comemoram os 50 anos do início da Era Espacial, graças ao lançamento do Sputnik I pela ex-União Soviética em 4 de outubro de 1957, f e ste j a m -se também os 40 anos do principal acordo que re gula inte rna cio na lm e nte a s atividades espaciais: o Tratado do Espaço de 1967. Suas virtudes são notáveis, mas, passado tanto tempo, urge atualizá-lo.
Seu nome real é bem maior: "Tratado
so b r e P r incíp io s Re g ula d o r e s d a s Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes". "Princípios" são normas básicas, orientam todas as demais. O acordo regula as "atividades dos Estados", consideradas fundamentais, pois são os Estados que respondem ante à comunidade mundial pelas atividades espaciais nacionais – públicas e privadas – e, para isso, devem não só autorizar tais atividades como exercer "vigilância continua" sobre e la s. "Exp lo r a çã o " nã o sig nif ica "exploração comercial", como se poderia respondem ante à comunidade mundial pelas atividades espaciais nacionais – públicas e privadas – e, para isso, devem não só autorizar tais atividades como exercer "vigilância continua" sobre e la s. "Exp lo r a çã o " nã o sig nif ica "exploração comercial", como se poderia supor, mas "exploração científica", "pe squisa ", "e studo". "Uso" indica utilização prática. E "espaço cósmico" ou "espaço exterior" não inclui apenas o váculo ou vazio sideral, por onde passam os vôos espaciais e as órbitas da Terra e dos outros corpos celestes, m a s ta m b é m o s p r ó p r io s co r p o s celestes de todo tipo: satélites naurais como a Lua, planetas como Marte e todos os demais do sistema solar, além dos cometas, asteróides e qualquer outro corpo celeste que possa surgir.
Assim, o Tratado do Espaço, com
substancioso preâmbulo e 17 artigos, é tão abrangente quanto o âmbito em que a tua . E co nstitui a pr incipa l referência legal para avaliar e julgar as atividades espaciais, sobretudo aquelas a inda nã o re gula da s de f o rm a específica.
Foi elaborado em plena Guerra Fria pelo
Subcomitê Jurídico do Comitê das Nações Unidas (ONU) para o Uso Pacífico do Espaço (COPUOS), durante trê s a no s, e m tra ba lho de dif ícil harmonização conduzido pelo eminente j ur ista po lo nê s Ma nf r e d La chs, posteriormente juiz e presidente da Corte Internacional de Justiça. Aprovado pela Assembléia Geral da ONU, em 19 de dezembro de 1966, abriu-se à assinatura dos países, em 27 de janeiro de 1967, sim ulta ne a m e nte e m Washington, Moscou e Londres. O Brasil firmou-o três dias depois, em 30 de posteriormente juiz e presidente da Corte Internacional de Justiça. Aprovado pela Assembléia Geral da ONU, em 19 de dezembro de 1966, abriu-se à assinatura dos países, em 27 de janeiro de 1967, sim ulta ne a m e nte e m Washington, Moscou e Londres. O Brasil firmou-o três dias depois, em 30 de janeiro. Como não basta a assinatura dos governos para um tratado entrar em vigor, é preciso ratificá-lo (ser aprovado pelos respectivos parlamentos), o Tratado do Espaço entrou em vigor em 10 de outubro daquele mesmo ano, após ter sido ratificado por cinco países. O Brasil não se apressou a ratificá-lo. Só o fez em 5 de março de 1969.
Vivia-se encarniçada corrida
armamentista entre Estados Unidos e União Soviética, além da corrida para ver quem chegaria primeiro à Lua. Havia também a guerra do Vietnã, desencadeada pelo governo norte- americano e outros pontos "quentes" no mundo. O clima geral era de tensão. A maioria dos países e a opinião pública mundial se opunham ao conflito na Ásia e queriam a retirada das tropas de ocupação. O Tratado do Espaço, ao contrário, vinha atender aos anseios de paz e cooperação. Seu Artigo 1º, d e f inid o co m o "Clá usula d o B e m Comum", reza que "a exploração e o uso do espaço cósmico, inclusive da Lua e demais corpos celestes, deverão ter em mira o bem e interesse de todos os países, qualquer que seja o estágio de se u de se nvolvim e nto e conôm ico e científico, e são incumbência de toda a humanidade". Esta é a regra de ouro das artividades espaciais, a pedra angular de todo o Direito Espacial.
O Brasil entrou com dois aportes
países, qualquer que seja o estágio de se u de se nvolvim e nto e conôm ico e científico, e são incumbência de toda a humanidade". Esta é a regra de ouro das artividades espaciais, a pedra angular de todo o Direito Espacial.
O Brasil entrou com dois aportes
históricos para melhorar ainda mais o tratado: 1) colocar o critério do bem comum, que de início constava apenas da introdução do Tratado, no seu Artigo 1º, dando-lhe um peso jurídico que da o utr a f o r m a e le nã o te r ia ; e 2) acrescentar a expressão "qualquer que seja o estágio de seu desenvolvimento econômico e científico", para deixar o mais claro possível que as atividades espaciais devem beneficar a todos os países, ricos e pobres, adiantados e atrasados, ou seja, independentemente do seu nível de prosperidade e de avanço científico.
Os princípios básicos adotados no
Tratado do Espaço falam por si:
1) As atividades espaciais devem ser
realizadas tendo em vista o bem e no interesse de todos os países (Art. 1º/1);
2) "O espaço cósmico, inclusive a Lua e
demais corpos celestes, poderá ser explorado e utilizado livremente por to do s o s Esta do s se m qua lque r discr im ina çã o , e m co ndiçõ e s de igualdade..." (Art. 1º/2);
3) O espaço e os corpos celestes são
inapropriáveis: não podem ser "objeto de apropriação nacional por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio" (Art. 2º);
4) As a tivida de s e spa cia is de ve m
3) O espaço e os corpos celestes são inapropriáveis: não podem ser "objeto de apropriação nacional por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio" (Art. 2º);
4) As a tivida de s e spa cia is de ve m
efetuar-se segundo o Direito Internacional, inclusive a Carta das Nações Unidas, "com a finalidade de manter a paz e a segurança inte r na cio na l e de f a vo r e ce r a cooperação e a compreensão internacionais" (Art. 3º);
5) É proibido pôr em órbita objetos
portadores de armas de destruição em massa, ou seja, nucleares, químicas e biológicas (Art. 4º/1);
6) Todos os países "utilizarão o espaço,
inclusive a L ua e de m a is co r po s celestes, exclusivamente para fins pacíficos. Estarão proibidos nos corpos celestes o estabelecimento de bases, instalações ou fortificações militares, os ensaios de armas de qualquer tipo e a execução de manobras militares" (Art. 4º/2);
7) Os astronautas são "enviados da
humanidade no espaço cósmico" e a eles será prestada "toda a assistência possível em caso de acidente, perigo ou aterrissagem forçada sobre o território de um outro Estado-Parte do Tratado ou em alto-mar" (Art. 5º);
8) Os países "têm a responsabilidade
internacional pelas atividades nacionais realizadas no espaço cósmico, inclusive na Lua e demais corpos celestes, quer sejam elas exercidas por organismos governamentais ou por entidades não- governamentais, e de velar para que as 8) Os países "têm a responsabilidade internacional pelas atividades nacionais realizadas no espaço cósmico, inclusive na Lua e demais corpos celestes, quer sejam elas exercidas por organismos governamentais ou por entidades não- governamentais, e de velar para que as atividades nacionais sejam efetuadas de acordo com as disposições anunciadas no presente Tratado" (Art. 6º);
9) O país que lança um objeto ao
espaço ou permite que ele seja lançado de seu território ou de suas instalações será responsável pelos danos causados a outro país ou a suas pessoas naturais pe lo o bj e to la nça do o u po r se us elementos constitutivos, sobre a Terra, no espaço cósmico ou no espaço aéreo, bem como nos corpos celestes (Art. 7º);
10) Realizar atividades espaciais levando
em conta os interesses correpondentes dos demais países (Art. 9º);
11) Evitar atividades espaciais que
causem contaminação e modificações nocivas ao meio ambiente da Terra (Art. 9º);
12) P ro m o ve r co nsulta s a nte s de
realizar atividades espaciais capazes de prejudicar as atividades de outros países (Art. 9º).
O Tratado do Espaço foi ratificado por
98 e firmado por 27 dos 192 países membros da ONU. Quando um país assina um tratado, está reconhecendo a sua importância, mas ainda não está se comprometendo a cumprí-lo. Só a ratificação torna o tratado obrigatório para um país. Mas o Tratado do Espaço parece ter conquistado um status especial. Como nenhum país jamais lhe fez qualquer restrição, ele já teria assina um tratado, está reconhecendo a sua importância, mas ainda não está se comprometendo a cumprí-lo. Só a ratificação torna o tratado obrigatório para um país. Mas o Tratado do Espaço parece ter conquistado um status especial. Como nenhum país jamais lhe fez qualquer restrição, ele já teria a ssum ido o ca r á te r de co stum e consa gra do por e pa ra toda a comunidade mundial. Seria universalmente aceito como obrigação para todos os países, inclusive aqueles que nã o o ra tif ica ra m , ne m o assinaram.
Não por acaso, o Tratado do Espaço é a
matriz dos demais instrumentos sobre o espaço e as atividades espaciais, quais sejam: Acordo sobre o Salvamento de Astronautas e Restituição de Astronautas e de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico, de 1968; Convenção sobre Responsabilidade Internacional po r Da no s Ca usa do s po r O bj e to s Espaciais, de 1972; Convenção Relativa ao Registro de Objetos Lançados no Espaço Cósmico, de 1976; e Acordo que Regula as Atividades dos Estados na Lua e em Outros Corpos Celestes, de 1979. Também se alicerçam no Tratado do Espaço as seguintes resoluções da Assembléia Geral das Nações Unidas: Princípios Reguladores do Uso pelos Estados de Satélites Artificiais da Terra para Transmissão Direta Internacional de Te le visã o, de 1982; P rincípios Relativos ao Sensoriamento Remoto da Te r r a de sde o Espa ço , de 1986; Princípios Relativos ao Uso de Fontes de Energia Nuclear no Espaço Exterior, de 1992; Declaração sobre a Cooperação Internacional na Exploração e Uso do Espaço Exterior em Benefício e no Interesse de todos os Estados, Levando Relativos ao Sensoriamento Remoto da Te r r a de sde o Espa ço , de 1986; Princípios Relativos ao Uso de Fontes de Energia Nuclear no Espaço Exterior, de 1992; Declaração sobre a Cooperação Internacional na Exploração e Uso do Espaço Exterior em Benefício e no Interesse de todos os Estados, Levando em Especial Consideração as Necessidades dos Países em Desenvolvimento, de 1996; e Aplicação do conceito de "Estado lançador", de 2004.
Contudo, por mais que se exalte a
importância do Tratado do Espaço, é impossível ignorar que ele precisa ser atualizado – até com urgência em certos casos –, para impedir qualquer perda de sua autoridade e ampliar sua força e eficiência sobre as atividades espaciais, cada vez mais intensas e complexas.
Em 1967, ao nascer o Tratado do
Espaço, o então presidente dos Estados Unidos, Lyndon B. Johnson, afirmou: "Se não foi possível, até agora, livrar o planeta Terra dos instrumentos de guerra, pelo menos devemos tentar impedir o alastramento desse vírus no espaço". Mal sabia Johnson que este seria hoje, 40 anos depois, uma das mais graves lacunas do Tratado do Espaço: ele proíbe a instalação em órbita de armas de destruição, mas não outros tipos de armas, como as anti- satélite. O resultado é a nova corrida armamentista no espaço, que ora se esboça entre, pelo menos, Estados Unidos, Rússia e China. Ao não vetar todo tipo de arma espacial, o Tratado do Espaço acaba se tornando um bom pre te xto pa ra a pe squisa e o desenvolvimento de novos artefatos de stina dos a de struir sa té lite s. A experiência realizada pela China em 11 esboça entre, pelo menos, Estados Unidos, Rússia e China. Ao não vetar todo tipo de arma espacial, o Tratado do Espaço acaba se tornando um bom pre te xto pa ra a pe squisa e o desenvolvimento de novos artefatos de stina dos a de struir sa té lite s. A experiência realizada pela China em 11 de janeiro deste ano, alvejando por míssil um velho satélite de meteorologia do país, deixa claro que, enquando não houver um acordo a respeito, o espaço continuará passível de se converter em campo de batalha.
Na pauta da Conferência da ONU sobre
Desarmamento, em Genebra, há um projeto russo-chinês de tratado que visa eliminar o uso de armas no espaço, mas a pr o po sta e stá blo que a da pe lo s Estados Unidos.
Outra solução seria propor uma emenda
ao Art. 4º do Tratado do Espaço, inclusindo em sua redação o co m p r o m isso d o s p a íse s d e n ã o colocarem em órbita qualquer tipo de armas, sejam de destruição em massa ou não, nem usarem-nas, de qualquer forma, no espaço, no espaço em direção à Terra, ou na Terra em direção ao espaço. Por seu Art. 15, todo país que ratificou o Tratado pode propor emendas a ele, e as amendas entram e m vigo r pa ra ca da pa ís a pó s a aprovação da maioria dos países-partes. Provavelmente, a maioria dos 98 países que ratificaram o Tratado votaria a favor da tal emenda. Mas a vitória por maioria de votos poderia não resolver o problema: a emenda com certeza não teria o apoio dos Estados Unidos, e, sem esse apoio essencial, seria difícil à nova regra vetar efetivamente o uso de qualquer arma no espaço. Nesta área, co m o e m o u tr a s, o m u n d o e stá favor da tal emenda. Mas a vitória por maioria de votos poderia não resolver o problema: a emenda com certeza não teria o apoio dos Estados Unidos, e, sem esse apoio essencial, seria difícil à nova regra vetar efetivamente o uso de qualquer arma no espaço. Nesta área, co m o e m o u tr a s, o m u n d o e stá obrigado a encontrar uma saída com a participação dos Estados Unidos – pelo menos enquanto perdurar a atual co rre la çã o de f o rça s na a re na internacional. Daí que o futuro do Tratado do Espaço, quanto a haver ou não haver guerra no espaço, depende de uma forte mudança na política da maior potência atual. Ao resto do mundo cabe discutir o tema cada vez m ais e pre ssionar para que e ssa mudança se dê o quanto antes.
Se e quando for possível alterar esse
quadro estratégico mais sensível, outras iniciativas para modernizar o Tratado do Espaço poderão emergir, ser debatidas democraticamente e merecer aprovação com mais facilidade.
Neste sentido, nunca é demais recordar
a s prim e ira s pa la vra s de se u pr e â m bulo . Lá se a f ir m a que o s Estados-Partes do Tratado inspiram-se "na s va sta s pe r spe ctiva s que a descoberta do espaço cósmico pelo hom e m ofe re ce à hum anidade " e reconhecem "o interesse que apresenta para toda a humanidade o programa da exploração e uso do espaço cósmico para fins pacíficos".
O espírito do Tratado do Espaço,
fundado na idéia de humanidade, está necessariamente comprometido com a época da globalização virtuosa, em que todos os países e povos, sem exceção, têm razões de sobra, boas e más, para para fins pacíficos".
O espírito do Tratado do Espaço,
fundado na idéia de humanidade, está necessariamente comprometido com a época da globalização virtuosa, em que todos os países e povos, sem exceção, têm razões de sobra, boas e más, para se sentirem passageiros de uma imensa nave espacial, o Planeta Terra, com todos os direitos e obrigações que isso implica. O desafio hoje é fazer com que a letra do tratado busque atender mais plenamente às demandas decisivas do nosso tempo, como legítima "incumbência de toda a humanidade".
A tarefa está anos-luz distante de ser
fácil e simples. Mas, afinal, somos ou não somos a única espécie inteligente conhecida até agora no Universo, capaz de descobrir os caminhos mais justos e produtivos, de discernir eticamente e de traçar o seu próprio destino?
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* Vice-Presidente da SBDA, membro da
Diretoria do Instituto Internacional de Direito Espacial, membro da Academia Internacional de Astronáutica e do Com itê de Dire ito Espa cia l da International Law Association (ILA), autor de "Direito e Política na Era Espacial – Podemos ser mais justos no espaço do que na Terra?" (Editora Vieira&Lent, 2007) E-mail: monserrat@allternex.com.br
Mulheres, Política e Direitos Políticos: Atualizada de acordo com a EC 117/22 (aplicação de recursos do fundo partidário na promoção e difusão da participação política das mulheres) e Leis n. 14.192/2021 e