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PARA UMA HISTÓRIA

DE VISEU
O PERCURSO DE UMA Esse avolumar de hipóteses,
HISTORIOGRAFIA: todas ou quase sem fundamen-
O PROBLEMA DAS ORIGENS to algum que ainda hoje nos
DE VISEU pareça válido, é significativo
de um profundo desconheci-
Por António João de Carvalho mento. Ainda no nosso sécu-
da Cruz lo ele se manifesta na polé-
mica que nas primeiras déca-
Desde o primeiro texto da das se estabelece sobre a qual
historiografia visiense, pelo me- a grafia a escolher entre Viseu e
nos daqueles que até nós che- Vizeu.
garam, as origens de Viseu Ao problema etimológico
são um problema nfo resol- costumava seguir-se o cronoló-
vido. Nlo que como tal ele gico.
tenha surgido perante esses ho- Botelho Pereira diz ser a ci-
mens. Nesses primeiros tempos dade "obra dos Romanos",
da historiografia viseense a dú- fundada "mais de cem anos
vida não aparece ainda como antes da vinda de Jesus Cris-
um caminho, o interrogar não to" num meio em que viviam
é ainda um método. Porém, "bárbaros", "verdadeiros
trata-se de um problema não lusitanos" que eram "das gen-
resolvido: quanto mais não seja tes que vieram com Tubal"
porque hoje não damos crédito neto de Noé, e que haviam
a muitos dos testemunhos que resistido a "uma grande e ge-
então foram utilizados nem ral seca" ocorrida uns 1300
aceitamos as conclusões que anos depois do dilúvio.
então foram tiradas. Aragão não ultrapassa a afir-
Normalmente, esse proble- mação de que a"a primeira '
ma aparece quando se pretende notícia Certa, constante de do-
saber a origem do nome de cumentos autênticos, que se
Viseu. refere a Viseu e lhe dá este
Nesse primeiro texto, o de nome, é do século VI da nossa
Botelho Ribeiro Pereira era "mas" em vista dos mo-
(1636), encontramos já refe- numentos arqueológicos e
rências às opiniões que dão a históricos, não pode duvidar-se
Viseu os nomes de Visonçio que a existência desta cidade
e de Vesurium, tirados de di- remonta a uma grande anti-
ferentes edições de Ptolomeu, guidade".
e à do autor, que opta por Vi- 80 anos depois, em 1974,
so. Com o passar do tempo a Alexandre de Lucena e Vale,
lista vai aumentando e, dois numa tentativa de visão das
séculos e meio depois, no l.o origens de Viseu, fica-se por
volume do Viseu de Maximia- um "segundo a lição actual
no de Aragão (1894), surgem e unânime dos mais concei-
os nomes de Lancia, Vacca, tuados arqueólogos, Viseu
Vico-Aquário, Visoncio, Verru-
vhim, Viso, Visonium, e Visoi. Cont. na pág. 6
de construção expedita" - que
PARA UMA HISTÓRIA a tinha como "uma sorte de
anexo social".
Estes são alguns dos passos
dàdos em direcção ao conhe-
DE VISEU que conseguiram ultrapassar a cimento das origens de Viseu.
O Caminho que hoje impor-
ta seguir é, antes de qualquer
C o m . da última pág.
construção proposta por esses outro, o de reunir todos os tes-
como aglomerado humano te- homens (que bem caberiam na temunhos que digam respeito
rá sido inicialmente um castro designação de antiquários) e, às origens de Viseu, sejam os
pré-histórico a remontar pelo pela primeira vez, resolveram arqueológicos, sejam os paleo-
menos aos tempos neolíticos. alguns problemas e colocaram gráficos, sejam os documentos
Tanto confirmam plenamente outros com fundamentos bem escritos e tentar interpretá-los
os inúmeros testemunhos ar- mais sólidos. de novo. Utilizando novos méto-
queológicos colhidos na área da Eles não se preocuparam dos, abordando novos aspectos,
cidade e suas imediações". O tanto com a origem etimoló- levantando novas hipóteses, ti-
vocabulário aqui utilizado, gica, quanto à antiguidade fo- rando novas conclusões.
todo ele vago nas atribuições ram mais críticos ao utiliza- Só então, só depois de se
traduz por um lado falta de rem apenas os testemunhos ar- ter feito este "ponto da situa-
segurança, por outro uma es- queológicos e foram além des- ção", devemos partir à busca
cassês de informação. E o con- tes problemas quando tentaram de novos testemunhos, Só en-
firmam plenamente quando procurar as principais causas tão eles poderio ser integral-
quase não há testemunhos... que concorreram para a for- mente aproveitados e melhor
Cronologicamente, entre mação de Viseu. compreendidos.
Aragão e Lucena e Vale fica o Para Amorim Girão, nas pa-
esforço de José Coelho, arqueó- lavras que escreveu para o Guia (1) Este texto, destinado a
logo incansável, Porém o seu de Portugal (1944), para a zo- primeiro de uma série de ar-
trabalho raramente ultrapassou na mais baixa "a causa desse tigos sobre as origens de Vi-
o descritivo. Porque sentiu que povoamento, nos tempos do seu que nunca cheguei a con-
lhe faltavam as pedras que lhe Império, parece ter sido as im- cluir, já há algum tempo se
permitiriam. construir o edifí- portantes vias romanas que per- encontrava terminado. Hoje,
cio da visão global? Porque to dali passavam" enquanto quando o revi, continuo a
não se sentia preparado para que para a colina da Sé teria achar que dificilmente se po-
esse trabalho? Porque, sempre sido o seu valor de defesa". derá explicar a ausência de in-
solicitado por muitas direcções Para Orlarldo Ribeiro (1971) terpretação na obra de José
não teve oportunidade de me- o desenvolvimento de Viseu de- Coelho. No entanto, as reflex-
ter ombros a essa tarefa? ve-se ao facto de a colina da xões que sobre as origens de
Dificilmente poderemos fazer Sé possuir "a dupla vantagem Viseu encontrei no seu Ca-
mais do que constatar esse do escarpado (. .)'.e da proxi- derno de Notas Arqueológicas*
facto; dificilmente, por isso, midade do rio - modesto aci- n.o 31, fs. 51 e ss., a propó-
poderemos optar por uma des- dente que podia facilitar a sito da leitura do Santuário
sas explicações (1). Deste mo- defesa" e simultaneamente se Mariano, de Fr. Agostinho de
do, o nome de José Coelho te- encontrar junto à Cava - Santa Maria, sugerem-me que
rá de ficar à margem deste per- acampamento militar destinada das três hipóteses formuladas
curso da historiografia viseense. a "garantir aos exércitos o a última não deve ser a menos
Os geógrafos foram aqueles abrigo de muros regulares mas importante.

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