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LABORATÓRI O DE POLUI ÇÃO

ATMOSFÉRI CA EXPERI MENTAL

RELATÓRIO - Roteiro Globo News - SP DIA 15/04/2011

No último dia 15 de abril, a equipe da Globo News e quatro autores do livro “Meio Ambiente e
Saúde: o Desafio das Metrópoles” se reuniram em São Paulo para filmar um episódio do
programa “Cidades e Soluções” que trará à tona um importante alerta: a cidade afeta de
maneira direta a saúde de seus moradores.

Trata-se do mesmo alerta esmiuçado no livro “Meio Ambiente e Saúde: o Desafio das
Metrópoles”, lançado pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade em novembro de 2010 e que
inspirou todo o movimento para a filmagem do programa.

Para esta ação de divulgação do programa, o Instituto Saúde e Sustentabilidade, contou com o
apoio da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e do Laboratório de
Poluição Atmosférica Experimental (LPAE), cedendo sua expertise e os aparelhos de medição
ambiental e de saúde. A abordagem para o programa foi focada nos efeitos da poluição
atmosférica para a saúde humana e três autores do livro, especialistas no assunto, foram
convidados para conduzirem as explicações científicas durante o programa. O presente
relatório diz respeito aos resultados em saúde vivenciados pelo apresentador (a cobaia) deste
programa durante a filmagem na cidade de São Paulo.

Somente no Brasil, 80% da população reside em áreas urbanas. Se colocarmos as cidades no


papel de pacientes doentes relatando suas queixas aos médicos, vários sinais e sintomas de
doença aparecerão. Febre Progressiva, pelo aquecimento da Terra; Dependência Física de
uma droga chamada petróleo; Obesidade, ao consumirmos mais energia do que devemos;
Dispnéia causada pela contaminação da atmosfera por poluentes; Obstrução Arterial Difusa,
causada por congestionamentos intermináveis; Insuficiência Renal, por não conseguirmos
eliminar adequadamente os nossos resíduos; Diabetes, caracterizado pela incapacidade de
aproveitar plenamente as fontes energéticas que dispomos; e, finalmente, Confusão Mental,
pois não somos capazes de avaliar adequadamente a gravidade da situação do quadro, este
motivado pela deterioração de alguns de nossos neurônios dirigentes, intoxicados que foram
pelo pensamento imediatista de que a temperatura da Terra não irá se elevar mais que alguns
centésimos de grau até as próximas eleições.

Mantido o atual padrão de consumo energético, incorreremos em riscos intoleráveis. O acúmulo


de poluentes primários emitidos a partir de termoelétricas e escapamentos de veículos
aumentará a taxa de mortalidade por câncer e doenças dos sistemas cardiovascular e
respiratório. O aumento do ozônio troposférico causará danos aos nossos pulmões. Maior dose
radiação ultravioleta aumentará o risco para tumores de pele. O consumo de água de pior
qualidade levará a uma maior taxa de doenças de veiculação hídrica, como a diarreia ou
intoxicação por metais pesados. Desastres naturais causados por eventos climáticos extremos,
como inundações e furacões, cobrarão um pedágio doloroso.

Evitar este conjunto de situações é um dever e o momento de fazê-lo é agora, enquanto nos
resta tempo. Este não somente é um compromisso do Instituto Saúde e Sustentabilidade, mas

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de todos os autores do livro e, dos quatro autores que participaram deste processo em
particular. Ao veicular essas informações científicas na televisão, torna-se também um
compromisso do programa “Cidades e Soluções”, somando forças para a transformação.

Participantes

Prof. Paulo Saldiva Médico, professor titular do Departamento de Patologia da


Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Dr.Paulo Afonso de André Engenheiro pela Escola Politécnica da USP, mestre, doutor e
pesquisador pela Faculdade de Medicina da USP, onde
participa do Instituto Nacional de Avaliação Integrada de
Risco Ambiental (INAIRA).

Dr.Ubiratan de Paula Santos Médico, doutor em Pneumologia pela Faculdade de


Medicina da USP. Assistente de Pneumologia do Instituto do
Coração (Incor) e do Hospital das Clínicas da FMUSP -
responsável pelo Ambulatório de Doenças Ambientais e
Ocupacionais da Disciplina de Pneumologia do Incor.
Dra. Evangelina Vormittag Médica, doutora pela Faculdade de Medicina da
USP e especialista em Gestão de Sustentabilidade
pela Faculdade de Administração da Fundação
Getúlio Vargas-SP. Diretora-presidente do Instituto Saúde e
Sustentabilidade.
Laís Fajersztajn Fisioterapeuta, mestranda pela Faculdade de Medicina da
USP. Assistente de projetos do Instituto Saúde e
Sustentabilidade.

I- Avaliação dos resultados

Apesar dos limites de interpretação de resultados inerentes a esta pesquisa realizada em único
indivíduo (hígido), os dados encontrados são coerentes e compatíveis com dados relatados na
literatura.

II- Monitoramento ambiental

Material particulado - MP2,5

O ambiente urbano nas grandes cidades impõe a sua população uma carga de poluição e
desconforto muitas vezes superior àquela estimada tendo por base apenas os indicadores de
poluição atmosférica monitorados pelas agências ambientais, notadamente quando se
considera a situação outdoor.

Equipado com um monitor contínuo de material particulado inalável fino, denotado por MP2,5,
um voluntário percorreu percursos junto ou próximo às vias de trânsito intenso, para avaliar a
real magnitude da exposição durante os deslocamentos urbanos, considerando diversos modais
de transporte.

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Percurso

O percurso cumprido pelo voluntário na cidade de São Paulo e os modais utilizados, estão
descritos na tabela abaixo:

INÍCIO FIM TRECHO MODAL

9:35 9:44 Preparação aeroporto nihil


9:44 11:09 Aeroporto - cabeceira caminhada
11:09 12:23 Cabeceira - Metrô Tatuapé veicular
12:23 13:14 Metro Tatuapé - Ter.Barra Funda metrô
13:14 13:37 Ter.Barra Funda - Mercado Central veicular
13:37 14:19 Mercado Central - externo nihil
14:19 14:32 Mercado Central - interno nihil
15:28 16:29 Mercado Central - Ibirapuera veicular
16:29 16:37 Ibirapuera nihil

Os resultados estatísticos do monitoramento de MP2,5 para cada um dos trechos acima são
apresentados na tabela abaixo, além de notas de esclarecimento.

ESTATÍSTICA PARA MP2,5


TRECHO MODAL NOTAS
MÉDIA DP N MAX MIN
Preparação aeroporto nihil Prox.Av.Rubem Berta 133 39,1 19 222 98
Aeroporto - cabeceira caminhada calçada A.Rubem Berta 122 24,1 169 222 89
Cabeceira - Metrô Tatuapé veicular ar condicionado parcial 181 102,9 148 752 66
Metro Tatuapé - Ter.Barra Funda metrô 79 33,2 102 203 22
Ter.Barra Funda - Mercado Central veicular com ar condicionado 38 35,1 46 187 12
Mercado Central - externo nihil 56 19,3 83 141 31
Mercado Central - interno nihil
Mercado Central - Ibirapuera veicular com ar condicionado 56 60,5 123 405 15
Ibirapuera nihil Prox.Av.Pedro A.Cabral 37 5,7 17 51 31
(DP=Desvio Padrão; N=número de medidas; MAX/MIN=concentração máxima/mínima observada)

Para se ter uma idéia da carga de material particulado recebida em cada um dos trechos, foi
calculado o tempo para acumular a mesma carga caso o voluntário tivesse sido submetido a um
ambiente que respeitasse a concentração máxima diária recomendada pela OMS –
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Organização Mundial da S . O resultado é apresentado na tabela a seguir,
para cada um dos trechos percorridos.

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DURAÇÃO (h:mm) AUMENTO


TRECHO MODAL
@ 25 mg/m
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REAL (%)
Preparação aeroporto nihil 0:09 0:48 534%
Aeroporto - cabeceira caminhada 1:25 6:54 488%
Cabeceira - Metrô Tatuapé veicular 1:14 8:54 722%
Metro Tatuapé - Ter.Barra Funda metrô 0:51 2:41 317%
Ter.Barra Funda - Mercado Central veicular 0:23 0:34 151%
Mercado Central - externo nihil 0:41 1:33 225%
Mercado Central - interno nihil 0:13
Mercado Central - Ibirapuera veicular 1:01 2:18 225%
Ibirapuera nihil 0:08 0:11 147%
5:53 23:56

Comentários

Com base nos dados anteriormente apresentados podemos comentar que:

1. Os trechos percorridos a pé, ou em veículo com janelas abertas, como também a


permanência próxima a avenidas de trânsito intenso, foram aqueles onde as maiores
concentrações ambientais foram observadas;

2. Trechos percorridos em veículo, mas com a utilização de vidros fechados e ar


condicionado, apresentaram menor concentração de poluição interna quando comparado
ao mesmo modal, entretanto não foi possível reduzi-la abaixo do limite recomendado pela
OMS. Mesmo com proteção e redução dos níveis de exposição (ar condicionado e vidros
fechados), observou-se substancial elevação da concentração de MP2,5 muito acima de
valores padrões preconizados como seguros pela OMS durante todo o período de
exposição. Os mecanismos de redução não foram suficientes naquele dia para proteção;

3. Em nenhum trecho do percurso observou-se valores de MP2,5 igual ou abaixo da máxima


concentração média diária recomendada pela OMS – Organização Mundial da Saúde, de
25 mg/m3;

4. Para relativizar os resultados aqui obtidos, vamos fazer uma equivalência considerando a
mesma carga acumulada de material particulado no pulmão do voluntário no percurso real,
caso ele estivesse em um ambiente cuja concentração de MP2,5 respeitasse o limite
máximo recomendado pela OMS. Assim, a carga acumulada nas 6 horas no percurso real
só seriam acumuladas na concentração máxima da OMS após 24 horas de exposição. Este
resultado é bastante preocupante não só pela sua magnitude, mas também ao lembrar que
a carga cumulativa no organismo de exposições continuadas a valores acima do limite da
OMS trarão inúmeros efeitos em saúde de longa duração, com comprometimento da
qualidade de vida e inclusive com a redução da expectativa de vida.

5. O maior acumulando ocorreu nos trechos de permanência próxima às vias de trânsito


intenso ou quando nessas vias se trafegou com as janelas abertas. Nestes trechos
observou-se desconforto físico, também relatado por entrevistados das ruas;

6. Mesmo no metrô, o voluntário foi submetido a uma concentração de MP2,5 superior ao


máximo recomendado pela OMS, apesar de inferior aos trechos de caminhada ou em
veículo com janelas abertas e sem ar condicionado;

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7. O valor máximo de concentração de MP2,5 obtida foi de 752 mg/m3, chegando a atingir 30
vezes o limite diário preconizado pela OMS- valor este considerado EMERGENCIAL –
requer INTERVENÇÃO ENÉRGICA - tomada de medidas urgentes e imediatas para a
proteção da população - pessoas que trabalham, residem ao redor da região (diminuir o
tráfego de caminhões, parar as obras de construção, diminuir o número de carros na rua).
Para se ter uma idéia, o Conselho de Ética em pesquisa não permite a exposição de seres
humanos a valores superiores a 200 mg/m3 de MP2,5.

Outros Parâmetros

1. RUÍDO: Os níveis de ruído mantiveram-se ao longo do percurso sempre aumentados. O


nível de ruído próximo às vias de trânsito intenso ficou pouco abaixo do medido próximo a
cabeceira da pista do aeroporto ou mesmo dentro do metrô quando transitando dentro do
túnel 95dB (conversa normal 40 a 50 Db);

2. A temperatura e umidade relativa do ar estiveram piores nas proximidades das vias de


trânsito intenso. A umidade alcançou níveis baixos de 40%. Pelos padrões da OMS, o
estado de atenção é caracterizado por valores de umidade relativa do ar entre 21% e 30%.
Houve uma oscilação de temperatura durante o percurso de 27,2 a 35,4 oC- em torno de 8
graus, fatores estes geradores de cansaço e estresse.

III- Monitoramento físico

Monitoramento da pressão arterial (MAPA)

• PAS- Pressão Sistólica (mmHg) 121 (± 8,14)

• PD- Pressão Diastólica (mmHg) 81 (± 8,83)

• PM- Pressão Média (mmHg) 93 (± 6,51)

• PP - Pressão de Pulso (mmHg) 40 (±10,86)

• Freq. cardíaca (bat/min) 85 (± 8,44)

• % medidas de PAS >130mmHg: 11%

• % medidas de PAD > 80mmHg: 22,2%

11% das medidas de PAS apresentaram valores acima de 130mmHg

22, 2% das medidas de PAD apresentaram valores acima de 80mmHg

OBS: Valores de PA aumentados acima de PAS 140 mmHg e PAD 90 mmHg.

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A Pressão arterial apresentou valores superiores aos observados no RJ (nível do mar) e elevou-
se do início para ao longo da caminhada, conforme foi aumentando a carga de poluentes
inalados. Resultado concordante com estudos que mostram efeitos da poluição no aumento da
pressão arterial.

Queda de pressão arterial no mercado: deve-se ao relaxamento, alimentação e diminuição do


estresse.

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Índices da variabilidade da freqüência cardíaca: SDNN e rMSSD

Variabilidade da Frequência Cardíaca (VFC): Desde o início houve a queda da VFC. A redução
da VFC predispõe (é um fator de risco) para arritmia e morte súbita (infarto) observados em
estudos após a exposição ao material particulado. Os parâmetros usados SDNN e rMSSD
diminuíram durante o período de exposição, até o almoço, Por esta razão o aumento de infarto
do miocárdio em idosos e/ou doentes cardíacos após alteração das concentrações de PM 2,5.

Este achado é conhecido e coerente com dados de estudos na literatura. O resultado é


compatível com estudos que mostram este efeito associado à poluição. Recentemente, um
estudo publicado em fevereiro deste ano na Revista Lancet (revista médica muito conceituada)
mostrou a associação entre poluição e tráfego como fator de risco para infarto. A exposição de
tráfego (entre outros, como fumo), é a que mostrou o maior risco atribuível.

A diminuição dos índices de variabilidade da freqüência cardíaca indicam a diminuição da


capacidade do coração em responder (adaptar-se) aos estímulos ambientais.
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Em estudos com variações de 10 de PM 2,5 , pacientes cardíacos chegam a apresentar
depressão do segmento ST no ECG, compatível com sinal de isquemia do miocárdio ( podendo
chegar ao infarto).

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COexalado e Saturação de O2
• COexalado

– medida inicial: 3 ppm

– medida variou até 6 ppm ao longo do trajeto

• Saturação de O2

– medida inicial 98%

– medidas variaram até 95% ao longo do trajeto

O CO exalado dobrou com relação valor inicial, compatível com exposição a monóxido de
carbono - caminhada e corredores de tráfico.

A Saturação de oxigênio- diminuiu até 3%, dentro da margem de erro do método e


equipamento, mas pode estar associado à dessaturaçao induzida pela poluição.

Resumindo, as alterações encontradas são compatíveis com vários estudos que mostram
aumento da pressão e redução da variabilidade da frequência cardíaca associados à poluição.

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