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O PRIMEIRO VIAGRA...

NINGUÉM ESQUECE!

Luis Fernando Verissimo


Foi desastroso!
Minha performance sexual tinha
caído muito. Nem tanto pela idade,
mas pelas dificuldades de
relacionamento matrimonial somado
a inúmeros
problemas pelos quais
eu passava.
Semana passada, resolvi
comprar o tal do Viagra.
Mas que vergonha de ir
comprar o medicamento.
Reconhecer publicamente
que tava brochando.
Vergonha...
Desgraça!
Mas eu queria experimentar.
Mas ninguém poderia saber.
Ninguém.
Mas como fazer com o farmacêutico?
Alguém iria saber. No mínimo uma
pessoa. No mínimo, não.
Uma só pessoa. O
farmacêutico.
Afinal eu não fabrico o fármaco.
Onde ir comprar? Será que em outra
cidade, onde ninguém me
conhecesse? Isso seria o ideal.
Mas eu estava sem nenhuma viagem
agendada.
Teria que ser na minha cidade.
Mas claro que numa farmácia em
bairro que absolutamente ninguém
me conhecesse.
Por alguns dias fiquei imaginando
uma farmácia "ideal".
Foi difícil imaginar.
Enfim, descolei uma. Por sinal,
Farmácia Ideal!
Restava agora escolher o perfil do
vendedor.
Uma vendedora seria melhor. Não.
Nem pensar. Eu não iria entregar os
pontos confirmando que tava em baixa.
Não.
Um homem, então. Dedução lógica.
Mas reconhecer pra um concorrente
que eu tinha abdicado das
funções? Desgraça.
As duas opções eram ruins.
Parecia que o atendimento pelo
homem era menos traumático.
Se tivesse um vendedor de uns 70 anos
seria o ideal. Ele já conhecia o
problema. Se ele fosse discreto,
melhor ainda.
Seria como ir comprar um
medicamento pra alergia e chegar lá
o vendedor ser
alérgico. O cara
conhece tudo.
Já pensou comprar de um
garotão:
-Tá aqui o levanta morto, tio.
Não!!!
Mas onde achar o bom velhinho
vendedor de Viagra?
Escolhida a farmácia, cheguei lá,
durante a manhã, quando teria
menos movimento.
Que nada!...
Várias pessoas na farmácia.
Será que entro?
Entrei.
Veio uma gatona me atender.
-Pois não?... me disse.
-Estou vendo uns sabonetes,
respondi.
E fiquei circulando na
farmácia, envergonhado,
cabeça baixa procurando o bom
velhinho.
E cadê o homem? Não
existia!
Continuei circulando.
Uma outra
senhora balconista. Não. Não
servia. Mulher não.
Um garotão terminava uma venda.
Também não. Tinha um cara de uns
quarenta anos. Parecia o indicado.
Fui até ele. Quando eu chegava ao
balcão, chega uma senhora de uns
quarenta anos e me diz a queima
roupa:
-Pois não, senhor?
Pô, a palavra "senhor" já
pressupunha que sou velho.
Diabo.
E agora?... Pedia ou não?
Comecei pedindo um AAS adulto,
que sempre preciso em casa.
Ela trouxe o AAS.
Bem discreta! E agora?...
Pedia... ou não?
Pedi um Pepsamar, que uso
sempre.
Ela trouxe o Pepsamar.
Discretamente.
Puta merda. Pedia ou não?
Me encorajei, enchi o pulmão de ar e com
uma voz sussurrada, como que vindo do
fundo de um túmulo, sussurrei:
-Ah... e um Viagra.
O Ah era pra dar idéia que tinha me
lembrado naquele momento.
Que original.
Senti que vermelhei.
A balconista me olhou.
Levantou a sobrancelha.
Só a esquerda.
Esquerda de quem olha.
Me olhou como quem diz....
-Brochando véio?
Eu não sabia se olhava pra ela
ou pro chão.
Os minutos não passavam.
Digo, os segundos
não passavam!
E a balconista me olhando
como a dizer:
-Velho safado, ainda quer
foder, é?!
Que aflição!...
Mas a sorte já estava
lançada.
Não é que nesse momento , olho
ao lado e vejo um amigo meu,
médico, acompanhado da...
esposa???
Gente conservadora.
Evangélicos.
Me abraçaram efusivamente.
Me pegaram com a boca na
botija. Maior flagra!
Eu tava fodido!!!
-Tá doente? Me disse o médico.
-Não, só umas aspirinas,
respondi.
Eu suava inteiro.
E eles não saiam dali.
Que merda. Atrapalhando a
compra do meu Viagra.
Que
desgraça!
Se o tempo voltasse, eu não
entraria naquela farmácia.
Nunca mais!!!
E a balconista nos olhando com
aquela cara de vitoriosa.
Diaba!!!
E um outro balconista ao lado,
olhando como se soubesse de tudo e
também como se não soubesse de
nada. Eu já nem sabia o que cada
um
sabia.
Nisso, a balconista berrou pro
outro balconista:
-Já chegou o Viagra?
Ontem não tinha!
Acho que a farmácia inteira
escutou. Eu queria chorar.
De raiva.
Uma semana depois ainda
ressoa na minha cabeça a
frase:
"Já chegou o Viagra?
Já chegou o Viagra?"
O balconista me olha e diz.
-Temos um similar, que é como
se fosse um Viagra Turbo.
Viagra turbo. Puta merda!!!
A mulher do meu amigo, que tava na
farmácia, ficou vermelha.
Também, acho que faz alguns anos
que não transam...
Empurrou meu amigo e me disseram:
-Até já!!!
A coisa não podia estar pior.
Daí o segundo vendedor
me diz, bem alto:
-Nunca usou esse similar do
Viagra? É o bicho!
Um pouco mais caro, mas
o efeito é de 36 horas!
Como se eu fosse um garoto de
programa, que precisasse de
desempenho total.
Eu achei que fosse desmaiar de
tanto mal estar.
Deixe quieto, eu falei.
-Não, não, disse a vendedora...
E gritou pra um vendedor do
final do balcão:
-Tem Viagra ou não, Jair???
-Pra quem que é o Viagra?,
diz o Jair... Será
que tinham que pronunciar a
palavra Viagra sempre?
-Pra esse senhor aqui, Jair!
diz a diaba. E aponta
com a cabeça em minha direção.
E que
outra direção poderia ser?
-O senhor chegue aqui!
diz o Jair.
E a mulher do meu amigo
médico, ali por perto, como se
não tivesse escutando nada, mas
acompanhando tudo. Aquela
cadela. Azar é pra quem tem.
Acredito que ela ali da farmácia,
via celular, já fazia a notícia
circular no bairro:
o Dico não
fode mais!
Fui até o Jair, como o maior
pecador chegando até São Pedro,
o que faz os julgamentos na
entrada do céu.
O Jair lazarento me olhou como
quem diz....
-Muito bem, seu
broxa!...
O senhor quer embalagem com
quantos?
-Com quantos tiver... sussurrei,
meio gaguejando.
Eu queria é ir embora. Que o
chão se abrisse. Nem que
eu não fodesse nunca mais.
Se eu tivesse imaginado o pior,
não seria tão ruim quanto foi.
Peguei o Viagra com o Jair
lazarento e voltei até a diaba.
-Que bom que tinha...
diz a diaba. Como se
eu fosse transar com ela. Aquela
bruxa. Eu ia precisar da cartela
inteira com ela. Aliás nem com a
cartela inteira.
Peguei a nota e saí em direção
ao caixa.
E o médico meu amigo, grita:
-Até mais, Dico.
A mulher dele não levantou a cabeça,
continuou olhando uns sabonetes.
Mas, pensando
no Viagra. Aquela
véia!
Que tragédia!
Mas, o medicamento
foi o bicho!
Sem
dúvida.
Uma semana depois vi que eu tinha
feito uma besteira.
Eu tinha que ter
comprado várias
cartelas.
Agora eu tinha que recomeçar
tudo!!!
E por onde? Voltar lá com a diaba e
com o Jair lazarento?
Nunca!
Mas por outro lado, eles já me
conheciam. Seria como que um
segredo profissional.
Melhor do que ir em outra
farmácia e a notícia se alastrar.
É, tive que começar tudo de novo!
Hoje pela manhã, voltei na farmácia
do Jair lazarento e da Diaba,
a Farmácia Ideal. Ideal o cacete.
Puto da vida.
Não é que quando chego lá no balcão
dos fundos, vem aquela puta
da esposa do meu amigo médico
(tavam lá de novo!),
me olha e
antes de me dar bom dia, me diz:
-Virou freguês, é ?
E deu uma gargalhadinha,
com sorriso de hiena.
Cadela! Vagabunda! Feia!
Véia! Vó! Miss Inferno!!!
Fiquei vermelho, olhei pro
balcão e vi o Jair Lazarento
e a Diaba!
Essa, meio que sorrindo,
como quem diz:
- O Brocha voltou.
Gostou
da festa!!!
Filho das puta!!!
Nem vou contar o resto.
Mas sofri muito de novo!

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