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VARIAÇÃO DA RADIAÇÃO SOLAR À SUPERFÍCIE PELO VAPOR D’ÁGUA EM

FLORESTA NATIVA E PASTAGEM NA AMAZÔNIA.

Marcos Antonio Lima MOURA


Aluno Pós-Graduação: Energia na Agricultura/UNESP/Botucatu/SP
Departamento de Meteorologia/CCEN/UFAL/Maceió/AL
Gutemberg Borges FRANÇA e José Ricardo de A. FRANÇA
Departamento de Meteorologia/CCMN/UFRJ/RJ
Roberto Fernando da Fonseca LYRA
Departamento de Meteorologia/CCEN/UFAL/Maceió/AL
Mário BENINCASA
Centro de Estudos Ambientais/UNESP/Rio Claro/SP

ABSTRACT

This work presents comparisons of the atmospheric transmittance in two experimental


environments in the Amazonian forest (natural forest and pasture), during burning season. In the scope
of the field experiment RBLE3 (Rondônia Boundary Layer Experiment) and of the project ABRACOS
(Anglo-Brazilian Amazonian Climate Observational Study), global solar irradiance data were collected
and meteorological soundings were made in 1994 near Ji-Paraná, RO (Brazil). Atmospheric direct
transmittance values corresponding to the respective temperature and humidity profiles were evaluated
with the radiative transfer code LOWTRAN-7. The results indicated that transmittances are 3 % higher
in pasture area. The role of water vapor absorption and aerossol extinction on global solar irradiances
is discussed.

1- INTRODUÇÃO

É de grande relevância a questão do meio ambiente e suas implicações nas mudanças


climáticas. Atualmente os estudos experimentais associados à modelização são os meios mais
utilizados no sentido de identificar os efeitos das modificações no ambiente natural nas mais diversas
escalas espaciais.
Grande parte do desflorestamento causado na Amazônia é feito com a queima, depois de
derrubada, da cobertura vegetal existente. Este processo libera vários resíduos que poderão ocasionar
vários efeitos sobre o balanço de radiação solar. Segundo Crutzen & Andreae (1990), estas partículas
podem aumentar a absorção/dispersão de radiação solar não só pela atmosfera como também, mais
especificamente, pelas nuvens. Mesmo assim Kaufman et al., (1990) não encontraram absorção
significante pelos aerossóis sobre a região tropical poluída pela queima de biomassa associada ao
desflorestamento.
De um modo geral, os modelos físicos fundamentam-se em premissas básicas sobre os diversos
tipos de interação da radiação solar com o sistema terra-atmosfera, as condições de contorno e as
características atmosféricas. Em geral, a atmosfera é meramente tomada como uma camada média
atenuando a radiação solar extraterrestre pelos processos de dispersão e absorção (La Casinière et al.,
1997). Atualmente os códigos de transferência radiativa mais difundidos na literatura e disponíveis
para a comunidade científica são o 6S (Vermote et al., 1994) e o LOWTRAN-7 (Kneizys et al., 1988).
Especificamente, o LOWTRAN é um código radiativo de múltiplas camadas que permite utilizar
várias atmosferas padrões ou perfis atmosféricos medidos.
Neste trabalho propõe-se a comparar, em dois sítios experimentais na Amazônia, a influência
do vapor d’água na transmitância direta atmosférica, já que o mesmo é o mais importante absorvedor
do espectro solar, determinada através do código radiativo LOWTRAN-7, uma vez que foi detectada
uma diferença na radiação solar incidente nos dois sítios.

2 - METODOLOGIA

Foram utilizadas neste trabalho as radiossondagens convencionais do Experimento RBLE3


(Rondônia Boundary Layer Experiment) nos horários de 8, 11, 14 e 17 HL (hora local), juntamente
com as medidas de irradiância solar global à superfície (Rg) do projeto ABRACOS (Anglo-Brazilian
Amazonian Climate Observational Study) no período de 13 a 26/08/1994, período este englobado na
época seca e de queimadas da região.
Todas as medidas foram realizadas simultaneamente nos dois sítios experimentais: floresta e
pastagem. O sítio “floresta” esteve localizado na Reserva Biológica do Rio Jaru (10°05’S e 61°55’W),
com altura média da copa da vegetação em torno de 33m e presença de árvores emergentes com até
45m. O sítio “pastagem” (10°45’S e 62°22’W) foi instalado numa fazenda de criação de gado, em que
a vegetação natural já foi retirada totalmente e substituída por gramínea. A distância em linha reta
entre os sítios é de cerca de 100km e ambos situam-se próximos à cidade de Ji-Paraná, Rondônia.
Os perfis verticais de temperatura, pressão e umidade foram obtidos com equipamento PC-
CORA (Vaisala, Finlândia). As medições de irradiância solar global à superfície foram efetuadas com
piranômetros (Kipp & Zonen, Holanda) dotados de cúpulas hemisféricas quase transparentes para
comprimentos de onda entre 0,3 a 3µm. Uma descrição detalhada dos instrumentos e erros de
medições pode ser encontrada em Fisch (1996).
Ao atravessar a atmosfera terrestre a radiação solar interage com a mesma sofrendo processos
de absorção e dispersão. Considerando que os gases constituintes da atmosfera, com exceção do vapor
d’água, são estáveis e uniformes em concentração, a transmitância direta foi calculada utilizando o
código radiativo LOWTRAN-7.
Após a consistência dos dados, apesar dos perfis terem se mostrado representativos para o
período estudado através do cálculo de média e desvio padrão, preferimos trabalhar com o perfil
vertical do dia 19 de agosto de 1994 (Dia Juliano 228), pois o mesmo se apresentou como um dia de
céu claro em que foi registrada a maior irradiância solar global (Rg) do período. Também para facilitar
a análise e tornar a conjuntura mais representativa das condições foram feitos os cálculos da
transmitância em dois intervalos considerados: Visível (0,3 - 0,7 µm) e Infravermelho (0,7 - 3 µm).

3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO

Durante a execução do experimento, as condições sinóticas foram típicas da estação seca, com
muita influência de queimadas e pouca atividade convectiva, tanto que no caso específico da área de
Ji-Paraná, foram observados 117 focos de queimadas e, estes aerossóis produziram muita névoa seca
(Fisch, 1996), tanto que no aeroporto de Porto Velho, RO, foi registrada uma visibilidade de 1.000m.
Conforme já verificado por vários autores (Fisch, 1996; Lyra et al., 1997) a irradiância solar
global (Rg) foi maior na floresta do que na pastagem. É importante salientar que os referidos autores,
por dedução, atribuem este fenômeno as queimadas. É conveniente registrar que, utilizando a razão
entre o fluxo integrado da radiação solar incidente à superfície e no topo da atmosfera, Fisch (1996)
não encontrou diferença expressiva entre a transmitância global (soma das transmitâncias direta e
difusa) diária na floresta e pastagem durante o experimento RBLE3.
Já o comportamento do ciclo diurno da umidade do ar é mínimo no início da manhã e máximo
no final da tarde, o que faz com que sejam semelhantes nos dois sítios, só que levemente superior na
floresta. Entretanto, é importante ressaltar que Lyra et al. (1994) asseveram que a evapotranspiração da
pastagem representa apenas 50% do valor observado na floresta, concluindo que o suprimento de
umidade na pastagem só pode ser efetuado via advecção, apesar de não haver nenhuma comprovação
da existência de uma circulação local.
É pertinente salientar que a transmitância direta devido ao vapor d’água, tanto para o espectro
visível como para o espectro infravermelho, têm um comportamento semelhante para os dois sítios
experimentais, conforme pode ser observado no Quadro 1 e na Figura 1. De um modo geral,
observam-se que as transmitâncias apresentam pequenas disparidades, com uma diferença relativa
menor do que 3% em favor da pastagem, exceto no infravermelho às 14 horas, quando a transmitância
na pastagem foi menor, devido justamente a uma maior quantidade de água precipitável.

Quadro 1 - Transmitâncias atmosféricas médias (τ) no espectro visível (τ(vis)) e no infravermelho


(τ(iv)), ângulo zenital (γ), em graus, e água precipitável (w), g.cm-2, na pastagem e floresta.
PASTAGEM FLORESTA
Hora τ(vis) τ(iv) γ w Hora τ(vis) τ(iv) γ w
08 0,226 0,458 64,31 5,00 08 0,223 0,444 64,17 5,80
11 0,438 0,581 28,61 2,56 11 0,434 0,575 28,27 2,61
14 0,412 0,563 38,50 2,87 14 0,399 0,564 38,25 2,60
17 0,068 0,287 78,27 11,76 17 0,066 0,282 78,15 11,58

Por outro lado, como era esperado, as menores transmitâncias ocorrem no início da manhã e
final da tarde. Naturalmente que isso está associado não só à quantidade de água precipitável, como
também com mais ênfase ao ângulo zenital, principalmente no espectro visível. Apesar da
transmitância no infravermelho está essencialmente associada a absorção do vapor d’água nota-se que
a transmitância vai aumentando de maneira similar com o aumento do comprimento de onda para
todos os horários, com exceção da absorção de algumas faixas bem definidas de comprimento de onda.
Infelizmente não foi possível fazer uma avaliação diferenciada para a componente direta e
difusa, uma vez que não há possibilidade com os dados disponíveis. Com um erro instrumental
estimado em 1% e uma diferença média de 5% na Rg em favor da floresta, deduz-se que esta diferença
de 3% na transmitância atmosférica é significativa, considerando-se as condições estudadas.

4 - CONCLUSÕES

Os resultados indicaram haver uma transmitância direta atmosférica média devido ao vapor
d’água maior na pastagem em relação a floresta em torno de 3%. Isso demonstra que este percentual,
que é significativo, não é compatível com as diferenças detectadas na radiação solar global (Rg) `a
superfície nos dois sítios experimentais, precisamente porque os maiores Rg ocorrem na floresta, o que
faz supor uma forte influência dos aerossóis oriundos das queimadas na pastagem e floresta nativa,
conforme já relatado por diversos autores.

5 - BIBLIOGRAFIA CITADA

CRUTZEN, P.J. , ANDREAE, M.O. Biomass burning in the tropics: impact on atmospheric chemistry
and biochemical cycles. Science(Washington, D.C.), v.250, p.1669-78, 1990.
FISCH, G. Camada limite Amazônica: aspectos observacionais e de modelagem . S.J.Campos, 1996,
171p. Tese(Doutorado em Meteorologia) - INPE.
KAUFMAN, Y.J., TUCKER, C.J., FUNG, I. Remote sensing of biomass burning in the tropics. J.
Geophys. Res., v.95, 9927-39, 1990.
KNEIZYS, F.X., SHTTLE, E.P., ABREU, L.W., CHETWYND, J.H., ANDERSON, G.P.,GALLERY,
W., SELBY, J.E. A, CLOUGH, S. A. Atmospheric transmittance and radiance: computer code
LOWTRAN-7. Hanscon AFB, Air Force Geophysics Laboratory, 1988, 135p.
La CASINIÈRE, A., BOYOKE, A.I., CABOT, T. Direct solar spectral irradiance measurements and
updated simple transmittance models. J.Appl. Meteorol., v.36, p.509-20, 1997.
LYRA, R., SOUZA, S., NOBRE, C., FISCH, G. Desmatamentos da Amazônia e sua repercussão ao
nível da camada limite atmosférica: Projeto RBLE. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE
METEOROLOGIA, 8, 1994, Belo Horizonte, MG. Anais...Belo Horizonte: Sociedade Brasileira
de Meteorologia e Federação Latino-Americana e Ibérica de Sociedades de Meteorologia, 1994,
p.1266-69.
LYRA, R., SOUZA, S.S., FISCH, G. Comparação floresta-pastagem através dos balanços à superfície
durante a estação seca. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE AGROMETEOROLOGIA, 10,
1997, Piracicaba, SP. Anais...Piracicaba: Sociedade Brasileira de Agrometeorologia, 1997,
p.552-54.
VERMOTE, E., D. TANRÉ, J.L. DEUZÉ, M. HERMAN & J.J. MORCRETTE - "Second Simulation
of the Satellite Signal in the Solar Spectrum (6S): Users Guide". 183 pp, 1994.
t.08 t.08
( a) ( b) t.11
t.11
t.14
t.14 t.17
1 t.17 1
0,9 0,9
0,8 0,8
0,7 0,7
0,6 0,6
0,5 0,5
0,4 0,4
0,3 0,3
0,2 0,2
0,1 0,1
0 0

Comp. onda (micrômetro) Comp. onda (micrômetro)

t.08 t.08
(c) t.11 ( d) t.11
t.14 t.14
t.17 t.17
1 1
0,9 0,9
0,8 0,8
0,7 0,7
0,6 0,6
0,5 0,5
0,4 0,4
0,3 0,3
0,2 0,2
0,1 0,1
0 0

Comp. onda (micrômetro) Comp. onda (micrômetro)

Figura 1 - Comportamento da transmitância direta na pastagem (a) visível , (b) infra-vermelho e na


floresta (c) visível e (d) infra-vermelho.

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