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UMA HISTÓRIA A SER CONTADA: A MALHA FERROVIÁRIA DE PROPRIÁ


E SUA INFLUÊNCIA NAS COMUNIDADES DO BAIXO SÃO FRANCISCO

DANIELLE LIMA SILVA*

RESUMO

Este trabalho pretende contar a história da malha ferroviária instalada no município de


Propriá que se estendiam as cidades circunvizinhas, mostrando as implicações da
desativação da Estação de Propriá e da privatização da via férrea daquela cidade. Para
intervir de forma mais efetiva sobre esta questão, foi realizada pesquisa bibliográfica
associada à pesquisa de campo, bem como aplicação de questionário e realização de
entrevistas para melhor conhecer a situação sobre a qual se deseja intervir. Verifica-se
que as razões da desativação e da privatização, segundo informações orais, se deram em
função do surgimento de meios de transportes mais céleres, da construção de estradas
automotivas e da intervenção político administrativa de Fernando Henrique Cardoso,
efetivando a privatização das linhas férreas em todo país. Identifica-se, portanto, que
tais ações trouxeram mudanças de ordem sócio-eonômica, relativas aquelas ligada direta
ou indiretamente com a ferrovia que outrora dinamizava economicamente a região do
baixo são Francisco.

Palavras-chave: Patrimônio. Malha ferroviária. Propriá. Baixo São Francisco.

*Professora de história no município de Gararu/Se, licenciada em história pela


universidade Tiradentes/UNIT.
E-mail: Danielle.hist.lysi@hotmail.com
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1 Introdução

Este artigo visa analisar e mostrar a importância da estrada de ferro como


patrimônio histórico político e cultural do Baixo São Francisco, de modo a ressaltar os
fatores que contribuíram para os avanços e retrocessos da via ferroviária do município
de Propriá, contextualizando e remetendo-se às origens do seu desenvolvimento
histórico com a implantação da ferrovia no estado de Sergipe.

Visando alcançar o objetivo proposto, pesquisamos sobre o cotidiano dos


trabalhadores ferroviários buscando sempre analisar a estrutura econômica dessas
pessoas antes e depois do declínio.

Desta forma, colocamos como um dos principais problemas a ser desvendado


nesta pesquisa é conhecer as causas da desativação da Estação de Propriá, como
também, a situação dos trabalhadores ferroviários com este sistema de transporte falido.

|A ferrovia foi o principal mecanismo de transformação cultural na sociedade


brasileira durante o século XX. Seus trilhos espalharam o desenvolvimento cultural,
econômico, o povoamento, a colonização e principalmente fizeram o homem criar uma
imaginação pautada na força do trem como sinônimo de mudança e no apito da
locomotiva um sinal de aproximação das pessoas.

Foram utilizados alguns autores que estudaram sobre a Ferrovia e aqui serviram
como referência e embasamento teórico para fundamentar trabalho. Dentre eles, a obra
“Café, Ferro e Argila”, escrita por Fábio Cyrino, apresenta os impactos provocados pela
Revolução Industrial que favoreceu o desenvolvimento tecnológico e conseqüentemente
a criação das estradas de ferro nos países europeus e em outras partes do mundo,
propiciados pelos investimentos governamentais responsáveis pela criação de
locomotivas e pela expansão do modelo ferroviário.

Fernando Azevedo, professor da Universidade de São Paulo, em sua obra “O


trem corre para o oeste: Estudo sobre o nordeste e seu papel no sistema de viação
nacional”, o autor salienta as transformações sócio-econômico e cultural, decorrendo
sobre formação e desenvolvimento das estradas de ferro.
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Como auxílio e fundamentação do trabalho, observamos a obra de Jorge


Caldeira intitulada “Mauá: empresário do império” e como complemento uma matéria
de autoria de Bertholdo de Castro, na qual ele trata de “Caminhos de ferro”, onde o
autor fala sobre a importância de investimentos econômicos no setor industrial no
Brasil, como os proferidos pelo Barão de Mauá, através de concessões governamentais,
para o desenvolvimento econômico do Brasil. Essas de essencial relevância para
percebermos a influência de iniciativas privadas como empreendidas por Mauá para o
crescimento do país.

Para melhor compreender o processo político que envolveu a construção da


estrada de ferro no território sergipano idealizado de início no governo de Josino
Meneses que procurava estender o trecho de Aracaju a Simão Dias com um ramal de
Laranjeiras a Capela, depois pela a aprovação do projeto de autoria do Deputado
Federal Rodrigues Dória, que autorizou o governo federal a abertura do trecho Timbó a
Propriá foi tomado como referência o texto de Luiz Antônio Barreto, extraídas do
caderno Personalidades Sergipanas.

Para identificar os governantes sergipanos que investiram na melhoria das


estradas do estado de Sergipe, analisamos os trabalhos existentes, quanto ao período, em
especial o de Ibarê Dantas (História de Sergipe República-1889/2000), onde se afirma
que Sergipe veio ter o privilégio de possuir uma estrada de ferro após a implantação do
regime republicano, enquanto outros estados como Pernambuco, Alagoas e Bahia, já se
usufruíram das vantagens advindas da implantação desse meio de transporte.

Já Maria de Santana Almeida em fundamentos da Economia Dependente,


procura-se esclarecer a preocupação das autoridades governamentais com a integração
do sistema ferroviário com outros meios de transportes, sendo também de essencial
importância para compreender as tensões que envolvia a implantação com este novo
meio de comunicação.

Com o propósito de estudar prioritariamente a malha ferroviária que abrange a


cidade de Propriá e suas implicações sócio-econômicas para as cidades ribeirinhas no
período de sua fundação até o ato da sua privatização, foi utilizado como referência o
trabalho de conclusão de curso de Daisy Lima de Menezes, um embasamento de
fundamental importância para construção deste trabalho. Com referencial teórico
aplicável a todas as etapas do trabalho, utilizamos a teoria de Max Weber e Karl Max,
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salientando as relações de trabalho no que se refere à exploração do trabalho e sua


separação dos meios de produção e lucro obtido, estabelecidas no mundo capitalista.
Além das teorias de Bejamim, Lewis Mumford, Tustel de Caulanges, George Simmel e
outros que utilizaram em sua abordagem sobre história urbana da cidade em todos os
seus aspectos, nos ajudando assim a compreender o sentido da implantação das linhas
férreas em Propriá e as implicações sócio-econômicas da privatização para o
desenvolvimento da cidade e para a vida dos ferroviários.

Visando buscar um sentido completo para construção deste artigo, foram


utilizadas fontes orais através de realização de entrevistas com ex-ferroviário que
trabalhou na Estação Ferroviária de Propriá. Esses são os conteúdos expressos no
decorrer de artigo.

2. Do projeto a sua concretização: uma viagem sobre os trilhos em Sergipe

Entre os investimentos nacionais que interessaram pelo empreendimento da


estrada de ferro aqui no Brasil, destacou-se Irineu Evangelista de Souza (1813-1889),
mais tarde agraciado pelo imperador com o título nobiliárquico de Barão de Mauá,
responsável pela implantação dos primeiros trilhos em terras brasileiras e da primeira
locomotiva construída em 1852, na Inglaterra denominada de “Baronesa” em
homenagem a sua sobrinha e esposa Maria Joaquina de Souza.

Irineu destacou-se como o primeiro empresário a perceber que o crescimento


econômico do país e sua modernização se baseavam nos investimentos industriais,
acreditando nisso, aproveitou-se das vantagens governamentais que facilitaram a
concretização de seus investimentos, como a tarifa Alves branco em 1844, responsável
pelo aumento das taxas de importação que contribuiu para o aumento da receita do
império e estimular a produção industrial, bem como do código comercial do império
que em 1850 tornou legal a criação e as operações de empresas e da lei Eusébio de
Queiroz, com a qual os investimentos dispensados com o tráfico de escravos passou a
ser revertido para empreendimentos industriais, como também beneficiou-se em junho
de 1852, do decreto legislativo 641 que assegurava o pagamento de 5% ao ano sobre o
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capital investido na construção de ferrovias, assim como diminuía as taxas de


importação de bens propícios a construção de vias de ferro.

Em Sergipe, as condições de transportes no início do período republicano eram


bastante precárias comparadas a outras localidades do país que já dispunha de estrada de
ferro. No período que se estendem até 1915, as únicas vias de circulação eram caminhos
mal traçados e estreitos, as trilhas eram abertas pelas necessidades imediatas dos
habitantes, essa era a forma como se podia definir a maioria das estradas de ferro do
século XIX.

Os meios de transportes que ligavam as povoações entre si eram precárias.


Nos municípios costeiros os cidadãos dispunham dos barcos. Mas para quem
vivia mais distanciada do litoral ou dos rios navegáveis, a opção era carros de
bois ou lombo dos cavalos ou dos burros, no momento em que nossos
vizinhos, Bahia e Alagoas, já dispunham de estradas de ferro. (DANTAS,
2004, p. 22).

Porém, a ideia de adotar um sistema de transporte que possibilitasse o tráfego


de cargas e passageiros cortando o território sergipano do sul ao norte, se deu quando
ainda estávamos no regime imperial, tendo como inspiração a construção da linha férrea
que ligava Alagoinhas a Timbó na Bahia em 1887, pela empresa San Francisco
Railway, principalmente por ser um período onde apareciam as primeiras notícias em
jornais atestando a possibilidade de Sergipe possuir uma estrada de ferro.

Para compensar a situação na qual se encontrava a província, foram realizadas


inúmeras tentativas de implantar estradas de ferro em Sergipe, a maioria não deu certo.
A primeira na gestão do então presidente Josino de Meneses, não concretizada em
função da quebra do contrato pela empresa de obras públicas do Brasil. Porém, em 15
de dezembro de 1903, autorizando o governo federal a construir a ferrovia entre Timbó,
localizada na Bahia, e Propriá, em Sergipe, este foi concretizado somente em 03 de
fevereiro de 1909, quando o governo federal autorizou a construção das obras iniciais
na Bahia em 06 de maio do referido ano e em Aracaju em 17 de junho, na presidência
do desembargador Guilherme de Souza Campos.

O primeiro trem chegou a Aracaju no dia 14 de julho de 1913, quando o estado


encontrava-se sob a administração do General José de Siqueira Menezes, que
recepcionou com uma grandiosa festa. Esta locomotiva movida à lenha, conhecida
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como “Maria Fumaça”, trafegou pela primeira vez de Barracão (Bahia) a Aracaju;
inaugurando a estação da estrada de ferro construída entre 1909 e 1911 situada na área
central da cidade, atualmente no início da Avenida coelho e Campos, neste tempo,
denominada de Arthur Bernardes.

Os dois últimos trechos da ferrovia de Sergipe que se estendia até Propriá


abrangendo o ramal Capela-Murta, foram inaugurados em meados de 05 de agosto de
1915, no governo do general Prisciliano de Oliveira Valadão. Partindo o trem da estação
da capital às 10 horas da quinta-feira, conduzindo o representante do Sr. General
Oliveira Valadão, o senhor Dr. Monteiro de Almeida, secretário do Estado, que também
era representante da chaminé e da fiscalização e outras pessoas.

Ao chegar a Capela foram recebidos com festas onde permaneceu até o dia
seguinte, partindo da manhã do dia 06 para Propriá, último trecho da ferrovia a ser
inaugurada, onde fora recepcionados em estrondosa festa pelo motivo da abertura do
tráfego deste trecho ferroviário como demonstra a seguinte matéria.

Sergipe em fim entrou de gosar dos favores de uma linha férrea que desejava
a longos annos passados... E do silvo da locomotiva inaugural do último
trecho juntar-se às locomotivas ruídos a dos povos dessas localidades, que se
preparavam alegres para receber com entusiasmo festivo dos representantes
officiaes, que levaram notícia do tráfego afectivo do timbó a Propriá... E com
a conquista desse meio rápido de transporte, nessas zonas produtoras do norte
do Estado, o povo vê a grande grandeza que os espera na conquista desse
ideal realizado e rejubila-se no enthusiasmo febril desse mesmo ideal para
prescrutar no futuro a grandeza de Sergipe enriquecendo formando na
vanguarda de seus irmãos da federal brasileira (Jornal O Estado de Sergipe, 7
de agosto, 1915)

Apesar da grande movimentação nos pontos de passagem e de parada dos trens


que percorriam o trecho ferroviário em Sergipe, o movimento da estação ferroviária foi
afetada provocando seu fechamento pelas construções realizadas em suas proximidades,
entre os quais, o Colégio Nossa Senhora de Lourdes e a Associação Comercial. Porém,
esta foi substituída por uma nova estação ferroviária no bairro Aribé atual Siqueira
Campos, inaugurada em 1950, recebendo os trens vindos da Bahia, dentre eles, Trem
Agul, Trem Rápido, Estrela do Norte e Alumínio, passando a velha estação a receber
somente os trens suburbanos de Salgado e de Capela que embora vagarosos,
transportaram passageiros até 1997.
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2.1 Um olhar sobre os trilhos de Propriá

Em Propriá a antiga estação ferroviária foi construída em meados de 1912, em


razão da abertura dos dois últimos trechos da ferrovia estendida de Timbó na Bahia à
Propriá em Sergipe. A estação integrada inicialmente a Rede ferroviária Leste
Brasileira, passando depois a pertencer a Rede Ferroviária do Nordeste, situava-se onde
é hoje o Tiro de Guerra que está localizada na Rua da Linha, nome dado em razão dos
trilhos passarem por esta rua, a estação funcionou aproximadamente até 1972, quando
foi desativada.

A denominada Estação Propriá, iniciou sua atividade em 1915, recebendo


passageiros e mercadorias vindas da estação ferroviária de Aracaju, saindo da capital
pela atual Avenida São Paulo com destino as localidades interioranas, onde existiam
outros pontos de parada; Calubi, Ibura, Caetitu, Japaratubinha e Batinga. Além desses,
segundo entrevistados, havia outros pontos próximos à estação de Propriá, é o caso de
malhada dos Bois, Muribeca e Murta (Capela).

Estruturalmente os pontos de parada dos trens considerados popularmente de


estações, eram no geral bem simples, diferentemente dos modelos de estações adotadas
neste período na Inglaterra, que desde a segunda metade do século XIX, já contavam
com grandes estruturas, aplicadas em estações de pequeno, médio e grande porte.
Apresentando um pequeno espaço (cômodo), construído de cimento com piso e
cobertura, a estação de Propriá não oferecia assentos para uma maior acomodação dos
passageiros, sendo exceção a estação de Batinga, povoado de Cedro de São João,
situado entre este município e o de Malhada dos Bois, possuindo uma enorme estação
compostas de salões, servindo para guardar mantimentos, maquinários e etc.

Ao chegar ou ao sair da estação ferroviária de Propriá, em sua maioria, os


passageiros encontravam-se carregados de diversos tipos de mercadorias que levavam
de Propriá para o consumo ou para revender em outras localidades, ao mesmo tempo em
que comerciantes como José dos Santos Alves, natural de Capela, deslocava-se da sua
região de origem para revender suas mercadorias em Propriá.

Como define também José dos Santos Alves, ex-ferroviário, que chegou a
ocupar por indicação, depois de comerciante, a função de conservador de via
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permanente e segurança na estação ferroviária de Propriá: “Tinha tempo que o trem não
cabia de gente, vinha carregado de mercadorias, eu comercializava aqui em Propriá e
sempre vinha de trem, era gente de todo lugar”. (ALVES, 23 de maio, 2007).

A freqüente movimentação da estação, propiciava na Rua da Linha, de certa


forma, a existência de cabarés nas proximidades da estação, fazendo com que esta rua se
tornasse mal vista pela maior parte da população propriaense, e com a desativação dessa
mesma estação acabou por diminuir o fluxo da clientela.

Entre as mercadorias transportadas nos vagões das locomotivas destacavam-se


banana, carvão, cana, verduras, ferro, trigo (um dos produtos mais comercializados),
louças, estas geralmente transportadas no trem conhecido popularmente por “Maria dos
Cavalos”, por ser ocupado por uma senhora que antes da construção da linha férrea em
Propriá costumava ir a Aracaju revender suas mercadorias a cavalo. Segundo
entrevistas, os trens que chegavam à cidade de Propriá possuíam em média de 05 a 10
vagões, quando vazios juntavam-se os vagões de até três locomotivas chegando a um
número de 55 vagões.

Também na estação circulava entre outros, o trem Maria Samaria, percorrendo


trajeto habitual de Aracaju a Propriá, no qual já ocorreram acidentes quando passava
por Malhada dos Bois, em função da linha sustentada pelos dormentes sair do lugar
devido ao peso do trem.

De acordo com alguns entrevistados os primeiros foram movido à lenha, que


eram chamados de “Maria Fumaça”, depois a óleo cru, as locomotivas que transitavam
em Propriá passavam um bom tempo para chegar a estação destinada, é o que relata o
senhor Norberto José de Lima (passageiro), que reside na cidade de Aquidabã.

Eu precisei fazer uma viagem de trem, isso foi em, se não me falha a
memória 1948, para São Paulo, para chegar de uma estação para outra
demorava muito. Principalmente para aqueles que iam na segunda classe, que
foi o meu caso, porque os bancos eram desconfortáveis e o trem muito lento,
como eu não tinha dinheiro para a primeira classe o jeito era esse mesmo. (30
de maio 2007).

O trem, que era considerado pela população como um transporte bom e barato,
além de sua capacidade em transportar grande quantidade de mercadorias, era pouco
ágil em função dos problemas ocorridos, como os freqüentes acidentes, afetando
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diretamente a qualidade dos produtos transportados e a comodidade dos passageiros,


tanto de Propriá como de outras localidades que também utilizavam o trem a passeio,
para vir a festa do Bom Jesus, ocorrida em Propriá todos os anos no dia 26 de janeiro ou
para se deslocar para outros locais.

Acomodados na primeira na primeira ou segunda classe das locomotivas de


acordo com o poder aquisitivo, os passageiros eram transportados respectivamente com
algum conforto na primeira e nenhum na segunda. O passageiro transportado na
primeira classe gozava de alguns poucos privilégios, poltronas confortáveis separadas
umas das outras onde serviam cafezinho, enquanto que passageiros de segunda classe
eram acomodados em bancos de madeira, sem segurança alguma.

As passagens para utilização das locomotivas que chegavam até Propriá eram
vendidas na estação em forma de bilhetes devidamente carimbados, na qual o valor do
passe variava de acordo com o destino do passageiro e com a classe que ele ocupava.
Além do bilheteiro, encarregados de entregar os bilhetes, receber o dinheiro e passar o
troco trabalhava na estação outros funcionários: o conservador de via permanente ou de
linha, que capinava a via, limpava e mudava os dormentes; o segurança incumbido de
tomar conta dos vagões, o supervisor de linha, responsável por administrar
determinados quilômetros de linha e 40 funcionários encarregados da manutenção da
ferrovia, como era o caso do ex-funcionário Carlito Paulino de Andrade, que
administrava 66 quilômetros de linha e 40 funcionários, o maquinista, o feitor, que
dirigia vários setores da ferrovia e distribuía tarefas aos funcionários, o controlador da
locomotiva (função mais remunerada que as demais já citadas), tendo também dentre
outros, o ajudante, o pessoal do socorro, os serventes, o guarda freio e o vigilante.

Recompensado pela função que exercia os funcionários da estação de Propriá,


como José dos Santos Alves, sendo inicialmente conservador de via permanente,
recebia equivalente ao salário da Bahia, em torno de 120 cruzeiros, afirma ele, elevado
com o passar do tempo, quando já estava assumindo outra função sendo suficiente para
suprir a necessidade da família, embora afirmasse “O salário era uma ruela, mais depois
fui enraizando na partição e foi melhorando”.

Reivindicando melhores condições de salário para suprir suas necessidades os


ex-funcionários entrevistados revelaram que os funcionários revoltosos da estação de
Propriá, já organizaram muitas greves, não contando muitas vezes com a presença de
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todos os interessados, como os vigilantes, que pela importância do seu cargo na


sinalização dos trens, evitando assim os eventuais acidentes, pois, era preciso controlar
as passagens dos carros e de pessoas na linha do trem, enquanto as locomotivas
passavam ou estavam próximas de passar.

A construção da ponte que liga própria a Alagoas, em 1972, coincide com o


período da desativação da estação que foi transferida para outro prédio, situada onde
hoje é o depósito da coca-cola, isso se deu por alguns motivos, primeiro - a preferência
de deslocamento de um lugar para outro já não estava mais sendo pelos trens, apesar de
seu custo ser mais barato. Segundo – outros veículos surgiam e ao invés das estações,
viam as rodoviárias. Terceiro – com a ponte, os trens não passavam mais pela estação,
situada na Rua da Linha, em decorrência do crescimento e da valorização da indústria
automobilística a partir da década de 60 e 70, o que tornou inevitável a futura
desvalorização da redes ferroviárias. A qual seria substituída por outros meios de
transportes (carro, caminhão, ônibus, avião), mais rápidos do que os trens. A partir de
então, as locomotivas que circulava o novo prédio se dedicaram mais ao transporte de
carga até o período da sua privatização.

Na visão dos ex-funcionários, o responsável pela privatização das malhas


ferroviárias do Brasil foi Fernando Henrique Cardoso, que em seu governo pretendia
diminuir as despesas da União, enxugando a “máquina”, como definiu alguns ex-
funcionários, essa era a justificativa de FHC. Deixando os funcionários numa situação
complicada. À medida levou muitos perderem os empregos e os benefícios adquiridos,
como plano de saúde, mas estabelecendo um acordo com o governo. Porem, quem já
estava no tempo de se afastar pela questão da idade e pelo tempo de serviço, se
aposentou, não recebendo com o acordo estabelecido o equivalente ao tempo de serviço
prestado, a maioria dos funcionários ficou em uma situação difícil, alguns investiram o
dinheiro na compra de terrenos e de cabeça de gado para tocar a vida, outros optaram
por gastar o dinheiro. Alguns estão no movimento sem-terra por falta de condições
propícias a sua sobrevivência, enquanto outros lutam para pagar o INSS para se
aposentarem.
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Conclusão

É extremamente importante em sua dimensão histórica, o resgate da memória


cultural e patrimonial de uma região, principalmente quando mudanças econômicas e
sociais refletem culturalmente a memória coletiva de um povo. Contudo, analisamos as
possíveis evidências de discordância nas condições de trabalho dos funcionários
contratuais ou efetivas estabelecidas entre operários e empresários federais das
ferrovias, à medida que os proletariados contestavam as falsas promessas de melhores
condições de trabalho, partindo então para medidas mais drásticas, como as
movimentações grevistas.

Essas questões referentes a lutas de classes foram debatidas e analisadas pelos


sociólogos Karl Marx desde o século XIX. Marx, em sua tese ignora a
representatividade política do Estado, pois ele tinha uma visão negativa da política, isto
é, para ele não existe uma teoria geral do Estado, este deveria ser gradativamente
extinto. Acreditando que tais representações estariam vinculadas ao benefício próprio da
classe dominante e não da população em geral.

Visando reiterar a valorização da memória como ponto culminante para a


construção de políticas públicas para o desenvolvimento geral, partindo da memória
coletiva dos trabalhadores, além de contribuir para pontuar questões referentes aos
impactos decorrentes desde sua construção a sua perda, sentimos a necessidade de trazer
um pequeno contributo para a história do município de Propriá.

Nessa reconstrução, conseguimos resgatar através dos relatos orais, história do


cotidiano da estrada de ferro de Propriá integrada à Rede Ferroviária Leste Brasileira
com sede na Bahia, para que gerações futuras possam conhecer, por meio desses relatos
já documentados, a grande importância da ferrovia para o desenvolvimento do Baixo
São Francisco. Assim, concluímos que as numerosas transformações tecnológicas no
transportes e na comunicação no século XIX, foram suficientemente significativas para
merecerem o título de revolucionárias, à medida que forneceram novos horizontes para
o desenvolvimento econômico, político e cultural, não somente da Inglaterra, berço da
Revolução Industrial, mas também para os países considerados subdesenvolvidos, como
foi o caso do Brasil.
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Embora tenhamos reconhecido durante o percurso do trabalho que a


implantação das malhas ferroviárias contribuiria para fornecer trabalho para as pessoas
que residiam nas proximidades da estrada de ferro, salientamos também que esses
mesmos trabalhadores representantes da classe proletária, sofriam com a falta de
investimento da empresa ferroviária quanto à remuneração salarial. Isso provocou
descontentamento e manifestações grevistas que visavam uma melhoria nas suas
condições de trabalho.

Para o que nos propomos pesquisar a respeito desta temática, certificamo-nos


de que a construção da ponte em 1972, que ligava o município de Propriá ao Estado de
Alagoas, foi uma das principais causadoras da grande decadência de movimentação de
passageiros na Estação de Trem de Propriá, que a partir de então, o trem já não
trafegava mais pelas cidades circunvizinhas, destinados apenas para o transporte de
mercadorias, levados aos portos de escoamento de materiais.
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REFERÊNCIAS

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