You are on page 1of 6

Resumos do 56º Congresso Nacional de Botânica.

Basidiomycetes, resumidamente

CLARICE LOGUERCIO-LEITE - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA


CLAUDIA GROPOSO - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
ELISANDRO RICARDO DRECHSLER-SANTOS – UNIV. FEDERAL DE SANTA CATARINA
JOSUÉ MICHELS - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
LIA FERNANDES - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
MARISA DE CAMPOS SANTANA - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

clleite@ccb.ufsc.br

Retrospecto

A taxonomia e a sistemática vêm disputando, conceitualmente, sua


abrangência. Sistemática, referindo-se ao “ordenamento de
organismos em classificações”, foi usado primeiro por Linneu em
1737 como sistemática botânica. Por outro lado, Taxonomia foi
cunhada, em 1831, por De Candolle aludindo a “teoria da
classificação das plantas”. Mais tarde, coincidindo com o
aparecimento da teoria de Darwin (1859), os dois termos passaram a
ser considerados como sinônimos (STUESSEY 1990). Alguns
micólogos como HAWKSWORTH (2001) consideram, ainda hoje, que
Taxonomia, junto à Nomenclatura são componentes da Sistemática,
que envolve também a elucidação das relações biológicas e
evolutivas.

Ao considerar que esta é a ciência da diversidade de organismos, ela


é estudada com a finalidade de sintetizar informações para
prognosticar sistemas analíticos de classificação (JUDD et al 1999).

Por outro lado, analisando a utilidade da Nomenclatura, constata-se


que os nomes aplicados aos organismos são a chave para todo o
conhecimento acumulado sobre eles, suas propriedades e usos
(HAWKSWORTH 2001).

A utilização de nomes já se encontra em Micheli que em 1729 utilizou


o conceito de gênero e usou nomes como Phallus e Puccinia
(Basidiomycota, acréscimo nosso). Linneu seguiu uma prática similar
em dois trabalhos posteriores, sobre plantas, em 1737 e 1745. O
sistema binomial só começou a ser usado por Linneu em 1751, que
em 1753 publica Species plantarum com cerca de 200 espécies de
fungo (HAWKSWORTH 2001). Alguns nomes de espécies descritas por
Linneu em Basidiomycetes são, por exemplo, Boletus luteus L. ,
Boletus edulis L. e Agaricus crinitus L.
Resumos do 56º Congresso Nacional de Botânica.

A introdução de nomes para os grupos de organismos em todos


níveis superiores (Classe, Divisão/Filo e Reino) é tradicionalmente
considerada como marginal frente aos requisitos normais do CINB
[Código Internacional de Nomenclatura Botânica]. Este procedimento
evidencia-se, no passado, pela introdução de nomes em tabelas de
classificação ou no texto sem qualquer descrição ou diagnose. Nomes
de taxa superiores em fungos foram raros nos séculos XVIII e XIX.
Persoon, em 1794, parece ser o primeiro a propor classes nos fungos,
que foram chamadas de Angiotécio e Gimnotécio correspondendo,
respectivamente, a frutificações abertas ou fechadas. Posteriormente,
Fries em 1821 propôs quatro classes (Coniomycetes, Hyphomycetes,
Gasteromycetes e Hymenomycetes). Anton de Bary em 1862
defendeu o uso de nomes de classe mais familiares (Ascomycetes,
Basidiomycetes) que ficaram preservados, com poucas alterações, no
sistema proposto em 1882 por Saccardo (DAVID, 2002).

A manutenção desta idéia manteve-se até bem pouco tempo, tal


posição pode ser comprovada ao examinar-se o sistema que se
encontra em HAWKSWORTH, SUTTON & AINSWORTH (1983). Nele o
reino Fungi é apresentado como uma divisão (Eumycota),
Basidiomycotina é subdivisão com quatro classes Hymenomycetes,
Gasteromycetes, Urediniomycetes e Ustilaginomycetes.

Com a ênfase dada à morfologia do basídio os basidiomicetes são


divididos em dois grupos distintos: basídios inteiros e basídios
septados. Apesar dos termos Holobasidiomycetidae e
Phragmobasidiomycetidae, terem sido cunhados por Gäumann em
1949, só em 1980 Moore os eleva ao nível de classe. Mais tarde,
Moore considera Basidiomycota como uma divisão formada por duas
subdivisões, Homobasidiomycotina e Heterobasidiomycotina (DAVID,
2002).

HAWKSWORTH et al. (1995) apresentam um sistema no qual os


basidiomicetes correspondem à divisão Basidiomycota, com três
classes Basidiomycetes, Teliomycetes e Ustomycetes. No caso de
Basidiomycetes, retoma-se a proposta de Gäumann com duas
subclasses, Phragmobasidio-mycetidae e Holobasidiomycetidae.

KIRK et al (2001) apresentam uma classificação com as subclasses


Tremellomycetidae e Agaricomycetidae em Basidiomycetes,
correspondendo respectivamente a basídios septados e inteiros. No
caso da primeira subclasse, proposta em 1984, seu nome baseia-se
em Tremella; a segunda, de 1986, baseia-se em Agaricus. Vale
ressaltar que em todas estas propostas não há indicação do tipo, nem
sequer a diagnose latina (DAVID, 2002).
Resumos do 56º Congresso Nacional de Botânica.

AGORA

Os sistemas apresentados acima se baseiam, sem exceção, em


características morfológicas e estão apoiados, metodologicamente, na
proposta hierárquica de Linneu (DE QUEIROZ, 1997).

Certos autores se surpreendem ao constatar que um sistema


enraizado no criacionismo haja sobrevivido à revolução darwiniana e
ainda seja usado nos dias atuais (ALEXANDER, 2002). A teoria da
evolução e a hierarquia - duas pedras angulares da taxonomia
contemporânea - têm coexistido harmoniosamente, apesar de
recentemente haver sinais de que esta situação não perdurará
(WHEELER, 2004).

Em resumo a distinção entre ambas é que a Sistemática Clássica


agrupa organismos em base fenética, coloca-os em uma classificação
e a filogenia é uma consideração secundária. A Sistemática
Filogenética determina em primeiro lugar as relações entre os
organismos, construindo então uma classificação que reflete a
filogenia (MCLAUGHLIN &. MCLAUGHLIN, 2001).

A entrada da biologia no século XXI caracteriza-se por um aumento


de tensão entre a Biologia Filogenética e a Taxonomia. Esta se
enfraqueceu, sofrendo agora uma perda de posições e fundamentos
para estudos que reconstruam filogenias. Por outro lado, a Biologia
Filogenética capitaliza a popularidade de genética molecular,
avançando às expensas da descoberta de espécies, de descrições e
do teste de hipóteses (WHEELER, 2004). A substituição -
principalmente em zoologia, de todo um sistema de referência por
alternativas taxonômicas e mesmo nomenclaturais, como o
PhyloCode que tem como proposta a estabilidade, clareza e unicidade
dos nomes (ALEXANDER, 2002), visto que essas características não
são encontráveis na nomenclatura e taxonomia clássicas.

Mesmo considerando que toda pesquisa biológica sustenta-se na


taxonomia TAUTZ et al (2003) consideram-na em crise, devida a
ausência de especialistas, o que seria sanado com a introdução de
métodos baseados em ADN, reduzindo a Taxonomia à proposta de
identificação de espécies e a inclusão nos táxons de nível superior.

A utilização de ferramentas moleculares passa a ter muita


importância na teoria e prática taxonômica, gerando sistemas de
classificação que se fundamentam em princípios e procedimentos
freqüentemente antagônicos aos preceitos clássicos. WHEELER
Resumos do 56º Congresso Nacional de Botânica.

(2004) considera que a crescente demanda por padrões filogenéticos


tem resultado na análise filogenética molecular e na redução
concomitante do trabalho taxonômico tradicional.

Relações filogenéticas baseadas em dados moleculares utilizam


principalmente seqüenciamento de ADN ribossomal (KIM & JUNG,
2000; WEIΒ & OBERWINKLER, 2001). Um exemplo deste tipo de
proposta pode ser visto em Homobasidiomycetes (HIBBETT & THORN,
2001; BINDER & HIBBETT, 2002), cujos resultados originaram sua
divisão em 8 clados principais (poliporóide, euagárico, boletóide,
teleforóide, russulóide, himenoquetóide, cantarelóide e gomfóide-
falóide), a monofilia do grupo é bem sustentada, exceto no clado
poliporóide. Nestes trabalhos há unicamente uma proposta formal
dentro da visão da Taxonomia Filogenética, não sendo consideradas
as categorias, usadas na taxonomia Clássica, estabelecidas pelo
Código Internacional de Nomenclatura Botânica,

Contudo, considerar que as propostas filogenéticas baseiam-se


apenas em dados moleculares não está totalmente correto, já que a
morfologia também pode ser utilizada para tal finalidade (WIENS,
2001). Uma revisão de características “morfológicas” (=não
moleculares) que podem ser filogeneticamente informativas é
apresentada por HIBBETT & THORN (2001). Entre elas encontram-se
macromorfologia do basidioma; micromorfologia e ultraestrutura;
estruturas esporulantes e somáticas; formas de nutrição.

Um exemplo mais pontual encontra-se em Phellinus Quélet


(Hymenochaetaceae). A família é considerada monofilética, mas
estudos recentes vêm mostrando que o gênero não o é. FIASSON &
NIEMELA (1984) ao trabalharem com Hymenochaetaceae, baseados
em morfologia e fisiologia, tiveram dificuldade em definir Phellinus,
subdividindo-o então em diferentes gêneros, conceitualmente os de
Murrill. GÓES NETO et al (2001; 2002) ao analisar filogeneticamente
espécies tropicais de Phellinus, baseando-se em dados morfológicos e
moleculares, encontraram alta similaridade entre estes dados, assim
como com os resultados de FIASSON & NIEMELA (1984). Deste
modo, comprova-se que muitas hipóteses taxonômicas baseadas em
morfologia são sustentadas por estudos filogenéticos.

Concluindo, constata-se que as tentativas da sistemática atual vêm


sendo as de unificar procedimentos, e ao invés do abandono da teoria
e da prática taxonômica este é o momento de adaptar informação e
tecnologias moleculares.
Resumos do 56º Congresso Nacional de Botânica.

Contudo os estudos filogenéticos em Basidiomycota não tem


originado propostas de classificações, porque as categorias do
sistema hierárquico de Linneu são insatisfatórias para tal proposta.
HIBBETT & DONOGHUE (1998) consideram que as análises
filogenéticas têm tido um impacto relativamente pequeno no
desenvolvimento de classificações fúngicas. A primeira barreira para
a conversão de árvores filogenéticas em classificações seria a falta de
confiança na hipótese filogenética, devida em grande parte à
amostragem incompleta. No entanto, o fato de que muitos clados
bem sustentados continuem sem ser nomeados sugere que há
também barreiras metodológicas (ou psicológicas) para traduzir
árvores em classificações.

Referências
ALEXANDER, J. The future of biological taxonomy. Does the PhyloCode offer a
viable alternative to traditional Linnaean Taxonomy? http://www.systass.org.
Jake_Alexander_essay.pdf. 2002.
BINDER, M. & D. S.HIBBETT. Higher-level phylogenetic relationships of
Homobasidiomycetes (Mushroom-forming fungi) inferred from four rDNA
regions. Molecular Phylogenetics and Evolution, v. 22(1), p. 76-90. 2002.
DAVID, J.C. A Preliminar catalogue of the names of fungi above the rank of order.
Constancea, v.83. p 1-42. 2002.
DE QUEIROZ, K. The Linnaean Hierarchy and evolutionization of taxonomy, with
emphasis on the problem of nomenclature. Aliso, v.15 (2). p 125-144. 1997.
GOÉS-NETO, A.; C. LOGUERCIO-LEITE & R.T. GUERRERO. Morphological cladistic
analysis of tropical Hymenochaetales (Basidomycota). Mycotaxon, v. 79, p.
467-480. 2001.
_______________. Molecular Phylogeny of tropical Hymenochaetales. Mycotaxon,
v. 84, p. 337-354. 2002.
HAWKSWORTH, D.L. SUTTON & AINSWORTH,. Ainsworth and Bisby’s Dictionary of
the fungi. CAB-CMI, Kew, Surrey. 1983.
HAWKSWORTH, D.L. et al. Ainsworth and Bisby’s Dictionary of the fungi 8th ed.
CABl, Wallingford. 1995.
HAWKSWORTH, D.L. The naming of Fungi. In MCLAUGHLIN, D.J., E.G.
MCLAUGHLIN & P.A. LEMKE. Systematics and Evolution part B, vol VII,
Springer-Verlag: Berlim .p.171-192. 2001.
HIBBETT, D. S. & DONOGHUE, M. J. Integrating phylogenetic analysis and
classification in fungi. Mycologia 90(3): 347-356, 1998.
HIBBETT, D.S. & THORN, R.G. Basidiomycota: Homobasidiomycetes In
MCLAUGHLIN, D.J., E.G. MCLAUGHLIN & P.A. LEMKE. Systematics and
Evolution part B, v. VII, Springer-Verlag: Berlin.. p.123-168. 2001.
KIRK et al. Ainsworth and Bisby’s Dictionary of the fungi. 9th ed. CABI Bioscience,
Egham. 2001
JUDD, W.S; KELLOG, E.A.; STEVENS, P.F.. Plant Systematics. Sinauer Assoc. Inc:
Sunderland. p. 2-3. 1999.
KIM, S. Y. & H. S. JUNG, Phylogenetic relationship of the Aphyllophorales inferred
from sequence analysis of nuclear small subunit ribosomal DNA. The Journal of
Microbiology, v. 38(3), p. 122-131. 2000.
Resumos do 56º Congresso Nacional de Botânica.

MCLAUGHLIN, D.J. & E.G. MCLAUGHLIN. Introduction In MCLAUGHLIN, D.J., E.G.


MCLAUGHLIN & P.A. LEMKE. Systematics and Evolution part B, vol VII,
Springer-Verlag: Berlim .p.1-2. 2001.
STUESSEY, T.F. Plant Taxonomy. Columbia University Press: New York. p 5-9.
1990.
TAUTZ, D. P. et al. A plea for DNA taxonomy. Trends in Ecology and Evolution, v.
18 (2), p.70-74. 2003.
WEIΒ, M. & F. OBERWINKLER. Phylogenetic relationships in Auriculariales and
related groups – hypotheses derived from nuclear ribosomal DNA sequences.
Mycological Research, v 105 94), p. 403-415. 2001.
WHEELER, Q.D. Taxonomic triage and the poverty of phylogeny. Phil. Trans. Royal
Soc. Of London, v.359, p. 571-583. 2004.
WIENS, J. J. Character analysis in morphological phylogenetics: problems and
solutions. Syst. Biol., v. 50(5), p. 689-699. 2001.

You might also like