Professional Documents
Culture Documents
O G1 consultou especialistas para saber quais são os perigos mais comuns e como
a indústria de petróleo precisa agir em caso de emergências.
Poço 'reforçado'
O professor Ricardo Cabral de Azevedo, doutor do Departamento de Engenharia
de Minas e de Petróleo da Universidade de São Paulo (USP), compara a perfuração
de um poço de petróleo à construção de um túnel: o caminho precisa estar pronto,
reforçado e cimentado para que seja seguro o 'trânsito' de óleo por ali. Antes
disso, qualquer fluido que entre no poço, como gás, detritos e o próprio petróleo é
indesejado e representa risco para a exploração.
"Enquanto você está perfurando , está criando uma superfície rochosa em volta do
poço que pode ser insegura", diz o professor. "Então após perfurar cada trecho
do poço, quando necessário, você desce um revestimento de aço para sustentar
essa parede".
Os "invasores" mais perigosos nessa etapa da perfuração são o petróleo e o gás.
"O mais perigoso é o gás, porque ele é muito leve, ele pode subir até a
superfície", explica.
Tipos de acidente
Para o ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP) David Zylbersztajn, a
maior parte das medidas de precaução das petrolíferas busca evitar o vazamento
de gás. "Hoje o que chama mais a atenção e é temido são os casos como o da BP,
de vazamentos que terminam em explosão", explica.
De acordo com Azevedo, da USP, há dois tipos principais de acidente que podem
ocorrer na perfuração do petróleo: o kick e o blow out. Os dois envolvem a
invasão do poço por fluidos.
O 'blow out' é a pior situação possível para um poço de petróleo: pode provocar
explosões, incêndios, um acidente de grandes proporções"
Ricardo de Azevedo
O mais perigoso, no entanto, é o gás: leve, ele pode subir e alcançar o contato
com a superfície mais facilmente. "Quando o gás chega à superfície você tem o
'blow out', que é a pior situação possível para um poço de petróleo: você tem
vazamentos de fluidos para o meio ambiente que podem provocar explosões,
incêndios, um acidente de grandes proporções".
Erros na BP
Meses após o acidente no Golfo do México, ainda não se sabe exatamente quais
foram as causas do desastre. "Uma coisa que pode ter acontecido são falhas na
cimentação, que permitiram que houvesse espaço para esse gás migrar por entre o
cimento e chegar até a superfície. É uma profundidade de 3 mil, 4 mil metros,
na hora de cimentar você não está vendo o que está fazendo então você corre
sérios riscos de não ter cimentado completamente", diz o professor, ressaltando
que essa é apenas uma das muitas possibilidades de explicação para a tragédia.
"[A exploração de petróleo] É uma atividade de risco. A cada cinco poços, apenas
um deve ter óleo e o gás. Os outros não produzem e não pagam o investimento.
Todas as empresas têm que ter muito dinheiro para investir nisso", diz.
"Qualquer exploração no mar daqui para a frente vai ficar muito mais cara.
Primeiro porque as próprias seguradoras vão aumentar o seguro de plataforma.[...]
Além disso, as próprias autoridades governamentais tendem a dificultar mais o
licenciamento ambiental para explorar petróleo no mar, e a exigir equipamentos de
maior grau de segurança. Isso tudo aumenta custos", afirma.
Apesar disso, ele afirma que a produção do óleo deve continuar a crescer, junto
com a demanda pelo produto. "O grande desafio é descobrir como você aumenta a
produção de energia com mais garantias ambientais, tendo menos acidentes e
também emitindo menos gás carbônico", diz.
No acidente da BP, essa tentativa foi feita, de acordo com o especialista da USP.
"Quando eles (da BP) viram que o fluido estava chegando próximo da superfície,
eles deveriam ter fechado. E eles tentaram fazer isso, mas infelizmente esse
equipamento, o blow out preventer, não funcionou".
Conforme avalia Zylbersztajn, o ideal é que a BP tivesse mais de um sistema de
segurança que pudessem ser acionados no caso de um vazamento como o ocorrido.
"O que faltou lá foi a redundância: quando uma coisa falha tem que ter outra para
a mesma finalidade. Se um não funciona, o outro tem que funcionar", diz ele, que
cita como exemplo de recurso que falhou o alarme da plataforma, que estava
desativado no momento do acidente para não acordar a tripulação com falsos
alertas. "O alarme poderia ter ajudado a salvar vidas".
"Você perfura poços ao lado do poço principal que vão 'matar' o poço, ou seja,
vão injetar fluidos densos que vão interromper o fluxo de óleo. E depois logo em
seguida vão preencher com cimento uma parte do poço dessa tubulação e vão
vedar, ou seja, esse poço não vai produzir mais", afirma Azevedo.
"O que eu acho triste é que todo mundo fala no vazamento, na questão ambiental,
que é importante também, mas ninguém fala nas famílias desses onze
trabalhadores que morreram (no acidente da BP)", diz Sanches.
No Brasil
O professor Ricardo Azevedo lembra que já houve casos no Brasil em que foi
preciso fechar um poço de petróleo em situação emergencial; um exemplo é o da
plataforma da P-36. "A plataforma afundou mas não houve nenhum derramamento
de óleo no mar, exatamente porque o equipamento para fechar o poço funcionou
perfeitamente", diz.
"No caso do pré-sal você tem águas ultraprofundas, até mais profundas do que
essa do Golfo do México (do acidente com a BP). Você tem pressões altíssimas,
suficientes para amassar o aço como se fosse uma folha de papel. A maioria dos
equipamentos que o ser humano dispõe não funciona nessas condições. Um
submarino muito antes de chegar nessa profundidade já é esmagado", explica.
No pré-sal, você tem pressão que amassa o aço como se fosse uma folha de papel
"
Ricardo de Azevedo
"Eu fico tranqüilo porque a nossa qualidade é uma das melhores do mundo, inclusive
superior a essa que foi utilizada no Golfo do México, onde aconteceu o acidente.
O Brasil e a Noruega são dois países que são referência nesse tipo de tecnologia",
afirma.
"O sal não se comporta como uma rocha, ele se mexe. As técnicas de usar fluidos
à base de água, que são usados para preencher os furos com água e evitar que a
parede caia, poderiam dissolver o sal e desabar a camada, fechando o poço",
explica.
Amenizar impactos
Embora tenha níveis de segurança adequados, o Brasil deve se preocupar em
planejar e tornar conhecidos os planos de ação que serão adotados em caso de
acidentes petrolíferos, afirma Zylbersztajn.
"A gente não pode apostar na infalibilidade de equipamento, não existe nada com
risco zero. E como os impactos são muito grandes, a sociedade merece uma
explicação do que seria feito no caso de um acidente. Ainda mais no pré-sal, em
que a exploração é feita a 300 km da costa. Não se sabe como seriam
transportadas pessoas, equipamentos, produtos dispersantes de óleo", diz o ex-
diretor da ANP.