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FACULDADE RAIMUNDO MARINHO

Raphael Chalfun Barbieri

O INTERROGATÓRIO DE MENORES.

Maceió – AL

2010
Raphael Chalfun Barbieri

O INTERROGATÓRIO DE MENORES.

Trabalho apresentado como requisito para


avaliação final da disciplina Psicologia Jurídica,
do 2º período noturno de Direito Turma A Prof.
Lwdmila Constant Pacheco

Maceió – AL

2010
Resumo

Este breve ensaio tem como objetivo analisar o processo de interrogatório de

menores por autoridades competentes com o fim de extrair da testemunha menor de

idade, dados e o testemunho de fatos que levem ao descobrimento de delitos por

estes presenciados ou sofridos.

O processo de pesquisa focou no fato de que suas mentes ainda não

completamente formadas, não tem a capacidade de discernir por si só, atos

prejudiciais a elas e à sociedade como um todo, e de que seus pais, responsáveis

ou amigos maiores de idade, podem ter intenções delituosas. É fato que pelo

convívio e pelo tipo de educação recebida, estes menores podem vir a encarar com

naturalidade atos que vão de encontro às leis e estatutos vigentes cometidos pelos

adultos que o cercam, e por vezes em casos de maus tratos ou abusos sexuais ou

psicológicos, o menor pode crer que mereceu aquele tratamento ou punição.

Não será tratado aqui pois os tipos de abusos, maus tratos ou delitos

presenciados ou sofridos por estes menores, apenas será descrito o processo de

oitiva por estes sofrido e de qual maneira deve o profissional interrogador,

devidamente auxiliado por equipe multidisciplinar deve conduzir sua atuação.


Abstract

This brief essay was composed to analyze the children interrogation process

by state authorities intending to extract from the minor as a witness data and

testimony of facts that helps find out crimes suffered or seen by them.

The research process focused in the fact that their minds are not completely

formed and have not the ability to discern by itself acts that are harmful to them and

to the society in general, let alone that their parents, tutors or friends of legal age

might commit misdeeds. It’s a fact that by the familiarity and the kind of upbringing

the child gets, these minors might face naturally acts that go against the current laws

and Statutes committed by adults around them and sometimes mistreating and

sexual and psychological abuse could pass as punishment or as a deserved

treatment.

The various kinds of abuse, mistreats or misdeeds seen or suffered by these

minors, only the process of interrogation and how must the professional interrogator,

helped by a multidisciplinary team that should outline his performance.


Sumário

Resumo......................................................................................................................2
Abstract......................................................................................................................3
Introdução..................................................................................................................5
Prerrogativa da verdade............................................................................................6
O comportamento do interrogador............................................................................8
O comportamento do interrogado............................................................................10
O processo do interrogatório...................................................................................12
Conclusão................................................................................................................15
Bibliografia...............................................................................................................17
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Introdução.

É um erro assumir que uma criança seja um pequeno adulto, estudos

psicológicos apontam que existem diferenças fundamentais que tornam o trabalho

da busca da verdade uma ciência mais elaborada pois deve ser levado em

consideração uma série de cuidados e providências especiais para que os dados

colhidos não sejam falsos desvirtuando assim o resultado de um interrogatório.

Em vários aspectos é considerado mais fácil colher informações de um

menor, porém esta noção se converte em meia verdade devido a singularidade da

mente não formada e do costume à submissão quando face a um adulto, sob esta

premissa o menor tende a tentar agradar ao adulto ou a mentir para que não venha

a sofrer consequências futuras.

Nesta análise será demonstrado que apenas por levar em conta os estudos

existentes sobre este assunto, os resultados obtidos de um interrogatório de um

menor de idade terão diferenças drásticas no resultado dos dados colhidos.


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Prerrogativa da verdade

É fato que menores de idade não tem sua mente completamente formada em

vários aspectos, sua abordagem de ética e moral é primitiva, estes indivíduos

tendem a absorver e aceitar tudo o que lhe for passado em seu cotidiano pelos

adultos que o cercam, seja em casa, na escola ou em seu bairro.

Por se tratarem de seres quase completamente indefesos é de extrema

facilidade sua alienação e alteração de sua noção de moral, o medo de errar é uma

constante no processo de amadurecimento humano e as referências de certo e

errado lhes são passadas pelos adultos que o cercam, e estes por falha moral, erros

de conduta ou até ignorância podem manobrar esta realidade em formação para os

fins mais sórdidos.

O medo incutido por uma criação opressora ou má influência, por muitas

vezes, faz com que estas vítimas protejam seus algozes tanto quanto a noção

distorcida do que seja uma boa conduta, este medo pode também ser incutido pelo

responsável no sentido de que se este for descoberto em uma falta, o menor ficará

desamparado ou sofrerá consequências desagradáveis por ter ajudado nesta

descoberta.

Para o culpado pelo delito é extremamente confortável que o menor assuma

seu erro, pois a punição é quase sempre branda ou inócua, porém para o menor tem

uma carga psicológica que pode alterar todo o seu futuro. Uma criança que sofra um

trauma será um adulto com problemas na maioria das vezes, problemas estes que

podem vir a afetar não só ao indivíduo, mas às pessoas de seu convívio e em casos

extremos à sociedade como um todo.


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Para combater este problema, os interrogadores devem seguir um padrão

traçado seguindo a ciência da psicologia infanto-juvenil que decorre de extensos

estudos por todo o mundo. O primeiro passo deste padrão é criar um ambiente

confortável onde a criança se sinta segura, para tanto é necessário segundo o autor

Stan Walters em seu livro Principles of Kinesic Interview and Interrogation (Princípios

da Entrevista Cinésica e Interrogatório) que um dos pais ou parentes do menor

esteja presente em um primeiro momento para que o sujeito ao interrogatório se

familiarize com o interrogador o que também é corroborado por outros trabalhos,

pois ao ser confrontada somente por um estranho a criança tende a responder

tentando satisfazer ao adulto que a interroga dizendo o que ela pensa que ele

deseja ouvir. Um erro de concepção é assumir que o menor de idade é um mini

adulto, e tende a fazer de tudo para escapar de problemas e possíveis punições,

caso pense que a eles esteja sujeita. Segundo o trabalho de mestrado da Dra. Lígia

Alexandra da Silva Carvalho, antes do interrogatório ao menor, deve se ter uma

entrevista com os responsáveis, abrangendo o maior número de temas sobre o

cotidiano para que se possa avaliar o desenvolvimento deste menor para

posteriormente poder também contrastar com as informações dadas pelo próprio

menor, esta entrevista se presta também para ter noção do ajustamento global da

criança.
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O comportamento do interrogador

É indispensável que o interrogador tenha treinamento condizente com sua

função, este é um dos pontos cruciais nesta discussão, pois por falta de profissionais

qualificados e de amparo técnico e teórico o resultado pode ter uma curva de

qualidade desfavorável para uma conclusão lógica dos fatos a serem apurados.

Este profissional, não obstante sua formação, deve possuir carisma suficiente

para não colocar o sujeito ao interrogatório em posição defensiva ou de causar-lhe

medo de espécie alguma. Esta característica deve estar em conformidade com o

ambiente confortável aonde deve se passar a entrevista, pois um ambiente opressor

causa desvio de atenção e respostas temerosas. Se possível esta oitiva deve se

passar em ambiente familiar à criança, pois assim a figura do interrogador se torna

menos estranha. Igualmente importante é a aclimatação da presença estranha do

interrogador mediante a presença de um familiar. Caso esta entrevista seja

conduzida em ambiente não familiar, deverá ser dependendo da idade do

interrogado, um ambiente preferivelmente infantil, brinquedos deverão estar

disponíveis para servirem como distratores para tirar a atenção do foco da conversa

e fazer com que discorra da forma mais discreta o possível para que a criança não

perceba a gravidade do que se passa. Estes elementos por serem lúdicos, podem

em certo ponto auxiliar a detecção de pontos cruciais que talvez sejam muito fortes

para serem expressos com palavras, porém facilmente com o uso de objetos, gestos

e sinais. Estes objetos podem ser também para que durante as brincadeiras o

interrogador crie uma ideia do nível de desenvolvimento que a criança se encontra,

podendo daí se basear para saber quais tipos de perguntas são mais cabíveis.
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O interrogador deve sempre levar em conta o poder que tem sobre o menor,

pois ele pode facilmente subjugar tanto física como psicologicamente o interrogado,

por características do próprio comportamento e reação infanto-juvenil em relação a

adultos estranhos ao seu convívio diário. Ele deve assumir que crianças tendem a

responder a quaisquer perguntas feitas, mesmo que não saibam a resposta, e ter a

capacidade de discernir entre fato e fantasia, por este motivo seu treinamento deve

ser extensivo. Este treinamento deve ser feito parte em ambiente acadêmico e parte

na prática acompanhando outros profissionais em sua atividade, pois é limitada a

capacidade de um estudo de laboratório reproduza com fidelidade a realidade

cotidiana.
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O comportamento do interrogado

A entrevista preliminar com os pais ou responsáveis é de crucial importância

para que se defina se a criança possui discernimento e capacidade cognitiva

suficiente para apontar com coerência fatos os quais venham a corroborar dados

para que os objetos da investigação sofram, baseados neste depoimento, punições

ou sanções legais a que estão sujeitos.

A tendência infantil a ter uma realidade própria e sua natural submissão à

presença de adultos torna esta ciência mais complicada e com mais tendência a

falhas. A formulação de várias perguntas sobre um mesmo tema podem criar uma

aumento não natural nas respostas, pois denotam o interesse do interrogador em

determinado assunto, podendo levar a um falso diagnóstico dos fatos como

descreve Stan Walters: "Quando um interrogador tenta esclarecer uma informação

com uma pregunta que inclua informações para a criança concordar ou negar, a

resposta resultante pode simplesmente ser uma mentira na qual ambos tendem a

acreditar." (tradução nossa).1

O menor tende temer as consequências do que dirá, por exemplo, se ele

assumir que quebrou um vaso virá um castigo, daí a tendência de estrar na

defensiva e mentir. Esta tendência pode ser sobrepujada pela capacidade empática

do interrogador para deixar o menor confortável e confiante. Uma das armas

defensivas das crianças é a omissão, quando confrontadas com informações que

comprovem esta omissão, elas tendem a alegar esquecimento, sendo que esta

1
When an interviewer attempts to clarify information with a question that includes information
for the child to agree with or deny, the resulting response might simply be a fabrication that both are
willing to believe.
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confrontação com os fatos deve ser posta de maneira que o entrevistado não se

sinta culpado e sim estimulado a revelar outras possíveis omissões.


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O processo do interrogatório

Para iniciar, deve-se pedir que o interrogado faça uma livre narrativa sobre

algum fato trivial para que seja avaliada sua capacidade narrativa e também para

que se crie um ambiente mais descontraído para a criança relaxar e sair da

defensiva. O interrogador deve criar perguntas para a criança para as quais ela não

saiba a resposta, e ao perceber a óbvia dúvida, deixá-la confortável para que

responda que não sabe ou que não tem a resposta e que isto não trará

consequências negativas para si. Outra ferramenta importante é contar uma estória

e deixar lacunas para que a criança as preencha e assim analisar a capacidade

inventiva da criança e sua reação corporal. No caso de crianças mais velhas isto

pode ser feito de forma mais concisa como, por exemplo, pedindo que identifique

situações falsas e verdadeiras, solicitando informações mais complexas e propondo

resoluções de charadas.

Deve se levar em consideração que as habilidades linguísticas de uma

criança não são suficientes para descrever uma situação complexa até o início da

adolescência, e mesmo assim, não se equiparam a de um adulto até o final dela.

Elementos de fantasia podem então surgir no interrogatório fruto de um

questionamento mal direcionado, que pode ocorrer quando se pede que a criança

use objetos para demonstrar fatos. Pode se assumir que o menor esteja narrando

um fato real, pois para um adulto faz perfeito sentido, mas este falso resultado pode

advir da capacidade extrema de fantasiar característica da infância e adolescência.

Expressões faciais e linguagem corporal devem se levadas em ampla

consideração, pois podem ser muito mais reveladoras do que palavras, é o conceito
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da cinésica, pois gestos denotam com muito mais sinceridade o que se pretende

expressar, e denunciam onde o que está sendo dito é real ou fantasioso, como

analogia podemos citar os jogadores profissionais de pôquer que nas primeiras

rodadas do jogo analisam o comportamento adversário para poder saber quando

estes têm uma boa mão ou estão blefando, por este motivo deve-se estar atento às

mínimas nuances gestuais durante os primeiros momentos da entrevista para

estabelecer quais as dicas corporais e expressivas do interrogado ao falar a

verdade, estar em dúvida e fantasiar situações, esta ciência quando corretamente

aplicada praticamente elimina a possibilidade de erros e falsas conclusões.

O entrevistador deve levar em conta a falta de capacidade da criança em

recontar situações e eventos por sua limitada capacidade linguística e sua retenção

falha de informações importantes por falta de foco em detalhes os quais adultos

percebem com facilidade.

Quando o menor estiver aclimatado, o acompanhante deverá se retirar, este é

o momento mais crucial da entrevista pois é quando informações mais concretas

devem ser solicitadas. Deve o interrogador deixar que o menor faça uma narrativa

livre dos fatos sem interrupções, e desta narrativa as informações surgirão de forma

espontânea.

As perguntas nesta fase serão feitas alternando entre o assunto em foco e

outro qualquer de teor neutro, para evitar que se construa uma estória pela repetição

de perguntas. As perguntas deverão ser formuladas de forma simples, com

respostas curtas evitando assim divagações e para que tenham fácil entendimento e

assim eficácia.
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Stan Walters explica que: "Crianças de inteligência normal são

consideravelmente acuradas em suas memórias, mas são inconsistentes no que

elas conseguem tirar delas. Crianças muito novas normalmente precisam das

perguntas dos adultos para conseguir reconstruir um evento" (tradução nossa) 2.

Estas crianças não tem a capacidade de relacionar a passagem de tempo com suas

memórias, esta capacidade só é atingida com mais idade. Este é um dos desafios

do interrogatório, pois uma falha na linha do tempo pode ser uma brecha jurídica.

Ao final da entrevista deve o entrevistador confirmar as informações colhidas,

pedindo ao entrevistado que aponte eventuais erros em suas conclusões, mais uma

vez deixando o menor livre e confortável para negar quaisquer inconsistências.

E finalmente, no caso de o interrogador encontrar problemas com o menor,

ele deve recorrer à equipe multidisciplinar, tais profissionais como psicólogos

infantis, assistentes sociais e pedagogos, têm habilidades de lidar com traumas e

processos físicos, mentais e de socialização e a noção de como isto pode interferir

no decorrer de um interrogatório.

2
Children of normal intelligence are consistently accurate in memories, but inconsistent in
what they recall. Young children often rely on the adult’s questions to guide their recall of an event.
15

Conclusão

A infância é uma fase crucial da vida de uma pessoa, é a época onde

possivelmente nos encontramos mais frágeis e desprotegidos. É por si só traumático

presenciar atos desagradáveis, quanto mais ser vítima destes. Para um adulto mal

intencionado o menor é um alvo fácil para desvios de conduta e violência, seja ela

de qualquer forma.

O estado deve se munir de mecanismos de sanção a este tipo de

comportamento, porém para saber o ocorrido, na maioria das vezes, depende

somente do testemunho de uma vítima que nem sempre tem consciência do mal

sofrido.

Dentre as formas de obter estas informações, deve-se tomar por regra a que

cause menos estragos psicológicos em um menor já abalado por fatos

desagradáveis, no mínimo, e consiga de forma menos traumática para o menor,

conseguir dados para que o autor das ofensas seja punido. Este é o objetivo do

interrogatório.

A ciência da psicologia aliada a outras, tem ferramentas e know-how para

conseguir extrair da forma mais sutil estas informações, e está em constante

evolução, vários autores tratam do assunto e muitas de suas conclusões estão em

acordo entre si. O fato é que isto é indispensável para a redução de problemas

psicológicos futuros e deve ser levado à sério pelas autoridades com tanta ênfase

que permita uma redução destes males que ainda hoje assolam a juventude

mundial.
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O respeito pelos tratados e estatutos sobre os menores deve partir de dentro

de cada lar, e por isto as punições para estes crimes contra a humanidade devem

ser noticiadas e mostradas como exemplo que o Estado não as tolera e que a

população em geral as repudia.


17

Bibliografia

Walters, Stan B.. Principles of Kinesic Interview and Interrogation. 2 ed. Washington
D.C. CRC Press, 2002

Zulawski, David E..; Wicklander, Douglas E.. Practical Aspects of Interview and
Interrogation. 2 ed. Washington D.C. CRC Press, 2002

Carvalho, Lígia Alexandra da Silva. A valoração do testemunho da criança vítima do


abuso sexual intra-familiar no contexto da avaliação forense. Universidade do Porto.
Porto, Portugal. 2007

Stein, Lilian Milnitsky; Pergher, Giovanni Kuckartz; Feix, Leandro da Fonte. Desafios
da Oitiva de Crianças e Adolescentes: Técnica de Entrevista Investigativa. Childhood
Brasil. Brasília D.F. 2009

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