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Edição 1847
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E-xpresso NOVO Mulheres que amam mulheres
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1.º Caderno Seis lésbicas aceitaram dar a cara pela primeira vez na imprensa
portuguesa. Algumas criam filhos de relações heterossexuais
Economia
passadas, outras querem ser mães por inseminação artificial. A
Única
nova geração assume-se cada vez mais cedo, ambiciona casar-se Mulheres que amam
Actual e reclama igualdade de direitos.Todas desejam ser encaradas com mulheres
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Quem TV Sara e Rita estão abraçadas no sofá da sala, frente à lareira, como um qualquer
Íntimo casal apaixonado num domingo invernoso. Aos seus pés cirandam Tigra,
Vaidades Rumba, Xica e Mia, as quatro gatas de estimação. Pela moldura das janelas
Sabores anuncia-se a chuva, o Tejo e a ponte Vasco da Gama. Uma carícia no rosto, um
Prova de vinhos abraço apertado e um longo beijo na boca ilustram uma história de amor com
À mesa
seis anos de existência. Ali não há lugar para pudores e preconceitos. Nem tão
pouco para estereótipos. Sara e Rita não encaixam na imagem batida da mulher
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máscula, de voz grossa, desmazelada. Pelo contrário, ambas são extremamente
Play femininas, bonitas e elegantes. E, acima de tudo, estão enamoradas uma pela
outra. A sua relação lésbica deixou de ser um segredo e é partilhada com a
família, amigos e colegas de trabalho. Uma conquista traduzida numa só palavra:
visibilidade. «Porque não temos de ter vergonha de ser quem somos», atira Sara
Martinho, 31 anos, consultora de Recursos Humanos. Até numa das últimas
reuniões de condóminos do prédio onde habitam, na zona do Parque das
Nações, escolheram contar a sua história aos vizinhos para não darem azo a
equívocos ou a falatório. «De resto, seja no café ou no médico, quando olham
para a minha aliança e perguntam se tenho noivo ou marido, respondo que tenho
uma... marida. Quando esta questão é dita com normalidade as pessoas ficam
desarmadas e tendem a aceitar», responde, entre sorrisos. Para trás ficou um
doloroso processo de «coming out» (vulgo «saída do armário») feito de lágrimas
e medos, onde ambas tiveram de aprender a aceitar e a viver com a sua
orientação sexual. Sara resume o lado assolador do tema: «Um dos primeiros
contactos que um homossexual tem com a sua própria homossexualidade é o
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insulto. A sociedade em que vivemos usa o que somos para insultar os outros, ou
seja, eu sou um insulto! - E eu não queria que ninguém me visse como tal...» Se
esta é uma das primeiras referências que os homossexuais têm de si, é
justificável que muitos vivam no permanente pânico de serem descobertos.
Talvez por isso e por ser bissexual, Sara só tomou consciência de que gostava
de mulheres aos 19 anos. Até lá teve inúmeros namorados, vivendo em pleno
esses amores heterossexuais, sem arranjar explicação para o facto de sentir
«borboletas na barriga» quando estava perto de determinadas raparigas. «A
sociedade é tão heterossexista e nós somos de tal forma educados para isso que
podemos viver muito tempo alheados da nossa verdadeira identidade». Rita
Paulos, 28 anos, a trabalhar na área da tradução, não passou por essa
ambiguidade. Aos 16 anos apaixonou-se pela melhor amiga. «Fui-me dando
conta de que o que as minhas colegas sentiam pelos rapazes que amavam era o
mesmo que eu sentia pela minha amiga. Mas a carga negativa que a
homossexualidade ainda acarreta para muitas pessoas não me afectou
grandemente». Quando Rita e Sara se conheceram, da fraqueza fizeram força, e
em 2003 fundaram a associação Rede Ex-Aequo, que contou com o apoio do IPJ
(Instituto Português da Juventude) para a criação em todo o país de grupos de
aconselhamento aos jovens LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros)
dos 16 aos 30. «Todas as semanas nos chegam casos de rapazes e raparigas
expulsos de casa, trancados no quarto e abusados física e psicologicamente por
terem assumido a sua homossexualidade aos pais», alerta Rita, porta-voz da
associação.
Também para ambas, o passo mais difícil nas suas vidas foi a revelação aos
respectivos pais. A aceitação aconteceu lentamente no caso da Rita, mas Sara
chegou a ouvir dos lábios da sua mãe: «Quem ama a minha filha a minha boca
adoça». Rita acrescenta-lhe: «O amor entre duas pessoas nunca pode estar
errado». Sara esboça um sorriso cúmplice. De olhos azuis muito abertos,
aproveita para lhe fazer uma declaração emocionada: «Ela é a companheira
certa para a minha vida. É a pessoa para quem eu gosto de chegar a casa, à
noite, e de abraçar na cama na posição de cadeirinha. É a pessoa que eu espero
ver ao acordar. É a amiga, amante, a minha crítica, a minha razão. É a pessoa
que dá sentido à minha vida. Não consigo conceber a minha realidade sem ela»,
explica. Por estas mesmas razões, há quatro anos estas duas jovens optaram
por fortalecer o compromisso amoroso passando a viver em união de facto.
Desta forma, ficaram abrangidas por uma figura legal reconhecida em Portugal
desde 2001 e que contempla duas pessoas, independentemente do sexo, que
coabitem como casal há mais de dois anos. «Com isto alcançámos alguns
direitos fundamentais como o regime de imposto de rendimento (IRS) nas
mesmas condições dos casados, protecção pela Segurança Social na
eventualidade da morte do beneficiário, direito ao imóvel equiparado ao do
cônjuge, entre outros». Na época, para oficializarem a relação e assumirem o
compromisso, organizaram uma grande festa para amigos e familiares. «Foi um
dia especial. A partir desse momento deixámos de ser namoradas para sermos
algo mais sério: companheiras», assevera Sara que, tal como Rita, tem a
ambição de alargar o agregado familiar. Ou seja, ambas querem ser mães
biológicas. Como? Através do acesso a um banco de esperma e às técnicas de
Procriação Medicamente Assistida (PMA). «Sempre quisemos ter filhos e
estivemos a aguardar por uma situação profissional estável. Mas será algo a
acontecer num futuro próximo», assegura Sara. Como a lei portuguesa, desde
2006, só permite o acesso à PMA apenas em caso de infertilidade e unicamente
a mulheres heterossexuais casadas ou em união de facto, Sara e Rita planeiam
fazê-lo numa clínica no estrangeiro. Provavelmente em Espanha. Preferem o
esperma de um dador anónimo porque lhes dará garantias de segurança.
Contam desembolsar pelo menos 1.500 euros por cada viagem. «O facto de ser
lésbica não anula em mim o desejo de maternidade, nem a minha competência
para tal. Sim, quero ser mãe!», sublinha. Para desfazer equívocos e falsas ideias
sobre o que é o quotidiano de um casal de lésbicas, Sara decidiu criar um blogue
onde conta as peripécias do casal: www.cacaoccino.blogspot.com. Sobre esta
questão, é peremptória: «Quero que as pessoas saibam que a minha vida com a
Rita é tão aborrecida e banal como qualquer outro casal heterossexual. Fazemos
compras mensais no supermercado, pagamos as contas, aos fins-de-semana
almoçamos com a minha mãe e jantamos com os pais da Rita. É uma vida tão
banal e insípida como a da maioria das pessoas e isso deixa-me muito feliz».
Convidado a comentar este caso, o advogado Luís Grave Rodrigues começa por
condenar o projecto-de-lei aprovado na Assembleia da República em Maio de
2006, que impede as mulheres lésbicas ou solteiras de recorrerem às técnicas de
PMA. «Esta proibição é manifestamente inconstitucional e incompreensivelmente
injusta. Para além disso, é uma lei absolutamente idiota. Primeiro porque afasta
uma determinada categoria de mulheres do direito à maternidade, por força de
um preconceito bacoco e obviamente de cariz religioso. Depois, porque não
permite que uma mulher possa constituir família - tal como lhe garante o artigo
36.º da Constituição - nas condições que muito bem entenda, só por força de
uma dificuldade física que a discrimina face às restantes mulheres».
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Afirma que a nova geração de lésbicas se está a assumir cada vez mais cedo.
Algo que o «Expresso» pôde confirmar ao passar algumas noites no bar Purex e
na única discoteca lésbica de Lisboa, a Maria Lisboa, estabelecimentos
frequentados por jovens mulheres homossexuais, muitas menores de 18 anos. E
tão femininas e vaidosas quanto as que apareceram na série televisiva
americana «A Letra L», que a RTP2 exibiu, e povoam o imaginário de muitos
homens heterossexuais.
Veja vídeo
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RAQUEL COSTA
SÍLVIA JORGE
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inferior, menos válido. Dou a cara para que chegue o dia em que o tema
homossexualidade deixe de ser considerado atípico, e passe a ser observado
como uma qualquer coisa normal na vida das pessoas. Tão banal como ir às
compras à Baixa. Ou simplesmente não ser referenciado em separado dos
outros tipos de relacionamentos em entrevistas para os ‘media’.»
ANA PINHEIRO
43 anos, editora
SOFIA OLIVEIRA
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estava grávida e, como tal, não passava por aquela cabeça que eu pudesse
estar com outra mulher. Penso que hoje a sociedade está ‘muito à frente’ e
com calma e persuasão chegar-se-à ao dia em que todos os casais possam
usufruir das mesmas ‘regalias’. O que não acredito é que isso seja
conseguido através de marchas pela Avenida da Liberdade.»
SOLANGE F.
31 anos, apresentadora de TV
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