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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO


DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO-SENSU
PROJETO "A VEZ DO MESTRE"

PSICOMOTRICIDADE

MÓDULO III

DESAFIOS DA ESTRUTURAÇÃO
ESPACIAL
Por: Fátima Maria Oliveira Alves

Prof. Fernando Arduini


Coordenação Geral
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SUMÁRIO

Introdução 03
Perturbações da Orientação Espacial 06
Orientação Temporal 08
Pré-Escrita 13
Maturidade para a Leitura e a Escrita 16
Bibliografia 19
Auto-avaliação 20

MÓDULO III ver 1.0 - PSICOMOTRICIDADE Projeto “A Vez Do Mestre”


INTRODUÇÃO

ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL

É através do espaço e das relações espaciais que nos situamos no meio em


que vivemos, em que estabelecemos relações entre as coisas, em que fazemos
observações, comparando-as, combinando-as, vendo as semelhanças e diferenças
entre elas. Nesta comparação entre os objetos, constatamos as características
comuns a eles (e as não comuns também).

Em primeiro lugar, a criança percebe a posição de seu próprio corpo no


espaço. Depois a posição dos objetos em relação a si mesma e, por fim, aprende a
perceber as relações das posições dos objetos entre si.

Para a criança assimilar os conceitos espaciais, precisa ter uma lateralidade


bem definida. A lateralização é a base da estruturação espacial e é através dela que
uma criança se orienta no mundo que a rodeia.

DESENVOLVIMENTO

Segundo Poppovic (1966), orientar-se no espaço é “ver-se e ver as coisas


no espaço em relação a si próprio, é dirigir-se, é avaliar os movimentos e adaptá-los
ao espaço. É, principalmente, estabilizar o espaço vivido e desta forma poder situar-se
e agir correspondentemente.”

E nesta dimensão, para Le Boulch (1983), a representação do espaço e a


imagem corporal evoluem paralelamente e suas etapas de evolução são correlativas.

Segundo Giacomim (1985), a exploração do espaço começa no momento


em que a criança consegue os primeiros movimentos voluntários e os vai ampliando
com a aquisição do engatinhar, da marcha e da verbalização.

O espaço humano é todo orientado no sentido esquerdo, direito, acima,


abaixo, longe e perto.

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Até os 3 anos, o espaço da criança se orienta em função das suas
necessidades afetivas, que se caracterizam pelas relações de proximidade com a mãe.
É um espaço sem formas e dimensão, segundo Piaget.

A partir dos 4 anos, a criança é levada a tomar consciência das referências


espaciais, tomando como base o seu próprio corpo: “A cabeça está em cima, os olhos
estão ao lado do nariz.”

Ela começa a organizar as suas relações espaciais de forma progressiva.


Consegue reproduzir as formas geométricas utilizando o grafismo, diferencia o longe-
perto, acima-abaixo e, assim, associa uma série de referências espaciais. Na
organização do espaço, a própria criança encontra situação que a favorece: a
ocupação do espaço nas brincadeiras e jogos, a organização do grupo (em fileiras,
roda, duplas) e a conscientização de ritmos diversos. A verticalidade é a primeira
aquisição.

Os exercícios de localização no espaço, de apreciação de trajetórias e de


velocidade, vêm após os citados anteriormente.

A criança tem necessidade de um espaço para se mover. A partir da


percepção do próprio corpo, é que pode ser percebido o espaço exterior.

Este espaço exterior é explorado, no início, por uma dupla em simultânea


percepção:

• Percepção extereoceptiva – a visão de um objeto (se faz através de


estímulos exteriores – vem de fora para dentro);

• Percepção proprioceptiva – os gestos que são necessários para apanhá-


lo (análise de dentro para fora).

Quando um objeto é fornecido a uma criança, ela começa por movê-lo em


torno do corpo, investindo assim no espaço que nos rodeia. Depois, lança os objetos
em diferentes direções. A criança vivencia um “eu” que ultrapassa os limites corporais,
depois de ter se alongado ao máximo em direções ao gesto. É a projeção no espaço a
partir de si mesmo. As coordenações viso-tátil-cinestésicas desenvolvem-se na
presença dos objetos, adquirindo um “espaço-prático”.

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Aos nove meses, ela começa a diferenciação do sujeito-objeto. Suas mãos
manipulam os objetos, construindo, com isso, um “espaço objetivo e operativo”,
através da tomada de consciência de seus limites corporais e de diferentes posições
que os objetos ocupam.

O controle da verticalidade vai lhe permitir ver o mundo de outra maneira,


não mais depende do outro, passando de um “espaço bucal” para um “espaço
próximo”, havendo maior liberdade de manipulação. Com o domínio da marcha, ocorre
o ingresso num “espaço locomotor”, passando a agir através do seu próprio
deslocamento.

Nesta fase é necessário tocar, manusear, subir, descer, sair, ou seja,


vivenciar várias experiências para que ela aprenda as formas, as dimensões, as
direções, orientações, as superfícies, os volumes e, assim o fazendo, poder melhor
ajustar-se às situações concretas.

As noções de orientação direita – esquerda e laterais constituem as


primeiras aquisições no domínio da estruturação espacial, promovendo uma boa
adaptação escolar no momento do aprendizado da leitura e da escrita, que depende,
em parte, da orientação espaço-temporal.

Muitas desordens do comportamento escolar reconhecem, como causa


inicial, uma perturbação desta função.

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PERTURBAÇÕES DA ORIENTAÇÃO ESPACIAL

CAUSAS

• Motoras: perturbações ligadas ao ritmo irregular da respiração do sujeito


ou a um problema auditivo;

• Psicomotoras: falta de orientação e de organização espaciais;

• Psicológicas: a criança sofreu um choque afetivo ou vive em ambiente


inseguro, onde não existem pontos de referência suficientes, onde os horários não são
fixos, nem das refeições, nem de levantar-se, de deitar-se, além da insegurança da
criança nunca saber se, depois do jantar, seus pais ou responsáveis ficarão em casa
com ela etc.

Existem diferentes etapas que marcam a aquisição de um espaço


coordenado e não poderiam ser compreendidas sem que se faça referência à evolução
da percepção do “corpo próprio”.

No decorrer do período pré-escolar, a criança deverá passar de um espaço


topológico ao espaço euclidiano.

Entre 6 e 7 anos, durante o ciclo preparatório, ela será capaz de associar os


conceitos direita e esquerda em relação a um lado de seu corpo. Para isto, ela deve
dispor de uma dominância lateral estável e de fazer atuar sua função de interiorização.

A partir do ciclo elementar, a criança disporá de uma imagem estática do


corpo operatório. Isto significa que estará apta a reproduzir, mentalmente, seu corpo
de acordo com os três eixos: alto – baixo, frente – atrás e direita – esquerda. O corpo
será um fator de referência e de orientação, permitindo a estrutura do espaço
circundante.

Quanto a este aspecto, note-se a importância que assume a representação


mental da reta (entre 7 e 8 anos), permitindo à criança prolongar ao infinito os eixos do
corpo e ingressar no espaço projetivo.

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Concluímos que uma criança adquire a estruturação espacial quando:

• toma conhecimento dos diferentes termos espaciais e da realidade que


eles representam;

• aprende a se orientar e a orientar as coisas;

• consegue orientar-se e, também, combinar várias orientações, tendo


noções de obliqüidade, ocupando um espaço pré-determinado, organizando trajetos
etc;

• compreende o que muda de uma figura para outra nas representações


espaciais, percebendo relações tais como: a simetria – a oposição – o ritmo – a
inversão – a transposição – os elementos orientados, de acordo com um movimento
rotatório – os elementos adicionados ou subtraídos.

Uma boa estruturação espaço-temporal não seria concebível sem uma


experiência vivida, bem dominada no tempo e no espaço. Realizado este sincretismo
prévio por volta dos 8 anos, a estruturação espaço-temporal vai solicitar a inteligência
analítica. Inversamente, o treinamento para uma boa estruturação espaço-temporal é
um meio de educar a inteligência.

Para Piaget, a orientação e a estruturação espaciais são importantes todo o


tempo, em nossa criança interior que, se não trabalhada a contento, deve colocar-se
em relação ao espaço e reestruturar-se em relação ao tempo... Ah! O tempo é
mágico!

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ORIENTAÇÃO TEMPORAL

“Orientar-se no tempo é avaliar o movimento


no tempo, distinguir o rápido do lento, o sucessivo do
simultâneo. É saber situar os movimentos do tempo, uns
em relação aos outros.”(Poppovic – 1966)

“O espaço é um instantâneo tomado sobre o


curso do tempo e o tempo é o espaço em movimento (...) o
tempo é a coordenação dos movimentos: quer se trate dos
deslocamentos físicos ou movimentos no espaço, quer se
trate destes movimentos internos que são as ações
simplesmente esboçadas, antecipadas ou reconstituídas
pela memória, mas cujo desfecho e objetivo final é também
espacial...”(Jean Piaget)

O desenvolvimento da estruturação temporal na criança é importante, pois,


por intermédio do ritmo é que ela terá uma boa orientação no domínio do papel, na
escolarização, construindo palavras de forma ordenada e sucessiva na utilização das
letras, umas atrás das outras, obedecendo a um certo ritmo e dentro de um
determinado tempo. Na comunicação oral, também estruturará os sons das palavras
dessa mesma forma, diferenciando os diferentes sons, reconhecendo as freqüências e
as durações dos sons das palavras, aprendendo a ler com mais facilidade.

A estruturação temporal garantirá experiências de localização dos


acontecimentos passados e uma capacidade de projetar-se para o futuro, fazendo
planos e decidindo sobre sua vida. A estruturação temporal insere o homem no tempo,
onde ele nasce, cresce e morre, e sua atividade é uma seqüência de mudanças. Seu
“relógio interno”, como diz Defontaine, é condicionado pelas atividades diárias.

Normalmente, dormimos à noite e de dia trabalhamos. Isto significa que,


quando chega a noite, temos uma enorme necessidade de nos recolher. A hora de
dormir não é tão determinada pela quantidade de sono como pelo hábito.

Não conseguimos distinguir, ou seja, separar o tempo do espaço.


Preferimos tratar o assunto como sendo a percepção espaço-temporal, pois chegamos
ao entendimento de que as noções de corpo devem estar intimamente ligadas ao
espaço e ao tempo, tendo um sistema de referência, conforme esclarece Defontaine
(1980).

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Não podemos esquecer, também, que o ritmo está presente em todos os
momentos do desenvolvimento, como vimos antes, ou seja, desde o momento em que
o óvulo é liberado pelo ovário, quando percorre um ritmo próprio até chegar ao
encontro com o espermatozóide que, também, utilizou-se de seu ritmo para chegar até
o óvulo (ritmo próprio biológico).

A estrutura temporal, tanto quanto a estrutura espacial, também não são


conceitos inatos, tendo que ser construídas. Exigem esforço e um trabalho mental da
criança de tal ordem que ela só conseguirá realizar quando tiver um desenvolvimento
cognitivo mais avançado.

A percepção temporal permite, além da consciência e da interiorização dos


ritmos motores corporais, a percepção dos ritmos exteriores. Esta passagem é
indispensável para que a criança possa tomar conta de seus próprios movimentos e
organizá-los a partir da representação mental. Esta última possibilidade só se realizará
no estágio seguinte do desenvolvimento psicomotor.

No ajustamento global, a criança tem consciência apenas do objetivo a ser


alcançado. O ajustamento com representação mental implica, ao mesmo tempo, a
consciência do objetivo visado e a representação da forma gestual colocada em jogo.

Esta representação mental exige a interiorização da organização temporal


das diferentes seqüências do momento que caracteriza o seu ritmo. O encadeamento
harmonioso dos “tempos”, graças a uma boa estruturação temporal, confiará ao
movimento a sua unidade.

Desde o nascimento, os ritmos corporais devem ajustar-se às condições


temporais impostas pelo ambiente, levando a uma organização de ritmicidade na
sintonização. Depois do nascimento, a repetição rítmica reforça o movimento, acentua
os tempos fortes e provoca uma euforia mediante uma espécie de auto-satisfação de
sentir, de forma harmoniosa, o jogo das sensações proprioceptivas.

A experiência rítmica vivida com seus próprios movimentos ajusta-se aos


dados do espaço e deve ser mantida através do trabalho de percepção temporal. Esta
percepção temporal influirá nos dados do ambiente e, em particular, nos dados
sonoros, pelo jogo de interiorização de seus próprios ritmos motores.

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A criança, no fim do período “corpo vivido”, deve dispor de uma motricidade
global bem organizada temporalmente, elemento fundamental de seu ajustamento ao
meio. A experiência vivenciada ritmicamente desenvolve-se, não só no plano motor,
mas também no plano da linguagem.

Ainda no fim deste período, a criança inicia a compreensão de horas, dias,


meses, anos, das estações do ano, associando-os com eventos concretos que
ocorrem no seu dia-a-dia.

EXISTEM 2 TIPOS DE TEMPO

• Tempo subjetivo – é aquele criado por nossa própria impressão, varia


conforme as pessoas e a atividade do momento (o momento de prazer passa mais
depressa do que o momento de aborrecimento);

• Tempo objetivo – é o tempo matemático, sempre idêntico; uma hora


dura sempre sessenta minutos.

Podemos desenvolver na criança a noção de tempo objetivo a partir de


pontos de referência, tais como: hora das refeições, dias de atividades especiais,
atividades próprias das estações, que são importantes na vida cotidiana, pois a maioria
de nossas atividades são reguladas pelo tempo objetivo: como o horário escolar, a
hora do almoço etc.

O ritmo é considerado um dos conceitos mais importantes da orientação


temporal. Ele não envolve apenas noções de tempo, mas está ligado ao espaço
também. Toda criança tem um ritmo natural, espontâneo. As manifestações do bebê
são ritmadas. Tem hora de repouso e horas de impulsos e se manifesta através delas.

A vida moderna interfere no ritmo de cada indivíduo, porém muito de nosso


ritmo natural se conserva conosco. O ritmo pode ocorrer em várias áreas de nosso
comportamento. Ele traduz uma igualdade de intervalos de tempo.

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RITMO MOTOR

Está ligado ao movimento do organismo que se realiza em um intervalo de


tempo constante. É condição necessária que a criança possua anteriormente uma
coordenação global dos movimentos para que estes se tornem ritmados. Exemplos:
andar, nadar, correr.

RITMO AUDITIVO

Normalmente é trabalhado em associação com algum movimento.


Exemplos: cantar, dançar, tocar instrumentos.

RITMO VISUAL

Envolve a exploração sistemática de um ambiente visual muito amplo para


ser incluído no campo visual em uma só fixação. É necessário que possua uma certa
organização de ritmo também.

Os movimentos ritmados servem para expressar sentimentos. O ritmo


permite uma maior flexibilidade de movimentos, um maior poder de atenção e
concentração, pois obriga a criança a seguir uma cadência determinada. A percepção
da alternância de tempos fracos e fortes leva à percepção do relaxamento e das
pausas.

Assim que a criança adquire uma coordenação global dos movimentos e


uma ritmicidade espontânea, já poderão ser introduzidos a ela tempos ritmados
através de danças cantadas, por exemplo.

Le Boulch afirma que devem-se introduzir, nas manifestações rítmicas das


crianças, as estruturas rítmicas. Elas representam uma ruptura na igualdade de
cadência, sempre constante, através da introdução de intervalos diferentes de tempo.

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Os conceitos temporais apresentam maior dificuldade para serem
compreendidos. A criança sente a passagem do tempo, inicialmente, pelos seus
próprios ritmos e necessidades biológicas (a fome e a sede que obedecem a uma
organização rítmica, sincronizada pela alternância vigília-sono).

Assim, desde o nascimento, devem-se ajustar os ritmos corporais de uma


criança às condições temporais impostas pelo ambiente, para que haja uma
organização da ritmicidade da mesma que será o 1º ponto referencial da informação
temporal que com o decorrer do seu desenvolvimento terá a percepção do tempo.

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PRÉ-ESCRITA

Aprender a ler e escrever é como aprender um jogo: é preciso conhecer as


combinações, as regras, ter vontade e treinar bastante. Vale a pena, não vale?
Aprendendo o jogo da escrita é possível conhecer e escrever histórias, poesias, cartas,
bilhetes, reportagens, pesquisas, tomar ônibus e chegar à rua que estamos
procurando; portanto, podemos conhecer o mundo e suas coisas.

O desenvolvimento da escrita não se deve simplesmente a um acúmulo de


exercícios. A escrita constitui o produto de uma atividade psicomotora extremamente
complexa, na qual participam os seguintes aspectos: a maturação do sistema nervoso,
expressa pelo conjunto de atividades motoras; o desenvolvimento psicomotor geral,
especialmente no que se refere à tonicidade e coordenação dos movimentos e o
desenvolvimento da motricidade fina, ao nível dos dedos e da mão.

Do ponto de vista da linguagem, a escrita implica, para a criança, uma


reformulação de sua linguagem falada, com o propósito de ser lida. O aprendizado da
escrita, como modalidade da linguagem, pode ver-se afetado de forma específica,
conservando intactas as outras condutas verbais. Em outras palavras, uma criança
pode ter dificuldade para executar os padrões necessários para o traçado de letras,
números ou palavras, apesar de ter um bom nível de linguagem oral e ser um bom
leitor.

O aprendizado da escrita, como modalidade da linguagem expressiva,


requer que a criança não só tenha alcançado um determinado desenvolvimento da
linguagem e do pensamento, como também tenha desenvolvido sua afetividade de
maneira tal que lhe permita codificar mensagens com matizes emocionais
diferenciados.

O desenvolvimento está sempre em relação com as funções motoras,


verbais, perceptivas, entre outros. Progredimos do simples para o complexo, do geral
para o específico, do homogêneo para o heterogêneo. Não há desenvolvimento
possível sem uma estrutura que o origina e o sustenta. Estrutura subjetiva que os torna
singulares.

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Quem escreve é o sujeito criança, mas para fazê-lo necessita de sua mão,
de sua orientação espacial (lateralidade), de um ritmo motor (relaxamento-contração),
de sua postura (eixo postural) e de seu reconhecimento no referido ato (função
imaginária).

Uma graduação progressiva de atividades envolve desde a coordenação


motora global, o equilíbrio, a relaxação, a dissociação de movimentos, o esquema
corporal, lateralização, a estruturação espacial até a motricidade fina.

Na Educação Infantil, todos os aspectos da percepção devem ser


trabalhados: o visual, o auditivo, o tátil, o olfativo e o gustativo. A imagem corporal, que
é a impressão que a criança tem de seu corpo, pode ser medida a partir de desenhos
da figura humana que ela realiza.

A lateralidade é definida a partir da preferência neurológica que se tem por


um lado do corpo, no que diz respeito à mão, ao pé, ao olho e ao ouvido. Essa
dominância é importante para desenvolver diferentes habilidades, inclusive as de
leitura.

Orientar-se no espaço é ver-se e ver as coisas no espaço, em relação a si


próprio. É dirigir-se, avaliar os movimentos e adaptá-los no espaço. É estabilizar o
espaço vivido e, dessa forma, poder situar-se e agir de forma correspondente. Enfim, é
a consciência da relação do corpo com o meio.

Para compreender o tempo, é necessário levar em consideração dois


aspectos: o tempo próprio de cada indivíduo e o tempo externo ao qual ele deve se
adaptar. A criança se organiza temporalmente a partir do próprio tempo. Através da
percepção do tempo vivido, ela adquire condições de dominar determinados conceitos,
como ontem, hoje, amanhã, dias da semana, meses, anos, horas, estações do ano
etc.

A coordenação motora global coloca em ação vários grupos musculares


amplos, enquanto a coordenação fina envolve habilidades manuais, como a preensão,
que são essenciais para o desenvolvimento do grafismo e da escrita. A falta de
habilidade rítmica pode causar uma leitura lenta, silabada, com pontuação e entonação
inadequadas.

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A escrita é uma das formas superiores de linguagem e requer que a pessoa
seja capaz de conservar a idéia que tem a mente, ordenando, numa determinada
seqüência, a relação. Escrever significa relacionar o signo verbal, que já é um
significado, a um signo gráfico. É planejar e esquematizar a colocação correta de
palavras ou idéias no papel. O ato de escrever envolve, portanto, um duplo aspecto: o
mecanismo e a expressão do conteúdo ideativo.

A evolução do grafismo se faz em ritmo pessoal, com um sentido que lhe é


próprio. Entretanto, características comuns aparecem nas representações gráficas de
todas as crianças, dando origem a diversas classificações, por diferentes autores, dos
estágios de desenvolvimento gráfico. Destacamos, a seguir, a classificação por
Ajuriaguerra.

ESTÁGIO FAIXA ETÁRIA CARACTERÍSTICAS


- A criança não possui domínio motor para
os traçados gráficos;
- não tem controle na inclinação e
dimensão de letras;
Pré-caligráfico De 5-6 a 8-9 anos - não faz margens ou as apresenta de
forma desordenada;
- tem postura errada do tronco, cabeça e
braços ao escrever;
- copia as palavras letra por letra.
- a criança já domina as dificuldades em
pegar e manejar os instrumentos gráficos;
- distribui corretamente as margens;
Caligráfico De 10 a 12 anos - sua escrita imita o modelo: é ainda pouco
pessoal;
- tem melhor postura de cabeça e do
tronco (mais longe do papel).
- modifica a escrita, dada a necessidade
de maior rapidez para acompanhar o
De 11 anos em
Pós-caligráfico pensamento e as atividades escolares;
diante
- tem postura correta.

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MATURIDADE PARA A LEITURA E A ESCRITA

RABISCAÇÃO DESCONTÍNUA

É o puro prazer na manipulação do instrumento (lápis, caneta ou pincel) e


nenhuma intenção de comunicação do pensamento. Revela ausência de qualquer
coordenação de movimentos. Os lápis batem na superfície do papel e escorregam ao
acaso.

RABISCAÇÃO DE LINHAS CONTÍNUAS

Desvela, como no caso anterior, prazer na manipulação do material e


nenhuma intenção de expressão de pensamento. Contudo, o nível de coordenação de
movimentos aperfeiçoou-se um pouquinho. Há mais facilidade na manipulação do
lápis.

CÉLULAS

Ocorre por volta dos 3 anos e meio. Quase simultaneamente a criança


interpreta as formas obtidas: “Olha, tia, um balão”!

“Aqui, ó, um sol”. Não houve ainda intenção em expressar essa ou aquela


idéia, antecipadamente, mas evidencia o fato que o homem tende a atribuir significado
à forma fechada, o que o torna (no futuro) capaz de ler. Nesta fase, os significados
mudam, ora a célula é um sol, ora um balão... Não há, portanto, associação entre
significado e significante. A forma escrita não tem valor de comunicação ainda.

GARATUJAS

Das células saem agora radiais e, no seu interior, aparecem pontos


indicando os olhos, às vezes, a boca e o nariz. As radiais são interpretadas como
braços e pernas, não importando quantos sejam, pois a esta altura a percepção de
quantidade (número) ainda não se instalou.

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O desenho livre mostra sempre o que a criança sabe e como ela “vê” as
coisas. No caso; a cabeça é importante e os braços e pernas, ela sente que existem; o
tronco só vem depois. O desenho é a expressão fiel do seu conhecimento e não cópia
da realidade. Tentar ensinar a criança a fazer bonecos é um ato enganador e
infrutífero. À medida que ela descubra os “seus” pedaços: barriga, umbigo e o que for
importante, ela os representará com os traços ou os pontos que ela souber fazer. É por
volta dos 4 anos que as garatujas aparecem, quando, também, as mãozinhas
ganharam maior destreza de movimentos.

FIGURAS ISOLADAS

Por volta dos 5 anos, a coordenação de movimentos deve ter-se


aperfeiçoado e a percepção e detalhes também evoluídos. Ex.: “Olha, tia, um homem
de neve, um bombom e um carro tava correndo na estrada”. Não há orações
coordenadas e o desenho não forma um conjunto organizado. Há um maior poder de
coordenar movimentos e dirigi-los, sob o comando do cérebro, em movimentos
intencionais – as figuras são mais identificáveis, mas mostram que o pensamento
divaga ao sabor do acaso. Iniciar uma alfabetização, nesta hora, seria contar com
sérios riscos de insucesso, as habilidades psicomotoras da criança estariam aquém do
necessário. Desenho é “sintoma”, é expressão do que está organizado internamente e,
por isso, é o desenho livre que vale e o seu exercício que desenvolve a criança.

CENAS SIMPLES

Revelam um aprimoramento na organização de idéias, um nível


possivelmente maior de coordenação motora, maior memória de detalhes, mas ainda
está insuficiente quanto à orientação espacial.

CENA COMPLETA

Por volta dos 6 anos, em média, a criança expressa, através do desenho


espontâneo da cena completa com detalhes, toda uma organização do pensamento
que inclui, além de orações coordenadas, algumas orações subordinadas. A cena
completa é a expressão de idéias em conjunto único, portanto, idéias inter-

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relacionadas. A colocação dos objetos pousados sobre a linha do chão, a
representação do céu por uma linha próxima à borda superior do papel indicam
claramente a visão de localização dos objetos no espaço já adquirido pela criança.

PERTURBAÇÕES DO GRAFISMO

Causas:

- má coordenação motora;
- rigidez ou crispação dos dedos;
- problemas psicológicos;
- instabilidade da criança;
- a criança quer terminar bem depressa.

Respeitando cada fase do desenvolvimento e a individualidade de cada ser,


fica mais fácil evitarmos problemas futuros.

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BIBLIOGRAFIA

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FONSECA, V. da. Psicomotricidade Filogênese, Ontogênese e Retrogênese. Porto
Alegre: Revista e Aumentada, 1988.
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LAPIERRE, Aucouturier. Simbologia do Movimento. Barcelona: 1977.
LE BOUCH, Jean. Rumo a uma Ciência do Movimento Humano. Porto Alegre: Artes
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MACHADO, Angelo. Neuroanatomia Funcional. RJ: Atheneu, 1988.
MORAIS, A.M.P. Distúrbios de Aprendizagem: uma Abordagem Psicopedagógica.
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ROSADAS, Sidney de Carvalho. Educação Física Especial para Deficientes. RJ:
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SANTOS, C.C. dos. Dislexia Específica da Evolução. SP: Sarvier, 1987.
THIERS, Solange. Sócio-Psicomotricidade. SP: Casa do Psicólogo, 1944.
THIERS, Ramain. Uma Leitura Emocional, Corporal e Social. SP: Casa do
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TUBINO, M.J.G. As Qualidades Físicas na Educação e nos Desportos. SP: Ibrasa,
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VAYER, P. O Equilíbrio Corporal; uma abordagem dinâmica dos problemas da
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VAYER, P. O Equilíbrio Corporal. Porto Alegre: Artes Médicas, 1980.
VLASCO, Cacilda G. Brincar, o Despertar Psicomotor. RJ: Sprint, 1996.

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AUTO-AVALIAÇÃO
Responda às questões abaixo, marcando apenas uma das alternativas.

1) Existem basicamente dois tipos de tempo. São eles:

(a) subjetivo e objetivo;


(b) formal e informal;
(c) lógico e casual;
(d) mensurável e imaginário;
(e) físico e virtual.

2) “Orientar-se no espaço é ver-se e ver as coisas no espaço em relação a si próprio, é dirigir-se, é


avaliar os movimentos e adaptá-los no espaço”. Estas palavras são de:
(a) Vitor da Fonseca;
(b) Jean Le Boulch;
(c) Jean-Claude Coste;
(d) Poppovic;
(e) Kurt Lewin.

3) A noção de tempo objetivo na criança pode ser desenvolvida, basicamente, a partir:

(a) de determinações do relógio biológico;


(b) de sensações derivadas de estímulos externos;
(c) de um ritmo interno natural e espontâneo do ser humano;
(d) dos pontos de referência de vida cotidiana como horário das refeições, de acordar, ir trabalhar
etc;
(e) da cognição humana.

4) Podemos entender como processos que participam do desenvolvimento da escrita:

(a) maturação do sistema nervoso;


(b) desenvolvimento das atividades motoras gerais;
(c) desenvolvimento da coordenação motora fina;
(d) coordenação de movimentos;
(e) todas as alternativas estão corretas.

5) A corrida, o pular com um só pé, o andar na ponta dos pés são, de início, um jogo para criança de
2 a 4 anos: mostram o aperfeiçoamento:
(a) da aquisição do conhecimento;
(b) da linguagem;
(c) da motricidade;
(d) da musculatura das pernas;

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(e) da aquisição da fala.

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MÓDULO III ver 1.0 - PSICOMOTRICIDADE Projeto “A Vez Do Mestre”


6) Em que estágio do desenvolvimento gráfico encontra-se uma criança de 10 a 12 anos?

(a) pré-caligráfico;
(b) caligráfico;
(c) pós-caligráfico;
(d) pré-motriz;
(e) nenhuma das alternativas acima.

7) A preferência neurológica por um dos lados do corpo pode ser definida como:
(a) percepção;
(b) coordenação;
(c) orientação;
(d) lateralidade;
(e) motivação.

8) É encarado como uma das perturbações do grafismo:


(a) instabilidade na fala;
(b) gagueira de fundo emocional;
(c) dificuldade na orientação especial;
(d) clivagens do ego desnecessárias;
(e) rigidez ou crispação dos dedos.

9) A percepção qualificada como proprioceptiva diz respeito:


(a) aos gestos necessários para apanhar um objeto;
(b) à visão que se tem do objeto;
(c) à emoção que o objeto desperta;
(d) à organização emocional do sujeito;
(e) à coordenação motora fina do sujeito.

10) Qual dos autores abaixo entende o tempo como fruto da “coordenação dos movimentos”?

(a) Sigmund Freud;


(b) Jean Piaget;
(c) Jean Le Boulch;
(d) Defontaine;
(e) Pestalozzi.

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