Thiago [POR WALTER BENJAMIN E SELIGMANN- Felício (PPGEL / SILVA] NUEHIS) OBJETIVO
Discutir a importância da narrativa de
trauma como uma política de memória. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS WALTER BENJAMIN E SUA TEORIA SOBRE O NARRADOR(2012) PRIMO LEVI E A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA (2015) SELIGMANN-SILVA E A NARRATIVA DE TRAUMA (2012) WALTER BENJAMIN É um dos mais importantes pensadores do século XX. Filósofo, ensaísta, crítico literário e tradutor, abandonou sua carreira acadêmica após a rejeição de sua tese de livre-docência, intitulada Origem do drama trágico alemão, pela Universidade de Frankfurt, que a considerou pouco convencional. Escreveu peças para rádio, além de artigos para diversos jornais e revistas, entre elas a Zeitschrift für Sozialforschung, revista do Instituto de Pesquisa Social (mais tarde conhecido como “Escola de Frankfurt”). PRIMO LEVI Primo Levi (1919-1987) foi um escritor e químico italiano de ascendência judaica. Sobrevivente de Auschwitz, ele dedicou sua vida a uma reflexão profunda sobre a frágil condição humana. É isto um homem? é considerada uma das obras memorialísticas mais importantes do século XX. SELIGMANN-SILVA Márcio Seligmann-Silva (São Paulo, 1964) é um tradutor, teórico e crítico literário, além de professor universitário na UNICAMP. Foi o ganhador do Prêmio Jabuti de Literatura em 2006 e finalista na mesma premiação em 2000. Formou-se em História pela PUC-SP e tem mestrado em literatura alemã pela USP, doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada pela Universidade Livre de Berlim (1996), pós-doutorados pela PUC- SP (1998, CNPq e 1999, FAPESP), pós- doutorado pelo Zentrum für Literatur- und Kulturforschung Berlin (ZfL) (2002) e pós- doutorado pelo Departamento de Alemão da Universidade Yale (2005). ASPECTOS BENJAMINIANOS SOBRE O NARRADOR “São cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente. Quando se pede num grupo que alguém narre alguma coisa, o embaraço se generaliza. É como se estivéssemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienável: a faculdade de intercambiar experiências.” (BENJAMIN, 2012, p. 213) “No final da guerra, observou-se que os combatentes voltavam mudos do campo de batalha não mais ricos, e sim mais pobres em experiência comunicável. E o que se difundiu dez anos depois, na enxurrada de livros sobre a guerra, nada tinha em comum com uma experiência transmitida de boca em boca.” (BENJAMIN, 2012, p. 214) ASPECTOS BENJAMINIANOS SOBRE O NARRADOR “Entre estes, existem dois grupos, que se interpenetram de múltiplas maneiras. A figura do narrador só se torna plenamente tangível se temos presentes esses dois grupos (...) camponês sedentário e outro pelo marinheiro comerciante. (...) No entanto essas duas famílias, como já se disse, constituem apenas tipos fundamentais. (BENJAMIN, 2012, p. 198-199) .A exaltação de Leskov como exemplo de um exímio narrador; “O primeiro indício da evolução na morte da narrativa é o surgimento do romance no início do período moderno. O que separa o romance da narrativa (e da epopeia no sentido estrito) é que ele está essencialmente vinculado ao livro”. (W.B., p. 201) ASPECTOS BENJAMINIANOS SOBRE O NARRADOR A arte de narrar está jporque [fim da p. 200] a sabedoria - o lado épico da verdade - está em extinção. Porém esse processo vem de longe. Nada seria mais tolo que ver nele um "sintoma de decadência" ou uma característica "moderna". Escrever um romance significa, na descrição de uma vida humana, levar o incomensurável a seus últimos limites. Na riqueza dessa vida e na descrição dessa riqueza, o romance anuncia a profunda perplexidade de quem a vive. O primeiro grande livro do gênero, Dom Quixote, mostra a grandeza e alma, da coragem e a generosidade de um dos mais nobres heróis da literatura são totalmente refratárias ao conselho e não contêm a menor centelha de sabedoria. ASPECTOS BENJAMINIANOS SOBRE O NARRADOR “A morte é sanção de tudo o que o narrador pode contar. É da morte que ele deriva sua autoridade”. (W.B., p.206) “Cada vez se pretende estudar uma certa forma épica é necessário investigar a relação entre essa e historiografia. Podemos ir mais longe e perguntar se a historiografia não apresenta uma zona de indiferenciação criadora com relação a todas as formas épicas. Nesse caso, a história escrita se relacionaria com as formas épicas como a luz branca com as cores do espectro. (...) entre todas as formas épicas a crônicas é aquela cuja inclusão na luz pura e incolor da história escrita é mais incontestável”. (p. 209) ASPECTOS BENJAMINIANOS SOBRE O NARRADOR “Não se percebeu devidamente até agora a relação ingênua entre o ouvinte e o narrador é dominada pelo interesse em conservar o que foi narrado. Para o ouvinte imparcial, o importante é assegurar a possibilidade da reprodução. A memória é a mais épicas de todas as faculdades. Somente uma memória abrangente permite a poesia épica apropria-se do curso das coisas, por um lado resignar-se, por outro lado, com o desaparecimento dessas coisas, com o poder da morte”. (W.B. ,p. 210) “o narrador figura entre os mestres e os sábios. Ele sabe dar conselhos: não para alguns casos, como o provérbio, mas para muitos casos, como o sábio. Pois pode recorrer ao acervo de toda uma vida. (...)O narrador assimila à sua substância mais intima aquilo que sabe ouvir dizer. Seu dom é poder contar sua vida”. (W.B., p. 221) A NARRATIVA DO TRAUMA, POR SELIGMANN- SILVA “Ele (O testemunho) se apresenta como condição de sobrevivência.” (p. 66) “Sabemos que dentre os sonhos obsessivos dos sobreviventes consta em primeiro lugar aquele em que eles se viam narrando suas histórias, após retornar ao lar.” (p. 67) “A narrativa teria, portanto, dentre os motivos que a tornavam elementar e absolutamente necessária, este desafio de estabelecer uma ponte com “os outros”, de conseguir resgatar o sobrevivente do sítio da outridade, de romper com os muros do Lager. A narrativa seria a picareta que poderia ajudar a derrubar este muro.” (p. 66) “Narrar o trauma, portanto, tem em primeiro lugar este sentido primário de desejo de renascer.” (p. 66) A NARRATIVA DO TRAUMA, POR SELIGMANN- SILVA “O próprio grau de violência impediu que o testemunho pudesse ocorrer. Sem testemunho, evidentemente, não se constitui a figura da testemunha.” (p. 67) “Primo Levi também destacou em diversas oportunidades esta impossibilidade do testemunho. Ele afirmava que aqueles que testemunharam foram apenas os que justamente conseguiram se manter a uma certa distância do evento, não foram totalmente levados por ele como o que ocorreu antes de mais nada com a maioria dos que passaram pelos campos e morreram” (p. 68) “Na situação testemunhal o tempo passado é tempo presente. (...) O trauma mostra- se, portanto, como o fato psicanalítico prototípico no que concerne à sua estrutura temporal.” (p. 69) A NARRATIVA DO TRAUMA, POR SELIGMANN- SILVA “A linearidade da narrativa, suas repetições, a construção de metáforas, tudo trabalha no sentido de dar esta nova dimensão aos fatos antes enterrados. (...) Falando na língua da melancolia, podemos pensar que algo da cena traumática sempre permanece incorporado, como um corpo estranho, dentro do sobrevivente. Na cena do trabalho do trauma nunca podemos contar com uma introjeção absoluta.” (p. 69) “O estranhamento está intimamente vinculado ao tema da irrealidade dos fatos vividos e da consequente inverossimilhança dos mesmos. Este constitui um topos importante das narrativas do trauma.” (p. 69) A NARRATIVA DO TRAUMA, POR SELIGMANN- SILVA “O trauma encontra na imaginação um meio para sua narração. A literatura é chamada diante do trauma para prestar-lhe serviço.” (p. 70) “Ao invés de negarmos ao testemunho a possibilidade de ver na imaginação e em seu trabalho de síntese de imagens um potente aliado, devemos, com Derrida (1998), ver nesta aproximação entre o campo testemunhal e o da imaginação a possibilidade mesma de se repensar tanto a literatura, como o testemunho e o registro da escrita autodenominado de sério e representacionista” (p. 70) “Todo testemunho é único e insubstituível. (...) O testemunho como evento singular desafia a linguagem e o ouvinte.” (p. 72) “Sabemos do valor atribuído em nossa sociedade aos sobreviventes.” (p. 73) A NARRATIVA DO TRAUMA, POR SELIGMANN- SILVA - A POLÍTICA DA MEMÓRIA “O testemunho é uma modalidade da memória.” (p. 74) “nunca existiu um documento da cultura que não fosse ao mesmo tempo um [documento] da barbárie” BENJAMIN Apud Seligmann-Silva (p. 74) “Já na América Latina, sobretudo desde os anos 1960, o conceito de testemunho adquiriu uma centralidade enorme no contexto da resistência às ditaduras que assolaram o continente.” O negacionismo. / O apagamento dos locais de memória / “A memória da barbárie tem, portanto, também este momento iluminista: preservar contra o negacionismo, como que em uma admoestação, as imagens de sangue do passado” A NARRATIVA DO TRAUMA, POR SELIGMANN- SILVA “O tema da narração do trauma de catástrofes históricas nos levou, portanto, a passar da cena do testemunho para a cena jurídica. Mas será esta capaz de permitir a construção da desejada passagem entre os indivíduos traumatizados pela catástrofe e a sociedade? ” (p. 78) Os dois tipos de testemunhos. “Talvez a busca deste local do testemunho seja antes uma errância, um abrir-se para sua assistematicidade, para suas fraturas e silêncios.” (p. 79) REFERÊNCIAS ARENDT, Hannah. Homens tem tempos sombrios. Tradução de Denise Bottman. São Paulo: Com.panhia das Letras, 2017 BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de História. In: Mágia e Técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 2012 BENJAMIN, W. O Anjo da história. Organização e Tradução de João Barrento, 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016 LEVI, P., BENEDETTI, L., Assim foi Auschwitz. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2015 SELIGMANN-SILVA. Narrar o trauma - a questão dos testemunhos de catástrofes históricas. Psicologia Clínica. Rio de Janeiro, Vol. 20, nº1, p. 65-82, 2008 Muito obrigado.