Atitudes Empresas
Ilustração: Revista Novo Ambiente/Marco Jacobsen

Regeneração
que rende capital
A Vale Fertilizantes é uma das
primeiras a conquistar créditos
de carbono por meio do
Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo (MDL), implantado em
suas unidades de Cubatão. Isso
significa que a empresa deixou
de jogar na atmosfera mais de
40 toneladas de óxido nitroso,
um gás centenas de vezes mais
nocivo à camada de ozônio que
o carbono. A Vale Empresa é um
dos símbolos da regeneração
de Cubatão, um dos mais bem-
-sucedidos casos de recuperação
ambiental da história mundial.

Desenvolvimento com equilíbrio


45 Março/2011
O
Vale da Morte. Era assim que Cubatão, de alternativas mais limpas de produção e geração
cidade da Baixada Santista, era conhe- de energia. Hoje, indústrias do polo começam a co-
cida na década de 1980. Isso por causa lher frutos econômicos das suas iniciativas, como é
dos terríveis níveis de poluição advindos de um dos o caso do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
maiores polos industriais do país, que, entre outras (MDL), acrescentando o pilar que faltava na susten-
coisas, produzia a temida chuva ácida, causando tabilidade dos métodos ambientais. A Vale Fertilizan-
danos irreparáveis à saúde da população local e de- tes é a primeira a conquistar créditos de carbono por
generando boa parte da Mata Atlântica no entorno. meio do MDL e, por isso, a Revista Novo Ambiente
Em 1983, a ONU havia declarado a cidade como o escolheu a indústria para representar a atitude em
pior lugar do mundo para se viver. As 23 grandes in- verde e amarelo no setor privado desta edição.
dústrias ali instaladas lançavam 30 mil toneladas de
poluentes na atmosfera por mês. Isso em uma área
muito concentrada, que incluía uma vila de 4 mil mo-
radores, quase todos com graves problemas respi- Quanto Vale?
ratórios. Lenda urbana ou não, os recorrentes casos
de crianças nascidas sem cérebro naquela localidade
eram atribuídos à poluição impiedosa. Se o dióxido de carbono (CO2) é ruim para a cama-
Podia ser pior? Sim, se a cobrança rígida do go- da de ozônio, o óxido nitroso (N2O) é 310 vezes pior.
verno do estado de São Paulo e a resposta das indús- Após dois anos de implantação do projeto de Meca-
trias não tivessem acontecido. Mas a mudança ocor- nismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), a Vale Fer-
reu de uma maneira tão radical que nem o jogador tilizantes conseguiu reduzir em 80% a emissão deste
mais ousado apostaria sequer uma de suas fichas gás altamente nocivo quando liberado na atmosfera,
no fato de que Cubatão, menos de 10 anos depois um dos principais causadores do efeito estufa. A medi-
da sentença da ONU, ganharia, justamente desta ção foi feita nas unidades de produção de ácido nítrico
organização, o status de cidade símbolo da ecologia de dois de seus complexos industriais em Cubatão e
e exemplo de recuperação ambiental. Atualmente, rendeu 13.663 créditos de carbono (CER – Certificado
Cubatão emite menos de 1% de poluentes na atmos-
fera em relação ao que era produizdo na década de
1980). Além disso, grandes áreas de mata aparente-
mente irrecuperáveis voltaram a abrigar vida animal,
e muitas e muitas novas árvores estão em pleno de-
senvolvimento. Os investimentos da indústria foram
pesados em equipamentos como filtros e na adoção

O projeto permite à companhia


comercializar créditos de carbono
no mercado internacional – o que,
além de gerar recursos para a
empresa, favorece efetivamente
o meio ambiente, contribuindo
de forma mais ampla para o
desenvolvimento sustentável.
Foto: Ascom/Vale Fertilizantes

Sérgio Ribeiro, gerente de produção de nitrogenados do Complexo


Industrial de Piaçaguera e coordenador do projeto MDL

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Março/2011 46
de Redução de Emissões), os primeiros deste braço da
maior empresa em valor de mercado do Brasil.
Os créditos de carbono são certificados emitidos
para empresas ambientalmente responsáveis que
conseguiram reduzir a emissão de gases do efeito es-
tufa no meio ambiente. Um CER corresponde à redu-
ção de 1 tonelada equivalente de CO2. A redução da
emissão de N2O convertida em carbono equivalente
ao CO2 corresponde, para cada tonelada de N2O re-
movida, a 310 toneladas de CO2.
Ricardo Prado Santos, engenheiro especialis-
ta em processos nitrogenados da Vale Fertilizantes,
explica que para a redução de emissão de N2O “foi
necessária a instalação de um catalisador secundário
que tem a função de quebrar as moléculas de N2O,
considerado um GEE (gás do efeito estufa), em mo-
léculas de oxigênio e nitrogênio, gases não poluentes
encontrados em grandes quantidades na atmosfera”.
“O projeto permite à companhia comercializar
créditos de carbono no mercado internacional – o
que, além de gerar recursos para a empresa, favore-
ce efetivamente o meio ambiente, contribuindo de
forma mais ampla para o desenvolvimento sustentá-
vel”, acrescenta Sérgio Ribeiro, Gerente de Produção
de Nitrogenados do Complexo Industrial de Piaça-
guera e Coordenador do projeto MDL.

Mercado carbônico
Os créditos de carbono foram uma solução ado-
tada durante as negociações do Protocolo de Quioto
para estimular boas práticas ambientais nas empre-
sas e também uma primeira forma de quantificar, em
cifrões, o valor dos serviços ambientais que mantêm
a estabilidade da atmosfera.
Quem libera os créditos é a United Nations Fra-
mework Convention on Climate Change (UNFCCC),
após monitoramento dos dados das empresas, análi-
se de periódicos e auditoria de órgãos internacionais.
O mercado brasileiro é o que provavelmente possui
maior potencial no planeta, pela riqueza de seus re-
cursos naturais; no entanto, a atividade ainda é mui-
to incipiente. Existe a negociação privada de CREs, na
qual geralmente o Brasil é um gerador de certifica-
dos, e empresas estrangeiras comprometidas com
as metas de redução de Quioto são as compradoras
para atingir tais objetivos.

Desenvolvimento com equilíbrio


47 Março/2011
Existe o temor de que
o mercado de carbono Cada tonelada de carbono (CO2)

=
pode vir a ser como uma evitada na atmosfera equivale a
“licença para poluir”, já que
uma empresa situada na
China, por exemplo, poderá
1 carbono
crédito de

comprar créditos no Brasil,


o que favoreceria nosso Cada crédito de carbono custa
entre R$ 10 e R$ 12, segundo o
país, mas não o entorno da último leilão promovido pela
empresa em questão. Bovespa, em abril de 2010.

A BM&Bovespa disponibiliza uma plataforma Não existem, tampouco, orientações específicas so-
para leilões de créditos para operações específicas, bre a matéria por parte das autoridades competen-
porém falta apoio e instrumentalização legal para tes brasileiras, seja nos atos normativos expedidos
regular o mercado de carbono. No Brasil, existe uma pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB),
única Lei, a de n.o 12.187/09, que institui a Política seja nos organismos responsáveis pela uniformiza-
Nacional sobre Mudança no Clima, a qual propõe ção das práticas contábeis nacionais.”
o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões, que Existe o temor de que o mercado de carbono
dará condições para a negociação de CERs mas ain- pode vir a ser como uma “licença para poluir”, já que
da não foi efetivamente implantada. Outros quatro uma empresa situada na China, por exemplo, pode-
projetos tramitam no Congresso Nacional tratando rá comprar créditos no Brasil, o que favoreceria nos-
de diversos aspectos deste mercado. No documento so país, mas não o entorno da empresa em questão.
“Regulação dos Ativos Ambientais no Brasil”, coorde- Mesmo assim, existem poucas dúvidas de que ele vai
nado pelo BM&Bovespa e o Banco Mundial e desen- prosperar como uma das melhores soluções globais
volvido pelo escritório de Direito Leoni Siqueira Ad- encontradas até aqui. O valor de mercado de cada cré-
vogados, seus autores* apontam: dito, no entanto, ainda é indefinido, o que gera certa
“A legislação brasileira não estabelece regras es- resistência de investimentos pesados em sua geração/
pecíficas relativas à tributação e à contabilização da compra. Uma tonelada evitada de carbono na atmos-
geração e à comercialização de créditos de carbono, fera pode valer entre R$ 10 (como no leilão realizado
logo o tratamento aplicável a tais operações deve pela BM&Bovespa em abril do ano passado) e R$ 60
ser determinado a partir das normas gerais em vigor. (valor a que chega nos EUA e na Europa).

Cada tonelada óxido nitroso


(N2O) O valor de mercado de

=
cada crédito, no entanto,
ainda é indefinido, o que
gera certa resistência de
investimentos pesados em
sua geração/compra.

*Autores do estudo “Regulação dos Ativos


evitada na atmosfera equivale a
310 carbono
créditos de Ambientais no Brasil”: Antônio Mello e Souza,
Flavio Leoni Siqueira, Hermano Notaroberto
Barbosa, João Paulo Ferraz Vasconcellos, João
Ventura, Leonardo Ciuff o e Priscila Carvalho.

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Março/2011 48
Atitudes Governo

cular mente
Par ti as
preser vad

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Março/2011 50
Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Vem mais uma vez de São Paulo uma atitude em verde e amarelo
digna de destaque em nossa série especial de reportagens sobre
ações positivas por um desenvolvimento com equilíbrio do setor
público. Juntas, atitudes como o projeto Mina d´Água, recém-
lançado pelo governo paulista, e a ampliação do número de
Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) no estado
podem representar novo sopro de esperança na preservação do
precioso e cada vez mais escasso líquido.
A
o fazer valer a Lei Federal nº 9.985/2000, Já o Secretário de Estado do Meio Ambiente,
que criou o Sistema Nacional de Unida- Bruno Covas, também presente ao ato, foi ainda
des de Conservação (SNUC) e que prevê a mais incisivo: “Esta é uma forma de garantir que da-
certificação de RPPNs (Reservas Particulares do Pa- qui a muitos e muitos anos, talvez até centenas de
trimônio Natural), o governo do estado de São Paulo anos, tenhamos em uma área particular as condições
oficializou o papel de protagonismo que cada um de ideais para assegurar a continuidade da biodiversida-
nós “pessoas físicas”, comuns, filhos de Deus temos de do estado de São Paulo”, declarou. E afirmou ain-
na preservação dos recursos naturais. da: “Nosso compromisso à frente da Secretaria é dar
Por falar em pessoa física, tem pouco mais de 3,5 vazão a este trabalho e ampliá-lo. Iremos inclusive
km2 a maior RPPN do estado mantida por apenas um buscar as condições para a remuneração por serviços
cidadão, em São José dos Campos. Ao todo, o estado ambientais dentro do escopo das RPPNs paulistas”,
já dispõe de 4,7 milhões de hectares de área protegi- pontuou.
da. A Revista Novo Ambiente esteve presente à ceri- Representando um parceiro importante do esta-
mônia de oficialização de quatro destas reservas, que do nesta empreitada, o Diretor do WWF-Brasil, Clau-
somam, sozinhas, quase 1.400 hectares. Duas ficam dio Maretti, apontou ainda outra vantagem apresen-
em Bertioga e uma em Amparo, além da já menciona- tada por esta ação: “É uma forma inteligente de ma-
da em São José dos Campos. pear o sistema estadual de preservação, de levantar
Presente à solenidade, o Governador Geraldo informações a respeito das características dos biomas,
Alckmin ressaltou a importância desta oficialização: sua importância e estágio em que se encontram. E não
“Elas (as RPPNs) são uma grande conquista. São parte se trata apenas das áreas reconhecidas pelo estado de
dos deveres do estado de educar, fiscalizar e incenti- São Paulo, como também das que são reconhecidas
var, para que possamos ser mais efetivos na preserva- pelo governo federal, o que colabora para que tenha-
ção ambiental, do patrimônio natural de São Paulo.” mos um panorama abrangente”, disse.
Com a criação destas quatro novas áreas, • O Projeto Mina d´Água
São Paulo Investimento inicial (projeto piloto)
passa a contar com 59 RPPNs, totalizando R$ 3,15 milhões
18.130,63 hectares. Previsão de convênios
21 municípios
Brotas Previsão de nascentes protegidas
Colina 150 por município = 3.150 nascentes
Eldorado
Guapiara
Guararapes Em processo de firmar parceria:
Já assinaram Ibiúna
convênio: São Bento do Sapucaí Bertioga
Novo Horizonte Itapecerica da Serra
Santa Fé do Sul Santa Rosa do Viterbo
Assis São João da Boa Vista
Cristais Paulista Ubatuba
Garça
Monteiro Lobato
Piracaia
Fonte: SMA/Governo SP Regente Feijó

Mina d’Água
Parte constituinte deste esforço e não menos do valor a ser ordenado é definido de acordo com o
importante foi o lançamento, no mesmo evento do custo de oportunidade da região, o grau de proteção
Projeto Mina d’Água, que remunerará os produtores da nascente e sua relevância para o manancial.
rurais paulistas visando a proteção das nascentes Logo no lançamento do projeto, foram firmados
existentes nas propriedades. oito convênios totalizando 16 municípios, sendo que
A intenção é conciliar o incentivo à preservação na fase piloto serão firmadas parcerias com 21 deles.
com a geração de renda e, de quebra, mostrar van- Também já se encontram em adiantado processo as
guardismo ao adotar uma das mais modernas e atu- inclusões de mais cinco cidades.
ais concepções de enfoque ambiental da atualidade: Além da preservação ambiental das minas
a do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), práti- d´água, nascentes e, consequentemente, dos ma-
ca em franca ascensão e em voga nos discursos legiti- nanciais, há um aspecto econômico relevante a ser
mamente “verdes” mundo afora. considerado em tal remuneração advinda de um PSA
O projeto Mina d’Água pretende ser uma forma com estas características.
eficiente de estimular a proteção das nascentes de Os pagamentos aos proprietários das áreas con-
mananciais de abastecimento público, conciliando templadas poderão significar um aumento de ren-
atividades de preservação com geração de renda da geral para as economias locais. Diferentemente
principalmente no meio rural. O governo do estado dos centros urbanos, que são equipados com infra-
reservou R$ 3,15 milhões para a fase piloto do proje- estrutura e serviços variados, as áreas rurais e seus
to. A previsão é de que 150 nascentes sejam protegi- habitantes são muito mais sensíveis à entrada de
das por município, totalizando 3.150 localidades. recursos, sobretudo financeiros. Pequenas quan-
Por meio de convênios firmados com os municí- tias podem resultar em grandes avanços no campo
pios, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente capa- em termos de novos serviços, pequenos comércios,
citará técnicos municipais e viabilizará o apoio neces- produtividade agrícola e integração social. Adicional-
sário para o planejamento e monitoração dos projetos mente, estabelece-se a saudável mentalidade do PSA
que vierem a ser desenvolvidos. Tanto a assistência – a ideia de que preservar “dá dinheiro” é sempre um
técnica quanto o acompanhamento das ações in loco bom começo, um passo inicial para uma educação
serão de responsabilidade dos municípios. O cálculo ambiental legítima e consciente.

Desenvolvimento com equilíbrio


53 Março/2011
capa Cidades Sustentáveis

Sustentópolis
Em busca de cidades sustentáveis, poder público, iniciativa
privada e organizações têm dado importantes passos para
reverter os danos ao planeta e conquistar a dignidade
integral do ser humano. Um grande negócio para a
indústria de soluções limpas e inteligentes, uma grande
oportunidade para a evolução de novos conceitos políticos,
mas ainda falta o mais importante: a participação massiva
da população, que deve conhecer para saber cobrar e
ajudar a construir uma cidade melhor pra se viver.

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Março/2011 54
. Botânico em Curitiba.
Jardim
Foto: Revista Novo Ambiente/Estanis Neto

É
difícil dizer se estamos na Era das Catástrofes mundo, mas, até por seu próprio sucesso econômico e
Naturais e Humanas ou na era mais ilumina- estrutural, acabou absorvendo uma quantidade enor-
da de toda nossa história, na qual encontra- me de pessoas de outras partes mais pobres do país
mos, cada vez mais rápido, grandes soluções, que têm que vislumbravam a vida que a capital paranaense pro-
visivelmente melhorado a qualidade de vida da popula- metia. Milhares acabaram inflando bolsões de miséria
ção mundial de forma expressiva. Porém, o mundo está em torno de uma cidade onde ricos de todo o Brasil têm
mais do que convencido de que deve haver uma grande investido pesado, sob um mercado imobiliário cada vez
guinada, quase desesperada, em direção a um porto se- mais inflacionado, para usufruir os serviços que a bela
guro que garanta sua própria sobrevivência. O mar está capital oferece. Isso nos mostra que não é possível sus-
mais para tsunami do que para peixe, e o céu está mais tentar um país apenas com ilhas de bonança. O desen-
pra tempestade do que para brigadeiro. E os recursos volvimento precisa atingir cidades de todos os portes,
que mantêm uma cidade podem sumir da noite para distribuir-se regionalmente, ocupar geograficamente.
o dia, como aconteceu no Japão, uma potência econô- O crescimento demográfico curitibano foi grande
mica que agora se vê novamente diante do mais antigo nos últimos anos, a exemplo de todas as capitais, e o
mal coletivo: a fome. Estado parece não ter agilidade para acompanhar este
As cúpulas governamentais de boa parte do pla- crescimento, nem tampouco de atender a todas essas
neta se debruçam diante de possíveis soluções para os pessoas. O meio ambiente recebe como prêmio toda
problemas que afligem as cidades: insegurança, polui- a carga residual da ocupação desordenada. Curitiba
ção, desemprego, fome, congestionamento, ansiedade pode ser a cidade mais próxima do conceito de susten-
e outras doenças urbanas. O Fórum Urbano Mundial tabilidade, o que não significa que ela esteja perto de
da ONU, realizado na cidade do Rio de Janeiro no ano atingir esta excelência. Não. Não existem cidades sus-
passado, apresentou documentos com os quais os paí- tentáveis, mas existem exemplos geniais que devem
ses membros se comprometeram – mas não precisava ser seguidos, e exemplos de incompetência que não
muito para ver que boa parte deles, como o Brasil, sabia podem ser esquecidos.
que não poderia cumprir as intenções declaradas, pois a
grandeza da ideia da organização está a milhares de qui-
lômetros da realidade, e da possibilidade do que fazer Deslizando pela urbe
com ela. Então, banaliza-se o conteúdo.
Sob o genial título de A insustentável leveza do
ser, Milan Kundera, romancista tcheco, brinca que O desenho de uma cidade tem papel fundamental
uma pessoa sem amarras ou compromissos pode ser na qualidade de vida das pessoas; a forma de se loco-
insustentável, pois é necessário colocar os pés no chão mover dentro desse desenho também. Mas transpor-
para poder afirmar que se tem controle sobre si. tar massas, milhões de passageiros todos os dias para
lá e para cá não é fácil. Vivemos de modelos de trans-
portes públicos esgotados pela incrível demanda que
A sustentabilidade recai sobre eles. Por isso mesmo, o conceito de qua-
dras e edifícios onde se mora, estuda e trabalha ganha
que gera injustiça cada vez mais corpo na nova arquitetura sustentável.
Até lá, o número de carros continuará crescen-
do à proporção que o ganho médio do brasileiro
No Fórum Urbano, foi apresentado um relatório aumenta, e urbanistas de todo o Brasil já se deram
socioeconômico que apontou que, entre as 20 cidades conta de que não há rua que chegue e que abrir mais
mais desiguais do planeta, cinco são brasileiras: Goiâ- avenidas não resolve problemas. O foco contínuo no
nia, Belo Horizonte, Fortaleza, Brasília e, surpreenden- transporte individual por carro não leva a outra coisa
temente ou não, Curitiba, aquela que é considerada a senão a colapsos de transportes frequentemente ob-
cidade mais sustentável da América Latina. Pode não servados. Mesmo o carro elétrico ou os que utilizam
ser surpresa se analisarmos que Curitiba implantou pro- outros combustíveis alternativos são opções mais
gramas replicados mundo afora, como a coleta seletiva limpas e de menos impacto no meio ambiente, mas
de lixo (a primeira no Brasil); o calçadão da Rua XV, que continuam sendo carros, e, elétricos ou não, conges-
priorizou o pedestre ante o carro (também o primeiro tionam o trânsito, consumindo horas importantes na
do país); a imensa quantidade de belíssimos parques; o vida de cada um, além de serem muito mais suscetí-
sistema de BRT (Bus Rapid Transport) mais eficiente do veis a acidentes, assaltos e gastos com manutenção.

Desenvolvimento com equilíbrio


57 Março/2011
Se levarmos em conta os números, a segurança e tação e também pelas desapropriações milionárias
a eficiência, o Metrô de São Paulo é, de longe, o mais que precisariam ser feitas.
bem-sucedido sistema de transporte público do Bra- Muito mais magrinha que seu companheiro ro-
sil. Diariamente, ele transporta mais de 3 milhões de busto que circula sob a maior cidade do Brasil, a bi-
passageiros, e em 2010 registrou novo recorde de cicleta é a alternativa teoricamente mais inteligente
demanda: 3,9 milhões de passageiros transportados e saudável. Hoje, nenhum projeto urbanístico é con-
em único dia. Segundo informações oficiais do Me- siderado “racional” se não contemplar áreas para
trô de São Paulo, no início de sua operação comer- trânsito de ciclistas. Mesmo em locais onde existem
cial, em 1974, a média diária de passageiros era de grandes extensões de ciclovias, se o ciclista precisar
apenas 2.858 pessoas, e os trens do metropolitano sair da rota para ir ao local de trabalho ou estudo,
funcionavam somente de segunda a sexta-feira, das por exemplo, inevitavelmente terá que disputar, em
9h às 13h. Desde então, mais de 20 bilhões de pesso- uma briga injusta, território com os carros e as ainda
as (o equivalente a três vezes a população da Terra) mais perigosas motocicletas. Os extremos climáticos
já trafegaram pelo sistema de metrô, que hoje fun- e as chuvas também são complicadores. Em capitais
ciona todos os dias e possui um headway (intervalo como Curitiba e Porto Alegre, que contam com boas
entre trens) entre os menores do mundo. Existem ciclovias, o clima tende a desmotivar o ciclista, com
projetos e experiências de transporte público no muita umidade, chuvas e frio. A segurança também
Brasil como o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), o BRT preocupa, pois em cima de uma bicicleta a aborda-
(Bus Rapid Transport) e o TAV (Trem de Alta Velocida- gem dos ladrões é ainda mais eficiente, e ele ainda
de), mas é difícil imaginar algo mais eficiente que o pode fugir da vítima montado no próprio objeto do
metrô, porém a implantação deste nos grandes cen- roubo. Mas a opção séria pela bicicleta como meio
tros urbanos que ainda não o possuem é um sonho de transporte, e não apenas um objeto de lazer, ain-
quase impossível, por causa dos gigantescos custos da é incipiente, apesar de ela ser uma grande aposta,
com obras urbanas em regiões de grande movimen- inclusive muito mais viável economicamente.

. de São Paulo: rápido, seguro e confortável.


Metrô

Foto: Revista Novo Ambiente/Estanis Neto


revistanovoambiente.com.br
Março/2011 58
Foto: Revista Novo Ambiente/Paulo Negreiros

. controlado de Brasília, horas antes da sanção presidencial da Lei de Resíduos Sólidos no ano passado.
Aterro

Humanos: pequenas fábricas de lixo


Ruas arborizadas, prédios au- se esgoto recebe tratamento. O por causa das diarreias causadas
tossuficientes, espaços urbanos estudo “Esgotamento Sanitário por falta de saneamento. O que se
generosos com os moradores, siste- Inadequado e Impactos na Saúde espera do termo sustentabilidade
mas de transporte eficiente e limpo. da População”, do Instituto Trata passa muito longe desta realidade
Não se engane, um cenário paradi- Brasil, aponta que 5,9 bilhões de e, segundo grandes nomes do ur-
síaco pode esconder sobre si uma litros de esgoto são lançados dia- banismo, mesmo nas cidades apa-
vergonha: a falta de saneamento. riamente no país sem que rece- rentemente complexas e sedimen-
Isso joga o conceito de sustentabili- bam qualquer tratamento, e vão tadas, onde tudo parece perdido,
dade no lixo (a céu aberto), ou nos parar nos rios, nas praias, no solo. as mudanças podem ser muito
rios, ou nos mares. A pesquisa foi realizada a partir de mais simples e mais rápidas do que
Segundo últimos dados di- dados das 81 maiores cidades do se imagina.
vulgados pelo Ministério das Ci- Brasil (todas com mais de 300 mil O tratamento de esgoto, as-
dades, apenas 44% da população habitantes). Em 2008, quase 70 sim como do lixo, pode chegar a
brasileira está ligada a uma rede mil crianças de até 5 anos de ida- um impacto socioambiental zero
de esgotos, e menos de 30% des- de (a faixa mais atingida) foram – e melhor: economicamente in-
internadas, nas cidades avaliadas, teressante. Tratamento e reutili-
zação da água, gases dos aterros

40% das cidades com mais


de 300 mil habitantes registraram casos de
diarreia em crianças de 0 a 5 anos
por causa da falta de saneamento básico.

Desenvolvimento com equilíbrio


59 Março/2011
• Ranking das melhores cidades (acima de 300 mil habitantes) em
saneamento básico, segundo análise de um conjunto dos indicadores
avaliados pelo Instituto Trata Brasil:
sanitários para a geração de ener-
gia, ações inteligentes para a mini- Posição/cidade População Operação dos serviços
mização dos resíduos (esquemas 1º Jundiaí (SP) 348 mil municipal/privada
de coleta seletiva, óleo de cozinha, 2º Franca (SP) 327 mil estadual
baterias, lâmpadas) são algumas 3º Niterói (RJ) 478 mil privada
das centenas de boas ideias que 4º Uberlândia (MG) 622 mil municipal
podem ser aplicadas. 5º Santos (SP) 417 mil estadual
O ranking elaborado pelo Ins- 6º Ribeirão Preto (SP) 558 mil municipal/privada
tituto Trata Brasil, avaliando vários 7º Maringá (PR) 331 mil estadual
indicadores de saneamento (es- 8º Sorocaba (SP) 576 mil municipal
goto, praias, tratamento da água, 9º Brasília (DF) 2,6 milhões estadual
reutilização, resíduos sólidos, etc.) 10º Belo Horizonte (MG) 2,4 milhões estadual
aponta que Jundiaí/SP é a cidade
que oferece os melhores serviços à
• Ranking das piores cidades (acima de 300 mil habitantes) em sanea-
sua população de 348 mil habitan-
mento básico, segundo análise de um conjunto dos indicadores avaliados
tes. A operação municipal ocorre
(entre eles o tratamento de esgoto) pelo Instituto Trata Brasil:
em parceria com o setor privado.
Franca/SP aparece em segundo Posição/cidade População % de esgoto tratado
lugar, com operação estadual e
população de 327 mil habitantes; 72º Nova Iguaçu (RJ) 855 mil 0%
Niterói/RJ em terceiro, com ope- 73º Belém (PA) 1,4 milhão 6%
ração privada e população de 478 74º Canoas (RS) 329 mil 13%
75º Rio Branco (AC) 301 mil 3%
mil habitantes. O negócio é apren-
76º Jaboatão dos Guararapes (PE) 678 mil 8%
der com quem sabe, muito embora
77º Ananindeua (PA) 495 mil 0%
nossos melhores professores este-
78º São João do Meriti (RJ) 468 mil 0%
jam mesmo lá fora, onde há muitas
79º Belford Roxo (RJ) 495 mil 1%
décadas vários países já não admi- 80º Duque de Caxias (RJ) 0%
864 mil
tem mais a vergonha de expor suas 81º Porto Velho (RO) 379 mil 0%
populações à falta de saneamento.

Foto: Revista Novo Ambiente/Marcelo Almeida

Brasília, uma cidade planejada e com boa qualidade de vida, mas não escapa da regra da falta de saneamento básico nas capitais brasileiras.
.
Qualidade de vida inclui ambientes agradáveis e seguros para o convívio.

Do caos à sustentabilidade
A ocupação desordenada gera uma cadeia de
acontecimentos nefastos. O lixo e o esgoto vão para
o rio, o fluxo da água é interrompido, os vetores de
doenças se alastram, acontecem enchentes e os pre-
juízos, humanos e materiais são irreparáveis.
O conceito de cidade sustentável prevê organi-
zação acima de tudo. Autossuficiência energética,
uso inteligente dos recursos naturais, como o solo, o
sol, as águas, o vento, as árvores, sua madeira e seus
frutos. Isso inclui reavaliar um dos maiores erros co-
metidos pela humanidade em relação à natureza:
não respeitar o espaço que ela precisa. A ocupação
irregular em torno de cursos de água e encostas é
conhecida de todos, e, evidentemente, o curso de
um rio desviado, um banhado aterrado, uma encos-
ta ocupada, um vulcão adormecido, mais dia, menos
dia, vai reclamar seu espaço de volta. Se mantiver-
mos distância respeitosa (para nós mesmos e para a
natureza) muito se evitará de dor e perda.
Mas como sustentar um discurso tão romântico
com um déficit de 5,8 milhões de moradias no Brasil?
Estes dados fazem parte de um levantamento reali-
zado pelo Ministério das Cidades em 2008. Aqui, tal-
vez esteja uma grande oportunidade do país reverter Foto: Revista Novo Ambiente/Estanis Neto

seus conceitos desleixados quanto ao meio ambien-


te. O Governo federal aponta para um crescimento
no mercado da construção de casas populares, mas
a parcela de casas que primam por projetos em dire- “A persistência da pobreza
ção à sustentabilidade ainda é pequena, mas o setor urbana é em grande medida o
privado já viu que economizar e não ser dependente,
é um grande e inteligente negócio. Não por menos o resultado de economias e finanças
8º homem mais rico do mundo, o brasileiro Eike Ba- urbanas fracas e de ausência
tista, pretende criar a Cidade X, um empreendimento de instrumentos e instituições
que, para realmente ser sustentável deve promover
a integração de classes no espaço urbano, assim necessários para apoiar fundos para
como se propõe o bairro Cidade Pedra Branca, em habitação e infra-estrutura”.
Palhoça, na Região Metropolitana de Florianópolis.
Bom Ki-moon, Secretário Geral das Nações Unidas,
O bairro possui universidade, escolas, comércio e um durante o último Fórum da Habitação da ONU
conceito de quadras integradas onde se pode estu-
dar, trabalhar e morar.
A energia solar está ganhando espaço e a eólica energia e água, triagem do lixo domestico, nova pos-
conquistou definitivamente o coração dos brasilei- tura ética, políticas que expressem as melhores solu-
ros. Não será difícil que em um futuro próximo te- ções para os grandes centros urbanos. Compromisso
nhamos os “cataventos gigantes” próximos de mui- com a regeneração do meio ambiente.
tas cidades, oferecendo energia a preço competitivo Um novo mercado surgirá tão forte quanto o da
e tendo custos de transmissão muito mais reduzidos extração mineral: o da reciclagem, que a cada dia
pela distância. Muitas lâmpadas só acendem no Bra- ganha mais escala e domina parcelas ainda tímidas,
sil mais longínquo porque recebem energia de uma mas cada vez mais importantes da economia na-
usina distante: Itaipu, no Paraná. cional. O mundo já possui bons exemplos, alguns o
Para que haja sustentabilidade nas cidades, sua leitor pode encontrar em cada uma das edições da
população tem que ser comprometida com novos Revista Novo Ambiente. Pensar em cidades susten-
conceitos: nada de desperdícios de consumo (em- táveis é considerar a autosuficiência em recursos
balagens, alimentos jogados fora) e recursos como energéticos, econômicos, naturais e humanos.
Desenvolvimento com equilíbrio
61 Março/2011
Entrevista Gustavo Fruet

Metrópoles
sustentáveis
O advogado Gustavo Fruet tem apenas 48 anos
e já é uma liderança inquestionável. Nas elei-
ções de 2006 para Deputado Federal pelo Paraná, foi
Ou seja, ter muita clareza com essa ideia de inovação,
com essa ideia de cidades criativas – a chamada eco-
nomia verde, que trata da qualidade do ar, da água, da
o mais votado em seu estado, e, embora nunca tenha coleta e disposição final do lixo; planejamento urbano
declarado abertamente, sonha em um dia chegar ao e uso do solo e também a questão da mobilidade com
poder executivo da capital, quiçá do estado. Sinônimo relação a alternativas de transporte de massa e dimi-
de ética, assiduidade nas sessões e comissões, e de nuição de congestionamento. Cada vez mais esses
trabalho pesado e de alta qualidade técnica, foi apon- temas vão desafiar os gestores, então o objetivo das
tado por anos sucessivos como um dos políticos brasi- palestras é procurar trazer um pouco dessa experiên-
leiros mais influentes no Congresso Nacional. Em 2010, cia. Até 1988, não havia uma política urbana na Cons-
candidatou-se ao Senado pelo PSDB, enfrentando dois tituição brasileira, e de alguma maneira não era agen-
gigantes: o ex-Governador Roberto Requião, que desde da prioritária dos governos. O Presidente FHC criou a
os tempos de grêmio estudantil nunca perdeu uma elei- Secretaria Nacional de Desenvolvimento Urbano, o
ção, e Gleisi Hoffmann, casada com o Ministro das Co- Presidente Lula a transformou em Ministério das Cida-
municações Paulo Bernardo e principal aposta do PT no des, e muitos instrumentos foram criados, dando ou
Paraná. Obteve quase um quarto dos votos dos parana- potencializando a autonomia dos municípios.
enses (mais de 2,5 milhões) e não foi eleito, mas deixou
claro sua força política. Fruet recebeu a equipe da Revis- Quais instrumentos, por exemplo?
ta Novo Ambiente para uma entrevista, com a gentileza
que lhe é característica. Seu carisma e histórico de lisura • O Estatuto das Cidades, a Lei de Responsabi-
política mostram que estamos diante daqueles políti- lidade Fiscal, a Política Nacional de Saneamento, a
cos de que precisamos. política de desenvolvimento na área de Mobilidade
Urbana e agora a última medida do governo Lula,
que foi a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Isso é
uma demonstração de que esse tema definitivamen-
te está incorporado à agenda política do país, já que
quase 85% da população mora nas áreas urbanas.
Você coloca em suas palestras que as cidades têm
que ser inovadoras e criativas. Na prática, o que O Estatuto das Cidades é bem claro na questão da
isso deve representar para as cidades? boa destinação do solo, da preservação do meio
ambiente, da ocupação regular em áreas que não
• Diminuir o impacto do crescimento desorde- sejam de risco. Sabemos que o Brasil é até muito
nado. O estudo que eu apresento é uma análise feita bem servido de leis, mas a aplicação delas e a fisca-
a partir de uma classificação de cidades, em especial lização estão muito aquém do que se espera. Nós
nos EUA e na Europa, e demonstra, analisando uma temos estrutura para acertar isso?
série de fatores, um padrão de crescimento, um pa-
drão de qualidade de vida acima da média. Quais são • Não, não temos estrutura e não se resolve dinâ-
esses fatores? Melhorar o acesso à moradia; prevenir, mica urbana com a lei, evidente. É até um erro imaginar
antecipar e diminuir os riscos de desastres naturais; que se vá criar um engessamento, ou de forma autori-
políticas de energia e mudança climática; acesso a ali- tária definir como se deve dar o processo de crescimen-
mentos produzidos no local; base de conhecimentos. to urbano, é impossível isso. Justamente, o gestor tem

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Março/2011 62
Foto: Revista Novo Ambiente/Estanis Neto

Em algumas cidades da Região


Metropolitana, quase metade da
população ou trabalha em Curitiba,
ou atravessa a cidade para o
seu trabalho, então isso vai na
contramão do que se imagina para
a sustentabilidade.

que ter a capacidade de saber administrar entendendo ilegalidade. Muitas capitais têm uma parte expressi-
como se dá a dinâmica na sua cidade. Mas quais são os va da sua população – em algumas regiões, mais da
extremos? De um lado, evitar a inexistência de instru- metade da população – morando em áreas infor-
mentos que permitam ao administrador interferir. A ci- mais. Se a pessoa não tem condições de ter acesso
dade, cada vez mais, vai ser um espaço de contradição e a uma moradia no sistema convencional, é evidente
de conflito. O gestor será responsabilizado pela omissão, que ela vai morar onde for possível, e isso tem um
mas precisa ter instrumentos de ação. Por quê? É um processo de crescimento muito mais rápido que
princípio da gestão pública que ninguém pode fazer o qualquer planejamento.
que a lei não permita. Não é uma relação entre particu-
lares, por que existe isso? Pra evitar o arbítrio do gestor, Curitiba é uma cidade muito bem vista na questão de
do governante, do político. Ele também não pode fazer planejamento, embora tenhamos tido aí governos vi-
o que ele quer; por mais bem-intencionado, às vezes sionários como o de Jaime Lerner. Hoje, mesmo cida-
pode abrir margem a desvios ou a determinados benefí- des como Curitiba vivem grandes problemas com o
cios. Infelizmente, se estabeleceu que só pode ser feito o inchaço populacional, inclusive em suas regiões me-
que a lei permite, esse é um ponto. tropolitanas. Que soluções você apontaria?

A burocracia morosa é o outro lado dessa moeda?


Dois pontos: uma cidade sem fronteiras e, se-
• Temos que evitar o outro ponto que é o exces- gundo, que não pode ficar parada vivendo às custas
so legislativo, é um emaranhado de leis, má elabo- do seu passado de planejamento. Cidade sem fron-
ração da lei, que acaba não tendo sua aplicação, ou teiras: não se pode mais pensar em Curitiba isolada
por desconhecimento ou por falta de estrutura. Não da Região Metropolitana. Não se pode imaginar que
adianta ter uma lei maravilhosa, o Brasil dispõe de Curitiba vai ser uma cidade classe média e transferir
muitos instrumentos, se ela não for eficaz. A ideia do problemas para a Região Metropolitana, com custo de
estatuto foi deixar claro que boa parte da ocupação moradia mais elevado. Ocupação do solo, restrições
urbana se perde ou no excesso de formalismo ou na ambientais, o custo de ampliação do transporte é co-

Desenvolvimento com equilíbrio


63 Março/2011
Entrevista Gustavo Fruet

letivo; então, uma cidade sem fronteiras. E o segundo • Não, vai ter um preço, tem que ter consciên-
ponto: Curitiba tem uma belíssima tradição, com- cia disso. Isso é um processo de evolução, essa nova
pletará 50 anos de planejamento institucional, uma geração vem com uma consciência muito maior; os
cidade que tem uma cultura de planejamento muito governantes também, com uma preocupação muito
grande, com uma participação da sociedade organiza- maior, ou porque têm essa consciência, ou porque
da muito intensa. Uma cidade que já apresentou pro- têm receio de uma condenação, fiscalização, seja do
jetos que foram referência para o país e para muitas Tribunal de Contas, seja do Ministério Público, seja de
cidades no exterior. Mas precisa dar um novo salto, setores organizados da sociedade, e há cada vez mais
ela não pode ficar só gastando esse patrimônio que foi uma preocupação com a certificação de origem dos
conquistado ao longo do tempo. E pra isso precisa ser produtos. É evidente que temos uma desigualdade
criativa, ter capacidade de liderança e de inovação. nos preços, o fator preço acaba sendo o fator principal
na escolha, mas o próprio consumidor é o instrumen-
De certa forma, as cidades-polo acabam tendo uma to de transformação e de garantia desse equilíbrio.
responsabilidade sobre suas regiões vizinhas, porque
elas vivem sob a influência dessas metrópoles. Quanto a corrupção ou a lisura nos trabalhos influen-
ciam na execução de projeto de cidade sustentável?
• Veja, em algumas cidades da Região Metropo- Por que aí entra a questão de dar uma licença irre-
litana, quase metade da população ou trabalha em gular pra ganhar uns votos aqui, fingir que não viu
Curitiba, ou atravessa a cidade para o seu trabalho, o esgoto sendo jogado ali para não atrapalhar um
então isso vai na contramão do que se imagina para a financiamento de campanha... Você acha que, embu-
sustentabilidade. tida na questão das cidades sustentáveis, de um país
sustentável, está uma reforma para que os políticos
A respeito da agricultura, que é uma área em que você sejam sustentáveis?
atuou nesses anos todos na Câmara, qual é a respon-
sabilidade da agricultura pra uma cidade ser susten- • Interessante. Há uma distância. A cidade tem
tável? Curitiba, hoje, praticamente não produz nada, um processo de crescimento que precisa de muita
muito poucos alimentos. Ela processa, industrializa... clareza do gestor, de não querer engessar o proces-
so. Mas deve-se ter muita clareza no enfrentamen-
• Claro que em larga escala é inviável, não tem to de interesses. Cada vez mais, a ação de um ges-
como comparar, mas, entre os fatores analisados na tor vai ter impacto de médio e longo prazo. Hoje,
classificação destas cidades sustentáveis, um dos em vários serviços prestados na cidade, trabalha-se
itens mais importantes é o acesso aos alimentos com contratos de concessão de médio e longo pra-
produzidos no local, e aqui nos referimos à agricul- zo. Cito dois exemplos: a renovação do contrato de
tura familiar e em pequena escala. Isso marca muito transporte coletivo e a concessão do serviço de lixo.
o acesso a produtos, por exemplo, comercializados São contratos pra pelo menos 20 anos, então uma
no Seasa. Em Curitiba ainda há áreas que têm uma decisão tomada agora vai ter impacto por, pelo me-
tradição de produção de hortifrutigranjeiros, agora nos, quatro ou cinco gestões. Por isso, há de se ter
são áreas futuras de ocupação, então há que se es- um acompanhamento muito grande, porque mexe
tabelecer com clareza esta transição, respeitar a vo- com interesses expressivos; na questão do lixo, por
cação das pessoas que estão lá hoje, mas entender exemplo, um contrato pode chegar a R$ 650 milhões,
que cada vez mais nós temos uma relação de depen- então imagine o que move de interesse num projeto,
dência, principalmente com a Região Metropolitana, num processo desta natureza.
no acesso de produtos de mercadoria, ou seja, é um Então, saber que o custo da má gestão pode ser
grande mercado consumidor, mas precisa dos pe- tão comprometedor quanto o custo da corrupção,
quenos produtores no seu entorno. até porque há parâmetros e maneiras de fiscalizar
que não existiam há pouco tempo. Então isso vai
E a responsabilidade aí é mais uma questão específica exigir muito mais clareza, transparência, mas muito
ambiental. Nesta busca da grande cidade por alimen- mais responsabilidade. O que for mal feito hoje, pra
tos, a metrópole não pode ser a mais forte indutora do consertar, vai ser muito mais caro. Exemplo disso é
desmatamento, sem se preocupar com sua própria res- esse debate não resolvido no Paraná com relação à
ponsabilidade sobre isso? concessão para o pedágio das estradas.

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Ilustração: Revista Novo Ambiente/Fernando Beker Ronque

Março/2011
66
revistanovoambiente.com.br
web Iniciativas
A liberdade proporcionada pela internet
abre caminhos para transformar ideia em
ação. Promovendo a reunião de pessoas
com afinidade de pensamento de forma
consistente e com alta velocidade de
comunicação, as campanhas alternativas
nunca mais serão a mesmas. Hoje, elas
encorpam uma voz imponente dentro
da sociedade e estão fazendo impérios
ascenderem e caírem em ruínas com uma
rapidez estonteante.

Desenvolvimento com equilíbrio


67 Março/2011
U
ma ideia, uma unidade de pensamento. buscava reunir diversos internautas a fim de unir for-
Milhões delas agrupadas formam uma ças em prol de causas que visavam um mundo me-
via, todas em uma grande rede criam lhor. O usuário se cadastrava, registrava a causa que
um tronco, um tronco de conhecimento que se dis- defendia e contava com a assinatura de outros usuá-
semina em infinito de informações. Algumas ideias rios para fortalecê-la. Superando em muito a expec-
sucumbem no processo de sua existência, outras tativa inicial de 10 mil usuários, a rede social Care2
ganham forças e se transformam em atitudes, alcan- hoje é formada por mais de 15 milhões de pessoas
çando o topo da copa, tornando-se uma folha, tor- votando e registrando causas que vão desde as pre-
nando-se uma ação. ocupações com aquecimento global a denúncias de
A força que alimenta uma ideia é a iniciativa, a desmatamento inconsequente.
voz daqueles que buscam expressar e defender sua Seguindo o mesmo caminho de união de vozes,
doutrina e ideologia, a voz do ativismo. Voz que, a a rede social Amnesty.org reuniu mais de 3 milhões
partir dos anos 90, utilizando a internet, ganhou li- de ciberativistas de 150 países diferentes em campa-
berdade de comunicação incalculável e proporcio- nhas pelo respeito aos direitos humanos. Por meio
nou o chamado ciberativismo. Entre diversas inicia- da ferramenta de comunicação digital, qualquer usu-
tivas ciberativistas, destaca-se a do americano Randy ário consegue ter, além de sua voz ouvida, sua ideia
Paynter, fundador de uma pequena rede social que exposta para a avaliação das pessoas sem o filtro ofi-

• A partir de 2008, a técnica Geo-bombing


se tornou uma importante ferramenta
ciberativista. Sua primeira campanha de
sucesso veio por meio da Nawaat, que
luta pelos direitos humanos na Tunísia. A
técnica se baseia em disseminar conteúdo
audiovisual hospedado no Youtube por
meio do Google Earth e Google Maps. A
campanha consistiu em divulgar videos
sobre liberdade civil, material que o gover-
no local tentava controlar. A repercussão
chamou a atenção de diversas entidades
de luta pelos direitos humanos e da socie-
dade civil para a tentativa do governo em
calar a liberdade de expressão.

• Entre fevereiro e março de 2009, os mi-


croblogs (iniciativas de pequeno porte)
tiveram um aumento de 96,8% na parti-
cipação de brasileiros, representando o
crescimento de 344 mil para 677 mil usu-
ários, sendo que 91,42% compartilham
opiniões, críticas e pensamentos.

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Março/2011 68
cial. Já o portal thepetitionsite.com instrui passo a cortinou para aqueles que gostavam de varrer des-
passo como criar uma petição online, reunindo mais caradamente suas sujeiras para debaixo do tapete.
de 10 mil assinaturas diárias, contando com o regis- Hoje, bilhões de pares de olhos observam, as bocas
tro de mais de 60 milhões de petições. revelam e os dedos denunciam. É uma força que está
Em escala menor, o blog Cultura-de-paz, criado abalando impérios econômicos e políticos, e não tem
pela gestora ambiental Juliana Zellauy, utiliza sua mais volta, quem não se comportar vai ter que pres-
influência para disponibilizar ferramentas que con- tar contas.
tribuam para a disseminação da cultura de paz, do Do ponto de vista social, aglutinar trabalho vo-
cyberativismo e do respeito ao meio ambiente, des- luntário atende demandas nunca antes imaginadas,
tacando links para portais com a causa em comum e permitindo o acúmulo e a troca de conhecimento e
trazendo informações de campanhas ativas. experiências, dando corpo às aspirações e necessi-
Ao longo da história, muitas causas foram sufo- dades muitas vezes ignoradas pelas autoridades ou
cadas antes mesmo que ganhassem conhecimento manipuladas por interesses de pequenos grupos,
do mundo e, talvez por isso mesmo, fracassaram. em detrimento de toda a população. Ações simples
Mas depois que a informação tornou-se mais livre como criar um blog e defender sua causa permitem
e democrática do que nunca, fora do controle mo- que elas germinem e se desenvolvam como ações
nopolizador do Estado, uma nova realidade se des- para uma realidade melho

• O Flash Mob, movimento que, organizado online, é


materializado fisicamente com alguma ação planeja-
da e discutida via web por pessoas de muitos locais,
adquiriu maior força com os movimentos das redes
sociais. No dia 5 de fevereiro, em Milão, aconteceu o
primeiro eco-sustentável Flash Mob, organizado pelo
renomado artista digital Giuseppe La Spada. Mais de
600 pessoas se mobilizaram chamando a atenção
para a qualidade do ar. Os participantes do evento • Com a ajuda da rede social Orkut e do Twitter no
utilizaram bolsas de pano das cores verde e marrom, movimento “Mega não!”, inúmeros ciberativistas se
agrupando-se de maneira que, visto de cima, lembra- reuniram em protesto contra o projeto de lei proposto
va uma grande árvore no meio da Piazza Duomo. pelo Senador de Minas Gerais Eduardo Brandão Aze-
redo, conhecido como “Lei Azeredo”, que obrigaria os
provedores de internet a monitorar os dados de ori-
gem e horários dos acessos realizados pelas cidades.
Além de chamar atenção da mídia, o movimento co-
lheu mais de 150 mil assinaturas na petição online.

• No Egito, utilizando a internet como ferramenta de


comunicação, manifestantes de todo o país iniciaram
protesto para derrubar o presidente Hosni Mubarak.
Tão rápido quanto a pólvora, as redes sociais servi-
ram como trombones virtuais a ciberativistas que
buscavam expressar e defender seu ponto de vista.
política Saneamento

Destinação
certa
Problema milenar, o lixo sempre foi uma questão delicada, varrida sem
pudor para baixo do belo tapete da história da civilização, que preferiu omiti-
lo na definição de suas prioridades evolutivas. Governo e iniciativa privada,
juntos, têm dado grandes passos para aquilo que está se apresentando
como a maior oportunidade de reverter toda uma realidade que agride
direitos humanos, saúde pública e meio ambiente. O estado de Minas Gerais
está determinado a acabar com essa vergonha e fazer com que os resíduos
sólidos deixem de ser pesadelos amontoados em lixões.

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Março/2011 70
Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

A
s expectativas mais otimistas são para que ção de peças descartadas. Enfim, parece que estamos
ocorra, na próxima década, uma vertigino- no alvorecer das destinações inteligentes, e isso ilumi-
sa mudança que não se deu em 500 anos na, como um holofote, nossos subdesenvolvidos lixões,
de Brasil. A regulamentação política recente sobre uma vergonha que atinge a grande maioria das cidades
responsabilidades na produção foi decisiva quando brasileiras e que, segundo a nova Lei de Resíduos Sóli-
implantou o sistema de logística reversa, em que a res- dos, sancionada no ano passado, tem data para acabar:
ponsabilidade do consumidor sobre as embalagens e 31 de dezembro de 2012.
os resíduos dos produtos passou a ser compartilhada Mas e como acabar assim tão rápido com uma prá-
com os fabricantes, que até então transferiam o pro- tica de 500 anos? Absorvendo experiências e seguindo
blema da destinação do lixo integralmente ao Estado. exemplos como o de um dos maiores estados do país,
O problema de ontem está virando uma grande Minas Gerais. Na última década, o estado mineiro redu-
oportunidade de geração de renda. Surge um novo seg- ziu em 40% o número de lixões. Em 2003, 17% da popu-
mento de mercado de proporções titânicas: a recicla- lação era atendida com sistemas adequados de disposi-
gem, um conceito evoluído que barateia custos com ma- ção de resíduos, índice que pulou para 53% em 2010. A
téria-prima e ajuda a preservar os bens naturais. Junto meta – ousada – é atingir os 60%, além da redução de
com ela, uma gama de oportunidades se descortinam, 80% dos lixões até o final de 2011, uma considerável
como a geração de energia a partir do lixo e a reutiliza- evolução em relação à realidade brasileira.

A Cidade Administrativa de Minas


Gerais é uma construção baseada
em princípios sustentáveis. Sede
do governo do estado, dali sairão
decisões ambientais importantes
para os mineiros.

Desenvolvimento com equilíbrio


71 Março/2011
Este é um dos principais objetivos da Secretaria
de Estado Extraordinária de Gestão Metropolitana
de Minas Gerais, criada na gestão do Governador
Antônio Anastasia. “Os problemas decorrentes dos
resíduos sólidos são comuns a todos os municípios
Extração mineral
brasileiros, mesmo porque eles são de responsabili-
dade municipal, mas se tem encontrado dificuldades A cultura extrativista que deu nome ao estado é a
para lidar com isso no âmbito local”, explica à Revista mais pujante do país, e é dali que vem boa parte do PIB
Novo Ambiente o Secretário Alexandre Silveira. Ele brasileiro. Em 2009, Minas Gerais produziu nada menos
aponta que o problema só pode ser solucionado de que 411 milhões de toneladas de resíduos sólidos in-
forma estratégica: “Existem problemas como a limi- dustriais, e quase 90% desse total eram decorrentes da
tação orçamentária dos municípios e deficiências atividade de lavra a céu aberto. Os resíduos mais gera-
técnicas. Para resolver estes problemas com sucesso, dos eram rejeitos de beneficiamento mineral, vinhaça,
precisamos trabalhar em grande escala. E o Estado bagaço de cana, escória de alto forno e sucata.
precisa fomentar os consórcios municipais”, conclui. O Inventário de
A Secretaria terá ainda muito trabalho pela fren- Resíduos Sólidos In-
te, pois mais da metade dos municípios, embora con- dustriais de Minas
centrem uma população menor, ainda se utilizam de Gerais/2010 aponta
lixões. Silveira representará o governo mineiro em que mais de 90% de
uma visita ao Reino Unido, a convite do Estado bri- todos os resíduos são
tânico, onde conhecerá experiências de sucesso na gerados por apenas 17
utilização de lixo em energia, para poder avaliar pos- empresas, das 430 in-
sibilidades de sua aplicação em Minas Gerais. ventariadas pelo docu-
“O papel do Estado de regulador tem que existir. Ele mento, o que permite
garante o interesse público, mas é necessário estar aten- ao estado mais facili-
to para que exista viabilidade no envolvimento com a dade no controle da
iniciativa privada e a aplicação de tecnologias avançadas geração de resíduos e
para a destinação do lixo”, lembra Silveira. na aplicação de novas
normas que podem ter
efeitos de grande mag-
nitude.

O papel do Estado de regulador


tem que existir. Ele garante
o interesse público, mas é
necessário estar atento para
que exista viabilidade no
envolvimento com a iniciativa
privada e a aplicação
de tecnologias avançadas
para a destinação do lixo.
Alexandre Silveira, Secretário

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Março/2011 72
carros EV Adapt

A hora da
conversão
Disponibilidade, preço, autonomia. Os motivos para converter para outro
combustível ou motorização um veículo inicialmente concebido para rodar
com combustível fóssil são muitos e estão também ligados a momentos
históricos. Os kits de gasogênio (que mantiveram muitos países rodando
durante a Segunda Guerra devido ao racionamento), a conversão de
modelos a gasolina para o álcool durante a crise do petróleo na década de
70 e, mais recentemente, a combinação de motores elétricos e a combustão
para diminuir emissões são alguns dos exemplos.
E
m tempos de alternativas mais “verdes”, Arrefecido a ar, trifásico e com potência nomi-
a empresa sueca EV Adapt foi mais radical nal de 24 kW, o pequeno motor impulsiona o carro
em sua proposta: abandonou o motor a a uma velocidade máxima de 120 km/h (segundo
combustão e o trocou por um 100% elétrico. Ainda dados da EV Avdapt), com autonomia de 120 km. A
considerado por muitos como um “brinquedo caro”, carga total das baterias LiFe PO4 demora 10 horas
o carro elétrico sem dúvida esbarra em problemas de em uma corrente de 240 volts e 10 amperes. Aliás,
escala quando o assunto é viabilidade. O desenvol- estas baterias, de lítio-ferro-fosfato, têm vida útil de
vimento de novos veículos exclusivamente movidos cinco anos e não precisam ser compradas junto com
a este tipo de fonte motriz é dispendioso e envolve o carro, o que resulta em um preço mais competiti-
desde a logística de toda a cadeia produtiva e plane- vo, uma vez que você pode alugá-las por 150€ por
jamento de uma nova linha de montagem totalmen- mês (algo em torno de R$ 340,00). Com baterias in-
te distinta das comuns até o suporte do fabricante à cluídas, o modelo sai por 36.900€, pouco mais de R$
criação de uma nova “cultura” automobilística. 84.000,00. Sem elas, o preço cai para 23.900€, ou R$
É certo que as grandes montadoras, mais do que 54.530,00. Lembre-se: nestes preços não estão inclu-
perceber um nicho, estão se movimentando nes- ídas nem as taxas nem os impostos brasileiros, o que
te sentido, porém há os consumidores que querem tornaria no mínimo “proibitiva” a comercialização do
agora o que elas só poderão entregar em dois ou três carrinho por aqui.
anos. Sem poder contar com o “ágio” que apressa a
entrega de modelos desejados e indisponíveis, estes
compradores voltam suas atenções para empresas
como a EV Adapt, que a um custo mais próximo do Subsidiando o próprio
orçamento dos “mortais” e sem o exotismo e as ex-
travagâncias que envolvem os carros elétricos moder- combustível: apagando as
nos oferece o simpático Fiat 500 – ou “Cinquecento”
–, totalmente convertido para rodar a eletricidade. próprias pegadas
Os suecos não se furtaram ao trabalho de explo-
rar o nicho em que se propuseram atuar. Ao comprar
um veículo da EV Adapt (uma opção ao 500 é o Ford
Ka europeu, lançado em novembro do ano passado),
o proprietário passa a ter uma cota de um gerador
eólico. Por meio deste expediente, além de incentivar
uma fonte energética cujas emissões correspondem a
zero, a intenção é fazer com que o abastecimento via
usina eólica compense as emissões de outros veículos
elétricos alimentados em uma rede elétrica comum
– nestes, a matriz não é 100% limpa e gera-se de 60
g a 65 g de CO2 por quilômetro (levando em conta a
matriz energética europeia). Nesta conta, um veículo
alimentado pelo parque eólico emitiria estas mesmas
60 g ou 65 g percorrendo entre 6.500 e 9.000 km.
Em tempo: cada turbina “compartilhada” produz
energia suficiente para 2.000 carros elétricos, permi-
tindo a cada um deles rodar 20.000 km por ano. Uma
frota equivalente de veículos movidos a combustível
fóssil, rodando a mesma proporção, em vez de zero,
emitiria aproximadamente 12.000 toneladas cúbicas
de CO2 por ano, um peso cada vez mais insustentável
para o planeta.
Foto: Divulgação

Desenvolvimento com equilíbrio


75 Março/2011
clima Destruição

Pode acontecer com


qualquer um.
Inclusive você.

.
Antonina, no litoral paranaense, foi mais uma das cidades brasileiras castigadas pelas chuvas.

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Março/2011 76
Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Um raio que cai duas vezes no mesmo


lugar, uma situação improvável que se
repete. O acaso às vezes bate à porta de
casa. Desta vez, foi à porta da casa da
Revista Novo Ambiente, que passou pela
experiência de cobrir a curta distância os
deslizamentos de terra que desfiguraram
Morretes, Antonina e Paranaguá, no
Paraná. Acostumados a cobrir grandes
distâncias para chegar “ao assunto”,
causa estranheza a todos os integrantes
da equipe o caminho rápido e familiar
dos fins de semana. O que era sinônimo
de lazer no período de descanso ganhara
status de pauta urgente e ares sombrios,
como o contorno sinistro da neblina que
encobria a visão do motorista.

A
mesma bota se apoia no estribo, coin-
cidentemente da mesma caminhonete,
e pisoteia o barro. À altura dos olhos, o
mesmo semblante de consternação, misto de sofri-
mento e revolta, encontrava as mesmas lentes, em-
punhadas pelas mesmas mãos. A mesma cena, mas
montada em outro palco. Protagonizada por outros
atores, em um enredo conhecido, com um desfecho
trágico, infelizmente, já familiar a todos. A mesma
sensação de pesar. Por trás dos mesmos óculos escu-
ros, os olhos novamente marejam disfarçados, quan-
do a história é proferida letra por letra, parágrafo por
parágrafo, pela voz de outra pessoa.
O pequeno hiato de tempo transcorrido entre
duas edições da Revista Novo Ambiente constituiu
uma janela suficiente para voltarmos a tocar em um
assunto que sequer pôde ser digerido. Primeiro ato:
toneladas de lama, numa enxurrada caótica, varrem
uma indefesa e bela região serrana, no Rio de Janeiro.
Pouco mais de um mês depois, é a bucólica e aprazível
serra paranaense que cede sob o peso imponderável
de uma chuva absoluta. Em ambas as situações, sobe-
jam acusações aos mesmos culpados: o volume plu-

Desenvolvimento com equilíbrio


77 Março/2011
Ponte sobre o rio Jacareí, BR 277, km 18.

viométrico diluviano, aliado à ocupação desordenada


e incompetência do Estado em fiscalizar e proteger a
população. Em ambas as situações, o mesmo proces-
so cruel de fugir do único lugar que realmente serve
de abrigo ao homem: sua própria casa.
Este pedaço de reportagem não tratará das somas
necessárias para a reconstrução, nem das compila-
ções e comparativos numericamente frios e distantes
do barro da realidade. O leitor desculpe, mas o que
mais uma vez a equipe presenciou está muito longe da
expressão “barro da vida”, que todos conhecemos.
Foto: Revista Novo Ambiente/Juliano Grosco
Aliás, barro e lama são a antítese do desenvolvi-
mento que almejamos ver nestas regiões, quando o
tempo e a hora chegarem. Carlos concorda, enquanto breve aceno, sobe na caçamba da caminhonete intei-
posa diante de sua casa destruída. À frente da fachada ramente enlameada junto com os outros cinco amigos.
que ele não poderá mais rever, está a singela e rosa casa Um toque inspirador: dois deles receberam pronta au-
de boneca construída para a própria filha, de oito anos, torização do Exército para poder retornar do Rio Grande
que, no abrigo com a mãe, não pode acompanhar o pai do Sul ao Paraná e auxiliar outros amigos e até mesmo
na cata de seus brinquedos e demais pertences da famí- familiares. Eles souberam pela internet do ocorrido, da
lia. Carlos, ao mesmo tempo, é e não é mais um. Não há mesma forma que têm ciência do que aconteceu no Ja-
resistência. Monitorados sob o olhar atento de uma Po- pão e em Santa Catarina, pelo mesmo meio. “Lá morreu
lícia Militar que tenta como pode evitar novas vítimas, muita gente, né? Muita judiação, aquilo...”, ouvimos en-
eles apenas desmontam janelas, recolhem armários en- tre um passo e outro no calçamento encharcado. Tragé-
sopados e auxiliam seus vizinhos a reaver qualquer item dias comuns, transmitidas online, 24 horas. Horas, dias,
que ainda possa ser aproveitado. Para onde depois? meses, anos. A equipe sobe o estribo começa a pensar
Carlos ainda não sabe responder. Despede-se com um onde será a próxima parada.

Carlos, morador de Antonina, observa os estragos em sua casa.

revistanovoambiente.com.br
Março/2011 78
consumo Coca-Cola

Garrafas mais
amigáveis
De símbolo do imperialismo americano a bandeira
da libertação econômica, a Coca-Cola é muito mais
do que um simples refrigerante, é a representação
de várias gerações, a bebida revolucionária, des-
colada e eternamente moderna. Para justificar tais
atributos, além de readequar seu modo de fazer re-
frigerante, ela também está lançando a Plant Bot-
tle, uma garrafa “híbrida”.

E
m 1886, o farmacêutico John Stith
Pemberton, americano da cidade
de Atlanta, nos Estados Unidos,
desenvolveu o que se tornaria a fórmula da
Coca-Cola. No mesmo ano em que se ter-
mina de erguer a Estátua da Liberdade, um
símbolo ainda mais impactante da globali-
zação da cultura americana acabava de ser
inventado, uma bebida que seria o símbolo
de gerações. Era um produto diferente dos
refrigerantes comuns, e isso pode ser ilus-
trado até mesmo pelo slogan de 1928, cria-
do pelo célebre Fernando Pessoa: “Primeiro
estranha-se, depois entranha-se.”
O empresário Asa Griggs Candler, que ha-
via adquirido a marca, de fato acreditava no
produto. Tanto que muito antes deste curioso
slogan a Coca-cola já tinha se internacionaliza-
do, marcando presença até mesmo nos fronts
de guerra, com a ativa distribuição do refrige-
rante para soldados americanos na Segunda
Guerra. No Brasil, a primeira fábrica foi insta-
lada em 1942. Virou grife de roupas e modelo
de produtos que vão de cadernos a canecas.
E, hoje, em qualquer lugar do mundo pode-se
pedir uma Coca-Cola em um estabelecimento
e ter seu pedido atendido. A marca se tornou
uma das mais influentes do planeta, tomando
a frente em grandes decisões que afetam o
mundo todo.

Desenvolvimento com equilíbrio


81 Março/2011
Sede de responsabilidade
Mas não apenas de glória se escreve a história da
Coca-cola. Muitas vezes símbolo do imperialismo esta-
dunidense e dos hábitos pouco saudáveis de toda uma
população criada pelos industrializados, tornou-se um
alvo para as mais diversas reações. A própria fórmula da
Coca-Cola, por ser mantida em um segredo tão absolu-
to, a envolve em mistério e desconfiança. Teorias acerca
do fato de que ela poderia servir como desentupidor de
pia e pesticida são conhecidas, e também as alegações
de que o refrigerante seria feito com folhas de coca,
causando uma espécie de dependência química no con-
sumidor. E para uma empresa que, querendo ou não,
ostenta a bandeira do consumismo exacerbado, nos últi-
mos anos mais uma nova responsabilidade lhe foi cobra- No Brasil,
da: a sustentabilidade de seus produtos.
A primeira embalagem oficial era a garrafa de vidro em 2010, foram produzidos
“conteur”, exatamente para enfatizar o seu contorno,
que pode ser reconhecido até em preto no branco. Mas, 10,6 bilhões de litros
com o advento das latas e do plástico, a embalagem re- do refrigerante, incluindo desde garrafas
tornável acabou por perder o seu espaço. E uma gigan-
te como a Coca-Cola possui um tipo de característica de 3 litros até as minilatinhas.
especial: cada uma de suas decisões e reformulações
internas modifica um sistema de consumo em escala
mundial. A Coca-Cola Company foi uma das maiores res-
•Qualquer diminuição na
ponsáveis pela difusão das garrafas PET no mundo. E, ao extração e produção significa
mesmo tempo em que é considerada 100% reciclável, uma alteração significativa.
essa embalagem corresponde também a uma parte sig-
nificativa do lixo acumulado no mundo inteiro. Isso sem
contar o consumo de petróleo e água utilizados na pro- Plant Bottle
dução da quantidade massiva de garrafas necessárias
para atender a demanda mundial.
Mas, prezando por sua filosofia de querer se man- Seguindo essa linha de raciocínio, a empresa
ter sempre conectada ao pensamento de sua época, a também desenvolveu a PlantBottle™, um produto
marca reagiu. O Instituto Coca-Cola promove programas inovador que seria composto de 30% de material
de cunho social no Brasil, como o Projeto de Valorização vegetal, formado pela cana-de-açúcar e melaço, di-
Jovem e o Projeto Educação Campeã, com o objetivo minuindo, assim, a demanda por petróleo. A garrafa
de incentivar a educação. Em caráter ambiental, várias foi desenvolvida recentemente e é 100% reciclável,
novas iniciativas foram tomadas. A diminuição do peso tal como as PET comuns. Este lançamento pode re-
das garrafas vem sendo feita e já apresenta resultados; presentar uma invenção significativa na história das
com a aplicação total do projeto, seria o equivalente a embalagens – como a Coca-cola sempre fez – e dimi-
270 milhões de embalagens de 2 litros deixando de ser nuir a extração de combustíveis fósseis. O atual for-
produzidas. A empresa também anuncia um amplo in- mato, segundo a empresa, já reduz em 25% as emis-
centivo à reciclagem. sões durante sua fabricação e utiliza matéria-prima
Em comparação com a gasolina, por exemplo, o (cana-de-açúcar e melado) nacional, cuja produção é
petróleo utilizado para uma simples garrafa não nos calcada em fatores como o aproveitamento da água
parece muito significativo, e tampouco a diminuição da chuva e a colheita mecanizada, que evita as quei-
do peso de uma garrafa. Mas a produção em massa madas de campos, as quais, por sua vez, devem ser
do refrigerante com certeza tem resultados influentes abolidas até 2017 no estado de São Paulo, o maior
em grande escala. Considere que, apenas no Brasil, produtor de cana do país.
em 2010 foram produzidos 10,6 bilhões de litros do A meta da Coca-Cola é desenvolver garrafas plásticas
refrigerante, incluindo desde garrafas de 3 litros até as recicláveis compostas de resíduos 100% baseados em
minilatinhas. Qualquer diminuição na extração e pro- plantas (como lascas de madeira, espigas de milho ou ta-
dução significa uma alteração significativa. los de trigo), transformando resíduos em recurso.
Tecnologia

• Usou, plantou
“O futuro da moda está na reconciliação entre a natureza e
a indústria” – são as palavras da dupla holandesa Christia-
an Maats e Dirk-Jan Oudshoorn, desenvolvedores dos tênis
biodegradáveis OAT. A coleção, resultado de dois anos de
pesquisa e desenvolvimento, traz calçados feitos de cânha-
mo, cortiça, algodão e outros materiais biodegradáveis. A
ideia é trazer acessórios amigáveis ao meio ambiente com
estilo. Ao final da vida útil dos tênis, o consumidor pode jo-
gá-los fora sem se preocupar com danos ao planeta ou pode
plantá-los – a primeira leva virá com sementes dentro da lín-
gua, completando o ciclo.

• Web sustentável
Vivemos a era da informação. A internet revolucionou a co-
municação humana e, hoje, as distâncias físicas já não são
mais barreiras para o conhecimento. Seguindo esta tendên-
cia mundial, alguns sites oferecem um catálogo de empre-
sas e produtos sustentáveis, como o brasileiro <www.cata-
logosustentavel.com.br>. Alimentado pela Escola da Admi-
nistração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio
Vargas, e trazendo vários produtos que acarretam pouco im-
pacto ambiental, como também notícias e artigos sobre sus-
tentabilidade, o site serve de vitrine para produtos verdes
tanto para consumidores individuais quanto para empresas
que procuram conciliar necessidades econômicas com a
iminente necessidade de cuidar do planeta.

• A 500 metros, salve o planeta


Buscando otimizar os gastos energéticos e emissões de
CO2 no dia a dia, a empresa americana Earthrise Technolo-
gy nos traz o Eco-Way – um GPS conectado à porta de diag-
nóstico dos carros com computador de bordo que mostra
a emissão atual de CO2 do veículo, bem como a melhor
rota baseada no consumo de combustível, a carga do mo-
tor e outros dados do carro. O motorista equipado com o
aparelho pode, assim, saber qual é a melhor aceleração,
troca de marcha e caminho a ser seguido para que sua
necessidade de transporte seja o menos nociva possível
para o meio ambiente. O aparelho pode ser adquirido por
US$ 250 já com mapas do Brasil.
Fotos: Divulgação

• Quebrando limites
Combinando criatividade e uma técnica presente há sécu-
los no conhecimento humano – o uso do vento como força
motriz –, a dupla alemã Dirk Gion e Stefan Simmerer cruzou
o continente australiano no Wind Explorer (Explorador do
Vento, em inglês). O carro é um protótipo elétrico construído
de fibra de carbono, pneus de bicicleta para reduzir o atrito,
uma bateria de 8 kWh e, quando as condições climáticas per-
mitiam, era puxado por uma pipa para economizar energia.
Durante a noite, o carro era carregado por uma turbina eólica
atrelada a uma armação de bambu, e quando não havia vento
suficiente, era carregado na corrente elétrica. Durante toda a
viagem, gastou-se por volta de R$ 30 em eletricidade.

• Içar velas!
Essa frase não faz mais parte da náutica moderna, mas o ven-
to não foi descartado como propulsor de navios. A multina-
cional Cargill, que transporta mais de 185 toneladas de com-
modities ao ano via marítima, fechou um acordo com a Sky-
Sails, fabricante de pipas rebocadoras para navios de carga.
A instalação da pipa está prevista para dezembro e promete
economizar, em média, até 35% de combustível ao ano. Com
um sistema quase completamente automatizado, a pipa, de
320 m², será instalada num navio com porte bruto de 30 mil
toneladas, tornando-o o maior navio do mundo com esta tec-
nologia. De acordo com a Organização Marítima Internacional
das Nações Unidas, 100 milhões de toneladas de CO2 deixa-
riam de ser emitidas com a aplicação da tecnologia em toda a
frota de navios comerciais do mundo.

• Coisa de cinema
Filmes de Hollywood têm orçamentos astronômicos para co-
brir todos os detalhes de filmagem – elenco, equipamentos,
figurino, cenário e, claro, a luz. Seguindo uma tendência mun-
dial e buscando reduzir custos, os estúdios Twentieth Century
Fox Film (conhecidos por produções como Avatar e Os Simp-
sons) implantaram recentemente em seu prédio histórico um
painel de 158 kW, suficientes para abastecer por volta de 150
residências. A instalação, feita pela empresa Solar Power Inc.,
conta com o sistema de montagem SkyMount, adaptado ao
formato esférico do prédio, e servirá para cobrir os gastos lo-
cais de energia do estúdio. A ação da Fox Film faz parte de sua
Inciativa Global de Energia.
revistanovoambiente.com.br
Março/2011 86
Delson Amador
87
engenheiro eletricista

L’État c’est moi,


toi, lui, elle, de nous tous
implodir, como um sistema que de repente tem res-
tringido o número de espécies que o tornam simbióti-
co e viável. Reconhecidamente, o totalitarismo (e seus
vários nomes e desdobramentos) tem um impacto
ainda a ser mensurado nos recursos naturais do plane-
ta. Um cálculo que à primeira vista sucumbe aos indi-
cadores econômicos, mas que constitui parte de uma
conta que todos vamos pagar.

O Estado sou eu, você, ele, ela, somos todos nós.


Alterar a famosa frase atribuída a Luís XIV, o
“Rei Sol” francês, nos permite divagar sobre um senso
O que quero demonstrar é que é antiecológico
ser antidemocrático. Tomemos a indômita África
e suas dezenas de feudos, derreados por sobre um
de coletividade que foi se moldando ao longo do tempo imenso patrimônio natural, sistematicamente re-
em inúmeras sociedades. Levantes populares represen- duzido a pó, em nome da ganância e da manuten-
tam o caldo que entornou, a insustentabilidade gover- ção dos poderes tribais de poucos. O sofrimento, a
namental frente a novas demandas e comportamentos. miséria (que também sabemos ser uma catástrofe
Aqui, como no mundo árabe, o acesso à informa- ambiental) e as perdas irreparáveis já sofridas. Serão
ção, ao mundo globalizado chama cada cidadão ao pa- eles os próximos a se rebelar? Ou seremos nós?
pel que cumpre no seu próprio ecossistema, sua cidade, Qual é a nossa parcela de culpa neste contexto
seu estado, seu país. As pessoas organizam-se para boi- (nós, os compradores de petróleo, diamantes, de
cotar empresas, protestar contra leis e, igualmente, dis- marfim, de animais silvestres)? Estamos tão distan-
solver construtos insatisfatórios, que não refletem mais tes desta realidade por estarmos em um “mundo li-
a realidade dinâmica até então representada de forma vre”? Temos o poder de regulação em nossas mãos.
morosa pelo poder público. Usamos a ferramenta de O sufrágio que garante aumentos de salário e direi-
nossa vontade (poderosa ferramenta) até para organizar tos constituintes. Criticar beduínos imersos anos
movimentos completamente fúteis como o que recen- a fio na brutalidade parece ser uma tarefa simples.
temente houve em Nova Iorque, que arregimentou pes- Porém, lembremo-nos de nossa recente história de-
soas para andar de pijama no metrô. mocrática – aprendemos há pouco o que eles ainda
Na figura de seus ditadores, qualquer regime au- levarão um longo caminho para aprender.
toritário torna-se um bioma carcinômico, pronto para Quiçá esteja na hora de o Brasil começar a expor-
tar outro tipo de know-how. O da sustentabilidade
Formigas na Paraíba Obra legal, madeira ilegal
Depois do problema noticiado na edição passada, O Ibama flagrou, em fevereiro, o uso de madeira
sobre invasão de formigas argentinas nos Estados ilegal em obras do programa Minha Casa, Minha
Unidos, desta vez é na Paraíba que sofrem muitos Vida, do governo federal, em Altamira, no Pará.
agricultores e moradores da comunidade rural de As irregularidades apontadas na fiscalização sobre
Engenho Velho. Uma infestação de formigas está a documentação apontaram o uso de madeira de
destruindo lavouras, plantas e matando animais de castanheira. A madeira da castanheira é conside-
pequeno porte, além de infernizar a vida das pes- rada de excelente qualidade para aproveitamento
soas que tentam escapar todos os dias das ferroa- industrial. Com tronco bastante reto e uniforme,
das. Segundo informações de jornais locais, o pro- resistente, de fácil processamento e considerada
blema deve continuar por tempo indeterminado, bela, foi extraída descontroladamente até a extin-
já que ainda está prevista a visita de uma equipe ção em diversas regiões da Amazônia. Graças a esta
de estudiosos da Universidade Federal da Paraíba maneira pouco inteligente de extração, hoje sua
para avaliar a espécie de formiga e, a partir do diag- exploração é proibida por lei federal desde 1994.
nóstico, tomar providências de combate. O flagrante do Ibama, entretanto, mostra que a ex-
ploração ilegal de madeira de lei continua. O em-
preendimento em que se constatou as irregulari-
dades tem investimento total divulgado em R$ 37
milhões, mas, curiosamente, a empresa responsa-
bilizada pelo crime ambiental, a Em Casa, foi multa-
da em R$ 130 mil, o que representa menos de 0,5%
em punição. Os R$ 37 milhões são para a constru-
ção de 958 casas do Minha Casa, Minha Vida, o que
dá uma média de pouco mais de R$ 38 mil por casa
– mas vale lembrar que tais custos devem incluir
pavimentação de ruas, iluminação pública, entre
outras obras. A pergunta que fica é: quanto nos
custará a extinção total da castanheira? Certamen-
te muito mais do que seu valor comercial em toras
de madeira. Fica também o prejuízo (mais um) na
reputação do setor público, ao ver uma obra sob
sua responsabilidade ser palco de crime ambiental
e, pior ainda, com patrimônio brasileiro.
Adeus, abutres... ...e pinguins
Chega a ser irônico, não fosse tão triste, outra infor- Enquanto os abutres sofrem na Índia, uma colônia
mação do periódico internacional Scientific Ame- inteira do pinguim-imperador da Antártida desa-
rican, desta vez sobre a morte em massa de popu- pareceu graças ao degelo na região, causado pelo
lações do abutre-indiano-de-dorso-branco (Gyps aquecimento global. Segundo os principais portais
bengalensis). Um animal que de certa forma tem um científicos, os animais simplesmente desaparece-
papel perante a morte está acabando por sucumbir ram da ilha Imperador desde 2009. Avistados pela
diante dela. Importantes por consumir as carcaças de primeira vez em 1948, passaram a sofrer queda po-
animais mortos e assim evitar a proliferação de doen- pulacional a partir de 1978, desaparecendo no fim
ças que podem ser transmitidas por insetos, ratos e da década passada. O autor de uma pesquisa sobre
outros animais vetores delas, como cães selvagens, os o desaparecimento do pinguim-imperador, Philip
abutres estão morrendo justamente por cumprirem Trathan, do British Antarctic Survey (Observatório
tão bem o seu papel. Mas a culpa, é claro, está em Antártico Britânico), afirma não ser possível preci-
atitudes do homem. O uso de diclofenaco – anti-in- sar as causas do desaparecimento exclusivamente
flamatório aplicado em gados nas pastagens indianas no aquecimento ou degelo. Ainda assim é fato que
– é responsável por 99% das mortes de abutres-india- as mudanças climáticas podem ter alterado seus
nos-de-dorso-branco nos últimos 20 anos, segundo a comportamentos migratórios, bem como prolifera-
publicação. A morte ocorre por falência do espécies predadoras dos pinguins, colaborando
renal nos abutres que con- com sua ausência. O pinguim-imperador costuma
somem a car- retornar ao local de seu nascimento depois de um
ano, e Trathan especula que os nascidos no fim da
década de 1970 e com uma expectativa de vida de
cerca de 20 anos voltaram seguidamente à ilha,
como mandavam seus instintos, até que os grupos
começaram a ficar cada vez menores, chegando à
extinção. Outros estudos, mais catastróficos, esti-
mam o desaparecimento total da espécie nos pró-
ca- ximos 90 anos.
ça de animais
tratados com a droga. Proibida
desde 2006 pelo governo indiano, ainda é utili-
zada por muitos fazendeiros que desconhecem seus
efeitos nefastos, por pura falta de educação ambien-
tal. A morte dos abutres e a consequente proliferação
de doenças tornaram-se ameaça à saúde pública e à
vida das pessoas. Para tentar solucionar o problema e
ampliar o número de indivíduos da espécie da ave, bi-
ólogos criaram locais onde são disponibilizadas carca-
ças de animais livres do medicamento, para consumo
dos abutres. Os profissionais pagam US$ 67 por car-
caça, valor quase três vezes maior do que o pago pe-
los abatedouros locais pelos mesmos animais e, todas
as carcaças são testadas para se verificar a presença
da droga antes de serem liberadas para as aves. Ainda
assim, estudiosos locais apontam para a importância
da educação ambiental das pessoas e o respeito às
espécies, pois, mesmo com a tentativa de alimentar
os abutres, eles podem continuar morrendo enquan-
to o uso da droga for feito indiscriminadamente.
Da redação

N
é preciso sofrer”
o fechamento desta edição, o mundo todo temia o
vazamento de radioatividade de usinas nucleares
do Japão, causado pelo terremoto seguido de tsu-
namis que destruíram boa parte do país. Talvez tenhamos de-
morado para perceber, mas não adianta cuidarmos apenas do
nosso quintal, é necessário ter uma visão global. E essa foi nossa
preocupação desde o princípio, como Revista. Trazer pautas dos
mais variados setores envolvidos no desenvolvimento do Brasil,
sejam empresas, sejam pessoas, sejam governos, porque elas
estão intrinsecamente ligadas aos objetivos que desejamos
a esta nação: justiça, riqueza, desenvolvimento e respeito ao
meio ambiente. É preciso saber que, para acabar com o proble-
ma do lixo, é preciso analisar a outra ponta que pode viabilizar
isso, a economia de mercado. Quando detemos a atenção sobre
“Para escrever,
os rios, é preciso saber se o fabricante de sabão em pó e deter-
gentes está fazendo a parte dele, se o vendedor de fertilizantes
está atento à destinação do produto que fabrica. É necessário
ampliar a visão em torno de cada problema socioambiental.
Diante do uso cada vez mais constante desta publicação
por campanhas do governo, teses acadêmicas de graduação a
doutorado, temos cuidado triplicado com a origem dos dados,
pois, mesmo que oficiais, nem sempre representam com preci-
são uma realidade. Muitas vezes, argumentos óbvios derrubam
supostas verdades absolutas chanceladas por entidades ou go-
vernos, e cabe a nós também evitar propagar o erro, o que não
nos impede de errar por nós mesmos.
É difícil estabelecer prioridades sobre o que vai ou não ser
publicado em cada edição. São escolhas balizadas cada vez mais
por nossos leitores, cujas manifestações de simpatia e satisfa-
ção quanto ao nosso conteúdo têm se tornado cada vez mais
numerosas.
Se Dostoievski disse que para escrever é preciso sofrer (a
ação, a dor, a alegria), então ele estaria feliz conosco. Pois a cul-
tura de imersão continua, e ela nos arrebata. Vamos ao limite
do não envolvimento profissional com os temas, mas também
nos deixamos apaixonar, detestar, entristecer, recomendar,
apoiar e denunciar, porque esta Revista é feita de pessoas para
pessoas, como se olhássemos nos olhos dos leitores e contás-
semos sobre o que aprendemos. E neste mês novamente con-
tamos histórias tristes que não gostaríamos de contar, como
as enchentes em várias regiões do Brasil, arrasando cidades do
litoral paranaense, onde vimos o mesmo desespero das comu-
nidades que acompanhamos na Região Serrana do Rio de Ja-
neiro. Também contamos sobre iniciativas importantes, novos
rumos da indústria, da sociedade e do espírito humano. Tenta-
mos equilibrar não só os três pilares da Revista sustentável que,
enquanto empresa, também procuramos ser. Desta vez, procu-
ramos igualmente balancear a edição entre temas tristes e feli-
zes, porque se é preciso agir para evitar a degradação humana e
do planeta, também é necessário saber comemorar conquistas
que nos elevam; senão, qual seria a graça da vitória?

Março/2011 90 revistanovoambiente.com.br

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