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 Tratamento do caldo

Autor(es): André Ricardo Alcarde


O processo de fermentação ou destilação do caldo exige cuidados mínimos que garantam a qualidade do
processo e evitem problemas na centrifugação do vinho ou na destilação.
O tratamento do caldo tem os seguintes objetivos:
• eliminação de impurezas grosseiras (bagacilho, areia), que aumentam o desgaste dos
equipamentos e as incrustações, além de diminuírem a capacidade de produção e dificultarem a
recuperação do fermento;
• máxima eliminação de partículas coloidais, responsáveis pela maior formação de espuma e
também por dificultarem a recuperação do fermento;
• preservação de nutrientes, vitaminas, açúcares, fosfatos, sais minerais e aminoácidos livres,
necessários ao metabolismo das leveduras;
• minimização de contaminantes microbianos, os quais competem com as leveduras pelo substrato
e podem produzir metabólitos tóxicos a estas, diminuindo a eficiência e a viabilidade do
fermento.
É importante ressaltar que o rendimento de uma destilaria depende de uma série de fatores, como:
qualidade da cana; eficiência de lavagem; preparo para moagem; assepsia da moenda e condução do
processo fermentativo.
 Condução do tratamento
O tratamento do caldo para produção de álcool envolve: peneiramento, calagem, aquecimento,
decantação, concentração e resfriamento. Considera-se que a lavagem da cana é responsável pela
remoção de grande parte das impurezas grosseiras, sendo que essa eficiência depende não só do volume
de água, mas também da qualidade da aplicação, do tipo de mesa instalada e das condições de solo e
clima durante o carregamento.
 Peneiramento
Visa a redução das partículas leves (bagacilho) e pesadas (areia, terra etc). Os equipamentos utilizados
são peneiras e hidrociclones, os quais conseguem eficiência de 70 a 85%, dependendo do teor de sólidos
na alimentação, condições de operação, abertura de telas etc. As principais vantagens de sua utilização
são, sobretudo, a redução de entupimento e de desgastes em outros equipamentos, válvulas e bombas.
 Caleação
O tratamento de caldo com leite de cal não somente provoca a floculação e favorece a decantação das
impurezas, mas também protege os equipamentos contra a corrosão. Em relação ao pH a ser alcançado,
quanto mais se aproxima de sete, maior é a remoção de nutrientes do caldo e o excesso de cal pode afetar
o crescimento da levedura em cultura. O pH do caldo decantado é ideal quando atinge a faixa entre 5,6 e
5,8, pois não provoca remoção significativa de nutrientes e diminui a ação corrosiva do caldo sobre os
equipamentos, além de favorecer a redução do número de microrganismos contaminantes.
A calagem é conduzida continuamente pela mistura do leite de cal com o caldo no tanque de calagem,
sendo a dosagem automaticamente controlada pelo monitoramento do pH do caldo calado.
 Aquecimento
O aquecimento consiste em elevar a temperatura do caldo entre 103 e 105º C (Celsius). O aquecimento
em si pouco reduz a contaminação microbiana devido ao baixo tempo de residência à elevada
temperatura. Para aquecer o caldo, utiliza-se normalmente aquecedores verticais, horizontais, tubulares.
Após o aquecimento o caldo é levado para a próxima etapa, a decantação.
 Decantação
Visando a separação (por meio da gravidade) de impurezas com mínima remoção de nutrientes, a
decantação (Figura 1) é conduzida em menor intensidade na clarificação do caldo para destilaria do que
para produção de açúcar. Esta menor intensidade é dada pelo menor tempo de retenção do caldo no
decantador, que gira em torno de três ou três horas e meia contra quatro a cinco horas para a fabricação de
açúcar.
Fig. 1. Decantação do caldo da cana-de-açúcar.
Foto: Patrícia Cândida Lopes.
 Concentração do caldo
A concentração do caldo para produção e armazenamento de xarope é uma das operações de tratamento
que serve como estratégia tanto para a elevação do teor de açúcar total do mosto, com conseqüente
aumento do teor alcoólico, quanto para se garantir a continuidade do processo fermentativo em paradas de
moagem. No caso de armazenamento de xarope, sua concentração deve ser a mais elevada possível sem,
contudo, atingir um limite próximo ao crítico da cristalização.
A concentração ideal para armazenamento gira em torno de 60 graus brix (valor do teor de sólidos
solúveis contidos no caldo), embora usualmente se produza com concentração entre 50 a 55 brix. A
temperatura do caldo que alimenta a dorna é um fator importante no rendimento da fermentação. O
sistema de resfriamento de dorna é projetado para manter a temperatura de fermentação e não para
resfriar o caldo. Portanto, o caldo proveniente do tratamento deve ser resfriado a temperaturas
convenientes por um equipamento adicional antes de ser direcionado à alimentação das dornas.

 Fabricação do Açúcar
Após passar pelas etapas de extração e tratamento do caldo, inicia-se o processo de fabricação de açúcar,
por meio da concentração do caldo por evaporação da água em processo de múltiplo efeito. O xarope
resultante é bombeado para os tachos de cozimento para a cristalização do açúcar.
O cozimento é feito em duas etapas, sendo que na primeira ainda ocorre a evaporação da água do xarope
para a cristalização da sacarose (Figura 1). O produto resultante desse cozimento é uma mistura de
cristais de sacarose com o licor-mãe (mel). Na segunda etapa, ocorre o processo de nucleação, em que são
produzidos pequenos cristais de tamanho uniforme.

Fig. 1. Dornas para separação da água e do xarope.


Foto: Patrícia Cândida Lopes.
A separação dos cristais de sacarose do mel é feita por meio de centrifugação (Figura 2), no qual são
obtidos dois produtos: o açúcar e o melaço.

Fig. 2. Centrífugas para separação do açúcar. Foto: Patrícia


Cândida Lopes.

O melaço é enviado para a fabricação de álcool, enquanto o açúcar é destinado ao secador para a retirada
da umidade contida nos cristais. Após a secagem, o açúcar é levado ao silo para ser ensacado e estocado
(Figura 3).

Fig. 3. Estoque de açúcar ensacado.


Foto: Patrícia Cândida Lopes.

 Fermentação
A transformação da matéria-prima em álcool é efetuada por microrganismos, usualmente leveduras da
espécie Saccharomyces cereviseae, por meio da fermentação alcoólica. Para que a fermentação tenha
sucesso, dentro de especificações técnicas, é muito importante que se misture ao mosto uma quantidade
de leveduras capaz de converter os açúcares em álcool e gás carbônico, dentro de determinadas
condições. Este conjunto de microrganismos recebe o nome de pé-de-cuba ou simplesmente fermento.
As leveduras utilizadas na indústria do álcool e das aguardentes devem apresentar certas características,
como: velocidade de fermentação; tolerância ao álcool; rendimento; resistência e estabilidade. A
velocidade de fermentação é determinada pela quantidade de açúcar fermentado por uma quantidade de
leveduras durante um certo tempo.
O ganho em produtividade por meio de fermentações rápidas aumenta a produção diária e reduz,
consequentemente, o custo de produção e o risco de contaminação por microrganismos prejudiciais. O
rendimento, ou seja, a relação entre açúcar consumido e álcool produzido, deve ser elevado, sendo essa
condição essencial para uma levedura industrial.

 Preparo do mosto
Mosto é um líquido açucarado que pode ser fermentado. Para o preparo dos mostos devem ser tomados
alguns cuidados no tocante à concentração de açúcares totais e sua relação com sólidos solúveis, acidez
total e pH. Em alguns casos pode ser necessária a suplementação de nutrientes, adição de anti-sépticos e
aumento da temperatura para se obter rendimentos satisfatórios.
O preparo do mosto de melaço é simples, já que se constitui em uma correção dos açúcares totais por
meio de diluição. O pH tem papel importante na fermentação, sendo que para favorecer o
desenvolvimento das leveduras deve estar na faixa entre 4,5 e cinco.
O uso de anti-sépticos tem o objetivo de controlar os contaminantes, sendo que o ácido sulfúrico tem se
mostrado o melhor controlador das contaminações. As leveduras desempenham melhor sua atividade à
temperatura de 32 a 34º C (Celsius).
De acordo com a operação de tratamento do caldo, o caldo bruto deve sofrer um tratamento térmico, ou
seja, um aquecimento de até 105º C, visando a eliminação dos microrganismos contaminantes, de maneira
a reduzir a formação de espumas durante o processo fermentativo. Após o aquecimento, o caldo bruto tem
suas impurezas removidas por decantação e resfriamento até a temperatura de 30º C antes da
fermentação.

 Preparo do fermento
Os mostos preparados industrialmente devem ser inoculados com as leveduras, que são os
microrganismos responsáveis pela fermentação alcoólica. Para que as fermentações tenham uma
condução satisfatória, é necessário que se adicione aos mostos uma quantidade compatível de
microrganismos capazes de transformar rapidamente os açúcares em álcool e gás carbônico.
Os fermentos ou pés-de-cuba são o inóculo inicial. Na maioria das destilarias brasileiras é empregado
como inóculo inicial o fermento desidratado, dada a possibilidade de compra da quantidade inicialmente
necessária, evitando-se a operação de multiplicação e seus riscos. Esse tipo de inoculação é chamado de
partida direta, pois não é necessária a multiplicação dos fermentos. No caso da utilização de cultura pura,
é requerido da indústria um melhor nível tecnológico, pois a partir de pequenas quantidades de levedura
seca viva ou acondicionada em tubos de cultura, deve-se produzir a quantidade inicial necessária.

 Condução da fermentação
Uma vez preparados o fermento e o mosto, ambos serão misturados nas dornas de fermentação, momento
em que as leveduras transformarão os açúcares em gás carbônico (Figura 1) e álcool, sendo este último o
objetivo desse processo industrial. A adição do mosto ao fermento deverá ser realizada de modo contínuo,
sendo que a quantidade será controlada através da concentração da mistura.

Fig. 1. Vista do interior da dorna de fermentação


Foto: Patrícia Cândida Lopes.
 Fases da fermentação alcoólica
O processo industrial de fermentação alcoólica pode ser dividido em três fases: fermentação preliminar ou
pré-fermentação, fermentação principal ou tumultuosa e fermentação complementar ou pós-fermentação.
A fermentação preliminar inicia-se com a adição do mosto ao levedo. Quando o inóculo é pequeno, esta
fase caracteriza-se pela multiplicação das leveduras, com conseqüente consumo de açúcares e lenta
produção de álcool. Portanto, deve-se utilizar uma quantidade maior de leveduras de rápida multiplicação,
já que o processo de produção de álcool requer alta produtividade. Ocorrendo o aumento da produção de
álcool, evidenciado pela produção de gás carbônico, tem-se o final desta fase e o início da fase de
fermentação principal ou tumultuosa.
As principais características da fase de fermentação principal são: intensa produção de álcool e liberação
de CO2; aumento da temperatura, a qual deve ser controlada por resfriamento; progressivo aumento de
espumas e elevação da acidez do mosto. A fermentação principal cessa quando diminui a liberação de gás
e, consequentemente, a turbulência característica do mosto. Na pós-fermentação verifica-se a diminuição
da temperatura do vinho, elevação da acidez e a diminuição da atividade de fermentação da levedura pela
ação do acúmulo de determinadas substâncias, do esgotamento dos carboidratos e das toxinas dos
contaminantes.

 Processos industriais de condução da fermentação


As fermentações industriais podem ser classificadas de acordo com os tipos de alimentação das dornas e
desenvolvimento da fermentação, em processos contínuos e descontínuos (batelada).
Processos descontínuos são os intermitentes, denominados batelada simples ou batelada alimentada. Na
batelada simples, a fermentação só tem início após o preenchimento do fermentador, momento em que se
mistura o mosto com o fermento. Isto só é possível em condições de pequenas quantidades de mosto, não
sendo viável para a indústria alcooleira, tendo uso restrito para fermentações laboratoriais e
farmacêuticas. Já na batelada alimentada, mistura-se o mosto ao fermento conforme a dorna vai sendo
abastecida. Trata-se de um método mais produtivo e expõe as leveduras a menores riscos de se tornarem
inativas que no processo de batelada simples.
Em relação aos processos contínuos, os primeiros sistemas foram os de dornas ligadas em série, com
quantidade e tamanhos variados, em cascata, em que as primeiras dornas continham cerca de 70% do
volume total em fermentação. Com a evolução dos processos da fermentação, ocorre uma otimização dos
mesmos com redução dos volumes e do tempo de fermentação com aumentos na produção. O processo
ainda é em cascata, com melhoramento nos sistemas de agitação e com diferenciado traçado geométrico
das dornas.
Algumas vantagens observadas na condução dos processos contínuos são:
• maior produtividade;
• menor volume de equipamentos em geral;
• amplas possibilidades de total automação e uso da informática;
• redução do consumo de insumos, de uma maneira geral.

 Recuperação do fermento
A recuperação de células de levedura para sua reciclagem no processo fermentativo é feito por
decantação, característica de pequenas instalações produtoras de aguardente, ou por centrifugação
(processo Melle-Boinot).
A decantação consiste na espera da precipitação natural das leveduras após a fermentação. Já o processo
de Melle-Boinot é caracterizado pela recuperação do fermento por meio da centrifugação. Assim que os
açúcares se esgotam do mosto em fermentação, o vinho é bombeado da dorna para a centrífuga
separadora, onde ocorre a separação: de um lado o leite de levedura e, do outro, o vinho delevedurado.

 Processos contaminantes da fermentação alcoólica


Se não forem tomados cuidados mínimos quanto à qualidade da matéria-prima, pureza do fermento,
controle de pH e da temperatura, limpeza dos equipamentos, entre outras, pode ocorrer o
desenvolvimento de microrganismos como bactérias, que produzem fermentações indesejáveis, das quais
resultam substâncias estranhas à fermentação alcoólica. Estas fermentações levam à diminuição do
rendimento da produção de álcool, além de produzirem substâncias indesejáveis. Entre estas fermentações
destaca-se a fermentação láctica, cuja origem está na qualidade da matéria-prima.
Algumas medidas para evitar a ocorrência de infecções são:
• matéria-prima de qualidade;
• correto tratamento do caldo e preparo do mosto;
• quantidade e qualidade adequadas do fermento;
• condução controlada da fermentação;
• uso correto de anti-sépticos e antibióticos.

 Parâmetros de controle da fermentação


A produtividade e a eficiência de fermentação consistem nos mais preciosos parâmetros para o
julgamento de uma fermentação alcoólica visto que, indiretamente, inclui os parâmetros: temperatura,
tempo de fermentação e açúcares residuais.

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